O PICO DE PRODUÇÃO DO PETRÓLEO: UMA ANÁLISE DAS VISÕES OTIMISTA E PESSIMISTA

Documentos relacionados
ECONOMIA DO PETRÓLEO

Segundo o Relatório 2010 do EIA, no grupo que não integra a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), o Brasil, o Cazaquistão e a

Energy Security Situation Report

Cenário Atual do Setor de Petróleo & Gás e suas Perspectivas

Petróleo e Gás: Investimentos, Oportunidades e Desafios

SEÇÃO 1 Panorama Internacional. Petróleo 1.1 Reservas 1.2 Produção 1.3 Refino 1.4 Preços. Gás Natural 1.5 Reservas 1.6 Produção

Palestra de Abertura. Evolução dos Preços Internacionais do Petróleo. Eraldo Porto

Conjuntura atual e perspectivas no mercado de afretamento Internacional. Jan Skåre e Fernando Cruz

EDITORIAL. offshore brasileiro? BOLETIM ENERGÉTICO DEZEMBRO Adaptado de Weekly Energy, Economic & Geopolitical Outlook - November.

Recursos e oferta de energia - petróleo e gás natural. Ano base 2004 (Resources and energy supplies - oil and natural gas.

FACT SHEET. BP Statistical Review of World Energy 2016

Nacionalismo petroleiro e NOCs

Alta do petróleo beneficia Petrobras e o Brasil, dizem especialistas

O preço do petróleo e o sinal dos tempos

Exploração dos recursos naturais Prof. Paulo Santana

PANORAMA ATUAL DA MATRIZ ENERGÉTICA BRASILEIRA

Renováveis. Não renováveis

Petróleo. Daniela Simioni NºUSP: Rafaela Duarte Pagliarini N USP:

da Petrobrás Audiência Pública Comissão Especial da Câmara dos Haroldo Lima Diretor Geral - ANP 21 de outubro de 2009

UM OLHAR SOBRE A MATRIZ ENERGÉTICA DO FUTURO. Pedro Parente Ethanol Summit 27/06/2017

Geopolítica do Petróleo, Petrobras e Pré Sal. Brasil aumenta a importância no Mundo

ENERGIA E DESENVOLVIMENTO Oferta, demanda e desafios

Combustível Brasil Bloco III Desafios para o abastecimento. Rio de Janeiro, 08 de março de 2017

Mudanças tecnológicas, econômicas e políticas globais e locais impõem uma reflexão sobre o gás natural e seu papel no futuro do Brasil.

Panorama e perspectivas do setor de O&G nas regiões N/NE. Salvador, 19 de julho de 2018

Cenários para Precificação do Petróleo e do Gás Natural. Adriano Pires

MUDANÇA CLIMÁTICA E CRESCIMENTO VERDE

Balanço 2016 Perspectivas Cana-de-açúcar

Exercícios on line Geografia Prof. Dinário Equipe Muriaé

AS FONTES DE ENERGIA

O PLANEJAMENTO ENERGÉTICO DE PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS EM UMA ERA DE TRANSIÇÃO

BALANÇO DE ENERGIA FATOS E DADOS

EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO DE PETRÓLEO NO ESPÍRITO SANTO PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO PARTICIPAÇÕES GOVERNAMENTAIS E REFLEXOS ECONÔMICOS

O Sistema Tecnológico da PETROBRAS

3 Apresentação do problema

ANEXO B. DADOS MUNDIAIS DE ENERGIA

PETRÓLEO BOLETIM ENERGÉTICO MARÇO 2017 A) PRODUÇÃO, CONSUMO E SALDO COMERCIAL DO PETRÓLEO. Júlia Febraro / Fernanda Delgado

Perspectivas da Indústria de Óleo e Gás no Brasil

Contextualização e Panorama Macro do setor Ieda Gomes

PARNAÍBA GÁS NATURAL. Gas onshore Desafios e Oportunidades de Exploração em Bacias de Nova Fronteira

Recursos naturais não-renováveis

Tendências de gastos até 2025

BOLETIM ENERGÉTICO FEVEREIRO 2017

INDÚSTRIA BRASILEIRA DE BENS DE CAPITAL MECÂNICOS

Energia Solar Para A Paz Mundial 1

Plano Estratégico Petrobras 2020 e Plano de Negócios

Classificação das Fontes de Energia

Exploração e Produção de Petróleo no Brasil Aspectos do Desenvolvimento do Pré-Sal

Consumo de Energia Primária (Repartição das Fontes) Gás Natural 24%

BOLETIM ENERGÉTICO MAIO 2017

Desafios da Energia no Brasil

Painel 3 MATRIZ ENERGÉTICA BRASILEIRA: DESAFIOS E ALTERNATIVAS. Nivalde de Castro Coordenador do GESEL Instituto de Economia da UFRJ

Brasília, 13 de julho de 2006

As fontes de energia e sua importância no mundo atual

IMPACTO DA PRODUÇÃO DE PETRÓLEO NO ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO (IDH)

Tipos de Fontes Energéticas

Xisto (Petróleo e Gás)

PANORÂMA DA INSDÚSTRIA DE PETRÓLEO E GÁS

RIO ALÉM DO PETRÓLEO

Fontes de Energia. ex=1. Prof.

PERSPECTIVAS PARA INDÚSTRIA DE REFINO NO BRASIL

Cumprimentar os presentes Agradecer IotA Por que o tema é relevante Hámais de 30 anos... Essa nova realidade que eu gostaria de compartilhar com v.

Energy Security Insight

RELAÇÃO DO CRESCIMENTO ECONÔMICO E CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA 1

Relatório Mensal sobre Combustíveis. Maio de 2019

Perspectivas Mundiais dos Biocombustíveis

Mesa-redonda sobre gás natural -IBP

DIEESE - FUP DESAFIOS ECONÔMICOS DO BRASIL APÓS AS DESCOBERTAS DO PRÉ-SAL.

Classificação das Fontes de Energia

Capitalização da Petrobras. Aspectos do Mercado Internacional e Impactos sobre a Economia Brasileira

Relatório de Pesquisa Indicadores Mundiais do Setor Elétrico: Março Julho 2008

Conceito. são os diversos tipos de materiais ou processos dos quais se podem obter energia. Podem ser divididos em dois grandes grupos:

Reestruturação da Indústria de Petróleo e Gás Natural no Brasil

FIESP - 14º ENCONTRO DE ENERGIA. Symone Christine de Santana Araújo Diretora do Departamento de Gás Natural Ministério de Minas e Energia

2 Processo de Refino no Brasil e Mercado

INDÚSTRIA BRASILEIRA DE BENS DE CAPITAL MECÂNICOS

ATIVIDADE ON-LINE DISCIPLINA: Redação. PROFESSOR: Dinário Série: 2ª Série Ensino Médio Atividade para dia: / /2017

FONTES DE ENERGIA PROFESSOR : DANIEL DE PAULA

Nota à Imprensa. Resultados do 2º Trimestre de Principais Destaques do Resultado. Principais Destaques Operacionais

DIVULGAÇÃO DE RESULTADOS 1º trimestre de Teleconferência / Webcast 18 de Maio de 2015

O que levou à alta dos combustíveis, pivô da greve dos caminhoneiros?

MÓDULO 02 GEOGRAFIA II

Desafios, Necessidades e Perspectivas na Formação e Capacitação de Recursos Humanos para Exportação, Refino e Distribuição de Produtos Existentes nas

INDÚSTRIA BRASILEIRA DE BENS DE CAPITAL MECÂNICOS

A Indústria de Petróleo e Gás Natural no Brasil: Situação Atual e Tendências Futuras no Contexto da Sustentabilidade Energética

Lucro da Petrobras: o papel da venda de ativos e da alta do petróleo

PETRORIO: EMPRESA BRASILEIRA INDEPENDENTE DE PETRÓLEO SEMINÁRIO APIMEC RIO 22 DE OUTUBRO DE 2015

2. METODOLOGIA DE PESQUISA

Cenário Macroeconômico Brasileiro

ESTADO, PETROBRÁS E SETOR DE PETRÓLEO E GÁS NO BRASIL: diretrizes para reconstrução da soberania nacional

Boletim de Recursos e Reservas de Petróleo e Gás Natural 2017

A Indústria Química em 2020 Um novo Rumo é possível. Marilane Oliveira Teixeira

Matriz Brasileira de Combustíveis

Predição é muito difícil, especialmente se for sobre o futuro.

Perspectivas para Exploração e Desenvolvimento do Pré-Sal

Exploração dos recursos naturais não-renováveis

A BUSCA PELA AUTOSUFICIÊNCIA

A VOLTA DO CRESCIMENTO: UM MOVIMENTO EM DOIS TEMPOS

downstream da Shell Argentina

Química Professora: Raquel Malta 3ª série Ensino Médio FONTE DE HIDROCARBONETOS

Transcrição:

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA MONOGRAFIA DE BACHARELADO O PICO DE PRODUÇÃO DO PETRÓLEO: UMA ANÁLISE DAS VISÕES OTIMISTA E PESSIMISTA GREGOR ALMEIDA BRUCHER Matrícula nº: 101100472 ORIENTADOR: Prof. Edmar Luiz Fagundes de Almeida MARÇO 2008

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE ECONOMIA MONOGRAFIA DE BACHARELADO O PICO DE PRODUÇÃO DO PETRÓLEO: UMA ANÁLISE DAS VISÕES OTIMISTA E PESSIMISTA GREGOR ALMEIDA BRUCHER Matrícula nº: 101100472 ORIENTADOR: Prof. Edmar Luiz Fagundes de Almeida MARÇO 2008 2 de 72

As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade do autor. 3 de 72

RESUMO A partir da triplicação do preço do barril do petróleo nos últimos quatro anos, este trabalho apresenta a evolução e a atual disponibilidade das reservas mundiais de petróleo. A temática do pico do petróleo tem por base os estudos de Hubbert, que foi pioneiro ao realizar estudos técnicos da relação consumo x disponibilidade, não só do petróleo e de hidrocarbonetos, mas de muitas outras fontes de energia finitas (carvão, gás natural, urânio etc.). Este trabalho expressa as opiniões antagônicas de autores pessimistas e otimistas em relação à exaustão do petróleo, da atual crescente demanda por esse recurso natural, bem como a distribuição geográfica desigual e a disponibilidade de recursos, conforme as teorias de Hubbert e Hotelling entre outras. Entre os argumentos dos autores pessimistas destacam-se a fraca qualidade dos dados disponíveis; a dificuldade de previsão de novas descobertas; a dependência da oferta mundial da produção de alguns reservatórios gigantes (giant fields); a não descoberta de poços de grandes proporções; a irregularidade geográfica da distribuição das reservas; a atuação politicamente orientada da OPEP; o ritmo de crescimento econômico e as demandas mundiais atuais, incompatíveis com o crescimento da oferta. Os autores otimistas acreditam que as forças de mercado, principalmente o custo de produção e o preço, além dos conseqüentes avanços tecnológicos serão suficientes para uma gradual extinção da era do petróleo como conseqüência do surgimento de combustíveis alternativos. Entre os resultados deste trabalho está a constatação de que o comportamento de longo prazo do mercado petrolífero dependerá do preço, do crescimento da demanda, do avanço tecnológico para crescimento da taxa de extração de petróleo em poços existentes, de inovações, não só voltadas para a possibilidade da descoberta de novas reservas mas, também, de novas tecnologias para aumentar a eficácia dos motores a combustão. Num prazo mais longo, a velocidade de substituição dos derivados do petróleo, notadamente no setor de transportes, é que determinará a demanda. Afinal, são essas as mudanças que farão com que o pico do petróleo seja harmônico ou caótico. 4 de 72

SÍMBOLOS, ABREVIATURAS, SIGLAS E CONVENÇÕES ANP bb bbd CERA EIA IEA GNL GTL TRR mb mbd OGJ OECD OPEP SEC USGS WO Agência Nacional do Petróleo Bilhões de barris Bilhões de barris por dia Cambridge Energy Research Associates Energy Information Administration International Energy Association Gás Natural Liqüefeito (LNG = Liquefied Natural Gas) Gas-To-Liquids (Processo de conversão de gases para líquidos) Total de Reservas Recuperáveis (URR = Ultimate Recoverable Resources) Milhões de barris Milhões de barris por dia Oil & Gas Journal Organization for Economic Cooperation and Development = Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEC = Organization of Petroleum Exporting Countries) Security and Exchange Comission (Comissão de Valores Mobiliários dos EUA) United States Geological Survey Revista World Oil 5 de 72

ÍNDICE INTRODUÇÃO...8 I. CAPÍTULO I CARACTERÍSTICAS E PANORAMA DO MERCADO DE PETRÓLEO...13 I.1. A origem do petróleo...13 I.2. Capacidade de Produção...15 I.3. Petróleo convencional e não convencional...17 I.4. Análise das reservas de petróleo...18 I.4.1. Distribuição por região...18 I.4.2. Evolução das reservas por região:...19 I.4.3. Distribuição das Reservas OPEP e Não-OPEP...19 I.4.4. Empresas supermajors, majors e empresas estatais...20 I.5. O petróleo vai acabar?...23 I.6. A escalada dos preços do petróleo a partir de 2002...23 I.7. Fatores que afetam o mercado de petróleo...24 I.8. Previsão de demanda segundo o International Energy Outlook 2006...26 II. CAPÍTULO II VISÃO PESSIMISTA EM RELAÇÃO AO PICO DO PETRÓLEO...29 II.1. O Modelo de Hubbert...30 II.2. Campbell...35 II.3. Laherrère...40 II.4. Simmons...43 II.5. Hirsch...44 III. CAPÍTULO III VISÃO OTIMISTA EM RELAÇÃO AO PICO DO PETRÓLEO...48 III.1. Qualidade dos Dados e Erro Metodológico:...49 III.2. Análise Histórica do padrão de consumo de energia...53 III.3. A Teoria Econômica baseada no Modelo de Hotelling...54 III.4. Avanços Tecnológicos...57 III.5. Ascensão do Gás Natural & Queda na Importância do Petróleo...59 III.6. Dificuldade dos Investimentos & Comportamento Econômico do Upstream...60 CONCLUSÃO...65 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...68 6 de 72

ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES, GRÁFICOS E TABELAS Ilustração 1 Cadeia de Suprimento da Indústria do Petróleo...10 Ilustração 2 Perfis de exaustão de Petróleo e Gás (cenário de 2005)...36 Gráfico 1 Preços nominais do Barril tipo Brent (US$) 2002-2008...9 Gráfico 2 Distribuição das Reservas por Região...19 Gráfico 3 Evolução das Rerservas por Região (bilhões de barris)...19 Gráfico 4 Evolução das Reservas OPEP e não-opep (bilhões de barris)...20 Gráfico 5 Consumo Mundial de Petróleo por setor (mbd)...27 Gráfico 6 Produção de Petróleo OPEP, não-opep e Petróleo não-covencional (mbd)...28 Gráfico 7 Curvas de Produção das Estimativas dos Picos de Petróleo...29 Gráfico 8 Curva Natural de Extração...31 Gráfico 9 Extração em uma Província Petrolífera...31 Gráfico 10 Exemplo da Correlação entre o as Descobertas e o Pico de Produção...32 Gráfico 11 Curva de produção do carvão...33 Gráfico 12 Curva de produção do petróleo...33 Gráfico 13 Energia obtida a partir do carvão e petróleo...33 Gráfico 14 Curva de Produção Total...34 Gráfico 15 Estimativa do Pico de Produção de Hubbert...35 Gráfico 16 Reservas das Empresas Estatais vs. Empresas Privadas...38 Gráfico 17 Reservas OPEP e não-opep...39 Gráfico 18 Razões R/P históricas e estimadas para Petróleo e Gás...41 Gráfico 19 Produção onshore dos 48 estados continentais (exclui Alasca e Havaí)...45 Gráfico 20 Revisões das Reservas Estimadas para Diferentes períodos no Mar do Norte...52 Gráfico 21 Tendências na Evolução do uso da Energia 1860-2000)...54 Gráfico 22 Trilha do preço deum recurso finito...55 Gráfico 23 Aumento dos juros...56 Gráfico 24 Comportamento monopolista...56 Gráfico 25 Curva deoferta de Longo Prazo de um Bem Finito...56 Gráfico 26 Número de plataformas em atividade x Preço do barril tipo Brent (1980-2007) 62 Gráfico 27 Preço do Barril (Crude de NY)...63 Gráfico 28 Médias das Diárias de Plataformas e Navios de Perfuração...63 Gráfico 29 Demanda e Utilização das sondas de perfuração...63 Tabela 1 Conceito de Reservas, segundo a ANP...14 Tabela 2 Conceito de Reservas, segundo o Oil&Gas Journal...14 Tabela 3 Relação R/P dos Países com as Maiores Reservas de Petróleo...16 Tabela 4 Empresas Privadas e Estatais Detentoras das Maiores Reservas...22 Tabela 5 Consumo de Energia pro Grupo de Países 2003-2030 (Quatriliões de BTUs)...27 Tabela 6 Estimativas de Picos de Produção do Petróleo...29 Tabela 7 Reservas Provadas de países selecionados da OPEP...39 Tabela 8 Reservas Provadas segundo as 4 fontes mais utilizadas...53 7 de 72

INTRODUÇÃO O transporte é como uma cola que une o mundo por terra, mar e ar. Mohammed Barkindo Um dos maiores fenômenos econômicos, sociais e culturais que vêm ocorrendo desde o início do século XX e se intensificando no presente é a globalização. Esse movimento pode ser compreendido de diversas maneiras, uma vez que se insere num amplo leque de aspectos do mundo atual. Segue uma descrição apropriada, do vencedor do prêmio Nobel em economia Joseph Stiglitz: Fundamentalmente, é a integração mais estreita dos países e dos povos que resultou da enorme redução dos custos de transportes e de comunicação e a destruição de barreiras artificiais à circulação transfronteiriça de mercadorias, serviços, capitais, conhecimentos e (em menor escala) pessoas (Stiglitz J. (2004)) O custo cada vez menor dos meios de transporte pode ser resultado dos constantes avanços em toda cadeia de logística e em seus processos. Podemos também considerar outros fatores que contribuem para o barateamento do transporte: equipamentos mais eficientes, o uso de contêineres, guindastes mais modernos, navios maiores, motores mais econômicos, estoques menores, etc. Não iremos no entanto analisar fatores de ordem logística nem tampouco o processo de globalização, mas a presente monografia aborda outro aspecto, talvez o mais significativo no custo do transporte: o combustível. Esse custo está diretamente relacionado ao preço do principal recurso utilizado para executá-lo o petróleo. Nosso objetivo é analisar a disponibilidade desse bem, considerando os dados disponíveis, os diversos argumentos de importantes autores e as teorias existentes num ambiente em que ocorre um súbita e acelerada alta no preço do petróleo. O gráfico a seguir ilustra a recente escalada dos preços desde 2002. Verifica-se que o preço do barril de petróleo subiu, de uma média de 20 US$, para preços além dos 80,00 US$, havendo períodos no final de 2007, em que o barril Brent foi comercializado acima de US$ 100,00. Esse fato foi o principal motivador deste trabalho já que trata-se de uma variação de preço de 200% do bem mais imporatante no setor energético e, definitivamente, um dos bens mais importantes hoje em dia, além de ser um dos fatores que viabilizou o fenômeno da globalização. 8 de 72

Gráfico 1 Preços nominais do Barril tipo Brent (US$) 2002-2008 Preço do Barril tipo Brent (US$) 2002-2007 $100 $90 $80 $70 $60 $50 $40 $30 $20 $10 $0 janeiro-02 abril-02 julho-02 outubro-02 janeiro-03 abril-03 julho-03 outubro-03 janeiro-04 abril-04 julho-04 outubro-04 janeiro-05 abril-05 julho-05 outubro-05 janeiro-06 abril-06 julho-06 outubro-06 janeiro-07 abril-07 julho-07 outubro-07 janeiro-08 Fonte: EIA (2007) Historicamente houve diversos períodos de preços voláteis do petróleo. Em 1880, temeu-se o esgotamento após a queda da produção do estado da Pensilvânia, nos EUA; 30 anos mais tarde, quando o setor de transporte começou a depender dos combustíveis líquidos acreditava-se na insustentabilidade da produção em acompanhar esse setor; na década de 20, após as grandes descobertas no Texas, os preços caíram rapidamente. Na década de 70, o maior choque do petróleo reabriu a questão da sustentabilidade da produção e dos preços. Naquela época, entretanto, o petróleo já era a principal commodity mundial, o que mobilizou governos e empresas a investirem em projetos alternativos de energia, uma vez que havia a preocupação de que os preços não voltariam a cair em função do esgotamento dos recursos de petróleo. No Brasil, por exemplo, foram realizados grandes investimentos por parte do governo e iniciou-se a produção de um combustível a partir da cana-de-açúcar o etanol. Já o contra-choque do petróleo em 1986, gerou a necessidade de subsídios para manter a sustentabilidade desses projetos e afastou o temor da escassez. A escalada do preço do petróleo a partir de 2002, após um longo período de preços baixos desde 1986, fez com que as atenções se voltassem uma vez mais para os estudos sobre a perspectiva de um esgotamento das reservas. Muitos autores associam a recente elevação dos preços com a perspectiva de esgotamento iminente das reservas petrolíferas. Por outro lado, outros analistas apontam outras causas para dinâmica recente dos preços, apresentando uma visão mais otimista. Neste trabalho apresentamos e analisamos as duas visões sobre a matéria e apresentamos uma tentativa de análise crítica. 9 de 72

Estrutura industrial Do poço até o consumidor, o petróleo e seus derivados percorrem uma longa trajetória. A gasolina que move o automóvel, por exemplo, requereu a descoberta e identificação de reservatórios comerciais de petróleo; o produto desses reservatórios necessita ser extraído e transportado até uma refinaria para ser transformado em gasolina - apenas um dos múltiplos derivados resultantes do processo - para então ser transportada, distribuída e disponibilizada, em um determinado posto, ao consumidor final. Para garantir ininterruptamente o singelo evento de encher o tanque é necessário um sistema industrial estruturado por diferentes segmentos de atividades em cadeia, a saber: 1. Exploração - que inclui a prospecção geofísica e testes de existência para a identificação das jazidas; 2. Produção e armazenamento; 3. Rede de transporte desde as áreas de produção até as áreas de refino; 4. Refino; 5. Distribuição para as áreas dos mercados de consumo dos produtos derivados do refino e 6. Comercialização. Por convenção, denomina-se upstream as atividades dos itens 1 e 2 e downstream as atividades a partir do refino (itens 3, 4, 5 e 6). A Ilustração 1 representa a cadeia de suprimento da indústria do petróleo, sendo que à esquerda está o upstream e à direita o downstream. Ilustração 1 Cadeia de Suprimento da Indústria do Petróleo 10 de 72 Fonte: API (2006)

Os atributos técnico-econômicos que fundamentam a economia do petróleo levaram a maioria das indústrias a integrarem verticalmente essas atividades de forma a distribuir os riscos e os custos entre os vários segmentos da cadeia industrial e obter um risco e custo médios que compensem os diferenciais de custo e aumentem os ganhos ao longo dos segmentos da indústria. Atualmente observa-se que o upstream, por um lado, possui um risco muito grande em decorrência de projetos de exploração fracassados devido à ausência de petróleo. Por outro lado, o lucro nessa atividade é muito maior do que no downstream, que possui menor risco e margem de lucro reduzida. Observa Alveal em Fundamentos de Economia do Petróleo : O sentido racional da integração, porém, obedece basicamente à natureza esgotável do petróleo e à incerteza característica da atividade de exploração e produção. Esta atividade concentra cerca de 70 % dos dispêndios de capital da indústria, dá origem a toda a sua cadeia de valor, e, sobretudo, centraliza as suas possibilidades de geração e apropriação da renda. (Alveal, C. (2003), p. 4) A princípio o petróleo em si não tem utilidade prática. Importantes são seus derivados e subprodutos. No setor de transportes, por exemplo, necessita-se da gasolina, do diesel ou do querosene (e não do petróleo). Ainda assim, mesmo que cada derivado tenha seu próprio mercado e preço, todos dependem diretamente dos preços do petróleo e é ele o principal indicador para os projetos de investimento. O petróleo é classificado de acordo com características físicas como: peso relativo, viscosidade e quantidade de enxofre e também quanto a sua origem geográfica. O tipo Brent, por exemplo, é uma combinação de 15 diferentes variedades encontradas na bacia do Mar do Norte; já o WTI (West Texas Intermediate) é uma cesta dos principais tipos de petróleo obtidos nos EUA; a OPEP usa como padrão uma mistura de óleos extraídos dos seus países produtores chamado Cesta de Referência OPEP (OPEC Reference Basket). O tipo Brent, que é o padrão comercializado na bolsa de Londres, é o petróleo mais negociado, embora em termos de volume negociado esteja perdendo espaço para o WTI. Além disso, por ser este o tipo mais estudado e possuir a maior quantidade de dados, o consideraremos como padrão nesta monografia. No primeiro capítulo descrevemos a origem do petróleo, a classificação das reservas, a participação de cada país na produção além de uma análise da evolução e situação atual das reservas. Distinguimos, também, os tipos de petróleo em convencional e não convencional. 11 de 72

No segundo capítulo analisamos a dinâmica do mercado de petróleo, a influência da OPEP e os fatores envolvidos na precificação da commodity, bem como a previsão da demanda futura. No capítulo III apresentamos o modelo de Hubbert que serve de base à maioria dos argumentos dos autores pessimistas ou seja, aqueles que acreditam na necessidade de intervenção imediata e prevêem conseqüências catastróficas decorrentes do pico do petróleo. No capítulo IV apresentamos os argumentos dos autores otimistas, segundo os quais, o fato de o pico do petróleo estar a décadas de distância não trará mudanças sociais e econômicas abruptas, podendo, inclusive, ser contornado suavemente. 12 de 72

I. CAPÍTULO I CARACTERÍSTICAS E PANORAMA DO MERCADO DE PETRÓLEO Na medida em que vem se tornando um bem cada vez mais necessário, a busca por petróleo aumentou, assim como a necessidade de se conhecer a quantidade existente bem como a capacidade de produção (oferta de curto prazo). I.1. A origem do petróleo O petróleo é um composto orgânico de origem incerta. Sua estrutura é basicamente formada a partir de hidrocarbonetos. É encontrado no subsolo, em bacias sedimentares, e está associado a outras matérias como rochas e gases. Conseqüentemente nem todo petróleo existente pode ser extraído. Para determinar a disponibilidade ou os limites de disponibilidade desse bem, são utilizados conceitos de recursos e reservas além da capacidade de produção disponível sustentável. A seqüência é indicativa da gradual certeza dos limites quantitativos disponíveis para sua produção como resultado do investimento realizado na fase de exploração e produção (upstream). Recursos e reservas são conceitos que identificam os limites de produção de petróleo cujos níveis e variações influenciam a dinâmica e as relações entre custos e preços no longo prazo. O conceito de recursos define a disponibilidade do óleo passível de extração em condições economicamente não comerciais e presumíveis num futuro indefinido. Pode-se dizer que os recursos são a quantidade máxima de petróleo que pode ser produzida. Veremos adiante que esse termo é de grande importância para o debate que segue entre os autores pessimistas, que consideram os recursos fixos, e os otimistas, que acreditam na variação da quantidade de recursos de petróleo. Já o conceito de reservas designa o potencial de óleo passível de ser economicamente extraído com a tecnologia disponível; Existem três definições, convencionalmente aceitas como certeza, na medição dos limites de quantidade: 1) reservas provadas identificadas com elevado grau de certeza em dimensão, localização e qualidade;2) reservas prováveis cuja avaliação é de certeza menor; e 3) reservas possíveis (baixa certeza) estimativas de volume de óleo a partir de um estágio incipiente de prospecção (inexistência de perfuração). De acordo com o Glossário da ANP, as reservas são classificadas como segue: 13 de 72

Reservas Reservas Desenvolvidas Reservas Totais Reservas Provadas Reservas Prováveis Reservas Possíveis Fonte: Glossário da ANP (2007) Tabela 1 Conceito de Reservas, segundo a ANP Recursos descobertos de gás natural e petróleo comercialmente recuperáveis a partir de uma determinada data Reservas de petróleo e gás natural que podem ser recuperadas através de poços existentes e quando todos os equipamentos necessários à produção já se encontram instalados Reservas de petróleo e gás natural que, com base na análise de dados geológicos e de engenharia, se estima recuperar comercialmente de reservatórios descobertos e avaliados, com elevado grau de certeza, e cuja estimativa considere as condições econômicas vigentes, os métodos operacionais usualmente viáveis e os regulamentos instituídos pelas legislações petrolífera e tributária brasileiras Reservas de petróleo e gás natural cuja análise dos dados geológicos e de engenharia indica uma maior incerteza na sua recuperação quando comparada com a estimativa de reservas provadas Reservas de petróleo e gás natural cuja análise dos dados geológicos e de engenharia indica uma maior incerteza na sua recuperação quando comparada com a estimativa de reservas prováveis. Total de Recursos Recuperáveis TRR Do inglês, Ultimate Recovery Rate (URR) essa é a taxa que representa quanto petróleo poderá ser produzido. Trata-se de uma estimativa subjetiva baseada, somente, nas informações disponíveis. Alguns autores consideram o TRR, por se basear em dados físicos e geológicos, como fixo; outros afirmam que a estimativa cresce em decorrência do aumento do conhecimento, dos avanços tecnológicos e das mudanças na economia. Economistas freqüentemente negam a validade do TRR uma vez que acreditam que a extração dos recursos depende de mudanças econômicas imprevisíveis, além da evolução tecnológica. Se considerarmos a metodologia do Oil&Gas Journal, que também é utilizado pelo Statistical Review of World Energy 2006 da BP, a distinção é a que segue: TRR (Total de Recursos Recuperáveis )= URR (Ultimate Recovery Rate) Tabela 2 Conceito de Reservas, segundo o Oil&Gas Journal Produção Cumulativa Reservas Descobertas Estimativa do total de petróleo produzido até uma determinada data Estimativa da produção futura de campos conhecidos e definidas através de distribuição probabilística Reservas Provadas Probabilidade superior a 90% Reservas Prováveis Probabilidade de pelo menos 50% Reservas Possíveis Probabilidade inferior a 50% (P10 ou P20) Recursos não Estimativa da quantidade de reservas que não foram identificadas Descobertos Fonte: BP Statistical Review of World Energy (2006) 14 de 72 O TRR é dividido em três grupos: produção cumulativa, reservas descobertas e recursos não descobertos. A produção cumulativa é a estimativa do total de petróleo

produzido até uma determinada data, o que o caracteriza esse dado como sendo o único bem próximo à realidade. As reservas descobertas são uma estimativa da produção futura de campos conhecidos e são definidas através da distribuição probabilística. Classificam-se em reservas provadas, prováveis e possíveis, em ordem decrescente de probabilidade. Comumente a probabilidade associada a esses tipos de reserva é de 90%, 50% e 20%, respectivamente. Taxa de recuperação das reservas (recovery rate ou recovery factor) É impossível produzir todo o petróleo de um reservatório. Daí, apenas uma fração do petróleo existente ser considerada como reserva. A relação entre a quantidade de reservas e a potencial quantidade petróleo que pode ser produzida é chamada de taxa de recuperação. Esta sempre cresce cronologicamente de acordo com o histórico das operações e em resposta às mudanças tecnológicas/ econômicas. A taxa só diminuirá se sugir algum problema técnico no reservatório o que é considerado como um caso isolado. Segundo a IEA (2005), a taxa de recuperação situava-se em em média torno de 20% em 1970 sendo que hoje varia de 35 e 50%. Este aumento é um dos principais fatores utilizados para revisões da TRR. Os avanços tecnológicos foram os responsáveis pelo aumento da taxa de recuperação das reservas. Essas tecnologias são divididas em três categorias: Recuperação Primária: utiliza a própria energia do reservatório para produção. Recuperação Secundária: através da injeção de água ou gás cria-se pressão no reservatório, possibilitando a continuidade e mesmo um aumento na produção. Recuperação Terciária: é o estágio mais complexo e avançado de produção onde se utilizam processos térmicos, além de solventes ou produtos químicos para diminuir a viscosidade do petróleo e extrair o óleo mais difícil. Os avanços tecnológicos para as recuperações secundária e terciária possibilitaram o aumento na taxa total das reservas. Em geral, a quantidade das reservas prováveis e possíveis passa a constituir as reservas provadas. Daí, o chamado crescimento da reserva. Assim como as reservas, os recursos empregados são, também, definidos por uma probabilidade, que, por sua vez, baseia-se em fatores geológicos, econômicos e tecnológicos. I.2. Capacidade de Produção A dinâmica do mercado petrolífero de curto e médio prazos é condicionada por um limite de disponibilidade mais restritivo, denominado capacidade de produção disponível sustentável para um dado período de tempo, sem comprometer a quantidade de jazidas de óleo a ser extraído. Este limite, também conhecido como reprodução econômica das reservas, é 15 de 72

medido por uma razão, convencionalmente designada R/P. Esta operação relaciona o fluxo de produção (b/d = barris por dia; b/a = barris por ano), num determinado período de tempo t, à disponibilidade de reservas necessárias para manter a produção desse fluxo em um período futuro t n. A relação R/P é o principal dado da dinâmica da indústria mundial do petróleo nos curto e médio prazos. O objetivo dessa relação é estabelecer a duração, por país, da produção atual, considerando as reservas fixas. Os países do Oriente Médio possuem o maior fator R/P. Segundo esses cálculos, a Arábia Saudita (maior produtor mundial), se mantiver os atuais níveis, produzirá por mais 65 anos. Também os grandes produtores como Iraque e Kuwait, mantidos os níveis atuais de produção e o montante de reservas, produzirão por mais 100 anos. Tabela 3 Relação R/P dos Países com as Maiores Reservas de Petróleo País Reservas* % do total R/P EUA 29.3 2.4% 11.8 México 13.7 1.1% 10.0 Total América do Norte 59.5 5.0% 11.9 Brasil 11.8 1.0% 18.8 Venezuela 79.7 6.6% 72.6 Total América Latina 103.5 8.6% 40.7 Cazaquistão 39.6 3.3% 79.6 Noruega 9.7 0.8% 8.9 Rússia 74.4 6.2% 21.4 Reino Unido 4.0 0.3% 6.1 Total Europa e Eurásia 140.5 11.7% 22.0 Irã 137.5 11.5% 93.0 Iraque 115.0 9.6% > 100 Kuwait 101.5 8.5% > 100 Arábia Saudita 264.2 22.0% 65.6 Emirados Árabes 97.8 8.1% 97.4 Total Oriente Médio 742.7 61.9% 81.0 Argélia 12.2 1.0% 16.6 Nigéria 35.9 3.0% 38.1 Total África 114.3 9.5% 31.8 Austrália 4.0 0.3% 20.0 China 16.0 1.3% 12.1 Índia 5.9 0.5% 20.7 Total Ásia Pacífica 40.2 3.4% 13.8 Total 1200.7 100.0% 40.6 não-opep 298.3 24.8% 21.0 OPEP 902.4 75.2% 73.1 *: bilhões de barris Fonte: BP Statistical Review of World Energy 2006, com dados das revistas Oil&Gas Journal, e World Oil, do Secretariado da OPEP, entre outros. 16 de 72 A capacidade de produção disponível sustentável depende da descoberta de novas reservas, do volume de investimento em exploração de novas áreas e da infra-estrutura

necessária para a extração. Essas variáveis são os indicadores de custos das novas descobertas e da extração do petróleo. Para calcular renda (ou receita) da atividade de E/P precisam ser analisados e comparados, com os preços de curto e longo prazo. Os dados disponíveis de recursos, reservas e capacidades de produção apresentam uma conduta migratória e sempre poluem as interpretações do já ocorrido e do que ocorrerá na indústria.. A característica migratória deve ser entendida como um movimento intertemporal, onde, em dado momento, não se conhece, com exatidão, a existência ou não de um recurso ou reserva, ou, ainda, que não há intenção de divulgar a informação por motivos que veremos adiante. A rigor, os dados designam um estoque nunca exato pois sua definição é função de um complexo de variáveis. Clô, A. (2000) e Adelman et al. (1983) definiram essas variáveis como: o desenvolvimento tecnológico na exploração prospectiva e a ocorrência de novas descobertas; a evolução do preço do petróleo; a evolução da demanda de petróleo e a evolução da taxa de juros. Todas interagem para estimular ou desestimular as decisões de investimento na incessante atividade de procura e identificação de novas descobertas. I.3. Petróleo convencional e não convencional Apesar de não existir uma definição padrão do que seja petróleo convencional e petróleo não convencional, considera-se ser petróleo convencional aquele que foi produzido em maior quantidade até hoje, por ser uma produção viável nas atuais condições econômicas e tecnológicas. O petróleo não convencional é obtido de vários modos com utilização de diversas formas de energia, algumas menos e outras mais intensivas. O petróleo extraído das areias betuminosas (tar sands) no Canadá é um exemplo. Os tipos de petróleo não convencionais mais conhecidos, segundo Campbell, C. (1998) são: Petróleo extraído em condições climáticas desfavoráveis (ex: Região Polar); Petróleo extraído de grandes profundidades offshore (ex: Brasil, Nigéria); Petróleo pesado e extra pesado (ex: determinadas regiões da Venezuela); Petróleo em poços tão pequenos que não se tornam economicamente viáveis; Petróleo produzido a partir de injeção de outra substância (ex: gás, água); 17 de 72

Petróleo produzido a partir do xisto betuminoso encontrado em rochas (oil shale), amplamente encontrado no estado americano do Colorado e Petróleo produzido a partir de areias betuminosas (ex: tar sands no Canadá). Segundo essa definição verificamos que, para Campbell, o petróleo produzido offshore no Brasil é considerado não convencional, por ser sua produção mais cara do que a do petróleo do Oriente Médio, com custo menor que 5,00 US$ por barril. É difícil saber o custo em diferentes regiões em razão da escassez de dados disponíveis nos países cujo petróleo é propriedade/monopólio das empresas estatais. Como veremos mais adiante, o conceito de petróleo convencional e não-convencional é um conceito dinãmico, sendo principalmente função da tecnologia, dos custos de produção e do preço do petróleo. Uma definição de origem mais econômica seria a de que, em geral, o petróleo nãoconvencional é aquele produzido com um volume de recursos conhecidos mas cujo custo de produção é muito alto. A medida que a tecnologia evolui, tornando-o competitivo, ele deixa de ser não convencional e passa a ser convencional. Atualmente parte das reservas nas areias betuminosas no Canadá já foi incorporadas às reservas como petróleo convencional, assim como as reservas offshore do Brasil, Mar do Norte, Golfo do México e Nigéria. I.4. Análise das reservas de petróleo O aumento na demanda por petróleo tem levado empresas e governos, com a utilização de novas tecnologias, a investir maciçamente na busca e ampliação das reservas, tanto na descoberta de novas como na manutenção das já existentes. I.4.1. Distribuição por região Conforme o Gráfico 2, observa-se que mais da metade das reservas mundiais situamse em uma pequena área geográfica, no Oriente Médio,. O mesmo ocorre em outras áreas, embora em proporções bem menores. No Brasil, a maior parte das reservas conhecidas está nas bacias de Campos e Santos. Nos EUA, as maiores bacias estavam no Texas embora, atualmente, a maior produção ser a dos reservatórios offshore do Golfo do México. Concluise que os reservatórios tendem a estar aglomerados geograficamente. 18 de 72

Gráfico 2 Distribuição das Reservas por Região 10% 3% 5% 9% América do Norte 12% América Latina Europa & Eurásia Oriente Médio África 61% Ásia e Oceania Fonte: BP Statistical Review of World Energy 2006 I.4.2. Evolução das reservas por região: O Gráfico 3 mostra a evolução das reservas mundiais de petróleo por região, exceto o Oriente Médio. Contrariando previsões anteriores de escassez, observa-se que, desde 1980, vem ocorrendo um crescimento global das reservas da ordem de 21% no período de 1980 a 2005. Só o Oriente Médio, saltou de reservas de 360 bilhões de barris para 740 bilhões de barris. Podemos observar que no mesmo período, na América do Norte, que inclui os EUA, México e Canadá, houve um declínio de 36%, sendo esta a única região que teve um encolhimento das reservas. Gráfico 3 Evolução das Rerservas por Região (bilhões de barris) 160.00 140.00 120.00 100.00 80.00 60.00 40.00 20.00 0.00 África Europa e Eurásia América Latina 1980 Oceania e Ásia América do Norte 1990 2000 2005 Fonte: BP Statistical Review of World Energy 2006 I.4.3. Distribuição das Reservas OPEP e Não-OPEP 19 de 72 O Gráfico 4 mostra as reservas mundiais de petróleo existentes nos países membros e são membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (em inglês OPEC

Organization of the Petroleum Exporting Countries OPEP). Esta organização, foi fundada em 1960 no Iraque, e tem como membros os países do Oriente Médio, Argélia, Indonésia e a Venezuela, entre outros. A OPEP procura associar a exportação do petróleo e o lucro obtido a políticas de desenvolvimento socioeconômico em seus países. Gráfico 4 Evolução das Reservas OPEP e não-opep (bilhões de barris) 1000 900 800 700 600 500 400 Não-OPEP 300 200 OPEP 100 0 1980 1990 2000 2005 Não-OPEP OPEP Fonte: BP Statistical Review of World Energy 2006 Os países membros da OPEP estão tradicionalmente comprometidos com o upstream da indústria mundial, deixando o downstream sob responsabilidade das empresas internacionais. Ultimamente porém, a OPEP tem investido também no downstream. Os países membros da OPEP, tomaram iniciativas para investir em projetos de downstream o que têm ocorrido a partir de iniciativas isoladas ou em conjunto com parceiros. Atualmente, uma capacidade de refino de 600.000 barris por dia está sendo construída, com plano de expansão adicional de 1.900.000 barris por dia. Entretanto, segundo a OPEP, isso não muda o fato de que o investimento em downstream é responsabilidade primária das empresas internacionais de petróleo e dos países consumidores. I.4.4. Empresas supermajors, majors e empresas estatais O movimento de fusões e aquisições (F&A) da década passada no setor petrolífero internacional acarretou na formação de empresas consideradas gigantes no setor (chamadas supermajors), como a ExxonMobil, ChevronTexaco, Total, e BP. Há que se considerar também operações de F&A entre empresas privadas de porte médio, como a ConocoPhillips. Devido a essas transações, as companhias privadas vêm, nas atividades de upstream, elevando suas escalas de produção em comparação com as estatais. Essas mesmas companhias estão também, ampliando as vantagens no segmento de downstream. 20 de 72

O movimento de F&A que ocorreu principalmente na década de 90 possibilitou as empresas compradoras adquirir as reservas das empresas compradas, viabilizando um aumento de suas reservas sem em nenhum momento ter investido na atividade de exploração. O que ocorria de fato, dados os preços muito baixos do petróleo, é que as empresas grandes decidiram que era muito mais fácil investir as quantias destinadas à exploração na aquisição de novas empresas, aumentando indiretamente suas reservas. Tal fato também resultou em subinvestimento na exploração de petróleo na década passada. Após solidificadas as F&A, as empresas incrementaram suas posições no ranking das maiores empresas do setor, como demonstra o The Economist(2005) com dados do Petroleum Intelligence Weekly publicado em dezembro de 2002. As referidas supermajors, resultantes de F&A, estão, juntamente com a Shell, entre as 10 maiores empresas de petróleo do mundo. Posição em 2005 Tabela 5 As 10 Maiores Empresas de Petróleo em 2005 Posição em 2004 Nome da empresa 1 1 Saudi Aramco Arábia Saudita 2 2 ExxonMobil EUA 3 4 NIOC Irã 4 3 PDV Venezuela 5 5 BP Grã Bretanha País de origem 6 6 Shell Grã Bretanha/ Países Baixos 7 9 PetroChina China 8 8 ChevronTexaco EUA 8 7 Total França 10 9 Pemex México Fonte: The Economist (2006) Todavia, esse movimento de F&A e a conseqüente formação das supermajors privadas, não reduziu a competição no setor a nível global. Pelo contrário; o que se observou a partir dos anos 90 foi maior concorrência no setor. Isto se explica pelo surgimento de novas companhias originadas de processos de privatização em alguns países da Europa, como na Itália (ENI) e na Noruega (Statoil e Hydro) e, também, pelo atuação mais agressiva das empresas estatais em outros países. Apesar do variado nível tecnológico e gerencial, mas principalmente pelo fato de serem influenciadas por fatores não econômicos, as estatais formam o segundo tipo de organizaçöes detentoras de reservas. A tabela abaixo lista as 20 maiores empresas de petróleo em relação às reservas. 21 de 72

Tabela 4 Empresas Privadas e Estatais Detentoras das Maiores Reservas Empresa País Reservas(bb) % estatal Saudi Aramco Arábia Saudita 259,800 100 NIOC Irã 132,740 100 INOC Iraque 118,000 100 KPC Kuwait 99,000 100 PDVSA Venezuela 77,000 100 Adnoc Emirados Árabes 55,200 100 LibyaNOC Líbia 22,700 100 NNPC Nigéria 21,200 100 Pemex México 18,786 100 Lukoil Rússia 16,000 8 Gazprom Rússia 28,616 73 Exxon Mobil EUA 73,000 - Yukos * Rússia 11,800 - PetroChina China 18,300 90 Petrobras Brasil 12,300 32 Qatar Petroleum Quatar 11,000 100 Total França 11,000 - Sonatrach Argélia 10,500 100 BP Reino Unido 10,300 - Chevron EUA 5,626 - *: atualmente controlada pelo governo russo Fonte: PDVSA, ExxonMobil, Petrobras, Total, BP e Chevron: dados obtidos nos websites das empresas em 2007. Para as outras empresas, dados obtidos na Petroleum Economist, de 2004. Observa-se a que a maior parte das reservas situa-se no poder das empresas estatais. O aumento recente nos preços do petróleo permite a associação de aumento do poder de mercado, principalmente das estatais. Em relação ao futuro do petróleo, o nível de preços é conseqüência de dois fatores: Grande parte das reservas encontram-se nos países membros da OPEP, sendo que cerca de 70% estão situadas no Oriente Médio. O crescimento da demanda aumentará a dependência mundial da produção e exportação desses países. Os investimentos em aumentos de produção dependem muito dos planos e do potencial das empresas estatais, notadamente nos países da OPEP. Como vimos acima, somente uma pequena parte das reservas atuais pode ser explorada por empresas privadas. Considerando esses fatores, podemos prever que os preços do petróleo serão fortemente influenciados pela geopolítica praticada no Oriente Médio e pela capacidade de financiamento para o aumento da produção dos países membros da OPEP. 22 de 72

I.5. O petróleo vai acabar? "Meu pai andava de camelo. Eu dirijo um carro. Meu filho voa em um jato. Seu filho andará de camelo." Provérbio Saudita O que motivou o presente trabalho foi a recente disparada dos preços do petróleo e a conseqüente influência na dinâmica da indústria e do mercado de petróleo e, ainda, a tentativa de obter uma definição de quanto petróleo está ou poderá vir a se tornar disponível. Após análise das opiniões de diversos autores que estudaram o assunto, há diversas indagações: O petróleo vai acabar? Quando? Quais as conseqüências da escassez? Quais as opções alternativas? Essas são as principais indagações. É fato que existe uma quantidade finita de petróleo no planeta. A questão mais importante é saber o QUANTO e tentar estabelecer o prazo de duração das reservas. Nos anos 70, acreditava-se que as quantidades de petróleo estavam se deteriorando e que era necessário, a curto prazo, desenvolver outro tipo de combustível para substituí-lo. Hoje, passados mais de 30 anos, pouco mudou nesse sentido, havendo, inclusive uma crescente dependência do produto. I.6. A escalada dos preços do petróleo a partir de 2002 Fatores cíclicos e de curto prazo não previstos convergiram de tal maneira que o crescimento da demanda vem pressionando os preços. Contribuem para essa alta o crescimento acelerado do PIB e o conseqüente aumento na demanda do produto. Outros fatores são a depreciação do dólar, os preços da gasolina, as mudanças estruturais na indústria do petróleo, as políticas da OPEP, a restrição na capacidade de produção e o estoque existente, persistentemente baixo. Expectativas sobre as condições futuras do mercado como o terrorismo, guerras e incertezas políticas, tal como a relação do governo russo com sua a maior petrolífera, a Yukos, foram rapidamente incorporadas ao preço do barril. Riscos políticos e financeiros, que ocorrem em países com governos instáveis e economias frágeis também exerceram forte influência na dinâmica do mercado de petróleo. Para exemplificar tais riscos, só em 2007 tivemos alguns exemplos de naturezas diversas que afetaram o preço do barril. 23 de 72 Greve de trabalhadores e consequente interrupção da produção na Nigéria, além de ameaça aos trabalhadores extrangeiros;

Corte de abastecimento do gás vindo da Rússia, afetando a oferta na Europa; Decalrações do presidente da Venezuela, Hugo Chavez, ameaçando as exportações para os EUA. Compras e vendas do ativo por especuladores também afetam o preço uma vez que operadores financeiros ajustam o portfólio de seus investimentos levando em consideração, também, as expectativas das condições de mercado futuro. Motivos de ordem climática, como ocorrido durante o furação Katrina, onde a as operações e produção do Golfo do México foram parcialmente interrompidas, além de pressões e exigências ambientais, principalmente com o crescente debate sobre aquecimento global, também influenciam o nível de preços. I.7. Fatores que afetam o mercado de petróleo Atualmente o petróleo é o combustível mais importante do setor energético; a relação entre crescimento econômico e aumento no uso de energia é direta, variando apenas a elasticidade-demanda da energia, isto é, o quanto de energia adicional é necessário para o PIB crescer, digamos 1%. Essa relação dependerá, entre outros fatores, principalmente da estrutura industrial dos países, dos hábitos da população e da disponibilidade e tipos das fontes de energia. Além da absoluta importância no mercado de energia, o petróleo tem peculiaridades que as outras commodities não apresentam. Poucos mercados de commodity possuem, por exemplo, uma instituição como a OPEP. Desde sua criação em 1960, a OPEP influencia o preço de forma variada através do sistema de cotas de seus países membros. O petróleo está também sujeito a cortes no abastecimento em função da instabilidade política em alguns países e é sensível a fatores tecnológicos característicos de sua cadeia de produção. Ainda, as transações mundiais de petróleo são fixadas em dólares americanos (US$) o que afeta o valor dessa moeda nos mercados de câmbio, além de implicar em mudanças no valor monetário das reservas, e portanto na capacidade de financiamento, dos países importadores e exportadores. A previsão da demanda mundial de energia e de petróleo é fortemente dependente do crescimento econômico mundial. Na última década ocorreu um crescimento econômico espetacular na Ásia continental, onde países tiveram taxas de crescimento do PIB de quase 10%. Como esses países estão em fase de transição de uma economia rural para economias 24 de 72

industriais, estruturalmente bem mais dependentes de energia, observa-se e ainda prevê-se grande aumento na demanda. De acordo com o relatório da OPEP, o maior aumento na demanda futura de energia ocorrerá nos países em desenvolvimento (OPEP, 2006b). Com uma população combinada de aproximadamente 2,5 bilhões, Índia e China recentemente testemunharam aumentos significativos de demanda. No futuro, a demanda deverá aumentar sensivelmente, uma vez que existem atualmente 10-20 veículos para cada 1000 habitantes na Chna enquanto que a média, nos países da OECD é de 500 veículos por 1.000 habitantes. Sendo o setor de transporte considerado como a maior fonte de crescimento na demanda por petróleo, há enorme potencial para o aumento do consumo do petróleo nesses países. Nos EUA o crescimento econômico está ligado a níveis mais altos de consumo no qual a demanda por gasolina é o componente principal. Tanto na China como nos EUA, o crescimento do PIB e o aquecimento da atividade econômica em geral, resultaram em aumentos na demanda por energia. Existe porém, uma relação de feedback para diminuir esse efeito, que pode ser definido de duas maneiras; na primeira hipótese, se os responsáveis pelas políticas financeiras considerarem que os custos cada vez maiores com o petróleo irão acarretar uma inflação de preços, decidirão provavelmente por adotar uma política monetária restritiva. Como conseqüência, a economia seria freada para conter a inflação. Se os consumidores não podem ou não querem reduzir o consumo de produtos derivados de petróleo diante da alta dos preços, eles provavelmente reduzirão gastos com outros bens e serviços, freando a economia pelo efeito substituição. A segunda maneira de se observar o feedback é na relação entre as nações. Na Rússia, por exemplo, o PIB cresceu por um lado graças ao aumento do preço e da quantidade de petróleo exportada e, por outro, como conseqüência do próprio crescimento da indústria russa de petróleo, por sua vez, resultante do boom nos preços. Preços altos levam a investimentos em exploração e desenvolvimento a nível mundial. Ao encontrar mais petróleo como conseqüência desse tipo de investimento, a oferta maior reduz o preço, afetando os países exportadores. A mesma lógica se aplica quando investimentos em combustíveis alternativos surgem como conseqüência dos altos preços do petróleo. A disponibilidade de um substituto para o petróleo reduz seu preço. 25 de 72

Segundo o relatório da OPEP, os combustíveis renováveis e de menor emissão contribuem positivamente para o mix energético dos países, embora sua participação marginal deverá manter elevada a demanda pelos derivados de petróleo (OPEP, 2006b). A demanda por petróleo também é afetada pelas políticas públicas dos países consumidores. Impostos sobre combustíveis e tarifas energéticas, além de gerarem receitas importantes e volumosas, são políticas para controlar a demanda, influir no meio ambiente pela redução de emissões e garantir a segurança energética. Tais políticas são consideradas voláteis e imprevisíveis e contribuem para incerteza de demanda futura. Cargas tributárias maiores ou mesmo subsídios para outro tipo de combustível desestimulam o consumo de derivados do petróleo na medida que favorecem o consumo de combustíveis alternativos. I.8. Previsão de demanda segundo o International Energy Outlook 2006 Ao analisar a previsão de demanda da Energy Information Administration (EIA-2003) até 2030 notamos que, considerando uma taxa média de crescimento do PIB mundial de 3,8%, a previsão de crescimento anual da demanda mundial por energia é de 2% até 2030, sendo que os países em desenvolvimento (não membros da OECD) serão responsáveis por 75% do crescimento das necessidades energéticas. A partir de 2015 esses países serão os maiores consumidores de energia. Em 2030, sua necessidade será 34% maior que a dos membros da OECD. Apesar do crescimento significativo na demanda dos países em desenvolvimento, os países desenvolvidos ainda são os maiores consumidores uma vez que o consumo per capita nesses países é bem maior. Estima-se que em 2025 esse consumo ainda seja cinco vezes maior do que o dos países não membros da OECD. Embora a estrutura demográfica seja mais determinante na necessidade energética do que o crescimento populacional devemos também considerar o crescimento demográfico mundial, onde cada indivíduo adicional gera uma necessidade energética, mesmo que tenha nascido em um país subdesenvolvido. Um fator que contribui para a incerteza de previsão da demanda futura é a relação crescimento do PIB/crescimento das necessidades energéticas. Historicamente tem se observado que países em desenvolvimento aumentam muito mais as necessidades energéticas do que os países desenvolvidos. Estes, para um mesmo crescimento do PIB, necessitam menos energia. Comumente a expansão no uso de petróleo é alimentada por crescimento econômico robusto, que resulta em atividade industrial e expansão do setor de transporte. 26 de 72

Tabela 5 Consumo de Energia pro Grupo de Países 2003-2030 (Quatriliões de BTUs) Variação Anual: 2003-2030 Região 2003 2010 2015 2020 2025 2030 (%) OECD 234.3 268.1 289.9 281.6 294.5 308.8 1 América do Norte 118.3 131.4 139.9 148.4 157 166.2 1.3 Europa 78.9 84.4 87.2 88.7 91.3 94.5 0.7 Ásia 37.1 40.3 42.8 44.4 46.1 48 1 Não-OECD 186.4 263.6 283.5 331.6 371 412.8 3 Europa e Eurásia 48.5 56.5 62.8 68.7 74 79 1.8 Ásia 83.1 126.2 149.4 172.8 197.1 223.6 3.7 Oriente Médio 19.6 25 28.2 31.2 34.3 37.7 2.4 África 13.3 17.7 30.5 22.3 24.3 26.8 2.6 América do Sul e Central 21.9 28.2 32.5 36.5 41.2 45.7 2.8 Total Mundial 420.7 608.7 683.4 613 686.4 721.8 2 Nota: Totais podem não ser somas devido a arredondamentos independentesrevisado até aqui. Fontes: EIA - International Energy Outlook 2006; 2010-2030 System for the Analysis of Global Energy Markets Estima-se que a demanda por petróleo cresça 47% de 2003 a 2030, de 80 mbd para 113 mbd, respectivamente, sendo que os países em desenvolvimento asiáticos (incluindo a China e Índia) serão responsáveis por quase metade desse crescimento. Observa-se entretanto, grande volatilidade nas previsões da própria EIA, uma vez que o relatório de 2005 previa que, já em 2025, a demanda atingiria 119mbd, principalmente por causa do preço bem menor do barril de petróleo em 2004. O maior responsável pelo incremento na demanda por petróleo é o setor de transporte, seguido pelo industrial e, em quantidades proporcionalmente bem menores, pelos setores residencial, comercial e elétrico como pode ser observado no gráfico a seguir: Gráfico 5 Consumo Mundial de Petróleo por setor (mbd) 140 120 100 80 60 40 Eletricidade Transporte Industrial Comercial Residencial 20 0 2003 2010 2015 2020 2025 2030 Fontes: EIA - International Energy Annual (2006); 2010-2030 System for the Analysis of Global Energy Markets 27 de 72

A produção de petróleo não convencional, por ser mais cara que a do petróleo convencional, se torna viável toda vez que o preço do barril do petróleo suba a níveis mais altos. Como pode ser observado no Gráfico 6, a seguir, partindo do princípio de que o preço do barril continue acima de 60 US$, observa-se que a produção de petróleo não convencional aumenta gradativamente. Gráfico 6 Produção de Petróleo OPEP, não-opep e Petróleo não-covencional (mbd) 70 60 50 40 30 20 OPEP não-opep Petróelo nãoconvencional 10 0 1990 2003 2010 2015 2020 2025 2030 Fontes: EIA - International Energy Annual (2006); 2010-2030 System for the Analysis of Global Energy Markets A oferta de petróleo não-opep crescerá gradativamente, de 48,9 mbd em 2003 para 72,6 mbd em 2030, na medida que preços mais altos viabilizarem investimentos em áreas antes consideradas não econômicas. Como resultado, o market-share da produção de petróleo não-opep em 2030 subirá para 62%, em comparação com os 61% em 2003. Vale notar que segundo a EIA os recursos disponíveis não sofrerão escassez até 2030, cabendo às circunstancias políticas, econômicas e ambientais o desenvolvimento da oferta e demanda de petróleo. Flutuações no preço sempre ocorrerão a curto prazo; mas, segundo o relatório, a longo prazo, as leis de mercado é que definirão a dinâmica da indústria mundial do petróleo. Assim, a substituição do petróleo por combustíveis alternativos, como o próprio gás natural, pode impôr um teto ao preço do petróleo. A preços mais altos, reservas marginais se tornam economicamente viáveis assim como o petróleo não-convencional é adicionado às reservas provadas. Avanços tecnológicos na exploração e produção devem contribuir para evitar maiores aumentos no preço assim que essas reservas adicionais forem incorporadas às já existentes. 28 de 72

II. CAPÍTULO II VISÃO PESSIMISTA EM RELAÇÃO AO PICO DO PETRÓLEO A partir da recente elevação dos preços do petróleo a imprensa internacional passou a dar um grande destaque aos autores que prevêem um iminente pico do petróleo. Estes autores tem realizado previsões a partir do modelo desenvolvido por Hubbert. Tais autores têm como principal desafio determinar a quantidade disponível de petróleo, para então utilizar-se do modelo e fazerem suas previsões sobre a ameaça do pico do petróleo. Na Tabela 6 estão expostas diversas estimativas desses picos; no Gráfico 7 estão plotadas as curvas de produção estimadas dos referidos picos de produção. A teoria e metodologia usadas para essas previsões serão, também, analisadas neste capítulo. Tabela 6 Estimativas de Picos de Produção do Petróleo Data Estimada Fonte Referência da Fonte e Origem 2006-2007 Bakhitari, A.M.S. Executivo de Petróleo (Irã) 2007-2009 Simmons, M.R. Diretor de banco de investimento (EUA) Após 2007 Srebowski, C. Editor de jornal de petróleo (Reino Unido) Antes de 2009 Deffeyes, K.S. Geólogo de empresa de petróleo (EUA) Antes de 2010 Goodstein, D. Vice Presidente da CalTech (EUA) Por volta de 2010 Campbell, C.J. Geólogo de Petróleo (Irlanda) Após 2010 World Energy Council ONG Mundial 2012 Pang Xionogqi Executivo de Petróleo (China) 2010-2020 Laherrère, J. Geólogo de Petróleo (França) 2016 EIA nominal case Análise da DOE (EUA) Após 2020 CERA Consultores de Energia (EUA) 2025 ou após Shell Empresa de Petróleo Fonte: The Economist (2005) Gráfico 7 Curvas de Produção das Estimativas dos Picos de Petróleo Fonte: TrendLines (2008) 29 de 72

A diversidade de visões e opiniões esta associada a falta de transparência que caracteriza o mercado mundial de petroleo, principalmente no que diz respeito às informações sobre reservas provadas onde as empresas estatais exploram os recursos petrolíferos. O boletim Infopetro de Janeiro/Fevereiro de 2005 fornece uma explicação para o alarme relacionado à credibilidade de informações relativas àquelas dos indicadores de reservas. A questionabilidade desse tipo de informação é um dos principais argumentos analisados pelos autores pessimistas. Ao longo de 2004, as questões empresariais decorrentes de falhas informacionais, no caso da Shell e de problemas fiscais, no caso da Yukos, ampliaram o grau de incerteza no mercado. O efeito Shell, que implicou na necessidade de reconhecimento de um menor nível de reservas provadas, acendeu uma luz amarela com relação à credibilidade das informações referentes à relação do indicador reservas/ produção, afetando o valor das ações da empresa. Mesmo admitindo-se que o problema possa ser apenas um episódio singular, é bastante compreensível a reação de desconfiança de muitos operadores, traduzida pela manutenção de prêmios mais elevados para cobrir os riscos informacionais. (Pinto Jr., H., & Motta,P., 2005, p. 3) A partir da apresentação do Modelo de Hubbert, este capítulo apresenta as visões de quatro autores influentes de visão pessimista com relação à proximidade do pico de produção de petróleo com conseqüências catastróficas. II.1. O Modelo de Hubbert Em artigo de 1956, o geólogo Marion King Hubbert afirmou que o petróleo se origina de alterações químicas sofridas por sedimentos orgânicos ao longo de milhões de anos. Esse material, inicialmente sólido, transforma-se em uma mistura líquida ou gasosa de hidrocarbonetos que preenche os interstícios de uma camada rochosa. Esses hidrocarbonetos, pelo fato de terem densidade inferior ao material orgânico original, estão submetidos a considerável pressão por parte das rochas que os contêm. Ao se perfurar um poço, a pressão nos poros da camada rochosa faz com que o petróleo aflore. A pressão da jazida explica o perfil de extração normalmente encontrado nos poços, como no Gráfico 8. Após uma rápida expansão até um pico, a extração decresce gradativamente. À medida que diminui a pressão o fluxo do petróleo fica comprometido em razão da tensão superficial dos poros. 30 de 72

Gráfico 8 Curva Natural de Extração Fonte: Campbell, C. (1997) O fenômeno ocorre não só em poços individuais, mas também, de uma forma geral, nas jazidas de toda uma província petrolífera. A única e crucial diferença é que, em face dos motivos econômicos utilizados para a otimização da produção de diversos poços, a produção de uma província petrolífera pode ser representada por uma curva normal (Gráfico 9). Quando o poder de mercado da empresa proprietária da jazida for suficiente para controlar a taxa de extração, pode ocorrer um patamar ao invés de um pico, ainda que não se observem modificações nos períodos de crescimento e declínio. Gráfico 9 Extração em uma Província Petrolífera Fonte: Campbell, C. e Laherrère, J. (1998) Baseando-se nos perfis de extração acima expostos, Hubbert previu que a produção de petróleo dos Estados Unidos atingiria seu pico em torno de 1970, seguindo-se um longo período de declínio. A previsão revelou-se correta (o pico foi atingido em 1969) e pode ser considerada como a origem mais sólida dos estudos a respeito da exaustão do petróleo. O ponto em que a produção atinge o clímax foi denominado Pico de Hubbert, em sua homenagem. A metodologia utilizada por Hubbert é relativamente simples se considerarmos os seus conceitos básicos citados abaixo. A premissa inicial é que as jazidas de petróleo são descobertas, em geral, de forma seqüencial, como descrito a seguir: primeiro descobrem-se as jazidas mais acessíveis; à medida que evoluem as tecnologias de prospecção e o conhecimento geológico da província em questão, descobrem-se as jazidas de maior dimensão; e 31 de 72

as últimas jazidas a serem descobertas serão as de acesso mais difícil e dimensões relativamente reduzidas. Essa seqüência corresponde, aproximadamente, a uma curva normal, cujo ponto médio seria ocupado pela jazida de maior porte da região. Tal perfil de descobertas não é apenas hipotético, mas coincide com a produção observada em diversas regiões. Por outro lado, a curva de produção também é aproximadamente normal desde que os produtores não interrompam artificialmente o aumento da extração (hipótese pouco realista numa conjuntura de crescimento do consumo). A evolução da produção numa determinada província permite, portanto, estabelecer uma estimativa razoavelmente precisa do pico de produção, desde que sejam conhecidos o total das reservas e a seqüência temporal da produção. O pico da produção pode ser estimado a partir da seqüência das descobertas. Conforme pode ser observado no exemplo do Gráfico 10, as sequencias de descobertas (barras em roxo) e da produção (linha verde) seguem, em linhas gerais, o mesmo padrão (curva normal), e é possível estimar o pico a curva de produção desde que considerada a defasagem de algumas décadas entre as curvas. Gráfico 10 Exemplo da Correlação entre o as Descobertas e o Pico de Produção Fonte: Campbell, C. (1997) A previsão de Hubbert foi bastante facilitada pela abundância de informações sobre a produção e descobertas de petróleo nos Estados Unidos e, também, pelo fato de que essa produção ter seu padrão influenciado, principalmente, por fatores econômicos. Aprofundando o seu estudo, Hubbert observa que, até o século XIII, a humanidade, dependia da energia solar para possibilitar a agricultura; utilizava-se da queima da madeira das árvores; da energia animal que dependia da ração, além das energias eólica e fluvial. As 32 de 72

grandes transformações nos modelos energético e econômico ocorreram a partir da descoberta dos combustíveis fósseis e devido ao desenvolvimento de tecnologias que possibilitaram o armazenamento em grandes quantidades de energia (carvão e petróleo). Em seu trabalho de 1956 Hubbert compara as descobertas e a produção do carvão mineral e do petróleo cru no mundo e nos EUA (gráficos 11-13). Gráfico 11 Curva de produção do carvão Gráfico 12 Curva de produção do petróleo Fonte: Hubbert, M. (1956) Fonte: Hubbert, M. (1956) Gráfico 13 Energia obtida a partir do carvão e petróleo Fonte: Hubbert, M. (1956) Hubbert destaca a semelhança das curvas pois todas iniciam com pequena inclinação seguida de um aumento. Chamou esse ponto de ponto de inflexão, que ocorreria por volta de 1915 para o carvão (Gráfico 11) e em 1950 para o petróleo (Gráfico 12). O ponto de inflexão significa a intensificação no uso do recurso. Para melhor entender esse comportamento são necessárias duas considerações. A primeira é a de que dois pontos da curva são conhecidos de antemão; o primeiro (t 0 ) sendo antes do início da produção; o segundo (t ) sendo o momento de sua exaustão. Isso signigfica 33 de 72

simplesmente que na produção de qualquer bem finito, sua quantidade começa em zero e volta ao zero após um período de produção máxima. A segunda consideração baseia-se no cálculo integral onde, para a representação gráfica de uma dada função de valor único y=f(x), a área entre a função e o eixo horizontal é representada pelo intervalo da integral onde a função corta o eixo horizontal, isto é, nos pontos conhecidos mencionados acima (t 0 e t ) da curva de produção de um bem finito (Gráfico 14). Gráfico 14 Curva de Produção Total Fonte: Hubbert, M. (1956) Como dito na introdução, é freqüente a utilização da relação reservas/produção quando se analisa o futuro da produção de petróleo que é justamente a taxa de produção (production rate) no eixo vertical do Gráfico 14. Hubbert previu a quantidade total de recursos em 1250 bilhões de barris, sendo: 90 bb produzidos (cummulative production) + 250 bb já descobertos (proven reserves) + 910 bb a serem ainda descobertos (future discoveries). Ao plotar o gráfico de produção de petróleo e considerar fixo o crescimento da taxa de produção futura, Hubbert estimou que o pico de produção mundial ocorreria em torno do ano 2000 (Gráfico 15). 34 de 72

Gráfico 15 Estimativa do Pico de Produção de Hubbert Fonte: Hubbert, M. (1956) É possível visualizar o formato de um sino (bell curve) com um pico que foi chamado de Pico de Hubbert. Aqui o artigo é apresentado de forma resumida, mas é a partir dessas informações que muitos autores, principalmente geólogos, consideram estar o pico da produção mundial de petróleo próximo ou mesmo já ter ocorrido. II.2. Campbell Colin Campbell baseia sua estimativa de produção futura de hidrocarbonetos utilizando dados sobre reservas, produção e estatísticas de perfuração. Afirma que a capacidade de oferta já foi excedida no ano 2000 o que acelerou os preços e causou recessão econômica. Além disso, afirma que qualquer sinal de recuperação econômica irá promover novamente demanda maior do que oferta o que resulta em um ciclo vicioso (Campbell, C. 1997). Acredita ainda que a produção de petróleo tomará o formato da curva em forma de sino plotada por Hubbert e que, após o ápice (pico), os preços do petróleo dispararão resultando em uma crise global. Fundamenta sua afirmativa com base no comportamento das forças de mercado (demanda e preços altos) que não podem contrariar um fato geológico nem as limitações da engenharia. Hoje cada nova descoberta é adicionada ao total de reservas. Campbell, entretanto, salienta a importância de se pré-datar (backdate) as revisões sobre as descobertas dos reservatórios. A ausência do backdate cria a ilusão de que as reservas estão aumentando o que poderia justificar o comportamento, para o petróleo, da teoria clássica da demanda e oferta. Quanto ao argumento de que a tecnologia evoluirá enquanto houver suficiente oferta, afirma: Podemos achar uma agulha num palheiro, mas ainda assim trata-se de uma agulha 35 de 72

(Campbell, C., 2002). Ou seja, a tecnologia possibilita a descoberta de novos campos que, por serem pequenos, pouco contribuem para um aumento significativo das reservas. Uma das maiores contribuições para chamar a atenção do pico do petróleo foi uma estimativa técnica detalhada de produção de hidrocarbonetos que utilizou-se de dados referentes à produção potencial futura, individual, dos países. Os resultados são somados para refletir um cenário global. Além dos dados publicamente disponíveis, Campbell também utilizou informações do banco de dados da IHS Energy. O resultado, amplamente usado e divulgado em publicações e newsletters da Associação do Estudo do Pico do Petróleo (em inglês Association for the Study of Peak Oil - ASPO) está representado na Ilustração 2. Conclui-se que o pico de petróleo ocorrerá por volta de 2010, embora a ASPO afirme que com razoável confiança ocorrerá um pico de produção a qualquer momento entre hoje e 2015 (ASPO Austrália, 2005). Para entender o argumento de Campbell, olhando para as curvas da ilustração e abstraindo a produção de gás natural, basta visualizar a grande área que representa a produção de petróleo convencional (verde) constrastando com a participação marginal e diminuta do petróleo não convencional: petróleo pesado (marrom), petróleo de águas profundas (azul) e petróleo de regiões polares (branco). Ilustração 2 Perfis de exaustão de Petróleo e Gás (cenário de 2005) Fonte: ASPO (2004) Dificuldade de mensuração das reservas As informações sobre a produção e reservas mundiais são bastante divergentes e, com freqüência, pouco confiáveis. A produção de petróleo na região com a maior reserva o 36 de 72

Golfo Pérsico sofre forte influência de fatores geopolíticos, o que distorce consideravelmente as projeções. Estimativas de reservas tomam por base dados de fontes diversas. Empresas estatais e privadas fazem suas previsões muitas vezes segundo suas próprias opiniões e objetivos, o que as torna bastante subjetivas. Como nota Campbell, mesmo usando as técnicas mais avançadas e de total objetividade, não é possível fazer uma previsão 100% correta: A principio sendo impossível de medir exatamente o quanto de óleo se encontra num reservatório hoje existem técnicas avançadas e diversas empresas que fazem dessa questão sua atividade. Dentre as técnicas se destacam a sísmica 3D, leituras elétricas (electric logs) e avançado conhecimento dos fatores geológicos e de engenharia. Sempre haverá incertezas até a exaustão do campo e seu conseqüente abandono, quando suas reservas iniciais se igualam à produção, mas a dimensão de incerteza pode ser definida e compreendida. (Campbell, C., 1997) Observando-se as empresas privadas é comum supor que, antes da exploração física de determinado campo, os exploradores superestimem o tamanho das reservas. Isso é conseqüência do fato de estarem sob pressão para investir na exploração ou para garantir aprovação corporativa. Caso o poço se revele promissor/produtor, é freqüente a divulgação de dados agora analisados por técnicos mais conservadores, com índices de probabilidade bastante altos e, portanto, com maiores possibilidades de que, em revisões futuras, a estimativa inicial aumente. A empresa exploradora prefere trabalhar com estimativas iniciais baixas por diversas razões: para suavizar o valor de seus bens durante os anos de insucesso, quando não há novas descobertas; para motivar os acionistas em relatórios anuais com reservas de reposição; e para diminuir a carga tributária ao possibilitar, ainda que indiretamente, maior investimento em depreciação. O crescimento das reservas, apesar de muitas vezes ser atribuído ao avanço da tecnologia, é, freqüentemente, nada mais que a correção de uma estimativa inicial intencionalmente baixa. Finalmente, Campbell afirma que ninguém nunca saberá quanto óleo existe, pois uma grande parte ficará eternamente na rocha. (Campbell, C, 1997) Apenas as empresas menores divulgam, ocasionalmente, estimativas otimistas, com intuito de inflar o preço de suas ações. Entretanto, essas estimativas, quando divulgadas, sofrem um rigoroso processo de avaliação da comissão de valores mobiliários (Stock Exchange Controls SEC, nos EUA) das bolsas de valores onde são negociadas, assunto do próximo capítulo. 37 de 72

Gráfico 16 Reservas das Empresas Estatais vs. Empresas Privadas 1200000 1000000 800000 600000 Estatais Privadas 400000 200000 0 Estatais mbb Privadas Fonte: elaboração própria a partir dos websites das 20 maiores empresas em reservas (dados de 2004) Grande parte das reservas mundiais é propriedade das empresas estatais. Sua divulgação sofre influência dos interesses governamentais que têm por objetivo, entre outros, transmitir uma imagem positiva do governo e viabilizar a obtenção de empréstimos externos. Essas estatais têm definições e motivações bastante exclusivas o que influi nos seus relatórios. Pela sua natureza, estão acima das rígidas auditorias externas que atingem suas congêneres particulares. Outra razão dessa dificuldade é a indefinição do que seja petróleo convencional e não convencional. O México exagerou quando incluiu em suas reservas um campo enorme, embora de difícil produção (Bacia de Chicontepek). Um fato significativo dessa afirmação ocorreu em 1987, quando a Venezuela dobrou seu potencial ao incluir uma reserva de 20bb de petróleo pesado (heavy oil), já conhecida há muito tempo. Como a OPEP reparte sua produção em cotas proporcionais às reservas de cada pais, a Venezuela foi beneficiada. Nos anos seguintes, observou-se aumento significativo e duvidoso nas reservas de outros países membros como Irã, Iraque, Kuwait e Arábia Saudita (ver Tabela 8 e Gráfico 18). Tal aumento pode ser parcialmente explicado pela revisão dos dados, pós-retirada das empresas de petróleo privadas, desses territórios. Mas, segundo Campbell, ainda assim esses dados deveriam ter sido pré-datados à época da descoberta. Mesmo assim, um aumento de 300bb em três anos sem grandes mudanças nos investimentos de exploração é pouco plausível, principalmente considerando que, nos anos seguintes, as reservas continuaram inalteradas mesmo com a produção contínua. 38 de 72

Gráfico 17 Reservas OPEP e não-opep 1400.0 1200.0 1000.0 800.0 600.0 OPEP não-opep 400.0 200.0 0.0 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Fonte: BP Statistical Review of World Energy 2006 (Dados de 2005) Tabela 7 Reservas Provadas de países selecionados da OPEP Reservas Provadas (1000 x mb): OPEP Ano 1980 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 Venezuela 20 20 25 26 28 54 56 58 59 59 60 63 63 64 65 Irã 58 57 56 55 59 59 93 93 93 93 93 93 93 93 94 Iraque 30 32 59 65 65 65 72 100 100 100 100 100 100 100 100 Kuwait 68 68 67 67 93 92 95 95 95 97 97 97 97 97 97 Quatar 4 3 3 3 5 5 5 5 5 5 3 3 3 3 4 Arábia Saudita 168 168 165 169 172 171 170 170 255 260 260 261 261 261 261 Fonte: BP Statistical Review of World Energy 2006 (Dados de 2005) Observa-se na Tabela 8 que nos anos de 1989-1993 Irã, Iraque e Kuwait declararam suas reservas inalteradas, o que é pouco provável, devendo-se subtrair do valor das reservas a quantidade da produção daqueles anos. Segundo Campbell, nos últimos 20 anos as reservas têm crescido constantemente, embora o autor ache inviável esse crescimento se manter nas próximas décadas. Afirma, também, que 80% da produção atual ser de campos descobertos antes de 1973, campos estes que já atingiram seu pico de produção. Para retardar a época do pico, Campbell salienta que reservas em lugares inexplorados, como grandes profundidades e regiões polares, podem ser significativas. Argumenta, entretanto que, como grande parte das bacias sedimentares já ser conhecida (com existência ou não de petróleo), as possibilidades de novas descobertas são remotas. O principal argumento e preocupação de Campbell sobre a insustentabilidade da situação futura é que atualmente a demanda por petróleo cresce a 2% ao ano e segundo ele, avançará 60% até 2020. Com o pico de produção mundial, excluindo a produção da OPEP, sendo atingido, a fatia de mercado (market-share) da OPEP irá aumentar possibilitando altas constantes e arbitrárias no preço do barril antes, ainda, de ser atingido o pico de produção. 39 de 72

Ele acredita, entretanto que, com preparação suficiente, isto é, com a utilização de algum substituto ao petróleo, principalmente no setor de transporte, a economia mundial poderá evitar o desastre. II.3. Laherrère Jean Laherrère utiliza outros tipos de estatísticas para reforçar a idéia original de Hubbert. Utiliza taxas e dados do crescimento populacional, da substituição do uso de animais como força motriz e de curvas de produção de óleo de baleia. O autor responsabiliza a OPEP, notadamente o sistema de cotas de produção baseadas nas reservas estimadas, pela falta de coerência nos dados divulgados pelos países membros. Como Campbell, considera a dificuldade de mensurar reservas, principalmente pelos países membros da OPEP. Sobre a ausência do backdate, afirma que: [...] as estimativas são baseadas em valores correntes, e nunca são revisados pelo Oil and Gas Journal ao passo que a World Oil compara os resultados com os do ano anterior. O relatório estatístico da BP usa dados do OGJ e não os seus próprios dados para evitar aborrecimentos com os membros da OPEP (eles fizeram isso no passado, mas foram reprimidos e não querem fazer isso de novo!). (Laherrère, J. (2004)) Quanto à tecnologia, compartilha as opiniões de Campbell de que sua influência como solução ser ambígua quando acelera e barateia a extração de poços convencionais, embora não reflita um aumento na taxa de extração. Segundo Laherrère, esta varia de 3% a 85% dependendo da porosidade da rocha. Ele observa que nenhuma tecnologia nem a elevação dos preços têm poder para alterar a geologia dos reservatórios. Por outro lado, admite que novas tecnologias e aumentos de preço poderão aumentar a taxa de extração para reservatórios de petróleo não convencional. O que os economistas consideram tecnologia de ponta, como a análise sísmica tridimensional e poços horizontais, já existe há mais de 30 anos e vem sendo utilizada em campos produtivos. Ao contrário de metais como ouro e prata, que são regulados pela concentração econômica mínima que diz que será lucrativo extrair o recurso se o custo for menor do que o preço de venda, o limite de extração dos combustíveis sólidos depende da energia líquida disponível; ou seja: a diferença de energia utilizada na extração e obtida na utilização do combustível precisa ser positiva; caso contrário a extração torna-se improdutiva, tornando quaisquer tipos de subsídios inúteis. 40 de 72

A obtenção do etanol a partir do milho, processo fortemente subsidiado pelo governo americano, é considerada energia líquida negativa. Ouro pode ser extraído a 4000m de profundidade mas a extração do carvão dessa profundidade é improdutiva, segundo Oil & Gas Journal. Em relação às estimativas de produção futura através da taxa de recuperação (R/P), Laherrère plota as previsões (retas) e dados históricos (pontilhados) em um gráfico (Gráfico 18) e observa que: Um dos parâmetros mais usados quando se estuda o futuro do petróleo é a razão R/P, isto é, o resultado em anos das reservas restantes sobre a produção anual presente. Freqüentemente se diz que o R/P do petróleo é de 40 anos sugerindo que exista petróleo suficiente para os próximos 40 anos. Mas em primeiro lugar, assume-se que a produção aumente e a característica física da produção não permite que o nível de produção seja constante durante 40 anos e não exista nenhuma produção no ano seguinte. Para as reservas provadas dos EUA, a razão R/P têm sido ao redor de 10 anos desde 1946, quando as estatísticas começaram, o que mostra que esse parâmetro não tem significado nenhum. Para as reservas provadas mundialmente a razão R/P está inalterada desde os primeiros dados, mas considerando-se os dados técnicos situava-se em 120 anos em 1950 e após a uma função linear desde os últimos 20 anos teríamos um resultado de reserva nula em 2035. É claro que a razão mudará e o dado deve ser ignorado. (Laherrère, J. (2004)) Gráfico 18 Razões R/P históricas e estimadas para Petróleo e Gás Fonte: Laherrère, J. (2004) Um fator importante citado por Laherrère são os ganhos de refinaria. Quando um volume de petróleo é processado, o volume de resíduos resultante do processo de refino é sempre maior. Em média, pode-se considerar esse ganho como sendo de 10%, mas esse percentual pode variar bastante dependendo da tecnologia de refino, do tipo de petróleo, quantidade de enxofre e de outras variáveis. 41 de 72

Segundo Laherrère, há que se ter dados objetivos do passado e criteriosos estudos geológicos dos recursos disponíveis para uma previsão futura. A incerteza das reservas é grande por causa da complexidade geológica e dos limitados tipos de mensuração (os poços exploratórios e a sísmica somente revelam um percentual pequeno da área total do poço). Apenas após o abandono do poço é que as reservas são conhecidas com precisão. Argumenta que a publicação de dados sobre produção e reservas é um ato político por estar relacionado à imagem que o autor pretende, sendo que o próprio autor escolhe o valor dentro dos limites da grande margem de incerteza. Em razão das implicações políticas, a qualidade dos dados é pouco relevante, assim como a definição do produto. Não há interesse em modificar esses fatos em razão da e por causa da confidencialidade e da competição. Enquanto os países membros da OPEP persistirem em disputar suas cotas na produção da organização (enquanto houver capacidade de produção ociosa) a qualidade dos dados não melhorará. A produção de óleo camufla a descoberta com um certo hiato 7 a 50 anos mas é limitada também pela demanda. O primeiro choque do petróleo, em 1979, foi causado por demanda baixa frente à uma expectativa de preços altos. As descobertas nos EUA chegaram ao pico nos anos 30 e a produção atingiu o auge em 1970. Já o pico das descobertas mundiais de petróleo deu-se nos anos 60, devendo o pico de produção ocorrer na próxima década ou na seguinte. Este pode assumir a forma de um platô se a recessão econômica contrair a demanda o que resulta em produção constante. Já com relação à produção de gás, a estimativa de Laherrère é que o pico ocorra após o do petróleo, ainda que restrições de oferta no mercado norte americano possam ocorrer em breve, dada a queda na produção local e, ainda, o fato de insuficiente quantidade de GNL chegar ao mercado dadas às restrições de navios e portos para transportar e receber esse combustível. Os recursos disponíveis de gás natural podem ser inferiores àqueles reportados. Quanto ao carvão, Laherrère afirma que a produção pode alcançar o pico muito antes do que o esperado. Os combustíveis fósseis irão atingir seu pico de produção por volta do ano 2030, embora a produção per capita, que tem se mantido constante nos últimos 25 anos, continue constante e implicará na questão de como dividir essa energia limitada entre países pobres e ricos. Uma política de energia e preços altos é a melhor solução para economizar energia e evitar problemas futuros de demanda. Baseado nessa ocorrência, Laherrère condena as sociedades de consumo muito alto que necessitarão modificar esse modelo urgentemente. 42 de 72

Para concluir, Laherrère afirma que, antes da escassez dos combustíveis fósseis, provavelmente ocorrerá escassez de água, da pesca e de produtos agrícolas. II.4. Simmons Matthew Simmons, após examinar a produção de petróleo no Oriente Médio, argumenta que os poços da Arábia Saudita estão em declínio uma vez que, para manter sua produção, os mesmos estão sendo injetados, com grandes quantidades de gases e água (doce e salgada). As mais modernas tecnologias são usadas para manter a produção e poucas descobertas vêm sendo feitas. Apenas 5-7 campos de petróleo produzem 90% da produção árabe. O argumento é esmiuçado no seu livro Twilight in the Desert. Simmons observa que métodos avançados de perfuração contribuem para exploração mais eficiente de poços. Verificou que a perfuração horizontal em poços da empresa saudita SaudiAramco vem sendo utilizada a partir do momento em que a perfuração vertical não conseguir manter a produção. Em seu trabalho The Oil World: 1973 compared to 2000, Simmons identifica pontos em comum entre os anos de 1973 e 2000. Como empreendedor de uma empresa de análise de investimentos no setor de energia, Simmons é mais enfático ao se deter na dinâmica do mercado de curto prazo onde sua maior crítica fica por conta do limitado estoque de reserva de petróleo. Mas, assim como Campbell e Laherrère, critica a quantidade e qualidade das informações sobre petróleo, tanto quanto às reservas e, principalmente, quanto aos estoques e previsões de demanda e oferta. A realidade é que os campos muito grandes (super giant fields) estão em decadência e, desde 1968, não ocorreu nenhuma descoberta. Ademais, poucos campos gigantes (giant fields) foram encontrados após 1973 e estes estão em fase de declínio. Simmons não entra nos detalhes da teoria de Hubbert e simplesmente avalia o fato de que embora o esforço exploratório tenha crescido como nunca a partir de 1979, fase que ele chamou de boom da perfuração (drilling boom), o volume de produção dos principais estados americanos produtores caiu de 10.7 mbd em 1973 para 7.8 mbd em 1979 e apenas 4 mbd em 1999. 43 de 72 Com base na análise da demanda e na crítica aos preços muito baixos do petróleo, Simmons demonstra que, desde 1973, o consumo de petróleo para gerar eletricidade e aquecer

residências caiu significativamente. Por outro lado, a frota de veículos quase dobrou, sendo que os utilitários esportivos e picapes (light trucks), de alto consumo, são responsáveis pela maior parte desse incremento e com isso contribuem para que a demanda de petróleo no setor de transporte seja 50% maior em 2000 do que foi em 1973. Segundo Simmons, a atual tecnologia mais avançada apenas acelera o ritmo de produção de um campo, não influindo na quantidade de petróleo que pode ser extraído. A dificuldade da oferta em manter o ritmo de crescimento da demanda também se dá pelo fato de os projetos de aumento da produção necessitarem de um prazo longo para iniciarem as operações (5-7 anos). O autor é um grande defensor da reforma e padronização de dados sobre reservas pois discorda dos dados divulgados pelas empresas estatais. II.5. Hirsch Robert L. Hirsch salienta que, além de extremamente importante para o setor de transporte, o petróleo também é um insumo para a indústria farmacêutica, para a agricultura, produtos plásticos e outros. Embora já existam alternativas para serem postas em prática, a substituição do petróleo por outras fontes de combustível é muito demorada. Segundo o autor, o pico do petróleo é baseado no caso singular de um campo que segue a curva de produção já demonstrada por Hubbert. A produção mundial seria a soma de todas as curvas dos campos individuais e o somatório teria forma semelhante. É importante reconhecer que o pico do petróleo não significa escassez de petróleo. O pico do petróleo é a capacidade máxima de produção o que tipicamente ocorre após metade do óleo extraível num campo tenha sido produzido. O que é possível para uma escala mundial vale para campos de petróleo individualmente porque a produção mundial é por definição a soma do total de produção de todos os campos do mundo. (Hirsch, R. (2005c) p. 3) Hirsch afirma que todo campo de petróleo, após atingir o pico de produção, não volta àqueles níveis, pois um campo de petróleo pode ter reservas estimadas grandes, mas se um campo bem gerenciado passou do máximo de produção, as reservas restantes só podem ser extraídas a taxas decrescentes. As vezes essas taxas decrescentes podem ser minimizadas e mesmo mantidas mas o retorno para a produção de pico é impossível mesmo com constante 44 de 72

investimento na produção. Para ele, esse fundamento freqüentemente não é aceito por aqueles não familiarizados com a produção de petróleo. Ainda criticando as teorias econômicas freqüentemente aplicadas à produção do petróleo nota que Assim, a algum nível de preço, as reservas recuperáveis mundiais de petróleo convencional atingirão um máximo por causa de fundamentos geológicos. Após esse ponto, uma quantidade insignificante de petróleo convencional será possível de ser extraída a preços realistas. Isso é um fato geológico que freqüentemente não é compreendido por economistas, muitos dos quais estão acostumados a lidar com minerais, que possuem uma geologia fundamentalmente diferente. (Hirsch, R., 2005c, p.6) O Gráfico 19 demonstra a fragilidade da combinação de avanços tecnológicos e preços altos a partir de 1980. Essa combinação impossibilitou o aumento ou mesmo a manutenção da produção dos estados continentais dos EUA, o que contraria a teoria econômica. Gráfico 19 Produção onshore dos 48 estados continentais (exclui Alasca e Havaí) Fonte: Hirsch, R. (2005d) Hirsch enfatiza a importância de mudanças imediatas, pois acredita que o tempo é valioso e que mudanças nos hábitos para substituir o petróleo demorarão a surgir. Iniciando um programa de substituição 20 anos antes do pico oferece uma possibilidade de evitar uma escassez mundial de combustíveis líquidos no longo prazo. A razão para que seja necessário tanto tempo é que a escala de consumo mundial é enorme fato esse freqüentemente perdido num mundo onde a abundância de petróleo tem ocorrido por tanto tempo. Se o preparo for muito pequeno, muito tarde, o balanço de oferta e demanda mundiais terá de ser obtido através de destruição massiva da demanda e períodos de escassez o que significa extremas dificuldades econômicas. Por outro lado, com preparo suficiente, os danos econômicos podem ser minimizados. (Hirsch, R., 2005a, p. 6-7) 45 de 72

Em outro estudo, Hirsch analisou regiões onde o pico já ocorreu. Considerou a produção da América do Norte, Grã-Bretanha, Noruega, Argentina, Colômbia e Egito que são regiões certa ou muito provavelmente passaram do pico, que basicamente sofreram apenas influências de ordem econômica e possuem dados críveis sobre a produção. Examinando o histórico mostrou que em todos esses casos não era óbvio que a produção fosse chegar ao pico um ano antes de ocorrer, isto é, os níveis de produção antes do pico não evidenciavam tal fato. Na maioria dos casos os picos de produção foram engrenes, variando abruptamente e sem um nível máximo plano, como muitos esperam. Finalmente, em alguns casos o declínio da produção após o pico foi bem rápido. Contrariando a suposição de Hubbert, verifica que a curva em forma de sino tem uma ponta aguda, e não se consegue vê-la chegar. Nota que o fato de o pico ocorrer não ser um problema energético, mas sim um problema de combustíveis líquidos, principalmente aqueles usados no transporte e de difícil substituição nesse setor. Conclui: Durante o século passado o desenvolvimento econômico mundial tem fundamentalmente sido atingido através da disponibilidade de petróleo abundante e de baixo custo. Transições energéticas anteriores (madeira para carvão, carvão para óleo etc.) foram graduais e evolucionárias; o pico do petróleo será abrupto e revolucionário. Como defendido pelo EIA, a importância do petróleo em outros setores de consumo deverá declinar onde outros combustíveis são competitivos, como o gás natural, carvão e energia nuclear, no setor elétrico, mas atualmente não existe fonte de energia alternativa que possa competir economicamente com o petróleo no setor de transporte.(hirsch, R., 2005c, p. 13) Conclusão do capítulo A visão pessimista sobre as conseqüências do pico de produção do petróleo mostrou os argumentos e pontos de vista dos principais autores dessa corrente de pensamento. A linha argumentativa aqui segue com ênfase na orientação determinista, onde os autores buscam definir a quantidade de petróleo restante e a data do pico de produção do petróleo. A partir dos dados e modelos probabilísticos utilizados eles obtêm as diferentes previsões para as datas de pico de produção do petróleo. Para tal argumtanção, evidencia-se uma grande dependência dos dados sobre reservas e produção, que têm caráter subjetivo por serem fornecidos por entidades que arcam com as consequências das quantidades divulgadas. Essas quantidades são frequentemente fornecidas por instituições politica ou financeiramente dependentes como os países membros da OPEP ou o USGS. Ademais, argumentos sobre a dependência da oferta de alguns reservatórios gigantes, o poder de mercado da OPEP, a impossibilidade de avanços tecnológicos contornarem 46 de 72

princípios geológicos e a negligência de países, instituições e políticos em se importar com uma possível escassez repentina a nível global. Os autores pessimistas são mencionados pela mídia em períodos de alta de preços como a partir de 2005. Em tais momentos, a mídia preocupada pelos problemas nacionais comumente divulga os argumentos e pontos de vista mais sensacionalistas desses autores. Nos EUA a escassez do petróleo sempre está relacionada ao problema de segurança nacional. Nos países europeus, notadamente aqueles com fortes grupos ambientalistas, nota-se o argumento de conseqüências problemáticas da permanência e aumento dos níveis de emissão de gases poluentes. 47 de 72

III. CAPÍTULO III VISÃO OTIMISTA EM RELAÇÃO AO PICO DO PETRÓLEO Neste capítulo apresentamos os autores que acreditam não haver necessidade de alarme e pânico em relação à oferta de petróleo. Estes também chamados de otimistas quando se trata do pico do petróleo, baseiam-se, principalmente, em motivos de ordem econômica e tecnológica, mas também criticam a carência e qualidade de dados sobre reservas como veremos adiante. São também citados argumentos mais teóricos e tangíveis, como a redução da demanda por petróleo e o aumento da eficiência na exploração do mesmo e, ainda, a substituição do petróleo convencional pelo não convencional, as tendências mundiais de consumo de energia e o crescimento no uso do gás natural e de combustíveis renováveis. Os argumentos dos autores otimistas se inserem num cenário de desenvolvimento ambíguo pois por um lado vemos um acelerado crescimento da demanda mundial aliado a restrições de oferta de petróleo. Ademais, evidenciam-se restrições de investimento por causa acesso, regulamentação, risco político e de guerra em algumas regiões. O aquecimento global e o efeito estufa resultam nas exigências ambientais, principalmente a partir do comprometimento de muitas nações com protocolo de Kyoto e redução na emissão de gases estufa e aparecem como um efeito exógeno ao mercado de petróleo. O preço alto aliado ao crescimento da demanda num ambiente de redução das regiões exploratórias resulta em preocupações de segurança energética, principalmente nos EUA. Por outro lado, os preços altos propiciam investimentos cada vez maiores em exploração e desenvolvimento de novas tecnologias. Daniel Yergin, autor do premiado livro The Prize: the Epic Conquest for Oil, Money and Power e diretor do grupo de consultores do mercado de energia Cambridge Energy Research Associates (CERA), sustenta que não há razão de preocupação quanto à escassez geológica do petróleo. O aumento na oferta de petróleo virá, tanto de países membros da OPEP, como dos demais. Afirma que: Existem riscos em qualquer previsão. Nesse caso, os riscos não são geológicos ou de escassez de recursos do tipo abaixo do solo. Eles são muito mais do tipo sobre o solo instabilidade política, conflitos, terrorismo e lentidão nas tomadas de decisão por parte do governo nos países produtores de petróleo. (Yergin, D., 2005) 48 de 72

Com relação à teoria de Hubbert e previsões pessimistas do pico do petróleo, no artigo How Much Oil Is Really Down There? da CERA Yergin descreve que: Baseado em um número amplo de potenciais cenários e análises individuais dos campos, a CERA conclui que a produção mundial não atingirá o pico antes de 2030, mas que a idéia de um pico em si é dramática e altamente questionável. A produção global irá eventualmente seguir um platô ondulado por uma ou mais décadas antes de declinar lentamente. O padrão global de produção não será uma simples curva logarítmica ou em forma de sino como previsto por M. Hubbert, mas será assimétrico com a sessão de declínio mais gradual e não um espelho da rápida taxa de crescimento e muito além do pico geométrico. Será um platô ondulado que pode durar décadas. (CERA, 2006) Robert Esser, colaborador do CERA, cita outro motivo de dificuldade da indústria do petróleo para aumentar a capacidade de produção, motivo esse também não relacionado à problemas abaixo do solo : Segundo o autor, talvez o maior problema no presente seja a falta severa de recursos de mão-de-obra qualificada e limites impostos pela indisponibilidade de plataformas e estaleiros. (Esser, R., 2005) Para Yergin, o padrão nos ciclos de alta dos preços do petróleo é subestimar o impacto da tecnologia como no ciclo atual quando a tecnologia é a chave. Reservas provadas não são, necessariamente, um bom guia para o futuro. Apesar do otimismo causado pela oferta do petróleo, os colaboradores da CERA estão cientes da gravidade do problema. Esser, em seu discurso para o House of Representatives dos EUA em 2005, afirmou que: Esse é um assunto que precisa ser considerado seriamente. Afinal, o planeta possui recursos finitos e o mundo está consumindo 30 bilhões de barris por ano. Mas a compreensão da situação precisa ser esclarecida. Considerações chaves incluem tecnologia, economia, timing, termos fiscais e regulatórios, e um entendimento completo de capacidades de produção corrente e futura. (Esser, R., 2005) III.1. Qualidade dos Dados e Erro Metodológico: Yergin critica a qualidade dos dados sobre reservas provadas das empresas privadas. A primeira crítica baseia-se na utilização de métodos arcaicos pela Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (Stock Exchange Comission SEC) com o objetivo de provar a quantidade de reservas. Seu argumento: 49 de 72 O sistema atual exigido pela SEC para reportar reservas provadas se tornou antigo e a informação que fornece aos investidores cada vez mais se afasta do montante de recursos de muitas companhias.[ ] As regras não reconhecem o vasto progresso tecnológico dos últimos 30 anos. [ ] (Yergin, D., 2006) Desenvolvidas a partir do choque do petróleo de 1973, com intuito de garantir a segurança energética, as regras, na época, precisavam ser detalhadas para se saber quanto petróleo existia nos EUA. Em conseqüência, o Congresso ordenou à SEC a implementação de

um sistema para reportar as reservas provadas com a base de recursos. A SEC, por sua vez, baseou seu julgamento visando a proteger os investidores e, frente a complexidade da definição, uma vez que reservatórios não podem ser auditados ou verificados, pediu ajuda à Sociedade Americana de Engenheiros do Petróleo (Society of Petroleum Engineers SPE). As definições da SPE foram promulgadas em 1965. Apesar de três atualizações após essa data, a SEC continua adotando a primeira definição, que considera o padrão tecnológico e operacional dos anos 60 e 70. Finalmente, o objetivo da SEC em proteger os interesses dos investidores acabou por levá-los à grande indecisão, devido ao conservadorismo das estimativas da SPE. As regras atuais da SEC, que definem as reservas para investidores, são baseadas em tecnologia utilizada há 30 anos e oferecem uma estimativa incompleta do potencial futuro. A medida que as técnicas melhoram, a oferta de muitas regiões produtoras será muito maior do que antecipado. (SEC, 2000) De fato, partindo do princípio da SEC de que certeza razoável implica que, a medida de que mais dados técnicos ficam disponíveis, uma revisão positiva, ou para cima, tem maior probabilidade de ocorrer que uma revisão negativa, ou pra baixo. Para provar a existência de reservas perante a SEC é necessário algum tipo de teste que comprove sucesso na exploração no reservatório. Dados sísmicos não são aceitos como prova de existência de reservas ou continuidade de produção em áreas já exploradas. Enfim, a SEC enfatiza a existência de algum teste concreto para avaliar a existência ou não de reservas. Em conseqüência, os grandes avanços tecnológicos não foram incorporados à metodologia empregada, como observa Yergin. Surpreendente como possa parecer, as regras correntes para reportar reservas o que pode ser chamado de Sistema de 1978 insistem essencialmente em tecnologias e metodologias de 1970. Àquela época não existia a revolução digital, e a fronteira de desenvolvimento offshore era de 600 pés de lâmina d água, hoje são 12.000 pés.(yergin, D., 2006) A incorporação das fontes de petróleo não convencional à produção irá aumentar substancialmente a quantidade de reservas provadas e também a capacidade e o fluxo constante da oferta, uma vez que a quase totalidade de recursos não convencionais serem explorados em países fora da OPEP, com investimento de empresas privadas. Uma parcela cada vez maior da oferta virá dos óleos não tradicionais de águas ultraprofundas, areias betuminosas, gás natural liqüefeito, gás convertido em liquido (GTLs), carvão convertido em íquido etc. Ao passar do tempo, esses não tradicionais se tornarão tradicionais. [...] Ao invés de um pico, devemos esperar um formato de platô ondulado, daqui a 3 ou 4 décadas. (Esser, R., 2005) 50 de 72

Outro autor otimista, Michael Lynch, baseia dois de seus argumentos na metodologia empregada pelos pessimistas para a estimativa das reservas e do pico de produção. As estimativas com modelo de Hubbert usam o TRR como um dado estático, embora para o autor se trate de uma variável dinâmica. Lynch afirma que o TRR não se refere ao total dos recursos esse sim um montante fixo mas sim à proporção do total desse montante em condições de extração. Como essa variável com os avanços tecnológicos, há a tendência de aumentar a proporção de campos que possam ser economicamente produtivos. Por outro lado, mudanças de ordem não tecnológica - que reduzam custos - viabilizam a produção de campos menores, mais profundos ou, ainda, dos campos menos produtivos. O gráfico a seguir representa as estimativas de reservas com as chamadas Creaming Curves, muito utilizadas por Laherrère. Essas curvas plotam a quantidade de reservas de acordo com o número de campos petrolíferos descobertos. Para cada época é feita uma revisão, que representa uma linha. Ocorre que com o passar do tempo, após cada revisão de volume de reserva, essa curva se desloca na representação do montante revisado. No Gráfico 20 estão plotados dados para descobertas do Mar do Norte sendo que as 4 curvas inferiores mostram o volume de petróleo dos 23 campos descobertos e produtores até 1980 e o seu crescimento que das 1780 milhões de toneladas produzidas em 1980 atingiu o total de 2400 milhões de toneladas em 1998 - um crescimento de 1,6% ao ano portanto. A curva superior mostra todos os campos encontrados e produtores até o ano de 1998, cuja assíntota chega a 3500 milhões de toneladas. Para Lynch o uso dessas curvas induz a um erro metodológico grave, porque elas comparam estimativas correntes do tamanho dos campos com descobertas feitas em diferentes períodos. Isso é como comparar arbustos a árvores; naturalmente as árvores são maiores, mas isso não significa que os arbustos sempre serão pequenos. (Lynch, M., 2002). 51 de 72

Gráfico 20 Revisões das Reservas Estimadas para Diferentes períodos no Mar do Norte Fonte: Lynch, M. (2002) As revisões cada vez maiores levam Lynch a crer que o total das reservas recuperáveis (TRR) não poder ser tratada como um valor fixo. O autor se opõe a diversos autores que afirmam a estabilização das estimativas do TRR ser em torno de dois trilhões de barris, sugerindo que a tecnologia tenha alcançado uma assíntota. Entretanto, as análises das estimativas do TRR foram baseadas nas pesquisas dos anos 1970 e início dos anos 1980, o que induziu um um resultado falso de uma assíntota histórica. Partindo do princípio de que a quantidade de petróleo recuperável depende da tecnologia e que quase todas as estimativas do TRR dependem da tecnologia vigente (ao invés do desenvolvimento tecnológico e seus impactos), estimativas feitas em um período deveriam ser similares. Para Lynch as estimativas do TRR se expandem com o tempo uma vez que a estimativa em 1950 e 1960 era de 1 trilhão de barris ou menos; atualmente a estimativa é de três trilhões de barris aproximadamente. Veja-se a estimativa da USGS que aumentou de 1,7 trilhões em 1984 para 3 trilhões em 2003. Até Campbell aumentou sua estimativa do período 1991/1997 em 150 bilhões de barris o que, segundo Lynch, representa mais do que o consumo no período. Peter Odell, o quarto autor otimista estudado nesse capítulo, critica, assim como Campbell, a subjetividade utilizada nos diferentes estudos que, segundo o autor, causa disparidades nas avaliações das reservas provadas conforme a Tabela 8: 52 de 72

Regiões Tabela 8 Reservas Provadas segundo as 4 fontes mais utilizadas Oil and World Petro United States Gas Oil Consultants Geological Journal Survey América do Norte 77 77 64 103 América do Sul 78 85 51 74 Europa 16 31 30 37 Ex- União Soviética 59 191 76 121 África 73 79 53 72 Oriente Médio 660 590 439 583 Ásia Oriental 42 51 38 62 Oceania 2 4 3 4 TOTAL 1007 1107 746 1056 Fonte: Odell, P. (1999) Além disso, Odell discorda de Campbell quando dá sua opinião sobre a firma Petro Consultants, da qual Campbell faz parte: Os dados da Petroconsultants estão longe dos dados publicados por outras agências por motivos desconhecidos, dada a natureza privada e inacessível do estudo e portanto, da própria organização (Odell, P., 1999). III.2. Análise Histórica do padrão de consumo de energia Para ilustrar o ponto de vista de Peter Odell, reproduzimos o trecho do programa de rádio Counterpoint da rede ABC na Austrália, realizado pelo repórter Michael Duffy que além de Peter Odell, entrevista Kenneth Deffeyes, outro especialista do assunto. Michael Duff: Kenneth Deffeyes, quando você acha que ocorrerá o pico do petróleo? Kenneth Deffeyes: Bem, eu penso que já ocorreu. No caso de Hubbert...apenas uma expressão você só tem certeza quando você está vendo no espelho retrovisor você sabe, após ter acontecido no passado. Mas o pico de 1970 foi óbvio, quando em 1972 a Comissão de Estradas de Ferro do Texas (Texas Railroad Comission) que era comparável com a OPEP de hoje, anunciou que não haveria mais racionamento na produção do mês seguinte, todos os poços estariam autorizados a produzir o quanto quisessem, 100% permitido. Em março de 2003, a Saudi Aramco e o governo Saudita disseram aos países e governos do oeste que eles estavam produzindo no nível máximo, eles poderiam alcançar 9,2 milhões de barris por dia e que eles jamais haviam atingido 9,2 ou 9,5 milhões de barris em nenhum mês. E no ano passado eles haviam produzido uma média de 8,9 milhões de barris por dia. Assim, para mim, esse pronunciamento saudita foi um eco do que a Comissão de Estradas de Ferro do Texas dissera. Michael Duff: Peter Odell, posso lhe perguntar o que você pensa sobre a previsão de Ken? Peter Odell: Eu ouço o que ele fala mas não aceito o que ele quer dizer. Eu acho que defender o pico de Hubbert em termos de ano está correto, mas a curva de declínio tem sido bem menos íngreme do que sua previsão, porque o que ele não observou é que as reservas crescem ao passar do tempo com a necessidade da demanda. Isso aconteceu nos EUA; a tendência declinante não foi invertida, certamente, mas a necessidade da demanda tornou a curva bem menos íngreme. E com certeza não está ocorrendo a níveis internacionais. A Saudi Aramco na Arábia Saudita não tem apenas certeza que produzirá mais do que 10 milhões de barris por dia como está direcionada a essa meta, e mesmo 15 milhões tem sido indicado como um potencial futuro para o maior país produtor de petróleo do mundo. 53 de 72

É interessante notar que Odell não nega a existência do pico de produção do petróleo. Quando se refere ao pico ocorrido nos EUA em 1970, minimiza o fato de que a produção caíra rapidamente uma vez que, através da redução no consumo e dos investimentos em exploração, os EUA mantiveram um nível de produção bastante elevado. Sobre a taxa de crescimento na utilização global de energia, Odell se baseia em dados disponíveis desde o século XIX. Como demonstrado no Gráfico 21, com a utilização de retas de tendência, ele constata que a partir de 1973, a taxa de aumento na utilização de energia reverteu para a tendência de longo prazo, observada no período 1860-1945, de uma média de 2% ao ano, comparada com a taxa média de crescimento de 5% que ocorreu entre 1945 e 1973. A possibilidade de um retorno para taxas de crescimento de 5%, segundo o autor, agora é próximo de zero, uma vez que isso refletiu uma combinação temporária inerente de um conjunto de condições de uso de energia em todas as partes do mundo que não pode recorrer (Odell, 1989). Assim, esse crescimento menor de fontes de energia não renováveis é coerente mesmo não considerando o impacto adicional das preocupações com as emissões de dióxido de carbono (CO 2 ) e o conseqüente estímulo que implicará em taxas maiores de crescimento do uso de energia renovável aliadas a taxas menores no uso de fontes poluentes como os hidrocarbonetos. Gráfico 21 Tendências na Evolução do uso da Energia 1860-2000) Fonte: Odell, P. (1999) III.3. A Teoria Econômica baseada no Modelo de Hotelling Harold Hotelling, em seu artigo The Economics of the Exhaustibel Resources, de 1931, inseriu a extração de um recurso finito numa teoria econômica: esse processo pode ser 54 de 72

visto em sua forma mais simples como um problema de maximização de lucro, valendo tanto para um agente individual como para a sociedade como um todo. Como a sociedade maximiza o lucro por todo o período de extração, o valor futuro do lucro precisa ser descontado a uma taxa maior ou igual à taxa de juros. Esse é o problema fundamental de toda a economia dos recursos finitos; foi proposta e resolvida por Hotelling nesse artigo. A solução para o lucro máximo total é que é a formulação, conhecida como a Regra de Hotelling, e prevê que o preço do bem a ser extraído aumenta a uma taxa exponencial que iguala a taxa de juros. Isso significa que, no sentido econômico, um recurso finito tem o mesmo valor que um título atrelado à taxa de juros. O Gráfico 22 representa o comportamento dos preços de um recurso finito, conforme as curves de demanda e oferta resultantes da constatação de Hotelling. Gráfico 22 Trilha do preço deum recurso finito Observa-se que, a partir da trilha do preço, função da taxa de juros, e das restrições de demanda e produção, este continuará crescente até que outra tecnologia ou um substituto para o recurso seja economicamente viável, isto é, até o bem atingir o preço de interrupção (backstop price). O recurso estará na parte plana da sua curva de extração, o preço no nível máximo e a produção começará a cair. Nesse ponto o recurso é considerado economicamente exausto, embora ainda existam quantidades disponíveis para extração. Assim, partindo do princípio de que existe outra tecnologia que interrompa a produção a um preço 55 de 72

suficientemente alto, nenhum recurso pode ser totalmente extraído de forma economicamente viável. Tomando esse fato por base, podemos analisar mudanças de ordem econômica, como um aumento da taxa de juros. Juros mais altos (Gráfico 23) levarão os investidores a vender o recurso para aplicação a uma taxa alta de retorno o que resultará numa taxa de produção maior e exaustão mais rápida. Graficamente, temos uma curva mais ingrime. O Gráfico 24 ilustra o comportamento monopolista que se aplica à indústria do petróleo tendo em vista a atuação da OPEP. O monopolista busca a maximizar os lucros mantendo o preço mais alto do que o preço de equilíbrio, o que leva a uma oferta menor e à conseqüente exaustão mais lenta do recurso. Gráfico 23 Aumento dos juros Gráfico 24 Comportamento monopolista A descoberta de novas reservas, o desenvolvimento de tecnologias e o uso de estratégias de conservação do recurso irão forçar o preço de equilíbrio a se situar em níveis mais baixos, prolongando a vida econômica do recurso (Gráfico 25). A longo prazo, a curva toma a forma de serra, sendo que cada ponta da lâmina significa uma das mudanças mencionadas. Gráfico 25 Curva deoferta de Longo Prazo de um Bem Finito 56 de 72

III.4. Avanços Tecnológicos Segundo Hirsch, já mencionado anteriormente, o pico do petróleo é conseqüência da utilização dos combustíveis líquidos e não de uma crise energética, como é freqüentemente afirmado. Náo há alternativas concretamente víaveis para a substituição dos combustíveis líquidos nos veículos a motor, aviões e navios. Fontes de energia não derivadas de hidrocarbonetos, como a energia solar, eólica, geotérmica e nuclear, produzem eletricidade (mas não combustíveis líquidos). Portanto, além de necessitar considerável investimento em pesquisa e desenvolvimento, a utilização dessas energias no transporte ainda está distante. As pesquisas de Hirsch identificaram um número de opções viáveis a curto prazo para o aumento da eficiência dos combustíveis nos veículos, melhorias na recuperação de petróleo convencional em reservatórios e a substituição de combustíveis líquidos originados de óleo pesado/ areias betuminosas, carvão e gas-to-liquids (GTL). Todas essas alternativas teriam que ser consideravelmente desenvolvidas a fim de se tornarem viáveis, no mínimo, na década que antecede o pico do petróleo e evitar danos em escala mundial. Um programa extenso e oneroso como esse, para ser posto em prática antes dos sinais de mercado, requer forte intervenção e suporte por parte dos governos. A intervenção governamental que aumentou a eficiência na utilização dos combustíveis provou sua eficiência após o embargo do petróleo em 1973 e será um elemento crucial na redução, a longo prazo, do consumo de combustíveis líquidos. Os EUA possuem uma frota de mais de 200 milhões de automóveis, vans, caminhonetes e utilitários. A substituição de pelo menos metade desses por modelos de eficiência maior, necessitaria de um prazo de, pelo menos 15 anos ou mais, a um custo de US$ 2 trilhões. Essa transformação seria onerosa e lenta não só nos EUA como no resto do mundo. Aumentos da eficiência dos combustíveis, principalmente em veículos de alto consumo, criam, a longo prazo, uma perspectiva de redução do consumo de gasolina e do diesel. Ainda, para Hirsch, os avanços tecnológicos podem favorecer o retardamento do pico de duas maneiras: A) aumentando-se a taxa de extração atual e com isso moderar a declinante produção de petróleo de poços que já passaram do pico. Ele cita a injeção de dióxido de carbono como a mais promissora tecnologia para o aumento da taxa de recuperação. B) A exploração de reservas de petróleo não convencional quando ocorrer o declínio das reservas convencionais. Ele cita a existência de diversos tipos de óleo não convencionais muito atrativos e comercialmente viáveis como os óleos pesados (que dependem da capacidade das 57 de 72

refinarias para serem processados), de combustíveis sintéticos como o combustível liquido do carvão. Afirma o autor: O petróleo não convencional será cada vez mais responsável por uma fatia maior na demanda do mercado mundial por petróleo ao mesmo tempo em que a participação do petróleo convencional decline. Entre os mais atrativos dos petróleos não convencionais são os de tipo pesado, as areias betuminosas e os combustíveis líquidos obtidos a partir do gás natural e do carvão. Todas essas alternativas estão prontamente viáveis. Petróleo pesado e as areias de betume são muito viscosos, parecidos com uma resina, dos quais a maioria se encontra no Canadá e Venezuela. (Hirsch, R.,2005d) Atualmente os custos de produção de óleos pesados e daqueles oriundos de areias betuminosas ainda são consideravelmente mais elevados do que os do óleo convencional uma vez que, nos processos de produção e refino desses óleos, é usada mais energia para extrair, produzir e refinar, o que resulta num balanço energético (energia líquida) menor. Já a liquefação do gás natural vem sendo permanentemente aperfeiçoada, principalmente através do método, ambientalmente correto, de Fischer-Tropsch. A obtenção de combustível liquido a partir do carvão vem sendo estudada desde a 2ª Guerra Mundial, quando os alemães, com grandes reservas de carvão, tentaram obter uma alternativa para o petróleo. O processo necessita de duas etapas: primeiro o carvão é gaseificado para então ser submetido ao processo de Fischer-Tropsch, similar ao processo aplicado ao gás natural. O resultado é um combustível limpo, de alto teor energético e sem necessidade de refino. O carvão tem localização geográfica mais homogênea e pode ser convertido em combustíveis líquidos através da utilização de tecnologias comercialmente viáveis (ou quase). Hirsch cita ainda dois potenciais tipos de combustíveis não convencionais embora ainda não comercialmente viáveis: o óleo obtido a partir de pedras (xisto betuminoso) e óleos vegetais, originados de biomassa (etanol, biodiesel etc). Mas observa que a viabilidade desses combustíveis depende de consideráveis investimentos em pesquisa e desenvolvimento. O impacto tecnológico na expansão dos recursos pode ser observado numa variedade de casos. Como exemplo, a produção em pequenos campos no Mar do Norte que é viabilizada pela ampla rede de dutos (pipelines) de gás e petróleo, inexistentes nos anos 80. A produção britânica em 1995 (2,7 mbd), tinha 16% de seu volume (0.44 mbd) originado de poços que foram descobertos antes de 1980 quando sua produção diária era de 1.66 mb, mas que se tornaram viáveis apenas a partir de 1990 após a instalação da infra-estrutura para escoar a 58 de 72

produção. Nota-se que metade do aumento da produção nesse período se deu por causa dos ganhos de eficiência. Reforçando a possibilidade de aumento da produção através de inovações tecnológicas, Lynch constata que muitos países permitem apenas que empresas estatais explorem as reservas. Se esses países permitissem a exploração por empresas privadas, tecnologicamente bem superiores às estatais, a produtividade do upstream da indústria do petróleo aumentaria significativamente. Os avanços tecnológicos todavia são propriedade das majors privadas, mas a maioria das reservas situam-se em países cujas empresas estatais monopolizam o setor de exploração. Quando esses países permitem o investimento externo e a exploração privada, o risco político influi consideravelmente na tomada de decisão das majors. Como nota Yergin, se as empresas privadas tivessem como aplicar sua tecnologia em regiões monopolizadas por empresas estatais, a oferta de petróleo poderia, em pouco tempo, aumentar sensivelmente. (Yergin, 2005). III.5. Ascensão do Gás Natural & Queda na Importância do Petróleo Segundo Odell, a importância do carvão como fonte de energia irá cair rapidamente nos próximos anos, sendo ultrapassada pelo gás natural que, até o final do século, deverá ser a principal fonte de energia, ultrapassando, em 2040, o próprio petróleo que responderá, em 2100, por diminutos 28,8% da demanda por hidrocarbonetos. O gás natural provavelmente ultrapassará o carvão como fonte global de energia até 2010 mersmo considerando a utilização do gás natural como substituto ao petróleo aumentando. A expansão rápida da produção em anos recentes reflete que as reservas provadas de gás natural mais que dobraram desde 1980 e a expansão da Europa e outros mercados na demanda por gás natural desde o início da década de 90. Assim, o gás natural entrou o século 21 com uma relação R/P de 62 anos. Comparando a oferta de petróleo, gás e carvão, Odell explica que até em 2010 poderia existir uma indústria de petróleo maior do que a do ano 2000. Até lá, entretanto, no contexto das limitações do potencial do recurso e da competição intensificada de outras fontes de energia, o petróleo contribuirá menos do que o carvão na oferta mundial de energia: ao mesmo tempo que tenha sido há muito tempo ultrapassado pelo gás natural. 59 de 72

A concentração do petróleo em poucos países também irá diminuir à medida que a utilização do petróleo não convencional aumentar sua participação no total, em razão de sua menor utilização. Nesse contexto, ao mesmo tempo em que a importância geopolítica do petróleo continue nas primeiras décadas do século 21, ele irá depois disso, ser meramente uma outra fonte de energia de importância decrescente na participação energética mundial: e será cada vez mais diversificada geograficamente do que nos dias atuais. (Odell, P., 2003) Sua argumentação, entretanto, torna-se incoerente devido à afirmação, feita em 2003 ao The Global Energy Outlook for the 21st Century, onde considera os preços do barril em torno de 20 US$. Como os preços atuais estão, pelo menos, quadriplicados, sua previsão para 2010 de 25US$ é irreal. Devemos considerar, entretanto que, no mesmo artigo, ele observa que influências de curto prazo nos preços do petróleo irão ocorrer sem dúvida no futuro, mas dada a natureza essencialmente efêmera, eles são irrelevantes para prever custos totais de longo prazo e tendências de preço (Odell, P., 2003). Os preços de 60 US$ já duram mais de 1 ano e um novo patamar parece evidente. A crença de Odell na independência, à curto prazo, do preço do barril de petróleo, das pressões da demanda ou da oferta, é afirmada na declaração abaixo: O petróleo se tornará um tomador de preços (price taker) e menos um criador de preços (price maker) a ponto de a indústria poder se beneficiar do fluxo de receita gerada a partir dos preços maiores do gás natural. Isso possibilitará retornos suficientes para financiar investimentos na expansão contínua da produção de petróleo não convencional (Odell, P., 2003). Observe-se que o autor salienta a escalada do gás natural como principal fonte de energia e commodity energética, além dos benefícios na exploração do gás serem compartilhados para ambos os combustíveis. III.6. Dificuldade dos Investimentos & Comportamento Econômico do Upstream Vimos no Capítulo I que a indústria do petróleo, notadamente o setor de upstream, possui várias características econômicas singulares. Assim, considerando o volume, o risco e a dinâmica associados ao setor de exploração em conjunto com a volatilidade nos preços do petróleo concluímos que a tomada de decisão para investimentos acarreta enormes riscos e dificuldades. Sobre a previsão futura do preço do petróleo, podemos nos orientar pela 60 de 72

afirmação do chefe da gigante petrolífera saudita Saudi Aramco, na reportagem Oil in Troubled Waters, da revista The Economist: Para onde o preço vai, ninguém sabe.[...] A chave é ter estabilidade para podermos planejar. Os investimentos em petróleo levam um longo tempo até darem frutos. (The Economist, 2005) Para reforçar a idéia de volatilidade, citamos interessante observação do autor do mesmo artigo, publicada na revista The Economist: De fato, a única coisa sensata que pode-se dizer sobre os preços do petróleo hoje é que eles provavelmente não ficarão estáveis. Um ataque terrorista à infra-estrutura de petróleo saudita poderá elevar o preço para 100US$; um crash no mercado financeiro pode empurrá-lo abaixo dos 10US$. (The Economist (2005) A dificuldade na tomada de decisão em relação aos investimentos dos planejadores das majors e das empresas estatais se dá por causa do excesso de oferta dos anos 80 e 90, originado pelas enormes reservas existentes na época. Naquela ocasião, os investimentos em petróleo foram muito baixos e em grande parte frustrados; a possibilidade de ocorrer um retorno àqueles patamares, portanto, assusta os investidores e empresas do ramo. A ilusão de que o petróleo está em permanente sobreoferta levou a duas décadas de sub-investimento na indústria do petróleo. O mundo têm vivido a partir da lenda de capacidade de reserva criada a muitos anos atrás. Dadas os preços altos de hoje em dia, podese indagar se o mercado proverá a nova infra-estrutura necessária. No entanto, parece que o mundo está se desenvolvendo bem com os preços altos de hoje em dia, talvez eles tenham que persistir por mais tempo ou mesmo aumentar ainda mais antes que investidores sejam postos em ação. Em 2007 o preço atingiu preços ainda maiores do que em 2006 e nenhuma recessão era visível. Outro motivo para o autor é a memória azeda do petróleo a 10 dólares por barril (The Economist, 2005). Atualmente, embora os preços do petróleo se situem bem acima dos 60 US$, as empresas baseiam suas políticas de investimento considerando os preços na faixa dos 20-25 US$. Com relação à tomada de decisão das empresas privadas, o artigo nota que as majors do oeste estão mais aterrorizadas com um novo colapso de preços, e estão segurando as arredias nos seus gastos em aumento de capacidade produtiva (capital expenditure). Os projetos são tipicamente testados para darem lucro com preços do barril a 20 dólares. (The Economist, 2005) colocar com seu texto 61 de 72

Dados sobre atividade das plataformas e navios de perfuração atualizados mensalmente pela empresa Baker Hughes, e relacionados aos preços do barril de petróleo tipo Brent, se plotados em um gráfico mostram uma relação direta: 6000 5000 4000 3000 2000 1000 0 Gráfico 26 Número de plataformas em atividade x Preço do barril tipo Brent (1980-2007) 1980 1981 Numero de plataformas de perfuracao Preco 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Fonte: elaboração própria a partir de dados da Baker Hughes de 2007 (Numero de plataformas) e BP 2006 (preços reais do barril tipo Brent) 100,00 É possível visualizar a tendência de mudanças na quantidade global de plataformas (onshore e offshore) em resposta à variações no preço do barril de petróleo, o que reflete o comportamento tipicamente econômico do mercado de exploração. Se desconsiderarmos o hiato temporal, resultante do período decorrente entre o início da tomada de decisão e o início das operações com novo contrato, podemos observar que, quanto maior o preço do barril, maior a demanda por unidades que possibilitem a obtenção desse bem. 90,00 80,00 70,00 60,00 50,00 40,00 30,00 20,00 10,00 0,00 Outro indicador do comportamento econômico pode ser visualizado nos Gráficos 27 e 28. Essa análise leva em consideração o valor médio de aluguel diário ou simplesmente diária (dayrate) de sondas offshore que inclui jack-ups (JU), semi-submersíveis (SS) e navios-sonda (DS) e utiliza o preço do barril comercializado em Nova Iorque (WTI). Verifica-se que quando o preço do barril atingiu um pico de 25 US$ em 1997, o valor de aluguel diário continuou a subir durante quase um ano. Houve, portanto, um hiato de 11 meses entre o início da queda do preço do barril e o início da queda do preço da diária das sondas. No pico seguinte do preço do barril, em 2000, o mercado de sondas novamente se ajusta ao preço embora com um intervalo temporal maior (12-16 meses). Análise análoga se aplica aos períodos de preço mínimo do barril. Além da constatação do gráfico anterior podemos adicionar que o tempo de queda no dayrate frente à queda do preço do barril é mais rápido do que quando o preço sobe. 62 de 72

Gráfico 27 Preço do Barril (Crude de NY) Fonte: Rigzone (2007) Gráfico 28 Médias das Diárias de Plataformas e Navios de Perfuração Fonte: Rigzone (2007) O comportamento econômico e o aumento dos investimentos a partir da recente escalada do preço do barril, estreitando o horizonte de tempo para 13 anos (1995-2008), é demonstrado no Gráfico 29, com dados do International Rig Report de Junho de 2007. Verifica-se a crescente utilização das sondas, além das previsões futuras que estimam uma utilização de 100% desses equipamentos. Gráfico 29 Demanda e Utilização das sondas de perfuração 63 de 72 Fonte: International Rig Report Junho-2007 (Dados: ODS-Petrodata 2007)