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RECLAMAÇÃO 15.309 SÃO PAULO RELATORA RECLTE.(S) PROC.(A/S)(ES) RECLDO.(A/S) ADV.(A/S) INTDO.(A/S) ADV.(A/S) : MIN. ROSA WEBER :MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO :PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO :JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SUZANO :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS :ROBERTO CARVALHO CORREA :MARCOS ROBERTO PALMEIRA Trata-se de reclamação constitucional, com pedido de liminar, fundada nos arts. 103-A, 3º, da Constituição Federal; 13 a 18 da Lei 8.038/90; e 156 a 162 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra ato do Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Suzano-SP, que, nos autos da Ação Penal 000100-46.2012.8.26.0606, teria descumprido as decisões desta Corte exaradas na ADI 4.424 e na ADC 19. Narra a inicial que, no dia 22.10.2012, o Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Suzano-SP, diante da retratação da ofendida, declarou extinta a punibilidade de Roberto Carvalho Correa pela prática do crime tipificado no art. 129, 9º, do Código Penal. O Parquet manejou recurso em sentido estrito pendente de análise pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Argumenta, em síntese, que o magistrado de primeiro grau descumpriu decisões desta Suprema Corte proferidas nos autos da ADI 4.424 e da ADC 19, em que reconhecida a constitucionalidade da Lei 11.340/06. Requer, em medida liminar e no mérito, a procedência do pedido formulado na presente reclamação, para cassar a decisão reclamada a fim de viabilizar o prosseguimento da ação penal. É o relatório. Decido. A via estreita da reclamação constitucional (art. 102, I, l, da Constituição da República) pressupõe a ocorrência de usurpação de

competência originária do Supremo Tribunal Federal, a desobediência a súmula vinculante ou o descumprimento de decisão desta Corte proferida no exercício de controle abstrato de constitucionalidade ou em controle difuso, desde que pertinente, nesta última hipótese, à mesma relação jurídica e às mesmas partes. Há que verificar, portanto, a presença de uma dessas hipóteses, e com rigor, sob pena de desvirtuamento do instituto. O ato reclamado, datado de 22.10.2012, foi assim exarado: (...). Vistos. Roberto Carvalho Correia, qualificado nos autos, foi denunciado como incurso nas penas do artigo 129, 9º, do Código Penal, porque no dia 23 de janeiro de 2012, período da tarde, no endereço mencionado na denúncia, teria agredido sua companheira Ligia Regina Pereira de Souza, causando-lhe as lesões corporais de natureza leve, descritas no laudo de exame de corpo de delito juntado às fls. 15. A denúncia foi recebida em 29.5.2012 (fl. 58). Citado/notificado, o acusado apresentou defesa preliminar (fls. 67-9). Durante a instrução, foram ouvidas a vítima, uma informante e interrogando-se o réu ao final. Alegações finais estão logo acima. Representação da vítima está às fls. 7. É o breve relatório. Decido. Conquanto a materialidade delitiva esteja configurada à fl. 15, por ocasião da oitiva da vítima, Ligia Regina solicitou que o processo não tivesse mais andamento, relatando que depois da agressão, voltou a morar com seu marido, sendo que a vida do casal está muito tranquila. Ao analisar os autos, percebe que não foi realizada a audiência preliminar o artigo 16, em que a representação de fl. 7 seria ou não confirmada, sendo que a retratação da vítima ocorreu somente agora, na presença deste Magistrado. O caso presente indica que houve uma renúncia superveniente, que deverá ser acolhida neste momento. Posto isso, JULGO EXTINTA A PUNIBILIDADE do acusado com fundamento no artigo 107, inciso IV, do Código Penal c.c. artigo 38 do Código de Processo Penal. 2

Ora, em 09.02.2012, o Plenário deste Supremo Tribunal Federal, nos autos da ADI 4.424, rel. Ministro Marco Aurélio, dando interpretação conforme aos artigos 12, I, e 16, da Lei 11.340/06, assentou a natureza pública incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão corporal, pouco importando a extensão desta, praticado contra a mulher no ambiente doméstico. Em julgamento conjunto, nos autos da ADC 19, rel. Ministro Marco Aurélio, esta Suprema Corte também reconheceu a constitucionalidade dos arts. 1º, 33 e 41 da Lei 11.340/06. Naquela oportunidade, dessumiu-se que deixar a mulher autora da representação decidir sobre o início da persecução penal significaria desconsiderar a assimetria de poder decorrente de relações históricoculturais, bem como outros fatores, tudo a contribuir para a diminuição de sua proteção e a prorrogar o quadro de violência, discriminação e ofensa à dignidade humana (Informativo nº 654/STF). Ainda, considerou-se não ser aplicável a Lei 9.099/95 para tais delitos, já que, em se tratando de lesões corporais, mesmo que de natureza leve ou culposa, praticadas contra a mulher em âmbito doméstico, a ação penal cabível seria pública incondicionada (Informativo nº 654/STF). Em outras palavras, a propositura da ação penal por crime de lesão corporal no ambiente doméstico não está condicionada à representação da vítima, nem a posterior retratação tem qualquer efeito processual. Constato, de plano, que o ato reclamado divergiu do entendimento adotado por esta Corte Suprema nos autos da ADI 4.424 e da ADC 19, decisões com eficácia erga omnes e efeito vinculante (art. 102, 2º, da CF). Não tem lugar o argumento de que a decisão do Supremo não poderia retroagir para atingir a retratação ou os crimes praticados anteriormente. O Supremo é intérprete da lei, e não legislador. O julgado acima referido apenas revelou o melhor Direito aplicável, sem inovar na esfera normativa. Pretendesse o Supremo limitar temporalmente a eficácia da decisão, ter-se-ia servido da norma prevista no art. 27 da Lei nº 9.868/1999 que permite tal espécie de modulação. Não foi, porém, estabelecido qualquer 3

limitador temporal ao decidido nas referidas ações constitucionais. Destaco as seguintes decisões monocráticas, as quais ratificaram a orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal, no sentido da natureza incondicionada da ação penal nos crimes de lesões corporais leves praticados no contexto da violência doméstica, independentemente do controle de constitucionalidade abstrato ser posterior à data da prática do delito: RE 677.553/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 30.8.2012; RE 691.068/DF, rel. Min. Luiz Fux, DJe 10.8.2012; ARE 664.493 AgR/DF, rel. Min. Ayres Britto, DJe 26.3.2012. Registro ainda caso idêntico ao presente Reclamação 14.132/SP, ajuizado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra ato do Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Avaré-SP em que admitida a retratação da vítima, em procedimento criminal orientado pela Lei 11.340/06, ao argumento da prática do crime ter ocorrido antes da declaração de constitucionalidade da Lei Maria da Penha. Em 12.7.2012, o Ministro Ayres Britto, então Presidente deste Supremo Tribunal Federal, assim deferiu pedido de liminar: (...). Esta nossa Casa de Justiça, no julgamento das mencionadas ações de controle concentrado de constitucionalidade, não fez uso da faculdade de que trata o art. 27 da Lei 9.868/1999. Em palavras outras: o Supremo Tribunal Federal não restringiu os efeitos das decisões nem determinou que essas decisões apenas tivessem efeitos a partir do trânsito em julgado dos respectivos acórdãos. Pelo que a declaração de constitucionalidade dos dispositivos da chamada Lei Maria da Penha se aplica, sim, aos acasos anteriores ao julgamento da ADC 19 e da ADI 4.424. Isso posto, defiro a medida liminar requestada. A decisão atacada deve, portanto, ser reformada, o que se viabiliza, uma vez assentada a questão pelo Plenário deste Supremo Tribunal, por decisão monocrática do Relator, com base no art. 21, 1º e 2º, do Regimento Interno do STF. 4

Observo que, apesar de o art. 21, 1º e 2º, se referir à possibilidade de reforma pelo Relator de decisão contrária à orientação do Supremo firmada no julgamento de recurso com repercussão geral ou de acórdão contrário à Súmula, a norma também se aplica à reforma de decisão contrária ao resultado de julgamento de ação de controle concentrado de constitucionalidade, já que esta tem até maior eficácia potenciada que as demais. Ante o exposto, com base no art. 21, 1º e 2º, do Regimento Interno desta Corte, julgo PROCEDENTE a presente Reclamação para cassar a decisão judicial que reputou extinta a punibilidade do acusado nos autos da Ação Penal 000100-46.2012.8.26.0606, que tramita no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em sede de recurso em sentido estrito, devendo ser retomado o processo. Comunique-se, com urgência, com cópia da presente decisão, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e o Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Suzano-SP, determinando o cumprimento, com a prestação de informações, no prazo de 15 dias, ao Supremo Tribunal Federal das providências tomadas. Publique-se. Brasília, 21 de março de 2013. Ministra Rosa Weber Relatora 5