Salete Flôres Castanheira Orientadora: Profa. Dra. Stella Maris Bortoni-Ricardo



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Transcrição:

Universidade de Brasília Faculdade de Educação Estudo Etnográfico das Contribuições da Sociolingüística à Introdução ao Letramento Científico no Início da Escolarização Salete Flôres Castanheira Orientadora: Profa. Dra. Stella Maris Bortoni-Ricardo Brasília, 2007

SALETE FLÔRES CASTANHEIRA Estudo Etnográfico das Contribuições da Sociolingüística à Introdução ao Letramento Científico no Início da Escolarização Dissertação apresentada à Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, como exigência à obtenção do título de Mestre em Educação, área de concentração: Aprendizagem e Trabalho Pedagógico. Orientadora: Profa. Dra. Stella Maris Bortoni-Ricardo Brasília, 2007

SALETE FLÔRES CASTANHEIRA Estudo Etnográfico das Contribuições da Sociolingüística à Introdução ao Letramento Científico no Início da Escolarização Dissertação apresentado à Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, como exigência à obtenção do título de Mestre em Educação, área de concentração: Aprendizagem e Trabalho Pedagógico. BANCA EXAMINADORA Profª Drª. Stella Maris Bortoni-Ricardo - Presidente Faculdade de Educação da Universidade de Brasília Profª Drª Marcia Elizabeth Bortone Instituto de Letras da Universidade de Brasília Profª Drª Benigna Maria de Freitas Villas-Boas Faculdade de Educação da Universidade de Brasília Prof. Dr.Cristiano Alberto Muniz (suplente) Faculdade de Educação da Universidade de Brasília Brasília, 2007

A minha mãe, Dalva Flôres Castanheira, por uma vida dedicada a educação e uma existência em função do meu sucesso, especialmente dos meus estudos (In memoriam).

AGRADECIMENTOS À Mãe de Deus, por ser fonte de vida e ajuda infalível em todas as realizações. À minha irmã Cecília, amiga e companheira, por revigorar as minhas forças e dar esperança na caminhada, pelo apoio e dedicação em todos os momentos. À professora Carlita, diretora do Departamento de Educação da Universidade Católica de Goiás, pelo acompanhamento de toda trajetória do curso, apoiando-me e possibilitando-me a realização e conclusão do mesmo. À minha admirável professora Stella Maris, por sua competência nas orientações, pelo respeito e incentivo. À professora Benigna, pela riqueza de seu conhecimento a nós transmitido, pela educação e interação com os alunos do curso. À professora pesquisadora colaboradora Neusa pela dedicação, colaboração, compromisso e amor pela profissão. Aos alunos da sala de aula em que foi realizada a pesquisa, verdadeiros colaboradores, dando ânimo para prosseguí-la, participando ativamente da pesquisa. Aos pais dos alunos, pela colaboração e participação ativa na escola. À direção da Escola onde a pesquisa foi realizada, pela carinhosa acolhida.

RESUMO As estatísticas no Brasil e no exterior têm revelado, com freqüência, resultados negativos sobre a escolarização. Os altos índices de fracasso escolar que se expressam pela repetência, evasão e exclusão concentram-se nas crianças das classes sociais menos privilegiadas socioeconomicamente. Algumas das causas desse fracasso relacionam-se à utilização de metodologias pedagógicas não favoráveis à aprendizagem e descontextualizadas da realidade dos alunos, bem como à fragilidade do preparo dos professores para lidar com as novas demandas do ensino, especialmente dos anos iniciais, que envolvem a alfabetização. Esta pesquisa se propõe a apresentar os resultados obtidos em sala de aula pela aplicação do ensino de Ciências Naturais integrado à Alfabetização, utilizando os elementos da Sociolingüística Interacional, da Zona de Desenvolvimento Proximal, de Vigotsky, e das ações de andaimagem, propostas por Bruner e Cadzen, e complementando a noção de pistas de contextualização fornecidas por John Gumperz, dentro de um ambiente construído com a proposta da Pedagogia Culturalmente Sensível. Palavras-chave: Ciências Naturais, Letramento Científico, Sociolingüística Interacional, Pedagogia Culturalmente Sensível, Alfabetização.

ABSTRACT The low levels of education in Brazil encompass a large range of problems such as school underachievement, as shown by the nationwide reading comprehension and mathematical assessment systems and by the statistics of school failure and dropping out. Many children who attend school receive an inadequate education because of poorly trained, underpaid teachers, overcrowded classrooms, and lack of teaching resources and adequate methodology. The most affected students by these problems are those drawn from the poor social networks with a predominant oral culture. The motivation for this study was the concern with the education of these students. It focuses on classroom strategies that reconcile the teaching of reading and the introduction to scientific literacy in the first years of schooling in a public school. The teachers follow an agenda which was built upon the principles of a culturally responsive pedagogy ((Erickson), particularly upon the concept of scaffolding, as put forward by Bruner and Cazden and complemented by the notion of contextualization clues, as advanced by John Gumperz. The analysis of their action in the classroom is based on interactional sociolinguistics and the psychological theory of Lev Vygotsky. Key words: Scientific literacy; Teaching reading; first years of elementary school; a culturally responsive pedagogy

SUMÁRIO LISTA DE ILUSTRAÇÕES... 12 INTRODUÇÃO... 15 1 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO... 22 1.1 LEITURA E ESCRITA COMO TRANSCRIÇÃO DE CÓDIGOS... 22 1.1.1 Psicologia Comportamental... 22 1.1.2 Estruturalismo Lingüístico... 24 1.2 LEITURA E ESCRITA COMO SISTEMA DE REPRESENTAÇÃO... 33 1.2.1 Psicologia Cognitiva... 33 1.2.2 Jean Piaget... 33 1.2.3 Emília Ferreiro... 37 1.2.4 Construtivismo na Alfabetização... 38 1.2.5 A Prática Pedagógica a Representação da Linguagem... 46 1.2.5.1 Ambiente Alfabetizador... 46 2 CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA... 51 2.1 FORMAÇÃO DE PROFESSORES... 51 2.2 A PRÁTICA PEDAGÓGICA CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA... 52 2.3 O QUE O EDUCADOR PRECISA SABER SOBRE CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA... 55 2.4 CONSCIÊNCIA DA PALAVRA E DE FRASES... 60 2.5 CONSCIÊNCIA SILÁBICA... 61 3 SOCIOLINGÜÍSTICA EDUCACIONAL... 65 3.1 TRADIÇÕES ETNOGRÁFICAS NAS PESQUISAS EDUCACIONAIS... 65 3.2 AS TEORIAS DO FRACASSO ESCOLAR À LUZ DA SOCIOLINGÜÍSTICA... 69 3.2.1 A TEORIA DA DEFICIÊNCIA... 71 3.2.2 TEORIA DA DIFERENÇA CULTURAL... 72 3.3 SOCIOLINGÜÍSTICA INTERACIONAL... 76

3.4 PEDAGOGIA CULTURALMENTE SENSÍVEL... 82 3.5 OS PROCESSOS DE ANDAIME... 83 3.6 ESQUEMAS COGNITIVOS... 85 3.7 SÓCIO-INTERACIONISMO... 88 3.8 A PRÁTICA PEDAGÓGICA E OS PROCESSOS DE ANDAIMES OU ANDAIMAGEM... 89 3.8.1 Pista de Contextualização... 89 3.8.2 Verbalização Significativa... 90 3.8.3 Ações Responsivas Ratificadoras... 91 3.8.4 Diálogo... 91 3.8.5 Eventos de Oralidade... 92 3.8.6 Eventos de Letramento... 93 3.8.7 Socialização do Conhecimento... 93 3.8.8 Situações Problematizadoras... 94 3.8.9 Iniciação / Resposta / Avaliação (IRA)... 94 4 LETRAMENTO CIENTÍFICO (CIÊNCIAS NATURAIS)... 96 4.1 CIÊNCIAS, CIÊNCIAS NATURAIS E LETRAMENTO CIENTÍFICO... 96 4.2 CONTRIBUIÇÕES DA EPISTEMOLOGIA E DA PSICOLOGIA PARA O ENSINO DAS CIÊNCIAS NATURAIS... 99 4.2.1 O Aluno... 101 4.2.2 O Professor... 103 4.2.3 Ciências Naturais... 105 4.3 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE CIÊNCIAS NATURAIS... 106 4.3.1 Cientificista... 106 4.3.2 Escolanovista... 109 4.3.3 Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS)... 111 4.3.4 A Especificidade do Ensino das Ciências Naturais... 113 4.3.5 A Problematização... 115 5 CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLINGÜÍSTICA PARA A AVALIAÇÃO NO ENSINO DE CIENCIAS NATURAIS... 122 5.1 Avaliação Diagnóstica e Mediadora... 125

5.1.1 A Zona de Desenvolvimento Proximal e os Processos de Andaimes na Avaliação da Aprendizagem... 127 5.1.2 Repensando a concepção de avaliação... 129 6 DESCRIÇÃO DO PROJETO... 132 6.1 A PROFESSORA PESQUISADORA, A EXPERIÊNCIA E A CONSTRUÇÃO DO PROJETO DE PESQUISA... 132 6.2 OBJETIVO GERAL... 136 6.2.1 Asserção Geral... 136 6.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS... 137 6.3 1 Subasserções 6.4 METODOLOGIA... 138 6.5 OS INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS 6.5.1 Áudio-Visual... 140 6.5.2 Notas de Campo... 140 6.5.3 Protocolos Interacionais... 141 6.6 ANÁLISE DOS DADOS... 141 6.7 HISTÓRICO... 142 6.7.1 Uma Relação de Confiança... 143 6.7.2 Contexto Pedagógico... 146 6.7.2.1 Professora Pesquisadora Colaboradora... 146 6.7.2.2 A Escola Campo de Pesquisa... 147 6.7.2.3 As Crianças... 152 6.7.2.4 A Sala de Aula... 153 7 SOCIOLINGÜÍSTICA, ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO CIENTÍFICO... 157 7.1 AS TRANSFORMAÇÕES DA SALA DE AULA A PARTIR DOS FUNDAMENTOS DA SOCIOLINGÜÍSTICA INTERACIONAL... 161 7.1.1 A Sala de Aula... 162 7.1.2 Estrutura de participação... 164 7.1.2.1 Como a Professora Introduziu a Aula... 165 7.1.2.2 Como a Professora Conduziu a Aula... 166 7.1.3 Ações Responsivas Ratificadoras... 168

7.1.4 Como a Professora Conduziu o Letramento Científico... 171 7.2 LETRAMENTO CIENTÍFICO (CIÊNCIAS NATURAIS) E ALFABETIZAÇÃO (CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA)... 183 7.2.1 Como a Professora Organizou a Sala de Aula... 183 7.2.2 Como a Professora Introduziu o Tema da Aula... 186 7.2.2.1 Diagnóstico do Nível de Desenvolvimento Real (Vigotsky)... 186 7.2.3 Como a Professora Introduziu a Alfabetização... 190 7.2.3.1 Consciência Fonêmica... 191 7.2.3.2 Consciência Silábica... 192 7.2.4 Como a Professora Conduziu a Construção de Conhecimento Científico... 198 7.2.4.1 O Ambiente Interacional... 199 8 A (RE)CONSTRUÇÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA: A METAMORFOSE DA BORBOLETA... 211 8.1 NÍVEL CONCEITUAL DOS ALUNOS SOBRE O TEMA "AS BORBOLETAS"... 214 8.1.1 Estratégias para a Construção da Consciência Fonêmica... 214 8.2 AMPLIAÇÃO DA ZDP SOBRE A METAMORFOSE DAS BORBOLETAS... 222 8.3 CONSTRUINDO O CONHECIMENTO CIENTÍFICO SOBRE O PROCESSO DA METAMORFOSE DAS BORBOLETAS... 231 8.3.1 Estratégias de Ampliação da ZDP Através da Observação Indireta da Metamorfose da Borboleta... 231 8.4 CONSTRUINDO O PRINCÍPIO ALFABÉTICO... 239 8.4.1 Estratégias para Construir Princípio Alfabético: Contando Fonemas, Formando Palavras... 239 8.5 CONSTRUINDO A CONSCIÊNCIA SILÁBICA... 247 8.5.1. Estratégias para Construir a Consciência Silábica: Contando Fonemas, Construindo Sílabas, Formando Palavras... 248 8.6 LETRAMENTO CIENTÍFICO... 258 8.6.1 Estratégias de Letramento Verbal e Escrito... 259 8.7 AVALIAÇÃO: CONFIRMAÇÃO DA APRENDIZAGEM... 276 8.7.1 Estratégias para Avaliar o Nível Conceitual Através da

Construção de Frases... 276 CONCLUSÃO... 283 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 298 ANEXO I - Declaração assinada pelos pais autorizando a realização da pesquisa e a apresentação das imagens dos alunos... 307 ANEXO II - Matriz Curricular do Curso de Pedagogia da Universidade Católica de Goiás, a partir de 2004... 309 ANEXO III - Matriz Curricular do Curso de Pedagogia da Universidade Católica de Goiás, a partir de 2007... 311 ANEXO IV - Entrevista Semi-Estruturada I... 313 ANEXO V - Entrevista Semi-Estruturada II... 315 ANEXO VI - Entrevista Semi-Estruturada III... 316 ANEXO VII - Entrevista Semi-Estruturada III... 317 ANEXO VIII - Glossário... 318

LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 - Exemplos de exercícios de coordenação vísio-motora utilizados na fase inicial do processo de alfabetização... 24 Figura 2 - A língua é fragmentada em estruturas menores e exclui qualquer referência ao significado... 26 Figura 3 - As atividades resumem-se a ler, copiar, cobrir, colar, recortar, desenhar e pintar... 27 Figura 4 - No conjunto das atividades, o ensino e a aprendizagem da língua afastam-se do uso e da função que a criança faz da língua diariamente.... 27 Figura 5 - Os gêneros textuais, falados e escritos, são substituídos por textos descontextualizados... 29 Figura 6 - Na atividade prática, os professores devem aparelhar-se de material básico... 29 Figura 7 As atividades 2 e 3, recortar e desenhar, respectivamente, repetem-se no conjunto das quarenta lições e representam o condicionamento... 30 Figura 8 As lições estão sistematicamente organizadas em um programa único de leitura e escrita... 32 Figura 9 - Escrever é copiar e ler é repetir.... 32 Figura 10 - O índice do livro proposto para o nível de alfabetização aponta para a tendência da Psicologia Cognitiva... 38 Figura 11 - As placas são um tipo de texto descontínuo que favorece o desenvolvimento da idéia de símbolo... 41 Figura 12 - O conjunto das atividades da unidade 1 trabalha com textos descontínuos... 41 Figura 13 - As atividades de escrita sistemática podem começar com a escrita do próprio nome... 45 Figura 14 - Criação de um Ambiente Alfabetizador... 47 Figura 15 - Classificação das Consoantes... 58 Figura 16 - Quadro das Consoantes... 59 Figura 17 - Exemplos de atividades que auxiliam o desenvolvimento da

consciência fonológica... 63 Figura 18 - Exemplo de exercício tradicional... 107 Figura 19 - Exemplo da aplicação do Método Científico... 111 Figura 20 - Desenvolvimento Real e Potencial... 115 Figura 21 - Pedagogia Culturalmente Sensível... 116 Figura 22 Arco da Problematização... 116 Figura 23 - Metodologia da problematização... 118 Figura 24 - Práxis Pedagógica... 121 Figura 25 Pensamento interdisciplinar da disciplina de Fundamentos Teóricos e Metodológicos do Ensino de Ciências Naturais... 134 Figura 26 - Escola Municipal Benedito Rodrigues Siqueira Sobrinho... 147 Figura 27 - Escola Municipal Benedito Rodrigues Siqueira Sobrinho... 148 Figura 28 - Pedreira Izaíra... 150 Figura 29 - Condomínio da Pedreira Izaíra... 151 Figura 30 - Triangulação cruzada... 159 Figura 31 Entrevista e estudos entre as professoras pesquisadoras... 161 Figura 32 - Cursos de Formação Continuada ministrados pela Profª Salete, com a participação da Profª Neusa... 162 Figura 33 - O ambiente da sala de aula... 163 Figura 34 - Regras de participação são chamadas de "combinados"... 165 Figura 35 - Ambiente interacional favorável a aprendizagem... 166 Figura 36 - É do sujeito aluno o movimento de ressigificar o mundo... 172 Figura 37 - O experimento permite uma observação direta por parte dos alunos... 174 Figura 38 - Exemplo do letramento científico produzidos pelos alunos sobre os tipos de solo... 179 Figura 39 - Figuras utilizadas em livros didáticos de Ciências Naturais... 182 Figura 40 - Exemplo de figuras utilizadas para a unidade dos "Seres Vivos" do livro didático de Ciências Naturais... 183 Figura 41 - Fichas didáticas fixadas ao quadro-giz... 194 Figura 42 - Alunos organizados em círculo, participam da verbalização significativa da professora... 199 Figura 43 - Livro da FUNASA - Leitura... 200 Figura 44 - Observação indireta durante discurso explicativo do professor. 201

Figura 45 - Ilustrações utilizadas na aula sobre Tuberculose... 202 Figura 46 - Durante a leitura do texto, a observação dos pulmões na gravura permite que os alunos localizem a posição dos pulmões no próprio corpo... 203 Figura 47 - Sistematização através de desenhos... 204 Figura 48 - Prática de Letramento Científico - Sistematização: desenho dos pulmões... 205 Figura 49 - Andaimes - recapitulação contínua... 208 Figura 50 - O jogo das letras para construir palavras... 244 Figura 51 - As lições compõem uma mesma cartilha... 246 Figura 52 - As professoras planejando o trabalho com o Banco de Palavras confeccionado em cartolina... 257 Figura 53 - A atividade sistematizou outras palavras da historinha A Borboleta e o Grilo... 258 Figura 54 - Construção do texto com a ajuda do quadro-giz... 261 Figura 55 - Construção coletiva do texto - Segundo parágrafo... 268 Figura 56 - A professora fornece andaime ao passar de carteira em carteira275 Figura 57 - Sistematização através de texto e desenhos... 275 Figura 58 - A professora retoma o banco de palavras e evoca o texto construído na aula anterior... 276 Figura 59 - Resultado da aprendizagem... 277 Figura 60 - Resultado da aprendizagem... 279

15 INTRODUÇÃO As crianças das classes sociais menos favorecidas freqüentemente fracassam ou abandonam a escola antes de terminar os quatro primeiros anos do ensino fundamental. A escolaridade média no Brasil é de apenas seis anos por habitante, ao passo que a média proposta pela Unesco é, no mínimo, de doze anos, o que significa que no país não se conclui nem o nível obrigatório de escolarização previsto por lei, que é de nove anos. Conseqüentemente, a taxa de analfabetismo no país é alta, atingindo 26,5% dos brasileiros com mais de dezoito anos (IBGE, 2007). Vários programas do Ministério da Educação e Cultura são desenvolvidos com a finalidade de produzir indicadores de resultados de desempenho dos alunos que concluíram os primeiros anos de escolarização e os resultados obtidos apontam para índices semelhantes. Em 2003, dados do Sistema Nacional de Avaliação Básica (SAEB) revelaram que 55,4% dos alunos que concluíram a quarta série e 26,8% dos alunos que chegaram à oitava série do ensino fundamental apresentaram resultados críticos em Língua Portuguesa, isto é, não conseguiam compreender frases simples (INEP, 2005). A avaliação nacional, denominada "Prova Brasil", realizada em 2007, demonstrou que os estudantes do 5º ano não sabem ler nem escrever e os do 8º ano mal conseguem alcançar os conteúdos previstos para o 4º ano (MEC, 2007). Os sistemas de avaliação da educação, tanto nacionais como internacionais, apontam para os baixos níveis de desempenho dos estudantes

16 brasileiros. Os indicadores do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa 1 ), realizado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômicos (OCDE), sobre a efetividade dos sistemas de avaliação de desempenho de alunos com idade de quinze anos, em que se pressupõe o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países participantes da pesquisa, apresentaram dados comparativos entre os índices de analfabetos no Brasil e em outros países. O número de brasileiros não alfabetizados, com foco na leitura, é de 15,1%, ao passo que no México é de 8,9%, no Chile 4,4% e na Argentina 3,3% (DISTRITO FEDERAL, 2006, p. 6). O Pisa é realizado a cada três anos e foi implementado em 43 países no primeiro ciclo (2000) privilegiando a área de letramento em leitura. Em 2003, o Pisa envolveu 41 países e centrou-se em letramento matemático. Três anos depois, em 2006, o foco foi o letramento científico, envolvendo 57 países e mais de 400.000 estudantes. Os resultados colocaram o Brasil em 52º lugar, perdendo apenas para a Colômbia, a Tunísia, o Azerbaijão, o Catar e o Quirguistão (MEC, 04/12/07). Enquanto que países como o Japão investiram na educação e na formação de cientistas, tornando-se potências econômicas, o Brasil vive um quadro nada promissor. A posição obtida pelo país no Pisa 2006 não surpreendeu totalmente os pesquisadores, uma vez que em 2003 o país já ocupava em penúltimo lugar em letramento científico, o 37º em leitura e o último em matemática entre os 41 países participantes da pesquisa. É preciso destacar que o exame centra-se em resultados direcionados ao currículo que são essencialmente comuns entre os países participantes e enfatiza o domínio de processos, a compreensão e a capacidade de atuar em diversas situações dentro de cada área avaliada. 1 O PISA, realizado por iniciativa da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômicos (OCDE), consiste na aplicação de um teste padronizado nos alunos dos últimos anos da Educação Básica, com a finalidade de avaliar os conhecimentos adquiridos em leitura, Matemática e Ciências Naturais. Em 2006, o Pisa foi aplicado em 57 países e outros 12 já se cadastraram para participar do Pisa/2009 (www.pisa.oecd.org).

17 Se os indicadores de tendências do Pisa pretendem mostrar de que forma os resultados serão modificados ao longo do tempo, os resultados de 2003 não serviram de alerta para o Brasil. Conforme a OCDE (2007), os indicadores contextuais relatam resultados sobre características dos estudantes e das escolas, fornecendo uma base valiosa de conhecimentos para análises e pesquisas sobre políticas. Ao lado desses resultados encontra-se a precária formação dos professores. Conforme dados do Conselho Nacional de Educação (CNE), divulgados na Folha de São Paulo (GOIS, 2007), quase a metade dos professores que atuam nos anos iniciais da educação básica não tem formação superior no Brasil, esses professores são responsáveis por uma das etapas mais importantes para a qualidade da educação básica: a alfabetização. Esse breve levantamento de dados demonstra o quanto a pesquisa ora realizada é significativa no atual quadro nacional da Educação, uma vez que direciona a análise e os resultados para o letramento científico e para a formação de professores do Ensino Fundamental. A pesquisa intitulada Estudo Etnográfico das Contribuições da Sociolingüística à Introdução ao Letramento Científico no Início da Escolarização, se compromete com a formação de professores que atuam nos anos iniciais do Ensino Fundamental e, a partir da Sociolingüística Interacional e demais teorias que compõem o trabalho, visa desenvolver, junto a uma sala de aula de segundo ano de uma escola municipal, práticas de letramento científico que venham contribuir com sua transformação em um ambiente interacional favorável ao ensino e aprendizagem. Através da etnografia colaborativa, procurou-se registrar, descrever e analisar protocolos interacionais que retratem episódios bem sucedidos da prática pedagógica a favor da aprendizagem dos alunos e, conseqüentemente, contribuam com a formação dos alunos como sujeitos cidadãos.

18 Inicia-se o primeiro capítulo com foco na alfabetização e no letramento, apresentando duas grandes abordagens com seus principais representantes e implicações pedagógicas. A retrospectiva histórica enfoca alguns psicólogos que aderiram ao postulado positivista como Watson (1878-1958) e Pavlov (1849-1936) e segue com os lingüistas Ferdinand de Saussure (1857-1913), suíço considerado Pai da Lingüística Moderna, e Bloomfield, lingüista americano que viveu entre (1887-1949), e foi o fundador do Estruturalismo. Aponta ainda a Revolução Conceitual (Ferreiro e Teberosky, 1986) como um marco divisor na história da alfabetização no Brasil e a construção teórica de Piaget (1920-1980). O capítulo tem por objetivo remeter os educadores à teoria imprescindível para uma análise contrastiva entre essas abordagens e as que se apresentam no atual contexto para uma prática de letramento. No segundo capítulo, a Consciência Fonológica é apresentada como um desafio na formação dos professores que atuam nos anos inicias do Ensino Fundamental. É realizada uma análise contrastiva entre as abordagens estudadas do capítulo anterior com a perspectiva da construção do princípio alfabético. Destaca conceitos e práticas sobre consciência fonêmica, silábica, da palavra e da frase, que podem contribuir com os educadores na elaboração de estratégias para que as crianças construam a Consciência Fonológica de maneira eficiente, assegurando-lhes condições para o letramento. O capítulo três privilegia a Sociolingüística. É subdividido em três tópicos. Primeiramente encontra-se a linha de pesquisa adotada no trabalho, a etnografia colaborativa e seus principais representantes. Destacam-se conceitos, histórico, relações entre etnografia e Sociolingüística, especialmente a etnografia colaborativa de sala de aula. Apresenta-se o trabalho interativo entre pesquisadora e pesquisadora colaboradora, o diálogo e a observação, a reflexão da ação pedagógica, o ambiente interacional e a rotina da sala de aula como alguns dos objetivos da etnografia colaborativa. Em seguida são revistas algumas teorias do fracasso escolar, analisadas a partir da Sociolingüística. Dentre as várias formulações teóricas construídas sobre o fracasso escolar de crianças das classes sociais menos

19 favorecidas, destacam-se as Teorias da Deficiência e a da Diferença. A Sociolingüística apresenta questões complexas como fatores sociais, políticos, econômicos ou ainda, dirige a discussão para a escola, para a ação educativa e mais especialmente para as salas de aula como causas desse fracasso. Esse terceiro capítulo conclui com a Sociolingüística Interacional. Os principais teóricos, os componentes e argumentos que embasam a pesquisa estão enfocados, ressaltando-se a composição da tríade: Sociolingüística Interacional, Teoria da Aprendizagem de Vigotsky (Zona de Desenvolvimento Proximal) e as ações interativas de andaimagem propostas por Bruner e Cadzen (1980). Esses elementos sustentaram a triangulação para a análise dos dados e para a confirmação das asserções. São, também, apresentados alguns componentes norteadores da prática pedagógica como pista de contextualização, verbalização significativa, ações responsivas ratificadoras, diálogos, eventos de oralidade e letramento, sociabilização do conhecimento, situações problematizadoras e IRA (Iniciação/ Resposta / Avaliação). O quarto capítulo, Ciências Naturais e Letramento Científico, com três subdivisões, relaciona Ciências, Ciências Naturais e Letramento Científico. Enfoca a importância da relação entre o aluno, o professor e a Ciências para a construção da prática de letramento e conclui com um histórico sobre o ensino das Ciências no Brasil, uma revisão da abordagem Cientificista a Ciências, Tecnologia e Sociedade (CTS), descrevendo a metodologia problematizadora como uma proposta para atender a especificidade do ensino de Ciências Naturais, que consiste em letrar como condição para o exercício consciente da cidadania. As contribuições da Sociolingüística para a avaliação no ensino de Ciências Naturais é tratada no quinto capítulo, iniciando com uma breve reflexão sobre a avaliação da aprendizagem. Destaca-se como o letramento científico pode ser beneficiado pela Sociolingüística Interacional, pela teoria de aprendizagem de Vigotsky e pelas assistências interativas de Cadzen, apontando perspectivas de melhores resultados para o ensino aprendizagem dos alunos.

20 O sexto capítulo está relacionado à descrição do projeto e foi subdividido em duas partes: a primeira, relata a experiência e a motivação da pesquisadora e detalha o projeto; a segunda, descreve o contexto pedagógico da pesquisa, apresenta a professora pesquisadora colaboradora, a escola campo, as crianças, a sala de aula. No sétimo capítulo inicia-se a análise dos dados e resultados sobre as duas primeiras unidades de ensino das Ciências Naturais, "Estudo e Classificação do Solo" e "Educando o Cidadão: Tuberculose", que são inteiramente sistematizadas. A Sociolingüística, ZDP e Andaimes são tomados como a base da triangulação para analisar a asserção geral e todas as demais subasserções que dela emergem. Na primeira parte são analisadas três categorias: a sala de aula, as estruturas de participação e as ações responsivas como introdução às transformações da prática pedagógica. Na segunda, essas categorias se justapõem na construção da prática do letramento científico (Ciências Naturais) e Alfabetização (Consciência Fonológica). Finalmente, o oitavo capítulo conclui a sistematização da análise dos dados e resultados da pesquisa. Sua importância reside na (re)construção da prática pedagógica, por ter sido planejada pela professora colaboradora a partir do referencial teórico utilizado ao longo da pesquisa, o que lhe ofereceu autonomia para criar e repensar a sua própria prática. Os episódios são relatos de seis aulas e sete protocolos, transcritos para fitas VHF, e evidenciam as teorias que fundamentaram o trabalho, permitindo que a sistematização dos dados confirmem a asserção geral e as subasserções. Nesse mesmo capítulo são apresentadas estratégias para a construção da Consciência Fonêmica, a ampliação da ZDP através de texto literário e da observação, a construção do princípio alfabético, da consciência silábica, do letramento científico e a avaliação através da construção de frases. O conjunto de estratégias descreve eventos que são por excelência práticas de letramento bem sucedidas.

21 Seguem as conclusões com reflexões sobre a contribuição da pesquisa para a formação de professores do Ensino Fundamental e especialmente para o letramento científico com foco nas teorias que fundamentaram o trabalho.

22 1 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO É preciso dar as crianças do nosso continente, principalmente das classes menos favorecidas, o direito de se apropriarem da língua escrita em toda a sua complexidade. Dar-lhes o direito de saber ler criticamente a palavra escrita pelos outros e o direito de escreverem seus próprios textos, colocar suas próprias palavras. Alfabetizar não é luxo, é um direito. Se a alfabetização não é concebida desta maneira, não vale a pena lutar pela alfabetização. (Emilia Ferreiro) A história recente da alfabetização no Brasil foi marcada por um período anterior e outro posterior à chamada Revolução Conceitual, quando Emília Ferreiro e Ana Taberosky, em suas pesquisas, deslocaram a discussão do como se ensina para o como se aprende. A alfabetização, até então vista como um processo mecânico, passou a ser investigada como uma aprendizagem conceitual. Nascia a psicogênese da escrita na criança. O Construtivismo na Alfabetização desestabilizou as convicções metodológicas dos professores alfabetizadores que tiveram que mudar seu ponto de vista sobre a criança, de um ser que aprende, para um ser que pensa e interpreta. Nesse momento, o processo de alfabetização passou a ser norteado por duas grandes abordagens: a comportamentalista e a cognitivista. 1.1 LEITURA E ESCRITA COMO TRANSCRIÇÃO DE CÓDIGOS 1.1.1 Psicologia Comportamental A abordagem comportamentalista baseia-se nos princípios das teorias da aprendizagem condutista e associacionista. Pertencem a essa corrente os teóricos que aderiram ao postulado do positivismo, ou em uma visão mais clássica, à chamada corrente behaviorista, compreendida como "S-R" (do inglês, "Stimulus-Reaction" - Estímulo-Reação), iniciado por John Broadus

23 Watson (1878-1958). Outros teóricos inspiraram-se nos princípios condutistas, gerando uma grande variedade de derivações, como o condicionamento clássico de Ivan Pavlov (1849-1936), o condicionamento operante de B. F. Skinner, os estudos de Thorndike, no início de século XX, sobre o comportamento. William James, outro representante dessa corrente, assim se refere à Educação: "não existe melhor maneira de descrever a educação do que considerá-la como a organizadora dos hábitos de conduta e tendências comportamentais adquiridos" (VYGOTSKY, 1991, p. 91) Esse grupo de teóricos, em sentido mais amplo, concebe o conhecimento como algo que provém de fora, sendo o objeto um dado externo que deve ser absorvido pelos educandos de modo mecânico. A mente é um receptáculo vazio, passivo e receptivo ao estímulo, cuja resposta se dá por condicionamento. A adoção dessa abordagem dificulta para a escola o cumprimento de seu papel na formação do sujeito crítico. Ao contrário, serve a uma ideologia autoritária, formando sujeitos para uma sociedade antidemocrática que procura manter controle sobre as pessoas. Norteado pelo comportamentalismo, o processo de alfabetização desenvolve habilidades específicas na criança, o que supõe a modelagem dos comportamentos afetivo, cognitivo e motor para a aquisição da aprendizagem. Segundo essa corrente, existe um conjunto de habilidades perceptuais, como pré-requisitos para a aprendizagem da leitura e da escrita, conhecidas como prontidão para a alfabetização (Figura 1). Para Goodman (1982 apud BRAGGIO, 2002), a teoria da prontidão pode ser comparada a um preconceito racial baseado na teoria da deficiência. As crianças pobres têm mais coisas para aprender ao entrar na escola do que as crianças mais favorecidas por causa da sua história de vida e da natureza das próprias escolas, o que no entanto não pode confundir-se com a falta de capacidade mental perceptiva, motora ou psicológica dessas crianças.