A INCLUSÃO DO ALUNO SURDO NA REDE REGULAR DE ENSINO Maria Ivaneide D. de Azevedo Amorin 1 Sílvia Maria Da S. Morais Costa 2 Maristela Rosso Walker 3



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Transcrição:

A INCLUSÃO DO ALUNO SURDO NA REDE REGULAR DE ENSINO Maria Ivaneide D. de Azevedo Amorin 1 Sílvia Maria Da S. Morais Costa 2 Maristela Rosso Walker 3 RESUMO: Vivencia-se um período de transformação, onde assegura-se a todos igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola, sem qualquer tipo de discriminação. Essa maneira de atender a educação inclusiva exige uma profunda revisão das práticas educacionais e mudanças na forma como os recursos são distribuídos e disponibilizados para estes fins. É nesse contexto que esse trabalho traz algumas reflexões acerca da inclusão do aluno surdo no ensino regular. Tem que se admitir que as instituições têm seus fins próprios e nem sempre um novo propósito, como é o caso da inclusão se encaixa no foco de seus interesses imediatos. Contudo, há evidências que a orientação inclusiva contribui para melhorar a escola para todos. A investigação visa saber: como os professores trabalham a inclusão do aluno surdo; o que entendem por inclusão; quais as maiores dificuldades encontradas para trabalhar com o mesmo; que estratégias utilizam e que benefícios a inclusão desse aluno traz aos demais colegas e também ao professor. Portanto, entende-se que no marco desse novo tempo todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Palavras-chave: inclusão, aluno surdo, aprendizagem. ABSTRACT: We live in a changing period, where we ensure for everyone equal opportunity of settings to get access and stableness into school, without any type of prejudice. This way of focus into inclusive education claims a careful review about educational methods and changes in manner related to how these resources are identified and accessible to specific purposes. And this context of work conveys some reflections about the inclusion of deaf learners into a regular teaching. We must acknowledge that educational institutions have their own aims and not even a new principle, such a case of inclusion that makes part of their new direct interests. However, there are indications in which the inclusive orientation contributes to improve the school for everyone. This investigation intends to identify: how the teachers deal with the inclusion of deaf learners; what they understand about inclusion; which are the most difficulties exposed to deal with it; which strategies used and what advantages the inclusion of this learner conveys to the other colleagues as well to the teacher. Therefore, we comprehend that in the boundary of a new moment all the human beings grow up liberated and equals in self-respect and also in rights. Key words: inclusion, deaf learner, learning. Quem somos nós, quem é cada um de nós, se não uma combinatória de experiências, de informações, de leitura, de imaginação? Cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilo, onde tudo pode ser continuamente remexido e reordenado de todas as maneiras possíveis. (Ítalo Calvino) 1 Professora da Rede Regular de Ensino do Estado do Acre, graduada em Pedagogia pela UFAC. 2 Professora da Rede Regular de Ensino do Estado do Acre, graduada em Pedagogia pela UFAC. 3 Mestra em Educação pela UEM-PR, Professora de Didática e Prática de Ensino do Curso de Pedagogia da UFAC/CZS, orientadora deste trabalho de conclusão de curso. E-mail: maristela@ufac.br

1 INTRODUÇÃO Vive-se em uma sociedade democrática que tem por definição a pluralidade, o convívio e a interlocução na diversidade. Nesse sentido, a educação é posta como um direito de todos, pois propaga-se a idéia de que há oportunidade para todos. Nesse cenário, as pessoas com deficiência esforçam-se para serem aceitas, e a sociedade também empreende esforços para acolhê-las, esforço este que, em si, não expressa qualquer incapacidade das pessoas com deficiência. Ao contrário, percebe-se que o mundo em que se vive é incapacitante, devendose, portanto, disseminar a política de construção de sistemas educacionais inclusivos e apoiar o processo de implantação em todos os estados e municípios brasileiros. A educação inclusiva é um movimento que compreende a educação como um direito humano fundamental e base para uma sociedade mais justa e solidária, sabendo-se, no entanto, que a inclusão não acontece num passe de mágica. É uma conquista que exige muito estudo, trabalho e dedicação de todos os envolvidos no processo: aluno surdo e ouvinte, família, professores, fonoaudiólogos, psicólogos, assistentes sociais e demais elementos da escola. A legislação do Brasil prevê a inclusão do educando com necessidades especiais no sistema regular de ensino. Essa inclusão, no entanto, deve ser um processo individual, fazendo-se necessário estabelecer, para cada caso, o momento oportuno para que o educando comece a freqüentar a classe comum com possibilidade de êxito e progresso. O que nos fez optar por essa temática foi, de fato, a experiência profissional adquirida ao longo de alguns anos na educação especial e, sobretudo, o desafio frente a um trabalho de apoio à inclusão como professor itinerante, em algumas escolas da rede estadual no município de Cruzeiro do Sul. A experiência vivenciada trouxe a sensação de impotência, ao ver professores insatisfeitos e despreparados para lidar com essa clientela. Eles alegam a problemática de lidar com algo inteiramente novo e citam, como fato relevante, o uso de uma linguagem de difícil comunicação. Isso evidencia a necessidade de aprofundar os conhecimentos desses professores, fornecendo-lhes suporte para um trabalho efetivo com alunos inclusos. O que acontece, efetivamente, é que a maioria dos educadores desconhece a filosofia da inclusão, que defende uma educação eficaz para todos, sustentada no princípio de que as escolas, enquanto comunidades educativas, devem satisfazer as necessidades de todos os alunos, sejam quais forem as suas características pessoais, psicológicas ou sociais, com ou

sem deficiência. Em vista desse quadro fático, estabelecemos como campo de investigação a Escola de Ensino Fundamental, Mustafa Almeida Tobu, situada na Av. Lauro Muller, nº 1424, Bairro João Alves, no Município de Cruzeiro do Sul, Estado do Acre. É considerada do tipo B com 292 alunos matriculados. Atualmente, funciona com duas modalidades: Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série com 10 (dez) turmas no período diurno e duas salas de Educação de Jovens e Adultos (E.J.A.) no período noturno. Optou-se por esta escola, por três razões: ela está situada em local próximo ao bairro onde residimos, o que favorece maior dedicação em termos de tempo ao estudo; está sempre aberta para receber alunos com necessidades educacionais especiais; e, também, por contar na sua clientela, aluno surdo incluso, sendo este o principal motivo da pesquisa. Tomamos como sujeitos da pesquisa, professores que tem ou que tiveram aluno surdo incluído na sua sala de aula (estes denominados de professor A, professor B, professor C e professor D). Na tentativa de apreender a problemática de maneira global, temos por objetivo verificar como a inclusão do aluno surdo está acontecendo na referida escola; para tanto, estabelecemos algumas questões para análise: o que estes professores entendem por inclusão; como trabalham com o aluno surdo; que metodologias utilizam; quais dificuldades e benefícios a inclusão desse aluno traz aos demais colegas e também ao professor. O estudo foi realizado nos anos de 2005 e 2006, no turno da tarde da escola; baseamonos nos pressupostos teóricos e metodológicos da pesquisa social, com a utilização de técnicas como questionário e observação. O presente trabalho divide-se em três partes: na primeira abordamos a inclusão do aluno surdo pautados em autores como Luria (1986), Sassaki (1997), Fernendes (2000), Dyson (2001) entre outros; na segunda parte apresentamos os trabalhos empíricos juntamente com os resultados; por fim, nas considerações finais retomamos as discussões suscitadas em todo o trabalho.

2 O PARADIGMA DA INCLUSÃO DO ALUNO SURDO Partindo do princípio de que a educação é um direito de todos, o atendimento educacional às pessoas com necessidades especiais, em ambiente escolar comum ou em grupos especializados, está assegurado na Constituição Brasileira. Deve-se ressaltar que a inclusão não se refere somente às pessoas com alguma deficiência, mas a todas que se encontram em situação de risco, discriminação e exclusão; em suma, sejam, de alguma forma diferentes. Em relação ao direito à diferença, vários autores já se manifestaram, entre os quais citamos Boaventura de Souza Santos (1996 p.318): Temos o direito de sermos iguais, quando a diferença nos inferioriza; temos o direito de sermos diferentes, quando a igualdade descaracteriza. Sabe-se que a história da educação de surdos é repleta de controvérsias e descontinuidades. Nesse processo, como qualquer outro grupo minoritário, os surdos constituíram-se em objeto de discriminação em relação à maioria ouvinte. Acerca dessa discriminação é eloqüente o manifesto de Feiffer 4 que dá destaque ao sentimento gerado no grupo, revelado no comentário sobre as inúmeras denominações que lhe foram conferidas: Eu pensava que era pobre. Aí, disseram que eu não era pobre, eu era necessitado. Aí disseram que era auto defesa eu me considerar necessitado, eu era deficiente. Aí disseram que deficiente era uma péssima imagem, eu era carente. Até hoje eu não tenho um tostão, mas já tenho um grande vocabulário. Com efeito, trata-se, também, de mais um problema de cunho social, em que os discursos mascarantes da realidade pululam, em detrimento de ações efetivas em prol dos grupos ditos minoritários. No contexto da Educação, que é o cerne deste estudo, a língua de sinais surgiu com a função, entre outras, de facilitar a integração desse grupo ao mundo envolvente; entretanto, durante muitos anos, o mito de que a língua de sinais impediria a aquisição da língua oral pelas crianças surdas, impediu sua utilização no processo educacional. A língua de sinais não era considerada uma língua, mas um conjunto de gestos icônicos, sem estrutura interna e com a função de comunicar apenas conteúdos concretos. 4 Fragmento extraído de depoimento do autor, retirado da coletânea Ensaios Pedagógicos: construindo escolas inclusivas, 2005, sem nº de página.

Com base nos dispositivos da Legislação Brasileira, o Conselho Nacional de Educação aprovou a resolução n. 2/2001 que institui as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Essa diretriz inclui os alunos surdos no grupo daqueles com dificuldade de comunicação e sinalização diferenciada dos demais alunos, e que demanda a utilização de linguagem e códigos aplicáveis. O parágrafo 2º do artigo 12 dessa resolução diz: Devem ser assegurados no processo educativo de alunos que apresentam dificuldades de sinalização diferenciada dos demais educandos, a acessibilidade aos conteúdos curriculares mediante a utilização de linguagens e códigos aplicáveis, como o sistema Braile e a língua de sinais, sem prejuízo do aprendizado a língua portuguesa, facultando-lhes e às suas famílias a opção pela abordagem pedagógica que julgarem adequada, ouvidos os profissionais especializados em cada caso. Atualmente, a Lingüística da Língua de Sinais, é uma disciplina em expansão no mundo todo e suas pesquisas demonstram a importância dessa forma de comunicação na construção do sujeito surdo. Apesar desse avanço, ainda são comuns situações de interação entre professores e alunos medidas apenas pela língua oral, desconsiderando-se as dificuldades e o pouco ou nenhum conhecimento em relação a esta forma de comunicação por parte de uma determinada clientela. Nesse contexto, muitas vezes o professor propõe ordens ou resoluções de problemas que não são compreendidas pelo surdo, que ignora ou não atinge os objetivos propostos pela tarefa, simplesmente por não entender o conteúdo da mensagem veiculada. Nesse sentido, Luria (1986,s/nº), diz que: A língua é um fator fundamental na formação da consciência. Ela permite pelo menos três mudanças essenciais à atividade consciente do homem: ser capaz de duplicar o mundo perceptível, de assegurar o processo de abstração e generalização, e ser veículo fundamental de transmissão de informação. Percebe-se assim, que a capacidade de comunicação lingüística pode ser considerada como um dos principais responsáveis pelo processo de desenvolvimento da criança surda em toda a sua potencialidade, para que possa desempenhar seu papel social e integrar-se verdadeiramente na sociedade. No que concerne esse processo integrativo convém lembrar Sassaki (1997, p. 41) para quem a inclusão da criança com surdez na escola regular requer uma boa preparação tanto do aluno quanto da escola, para que ambos se sintam capacitados a participar dessa integração. No que se refere ao desenvolvimento da criança com problemas auditivos, Fernandes (2000, p. 49) explica que desenvolver-se cognitivamente não depende

exclusivamente do domínio de uma língua, mas dominar uma língua garante os melhores recursos para as cadeias neurais envolvidas no desenvolvimento dos processos cognitivos. No tocante às formas de comunicação, várias pesquisas comprovaram que crianças surdas procuram criar e desenvolver alguma forma de linguagem, mesmo não sendo expostas à língua de sinais. Essas crianças desenvolvem espontaneamente um sistema de gesticulação manual que tem semelhança com outros sistemas desenvolvidos por outros surdos que nunca tiveram contato entre si e com as línguas de sinais já conhecidas. Face ao exposto, pode-se concluir que o aluno com surdez tem as mesmas potencialidades de desenvolvimento que o aluno ouvinte, necessitando, apenas, que suas necessidades especiais sejam supridas, visto que o natural do homem é a linguagem. 3 A INCLUSÃO DO ALUNO SURDO NA ESCOLA MUSTAFA ALMEIDA TOBU Como já foi dito na primeira parte deste trabalho, pretendemos adquirir subsídios que permitam auferir se os professores da Escola de Ensino Fundamental, Mustafa Almeida Tobu, estão preparados para enfrentar com eficiência os desafios impostos pelo cotidiano escolar, no que se refere ao trabalho de integração do aluno surdo. Para atingir esse objetivo, elaboramos e aplicamos um questionário com cinco questões a um total de quatro professores, entre os quais dois atuaram com aluno surdo em anos anteriores e dois tinham, na época da aplicação dos questionários e do desenrolar da pesquisa, alunos inclusos. Destes educadores, dois possuem formação superior em Pedagogia e dois têm o curso de magistério. Apesar das dificuldades que se apresentam, como salas superlotadas e falta de formação adequada para lidar com esta clientela, estes profissionais demonstravam interesse e se preocupavam com a situação, desejando fazer o melhor para ajudar o aluno surdo e vê-lo desenvolver-se como os demais ouvintes. A instituição pesquisada recebe crianças de baixa renda, advindas de bairros próximos e as salas de aula comportam um grande número de alunos, o que torna difícil a inclusão de pessoas com necessidades especiais. Nesse quadro de dificuldades parece estar implícito que o trabalho do professor está fadado a não surtir muito êxito, com o conseqüente e freqüente fracasso do aluno surdo.

4 RESULTADOS DA PESQUISA A primeira pergunta feita aos professores diz respeito ao que ele entende por inclusão. A maioria respondeu que inclusão é inserir, fazer parte, participar, processo de igualdade que dá direitos iguais a todos, sem qualquer tipo de preconceito. Nesse aspecto Ballard (1997) tece comentários sobre o fato de que os alunos têm o mesmo direito de acesso a um currículo culturalmente valioso e em tempo completo como membro de uma classe escolar e de acordo com a sua idade. A educação inclusiva enfatiza a diversidade mais que a semelhança. A inclusão assume que a vivência e a aprendizagem em grupos é a melhor forma de beneficiar a todos, não somente as pessoas rotuladas como diferentes. A segunda pergunta trata de como esses professores trabalham a inclusão do aluno surdo na sala de aula. Responderam que utilizam materiais voltados para o visual (materiais concretos), pois percebem que há um melhor entendimento por parte dos alunos surdos e ao planejar suas aulas levam em conta as necessidades individuais, procurando atender esses alunos de acordo com suas dificuldades. Entretanto, quando perguntados sobre quais as maiores dificuldades encontradas para trabalhar com o aluno surdo, os mesmos responderam, que não se sentem preparados, alegando a falta de formação. Outro entrave encontrado no cotidiano escolar é a comunicação, uma vez que estes professores não têm domínio da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Enfoca-se agora a quarta questão da pesquisa. Quando se questionou sobre quais estratégias utilizam para trabalhar com este aluno, os professores responderam que usam gestos, dramatizações, alfabeto manual e jogos. Outros instrumentos citados por eles foram os impressos, com destaque para os cartazes e para as imagens. O último aspecto que se buscou investigar foi o benefício que a inclusão deste aluno traz para os demais colegas e para próprio professor. Diante das respostas dos docentes vislumbra-se que um dos benefícios trazidos pela inclusão à comunidade escolar é a quebra do preconceito, o que se explica, ainda e em parte, pela necessidade de convivência com essas pessoas para perceber que elas são, em primeiro lugar, seres humanos, com os mesmos desejos, vontades de ter amigos, fazer programas inerentes a seus colegas. Outro aspecto apontado pelos professores foi a oportunidade de conhecer o novo, demonstrando sensibilidade nesta questão. Foi possível observar que, por meio da inclusão de

alunos surdos, alguns deles estão se desenvolvendo como profissionais, tentando mudar as suas práticas pedagógicas e saindo da zona de conforto de um modelo tradicional; buscam o novo, o que requer mudança e esforço. No tocante a essa evolução demonstrada pelos professores, pensamos que adquire-se aprendizados quando resolvemos nossas dúvidas, superamos nossas incertezas e satisfazemos nossas curiosidades. Assim, a inclusão possibilita aos que são discriminados em razão da deficiência, da classe social ou da cor da pele, que, por direito, ocupem seu espaço na sociedade. Se isso não ocorrer, essas pessoas serão sempre dependentes e terão uma vida cidadã pela metade. Não é possível ter um lugar no mundo sem considerar o do outro, valorizando o que ele é e o que ele pode ser. Por outro lado, o restante da comunidade escolar também ganha, com a oportunidade de desenvolver novos valores, e no seio dessa comunidade, os professores exercem papel preponderante no processo de garantir a todos o direito a educação, o que se reveste, para eles, de grande importância. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Vale ressaltar que a questão abordada não tem caráter julgativo, mas o que se sabe é que o preconceito e a discriminação, infelizmente, ainda existem nos meios escolares por mais que se discuta e que se propague que o ensino é para todos. Tem-se tornado consenso a necessidade de se quebrar barreiras em vários sentidos, visto que, para que este ensino seja de qualidade e acessível a todos, necessita-se de colaboração e compartilhamento do processo educativo com todos os que estão direta ou indiretamente nele envolvidos. As escolas inclusivas devem ser espaços educativos de construção de personalidades humanas autônomas, críticas, nos quais as crianças aprendem a ser pessoas. Nelas os alunos são ensinados a valorizar as diferenças, pela convivência com seus pares, pelo exemplo dos professores, pelo ensino ministrado nas salas de aula, pelo sócio-afetivo das relações estabelecidas em toda a comunidade escolar. São contextos educacionais em que todos os alunos têm possibilidade de aprender, freqüentando a mesma turma. Diante da pesquisa realizada, percebe-se que a inclusão do aluno surdo na Escola Mustafa Almeida Tobu, está acontecendo de forma parcial, pois revelou-se, no decorrer da presente investigação, o despreparo e o desconhecimento dos professores para lidar com o

aluno surdo, apesar do interesse e sensibilidade dos primeiros em relação à questão, como já foi mencionado. Mas apesar dessa inclusão estar caminhando a passos lentos, já existe um bom começo, haja vista que, a despeito das dificuldades encontradas, a referida escola está sempre aberta para receber essa clientela específica, mesmo não dispondo de um quadro de profissionais como recomendam as Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica. Nesse trabalho sócio-educacional, recomenda-se que o professor nutra uma elevada expectativa pelas realizações desse aluno visto que o sucesso da aprendizagem reside na exploração de talentos, na utilização de possibilidades, no desenvolvimento das predisposições naturais de cada aluno. Ensinar uma classe em que todos aprendam reafirma a necessidade de promover situações de aprendizagem que formem uma trama multicor de conhecimentos, cujos fios expressem diferentes possibilidades de interpretação e de entendimento de um grupo de pessoas que atuam cooperativamente. REFERÊNCIAS BRASIL. Caracterização dos tipos de educandos portadores de deficiência auditiva. Programa de capacitação de Recursos Humanos do Ensino Fundamental Deficiência Auditiva, Vol. 1. Séries Atualidades Pedagógicas 04, Brasília: MEC/ SEESP, 1997. (pp. 53-55).. Ensaios pedagógicos: construindo escolas inclusivas. Brasília: MEC, SEESP, 2005. Deficiência Auditiva Secretaria de Educação Especial Série Atualidades Pedagógicas, Brasília: MEC/SEESP, 1997. BALLARD, K. Researching disability and inclusive education: Participation, construction and interpretation. Internacional Journal of inclusive Education 1, 1997. SANTOS, B.S. Pela mão de Alice: O social e o político na pós-modernidade. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1996. DYSON, A. Dilemas, contradições e variedades em Inclusão. Salamanca: Amaru, 2001. FERNANDES, E. Problemas lingüísticos e cognitivos do surdo. Rio de Janeiro: Agir, 2000. LURIA, A.R. Pensamento e linguagem: as últimas conferências de Luria. Porto Alegre: Arte e Científicos/ EDUSP, 1986. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL: Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. 2 ed. Brasília: Fundação Procurador Pedro Jorge de Melo e Silva, 2004.

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