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Transcrição:

2. Argumentação e retórica

2.1. O domínio do discurso argumentativo a procura de adesão do auditório

2.1.1. Demonstração e argumentação

LÓGICA FORMAL Estuda as condições formais que os argumentos dedutivos devem cumprir para serem considerados corretos ou válidos. Qualquer argumento dedutivo pode ser avaliado do ponto de vista formal : é possível demonstrar a sua validade ou invalidade, independentemente da verdade ou plausibilidade das suas premissas e conclusão. Mas para um argumento dedutivo ser aceitável, persuasivo e convincente não chega ser formalmente válido: as suas proposições devem também ser verdadeiras.

Exemplo As pessoas muito inteligentes têm direito à liberdade. Os assassinos em série são pessoas muito inteligentes. Logo, os assassinos em série têm direito à liberdade. Apesar de ser considerado válido, este argumento dedutivo parte de premissas duvidosas, discutíveis, polémicas e chega a uma conclusão totalmente inaceitável. Embora se possa demonstrar que o argumento é formalmente válido, tal argumento dificilmente terá a capacidade de convencer um vasto número de pessoas, sendo possível argumentar a favor ou contra cada uma das suas proposições.

Além dos dedutivos, usamos argumentos indutivos, por analogia, de autoridade argumentos cuja validade depende de aspetos que vão para lá da sua estrutura formal. LÓGICA INFORMAL Tentativa de desenvolver um modo de avaliar e analisar os argumentos que ocorrem na linguagem comum, partindo do seu conteúdo/matéria e do seu potencial persuasivo. Tem em atenção todo o tipo de argumentos cujo potencial persuasivo não dependa apenas de critérios formais, mas também de critérios dialéticos, informais.

LÓGICA INFORMAL Está relacionada com esquemas argumentativos num contexto de diálogo. RETÓRICA ARGUMENTAÇÃO Arte de bem falar e de argumentar. Tem por objetivo persuadir e convencer um auditório a respeito de determinado assunto, levando-o a aceitar que uma certa tese ou opinião é preferível àquela que se lhe opõe.

Para conduzir alguém a uma conclusão que resulte necessariamente das premissas, precisamos apenas de o demonstrar seguindo os critérios da: Para conduzir alguém a uma conclusão apenas verosímil, plausível, preferível e razoável, teremos de argumentar seguindo os critérios da: LÓGICA FORMAL RETÓRICA DEMONSTRAÇÃO ARGUMENTAÇÃO Demonstrar é fornecer provas lógicas irrecusáveis, encadeando proposições de tal modo que, a partir da primeira, se é racionalmente constrangido a aceitar a conclusão. Argumentar é fornecer razões a favor ou contra uma determinada tese ou conclusão, tendo por finalidade provocar a adesão das pessoas a essa tese, pelo que é necessário que ela lhes pareça razoável.

visa mostrar a relação/conexão necessária entre a conclusão e as premissas OBJETIVO visa provocar a adesão do auditório a uma tese verosímil, plausível, preferível, provável D E M O N S T R A Ç Ã O caracteriza-se pela univocidade própria da lógica e das suas regras permite uma única interpretação pela pobreza da linguagem formal reduz-se a um cálculo lógico-formal é independente da matéria ou conteúdo é impessoal ao nível da prova: a validade não depende em nada da opinião é isolada de todo o contexto é dominada pela autoridade lógica LINGUAGEM OPINIÃO CONTEXTO E AUDITÓRIO caracteriza-se pela equivocidade própria da linguagem natural permite uma pluralidade de interpretações pela riqueza da linguagem natural apresenta razões a favor ou contra uma determinada tese é dependente da matéria ou conteúdo é pessoal: dirige-se a indivíduos em relação aos quais se esforça por obter adesão é contextualizada é dominada pela intersubjetividade A R G U M E N T A Ç Ã O é independente do orador e do auditório é dependente do orador e do auditório Apesar de distintas, demonstração e argumentação não estão separadas: nos diferentes discursos são combinados processos simultaneamente demonstrativos e argumentativos.

2.1.2. A procura de adesão do auditório

SER HUMANO Ser que comunica: tem opiniões, crenças, valores e tende a partilhá-los com os outros, desenvolvendo um ponto de vista próprio sobre o mundo em que vive. Na comunicação que estabelece com os outros, ele pode querer marcar uma posição, convencer alguém, defender a sua opinião, etc. Domínio da argumentação e da retórica Imagem 1 Imagem 2

1. Quem transmite as mensagens? A UNICEF é o orador responsável pelas imagens/campanhas. 2. O que se está a tentar defender? A posição ou tese que se pretende defender é a de que todas as crianças têm o direito a não beber água poluída. 3. A quem se dirige cada uma das imagens? Estas imagens dirigem-se a um auditório universal, ou seja, a toda a humanidade. 4. Parece-lhe eficaz o meio usado? O meio/instrumento usado é a imagem, a qual, em caso de campanhas que visam chegar a um auditório universal, constitui o meio mais eficaz, dado não sofrer constrangimentos linguísticos.

Argumento Conjunto de instrumentos usado para suportar ou justificar a razoabilidade e plausibilidade de uma tese ou opinião. Esses instrumentos podem ser imagens ou um conjunto de proposições usadas para suportar a tese ou conclusão. A argumentação é um conjunto de técnicas cuja finalidade consiste em provocar ou aumentar a adesão de um auditório às teses que se apresentam ao seu assentimento. Importância da relação entre o orador e o auditório.

Orador Deve conhecer previamente as motivações, as aspirações, os valores e as crenças do auditório. Na posse desse conhecimento, poderá adaptar ao auditório o tipo de linguagem, de exemplos, etc. Modo de tornar a argumentação eficaz, garantindo uma boa receção da tese.

Elementos da argumentação Opinião do orador Orador Argumento Auditório Contexto de receção Pertence ao domínio do verosímil: tese, causa, ideia ou ponto de vista. Aquele que argumenta, em seu nome ou em nome de outrem, expondo a sua opinião a um auditório. Opinião formulada para convencer, podendo ser apresentado por escrito, oralmente, pela imagem, etc. Pode tratar-se de uma pessoa, de um público, de um conjunto de públicos ou mesmo do próprio orador. Conjunto de opiniões, valores e juízos que um auditório partilha e que têm um papel essencial na receção do argumento: na aceitação, rejeição ou adesão variável.

Processo argumentativo Nem sempre o auditório é uniforme e homogéneo. Num único auditório, podem existir pequenas especificidades. Elas obrigam o orador a fazer um discurso mais abrangente ou a procurar argumentos que vão ao encontro das várias particularidades. Para que a tese obtenha a adesão desejada, o orador pode ter de ir ao encontro de diferentes auditórios particulares, adaptando os argumentos e a linguagem às suas distintas características e motivações.

Orador: APAV. Tese: A violência é um crime que deve ser denunciado. Argumento 1 Argumento 2 Quem não te respeita Há marcas que não te merece. ninguém deve usar. Auditório 1: jovens (do sexo feminino e masculino). Auditório 2: mulheres (jovens e adultas). Contexto de receção: crenças dos jovens em idade escolar relativas ao namoro, ao assédio verbal e à violência em geral. Contexto de receção: crenças das mulheres em relação à violência e em relação à sua própria dignidade. Adesão, ou não, à tese.

2.1.3. Persuadir e convencer: ethos, pathos e logos

Processo argumentativo Objetos de acordo Premissas admitidas pelo auditório: podem ser crenças, valores e verdades que fazem parte da opinião coletiva do auditório. Do âmbito do real: factos, verdades e presunções. Do âmbito do preferível: valores, hierarquias e juízos de valor. O orador deve começar por escolher o objeto de acordo que melhor se ajuste às motivações do auditório, para o persuadir ou convencer.

PERSUADIR CONVENCER Objetivo do discurso dirigido a um auditório particular. Segundo C. Perelman Objetivo do discurso dirigido a um auditório universal. Persuade-se um auditório particular, tendo em conta a sua especificidade afetiva, valorativa, etc. Convence-se um auditório universal, a partir de argumentos racionais que são universalizáveis. Mas, dado que o discurso argumentativo combina a arte de persuadir com a de convencer, não se deve estabelecer uma distinção demasiado rígida entre os dois conceitos.

Dimensões da relação retórica segundo Aristóteles ETHOS PATHOS LOGOS A eficácia da argumentação persuasiva depende destes três pilares fundamentais: do facto de ajuizarmos (logos), do facto de os juízos nos parecerem credíveis e fiáveis (ethos) e do facto de nos provocarem impressões por via das emoções que em nós despertam (pathos).

Ethos Um dos aspetos que nos levam a confiar no discurso de alguém, a ouvilo e a aderir aos argumentos é o carácter do orador, ligado à ideia que temos da sua credibilidade. Estamos predispostos a ouvir determinados assuntos se a cada um deles corresponder um orador que consideremos especialista desse domínio do saber. Temos sempre expectativas positivas ou negativas do orador: confiamos ou desconfiamos dele, e tendemos a dar crédito aos argumentos usados por oradores que consideramos dignos de confiança, honestos, sinceros e especialistas na área de saber em causa.

Pathos Para conseguir persuadir e convencer o auditório, o orador deve também criar uma empatia com tal auditório. Criação de um ambiente de proximidade e de envolvência, suscitando no auditório emoções que o predisponham a aceitar a tese proposta. Adaptar-se ao auditório: pelos objetos de acordo, pela linguagem, pelo conhecimento prévio das motivações e características dos interlocutores, pela capacidade de captar e manter a atenção. Um auditório impressionado, que sente, tem emoções e não é indiferente está mais predisposto a aceitar a tese do que um auditório apático. Os sentimentos que predispõem o auditório a aceitar uma tese podem ser positivos ou negativos: depende do tipo de tese.

Logos Encontra-se associado à consistência e à solidez do discurso. A maneira como os assuntos são abordados e a consistência com que os argumentos são apresentados fazem toda a diferença no processo de adesão do auditório a uma tese. Para ser eficaz, um discurso argumentativo deve fazer sentido, estar corretamente estruturado e ser rico ao nível da informação, dos factos ou das estatísticas que apresenta.

Dimensões da relação retórica ETHOS PATHOS LOGOS É a dimensão relativa ao carácter do orador. Este deve ser virtuoso e credível para conseguir a confiança do seu auditório. É a dimensão relativa ao auditório. Este deve ser emocionalmente impressionado e seduzido. É a dimensão relativa aos argumentos, ao discurso. O discurso deve estar bem estruturado do ponto de vista lógicoargumentativo, para que a tese se imponha como verdadeira.

DISCURSO PUBLICITÁRIO Exemplos de discursos que pretendem cativar a atenção do auditório DISCURSO DA PROPAGANDA POLÍTICA É dirigido a um auditório específico. Faz promessas veladas. Tenta responder a necessidades, mas também as cria. DISCURSO PUBLICITÁRIO Opta por mensagens curtas (imagem/sonoridade), com pouca informação. Propõe de forma condensada uma visão do mundo (sistema de valores). Atua a um nível implícito e inconsciente, sugerindo associações. É sedutor, pois dirige um apelo específico à sensibilidade e à emoção.

Propaganda política Para ser eficaz deve ir ao encontro ou responder às necessidades e preocupações manifestadas pela opinião pública. OPINIÃO PÚBLICA Conjunto de pensamentos, conceitos e representações gerais dos cidadãos sobre as questões de interesse coletivo. É a voz da sociedade civil ou a expressão da vontade coletiva. Dá forma à política e pode, inclusive, derrubar governos.

Dois tipos de opinião pública Baseado nas instituições: imprensa, partidos políticos, associações, universidades, comércio livreiro, rádio, teatro, cinema, televisão, etc. Não baseado nas instituições: comentários e conversas que as pessoas têm sobre acontecimentos recentes. Mas a opinião pública é, hoje, muito mais opinião de massas, opinião (de)formada pelos meios de comunicação social. Atualmente, não é tanto a opinião pública que dá forma à política, mas é mais o discurso político, divulgado pelos meios de comunicação social, que dá forma à opinião pública.

OPINIÃO PÚBLICA Dirige-se a vários auditórios particulares. Utiliza interrogações retóricas, expressões ambíguas e repetições. É sedutor, na medida em que procura atrair as massas. DISCURSO DA PROPAGANDA POLÍTICA Reforça opiniões prévias. É muitas vezes manipulador e demagógico. Forma a opinião pública e é também formado por ela.

2.2. O discurso argumentativo principais tipos de argumentos e falácias informais

2.2.1. Tipos de argumentos

Discurso argumentativo Estrutura e organização Introdução Desenvolvimento Conclusão Deve ser o mais breve possível, consistindo numa apresentação sumária da tese que se irá defender, ao mesmo tempo que se procura captar a adesão do auditório. Deve consistir na apresentação dos argumentos favoráveis à tese, bem como dos argumentos que servem para combater teses opostas, do modo mais claro possível. Deve apresentar uma síntese que permita confirmar a relevância da tese. A linguagem deverá ser o mais clara e concreta possível e os argumentos devem ser apresentados de um modo que permita distinguir as premissas da conclusão. É também fundamental usar premissas plausíveis e verosímeis.

Tipos de argumentos Argumentos dedutivos Argumentos não dedutivos Argumentos indutivos (induções) Argumentos por analogia Argumentos de autoridade Generalização Previsão A validade dos argumentos não dedutivos não depende da forma lógica, mas do grau de probabilidade, razoabilidade ou relevância das proposições que compõem o argumento.

Argumentos indutivos: GENERALIZAÇÃO Argumento cuja conclusão é mais geral do que a(s) premissa(s). REQUISITOS DE VALIDADE DAS GENERALIZAÇÕES: - partir de casos particulares representativos; - não existência de contraexemplos. EXEMPLO DE UMA GENERALIZAÇÃO VÁLIDA: O cão Mondego tem pelo. Logo, todos os cães têm pelo. Qualquer cão parece ser um caso representativo e ainda não se acharam contraexemplos. EXEMPLO DE UMA GENERALIZAÇÃO INVÁLIDA: O medicamento para a tosse teve efeitos secundários graves para a saúde do meu primo. Logo, todos os medicamentos fazem mal à saúde. Aquele medicamento não é representativo de todos os medicamentos e não será difícil encontrar um contraexemplo suscetível de tornar ilegítima a conclusão.

Argumentos indutivos: PREVISÃO Argumento que, baseando-se em casos passados, antevê casos não observados, presentes ou futuros. A sua validade está dependente da probabilidade de a conclusão corresponder, ou não, à realidade. Este é um tipo de argumento muito usado pelas ciências. EXEMPLO DE UMA PREVISÃO VÁLIDA: Todo o sistema natural observado até hoje evolui para um estado de máxima desordem, correspondente a uma entropia máxima. Por conseguinte, todos os sistemas naturais que doravante observarmos evoluirão para um estado de máxima desordem, correspondente a uma entropia máxima. Trata-se de uma previsão válida, na medida em que é provável que a conclusão corresponda à realidade. A verdade da premissa fornece uma forte razão para aceitar a conclusão.

Argumento por analogia Argumento que consiste em partir de certas semelhanças ou relações entre dois objetos ou duas realidades e em encontrar novas semelhanças ou relações. O argumento por analogia baseia-se na comparação estabelecida entre as coisas, supondo semelhanças novas a partir das já conhecidas. EXEMPLO DE UM ARGUMENTO POR ANALOGIA: Quando alguém entra para uma equipa de futebol, concorda em obedecer às decisões do treinador. A administração americana é como uma equipa de futebol. Logo, quando alguém entra para a administração americana, concorda em obedecer às decisões do presidente. Equipa de futebol = Administração americana Treinador Presidente Mas, se a administração americana é semelhante, em certos aspetos, a uma equipa de futebol, noutros aspetos será diferente. Um argumento por analogia é válido se as semelhanças entre as realidades forem mais relevantes do que as diferenças. EXEMPLO DE UM ARGUMENTO POR ANALOGIA INVÁLIDO: O Universo é infinito. A sociedade é tão complexa como o Universo. Logo, a sociedade é infinita. Os raciocínios por analogia são muito frequentes na infância. Também a arte se baseia bastante na analogia.

Argumento de autoridade Argumento que se apoia na opinião de um especialista para fazer valer a sua conclusão. Requisitos para ser considerado válido: o especialista usado deve ser um perito no tema em questão; não pode existir controvérsia entre os especialistas do tema em questão; o especialista invocado não pode ter interesses pessoais no tema em causa; o argumento não pode ser mais fraco do que outro argumento contrário. EXEMPLO DE UM ARGUMENTO DE AUTORIDADE VÁLIDO: Einstein disse que E = mc². Logo, E = mc². EXEMPLO DE UM ARGUMENTO DE AUTORIDADE INVÁLIDO: O futebolista X disse que E = mc². Logo, E = mc².

2.2.2. Falácias informais

FALÁCIAS INFORMAIS Argumentos inválidos, aparentemente válidos, cuja invalidade não resulta de uma deficiência formal, antes decorre do conteúdo, da matéria, da linguagem natural comum usada nesses argumentos. Falácia da petição de princípio Falácia do falso dilema Falácia do apelo à ignorância (argumentum ad ignorantiam) Falácia ad hominem Falácia da derrapagem, bola de neve ou declive escorregadio Falácia do espantalho ou do boneco de palha Falácia da causa falsa (post hoc, ergo propter hoc) Falácia do apelo à força (argumentum ad baculum) Falácia do apelo à misericórdia (argumentum ad misericordiam)

Falácia da petição de princípio Processo que consiste em assumir como verdadeiro aquilo que se pretende provar. A conclusão é usada, de forma implícita, como premissa, encontrando-se muitas vezes disfarçada com palavras de significação idêntica à das da conclusão. Argumento circular EXEMPLOS: Andar a pé é um desporto saudável. Logo, andar a pé é um desporto que faz bem à saúde. O ser humano é inteligente, porque é um ser que possui inteligência.

Falácia do falso dilema Consiste em reduzir as opções possíveis a apenas duas, ignorando-se as restantes alternativas. Trata-se, portanto, de extrair uma conclusão a partir de uma disjunção falsa. «Falso dilema» é sinónimo de «falsa dicotomia». Exemplo de uma disjunção falsa: Ou votas no partido x ou será a desgraça do país. (Outros partidos são ignorados.) EXEMPLO DE UM FALSO DILEMA: Ou votas no partido x, ou será a desgraça do país! Não votas no partido x. Logo, será a desgraça do país.

Falácia do apelo à ignorância (argumentum ad ignorantiam) Comete-se esta falácia sempre que uma proposição é tida como verdadeira só porque não se provou a sua falsidade ou como falsa só porque não se provou que é verdadeira. EXEMPLOS: A alma é imortal. Na verdade, ninguém provou que a alma morre com o corpo. Não existem fenómenos telepáticos, porque até agora ninguém provou que eles existem.

Falácia ad hominem É o tipo de argumento dirigido contra o homem. Em vez de se atacar ou refutar a tese de alguém, ataca-se a pessoa que a defende. Os ataques pessoais poderão centrar-se, por exemplo, na classe social, no partido político ou na religião da pessoa em causa. Muitas vezes, o objetivo destes argumentos consiste em desviar as atenções daquilo que está em causa. EXEMPLOS: A tua tese não tem qualquer valor, porque és um ex-presidiário. Sartre estava errado a respeito do ser humano, porque não ia regularmente à missa.

Falácia da derrapagem, bola de neve ou declive escorregadio Esta falácia é cometida sempre que alguém, para refutar uma tese, apresenta, pelo menos, uma premissa falsa ou duvidosa e uma série de consequências progressivamente inaceitáveis. Usa-se um exemplo que se estende indefinidamente para mostrar que um determinado resultado indesejável inevitavelmente se seguirá. Se permitirmos uma exceção a uma regra, mais e mais exceções se seguirão, o que conduzirá à inevitabilidade de a regra ser totalmente subvertida ou de haver consequências totalmente indesejáveis. EXEMPLO: É péssimo que jogues a dinheiro. Se o fizeres, vais viciar-te no jogo. Desse modo, perderás tudo o que tens. Em consequência, se não quiseres morrer à fome, terás de roubar.

Falácia do espantalho ou do boneco de palha Esta falácia é cometida sempre que o orador, em vez de refutar o verdadeiro argumento do seu opositor/interlocutor, ataca ou refuta uma versão simplificada, mais fraca e deturpada desse argumento, a fim de ser mais fácil rebater a tese oposta. Além de não tratar realmente a afirmação do adversário, o orador tende a criticar uma posição diferente daquela que tinha sido originalmente defendida pelo oponente. EXEMPLO: António defende que não devemos comer carne de animais cujo processo de industrialização os tenha sujeitado a condições de vida e morte cruéis. Manuel refuta António dizendo: «António quer que apenas comamos alface!» [Em momento algum António defende que não devemos comer todo e qualquer tipo de carne, sugerindo que sejamos vegetarianos («comer alface»), mas apenas aquele tipo de carne sujeito às condições descritas. O argumento é assim deturpado e simplificado.]

Falácia da causa falsa (post hoc, ergo propter hoc) A expressão «post hoc, ergo propter hoc» significa «depois disto, logo por causa disto». Nesse sentido, a falácia da causa falsa surge sempre que se toma como causa de algo aquilo que é apenas um antecedente ou uma qualquer circunstância acidental. EXEMPLOS: Fiquei com dores de cabeça no dia em que a minha avó fez um bolo. O bolo foi a causa das minhas dores de cabeça. Quando faço testes em dias de chuva, tiro negativa. Por isso, a chuva é a causa das negativas dos meus testes.

Falácia do apelo à força (argumentum ad baculum) Consiste em obrigar alguém a admitir uma opinião recorrendo à força ou à ameaça. Submetidos a ameaças físicas ou psicológicas, os indivíduos são levados a aceitar determinada conclusão ou tese, tendo em conta as consequências desagradáveis que adviriam da sua não-aceitação EXEMPLOS: É bom que aceitem o aumento dos impostos se não querem que o país vá à falência e venha aí uma ditadura. É muito conveniente que se acredite no que diz o nosso livro sagrado. Se alguém não acreditar, será queimado na fogueira.

Falácia do apelo à misericórdia (argumentum ad misericordiam) Esta falácia ocorre quando se apela ao sentimento de piedade ou de compaixão para se conseguir que uma determinada conclusão seja aceite. EXEMPLOS: O meu ato, embora horrível, merece desculpa: naquele dia eu não estava psicologicamente bem e doía-me o estômago. Esperamos que aceite as nossas teses. No último mês, praticamente não dormimos só para chegar a estas conclusões.