PROCESSOS COGNITIVOS E APRENDIZAGEM DE MÚSICA: UMA ANÁLISE DE ASPECTOS FIGURATIVOS E OPERATIVOS NA FORMAÇÃO DE CONCEITOS MUSICAIS.



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Transcrição:

PROCESSOS COGNITIVOS E APRENDIZAGEM DE MÚSICA: UMA ANÁLISE DE ASPECTOS FIGURATIVOS E OPERATIVOS NA FORMAÇÃO DE CONCEITOS MUSICAIS. Leandro Augusto dos Reis - UEL Francismara Neves de Oliveira - UEL Introdução O momento vigente na educação musical suscita a urgente reflexão sobre o ensinar e o aprender música na escola. Recentemente garantido na legislação, o ensino de música na escola regular (Lei 11.769/08) 1 apresenta a necessidade de reflexão sobre os processos cognitivos envolvidos no desenvolvimento de conceitos musicais e abre espaço para discussões sobre a atuação do professor de música nas escolas. Com base nessa problemática discutimos nesse ensaio teórico uma possibilidade de aproximação entre a compreensão dos aspectos relacionados ao desenvolvimento musical do aluno propostos por Swanwick (1986) com a compreensão de desenvolvimento cognitivo e os estágios evolutivos do pensamento abordados por Piaget (1975). O presente artigo objetiva discutir possíveis correspondências entre os estágios de formação musical e os aspectos figurativos e operativos do pensamento, tomando por base os dois aportes teórico-metodológicos citados. Partimos da compreensão de desenvolvimento cognitivo à luz da teoria piagetiana tendo como base principal a teoria da Equilibração (Piaget, 1975). As relações entre os aspectos figurativos e operativos envolvidos na construção de conceitos (Piaget & Inhelder, 1977; Piaget 1978b, Valent, 2007) podem ser relacionadas aos estágios de criticismo musical (material expressão forma e valor), propostos por Swanwick (1986) em seu modelo espiral de desenvolvimento musical. No entendimento destes aportes teóricos, aspecto figurativo consiste em representar e descrever a realidade, mas implica em descrição estática mesmo quando se 1 Lei 11.769/08: Lei sancionada pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva no dia 18 de agosto de 2008, a qual estabelece a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas de educação básica.

2 trata de uma situação dinâmica a ser descrita. O conhecimento figurativo se baseia na abstração empírica, ou seja, na capacidade de descoberta e de descrição das propriedades particulares e observáveis existentes nos objetos e tem por função servir como auxiliar indispensável aos aspectos operativos, imitando, representando e antecipando alguns aspectos do real. Nesse caso, há predomínio da acomodação 2 sobre a assimilação 3, pois os objetos se impõem aos sujeitos na medida em que se apresentam apenas como configurações (Valent, 2007). Na teoria de Swanwick (1986) percebemos esse processo no primeiro estágio de desenvolvimento, denominado Materiais, onde a resposta da criança é caracterizada pela impressão do som particularmente considerando suas propriedades: timbre, intensidade (forte-fraco), altura (agudo-grave) e duração, manipulados com pouca caracterização expressiva, portanto com predomínio dos aspectos figurais sobre os operativos. É possível compreender esse processo à luz da teoria da equilibração (Piaget 1975). Considerando que o desenvolvimento estrutural supõe um continuum no qual as assimilações e acomodações desencadeiam aprimoramento qualitativo e quantitativo do pensamento, os aspectos figurais têm como papel principal o domínio das propriedades do objeto preparando a organização e a adaptação que oferecerão ao sujeito melhores condições de apropriação em momentos posteriores. Bispo (2000), em estudo que analisou a construção da imagem mental tomando por base o marco teórico piagetiano, define os aspectos figurativos como formas de conhecimento que permitem a representação do real e a sua descrição, se referem a cópias do real, se apóiam nas configurações ou estados e têm caráter estático. p.14 Assim, reconhecer a duração do som, o timbre, a dinâmica envolvida numa produção musical é elementar para que o sujeito possa representar ainda que neste momento, o discurso musical se traduza em cópia do real, estaticamente representada. O segundo estágio, denominado Expressão, caracteriza-se pela reorganização dos aspectos figurais por meio da capacidade de explorar as mudanças de andamento e dinâmica que estão para além das propriedades físicas do som. Nesse processo o indivíduo deixa de apenas responder as impressões do som para oferecer expressão 2 Acomodação: é a criação de novos esquemas ou a modificação de velhos esquemas. Ambas as ações resultam em uma mudança na estrutura cognitiva (esquemas) ou no seu desenvolvimento (Wadsworth, 1997, p. 20). 3 Assimilação: é o processo cognitivo pelo qual uma pessoa integra um novo dado peceptual, motor ou conceitual nos esquemas ou padrões de comportamento já existentes (Wadsworth, 1997, p. 19).

3 pessoal caracterizada pela maneira idiossincrática e deliberada com que as crianças iniciam suas explorações de mudanças de andamento e dinâmica, por exemplo. Trabalhando pequenas frases, gestos musicais, ainda que sem o controle estrutural, é possível identificar intencionalidade na ação do sujeito, revelada na descrição de associações pessoais, imagens visuais e sentimentos. É ainda nesse estágio que o indivíduo amplia sua consciência de que os materiais musicais permitem diferentes possibilidades expressivas. O aprendiz se volta em direção às convenções musicais estabelecidas por uma determinada cultura, ou seja, torna-se capaz de estabelecer um diálogo com esses padrões musicais (Swanwick, 1986). A esse modo de compreender os aspectos figurais do pensamento na produção musical, o entendimento piagetiano nos convida a perceber que no interior de um estágio ou nível de evolução atuam processos diferenciados. A passagem do predomínio dos aspectos figurais aos operativos não é constituída por um salto, mas tecida fio a fio, processualmente. Por essa razão é possível diferenciar o estágio materiais do estágio expressão, ambos reveladores de predomino dos conhecimentos figurativos. Bispo (2000) cita como tipos de conhecimento figurais: a percepção que ocorre na presença do objeto, mecanismos sensoriais, imitação na presença ou ausência do objeto, reprodução motora e imagem mental. Todos os processos citados permitem relação com o segundo estágio discutido por Swanwick (1986) a expressão. Este estágio é mais evoluído que o dos materiais, pois contém o anterior e o ultrapassa, o que nos remete ao caráter construtivo e conservador da espiral de conhecimento que assegura a criação do novo e a manutenção daquilo que constitui a estrutura cognitiva já consolidada. O terceiro estágio do desenvolvimento musical denominado Forma - apresenta evolução em relação ao anterior no que concerne a possibilidade de maior domínio, não só das propriedades do som, mas de seu caráter expressivo. Esse estágio é análogo aos aspectos operativos do pensamento nos quais predominam regulações mais complexas das relações parte-todo. Correspondem a especulação da estrutura do discurso musical, a repetição intencional de padrões e a contestação advinda da interpretação, além de controle técnico expressivo e estrutural mais consciente. Isso permite apropriação da forma, assim como na evolução do pensamento lógico-matemático a necessidade de lidar com o concreto favorece a consciência das próprias ações, o planejamento de estratégias e o domínio de regras, preparada no período representacional e acentuada no período operatório concreto.

4 Fraisse e Piaget (1969) comentam que o aspecto operatório diz respeito a um processo de conhecimento que necessariamente envolve a modificação do objeto de conhecimento de maneira a atingir as transformações como tais e seus resultados, e não mais apenas as configurações estáticas que correspondem aos estados, reunidos por essas transformações. p. 73. Assim, é possível identificar as diferenças com o estágio anterior no qual predominava o aspecto figurativo, pois agora manifestam-se a dedução e a modificação do objeto como resultantes de um processo interno, pertencente ao sujeito. Ao contrário do nível anterior no qual os conhecimentos eram retirados dos objetos, no operativo o conhecimento é predominantemente resultante das assimilações e acomodações desencadeadas para responder à necessidade lógica do sujeito cognoscente. O quarto estágio, denominado Valor, revela crescente capacidade de pensamento e de comunicação possíveis por meio da representação simbólica. Nesse estágio, os sujeitos não se prendem tanto às convenções da forma, mas ampliam o senso afetivo da música, ou seja, suas produções emocionantes e significativas. Este processo que engloba os estágios anteriores permite reflexão sobre sua própria experiência musical. O equivalente deste estágio na evolução da estrutura cognitiva seria a capacidade de autoregulação, pensamento reflexivo, tomada de consciência da própria ação ou compreensão (Piaget, 1977 e 1978). O conceito dado por Piaget (1977; 1978) ao processo de apropriação da ação - fazer e compreender - é estudado por Becker (2001) segundo o qual, a tomada de consciência significa um processo de apreensão do mundo, dos modos de construí-lo, de transformá-lo e de apreensão de si mesmo. Analisa o autor que a apreensão do mundo e de si mesmo é correlata, por isso objetivação e subjetivação devem ser entendidas como processos interdependentes. Posto isto que apresenta a interface que identificamos nos aportes teóricos de Piaget e de Swanwick, apresentamos um quadro organizador das principais características pertinentes a cada estágio de evolução musical, com base na proposição de Swanwick (1986). Cada nível de desenvolvimento engloba a noção do crescimento musical envolvendo um padrão seqüencial. Cada estágio possui duas fases e, a partir das pesquisas realizadas pelo autor, podemos observar características específicas para cada um desses estágios e fases do desenvolvimento musical.

5 ESTÁGIOS FASES CARACTERÍSTICAS MATERIAIS Pulsação irregular, explora Sensorial e experimenta os O sujeito focaliza o som, o instrumentos e sons vocais. prazer de manipular o som. Organização sonora espontânea. Manipulativo Manipulativo - possibilidade de controle do instrumento e pulsação regular. Compartilha uma interação musical social. EXPRESSÃO É a expressão própria da música, apresentando seus sentimentos, estados de ânimo e movimentos. FORMA Surge a consciência das relações estruturais na música como a tensão e repouso e a repetição e o Pessoal Vernáculo Especulativo Corresponde ao início das explorações de mudanças de andamento e dinâmica, em frases elementares. Gestos musicais. Os padrões rítmicos começam a surgir. Mais organização na métrica e apresenta influências no cantar, tocar e ouvir. Refere-se ao aparecimento da preocupação com a coerência estrutural na música e a procura pelos contrastes de idéias musicais. contraste. Idiomático O estilo é reconhecido em um idioma musical e o controle técnico é maior. VALOR A experiência musical de alto nível. Surgem as ligações com valores pessoais tornando a música uma atividade significativa. Simbólico Refere-se à atenção nas relações formais e no caráter expressivo em forma de fusão. Domínio técnico com forte comprometimento pessoal.

6 Sistemático Última fase onde o compositor, intérprete ou ouvinte, reflete sobre a sua experiência musical. Baseado em seu crescimento musical, acontece a expansão sistemática das possibilidades do discurso musical. Figura 1. Estágios e fases do desenvolvimento musical (Swanwick, 1988; 2003) Processos Cognitivos Subjacentes à Compreensão Musical Como problema central do desenvolvimento cognitivo na perspectiva de Piaget, se encontra a teoria de Equilibração (Piaget, 1975). Equilíbrio representa toda a dinâmica do processo de estruturação da inteligência. Estudos sobre a aprendizagem baseados na teoria de Piaget mostram a necessidade de uma investigação por parte do professor no sentido de identificar esse processo, acompanhá-lo e nele intervir (Macedo, 1994; Becker, 2001; Montoya, 2005). Não adianta o professor oferecer um conteúdo inacessível à estrutura cognitiva do aluno e por inacessível entendemos tanto aquele conteúdo que está aquém quanto aquele que está além das condições do sujeito, pois não havendo estruturas apropriadas que permitam a ação auto-estruturante do sujeito, os processos de assimilação e acomodação e consequentemente a equilibração ficam impedidos de ocorrer (Valent, 2007). Na teoria de desenvolvimento musical, as fases são analisadas recorrendo à imagem de uma espiral reveladora de duas dimensões: o lado esquerdo e direito do espiral relativos à construção pessoal e à interação social respectivamente. O equilíbrio neste processo dialético entre assimilação e acomodação, é garantido pelas contínuas trocas entre a estrutura de pensamento e as interações com o outro (Piaget, 1975; Hentschke, 1993). Neste processo de conhecer, é revelado o papel do outro e dos objetos de conhecimento na estruturação cognitiva do sujeito, oferecendo resistência aos esquemas do sujeito e demonstrando a fragilidade ou insuficiência da estrutura de pensamento. Ao se deparar com a incompletude dos esquemas, a estrutura é convidada à transformação advinda da modificação dos esquemas existentes ou construção de novos esquemas.

7 Esse processo não ocorre sem que antes se instale um desequilíbrio entre as assimilações e acomodações, afirmações e negações, parte e todo, acertos e erros, dialeticamente interdependentes (Wadsworth, 1997; Lukjanenko, 2001). É interessante considerar que na perspectiva teórica piagetiana o erro não é considerado negativo, mas parte importante do processo, pois revela a construção interna, os esquemas da estrutura de pensamento posta em ação (Macedo, 1994; Bianchini et al., 2009). Assim como a inteligência está relacionada à adaptação, pode-se também entender o equilíbrio como a própria aprendizagem. Muito mais do que uma mudança de comportamento, a aprendizagem/equilíbrio é a transformação construída pelo sujeito. A aprendizagem é, portanto, resultante de um processo de equilibração, pois será a dinâmica de uma assimilação que incorpora elementos externos possibilitada pela acomodação que modifica internamente a estrutura a fim de tornar possível novas assimilações e acomodações (Montoya, 2005). Este processo gradativo e ascendente está representado no modelo Espiral de Swanwick (1986), onde cada curva da espiral representa este processo de formação de esquemas mentais. Os estágios representam um movimento na direção de uma nova maneira de organização da experiência musical. Nesse sentido, o conceito de desenvolvimento apresentado na teoria de Swanwick envolve a noção de crescimento de um ponto ao outro, e assegura que este crescimento implica um padrão seqüencial, porém não linear crescente (Hentschke, 1993). Isso significa considerar que há momentos de crescimento, desequilíbrio, reorganizações e novo equilíbrio ou nova organização. Além dos estágios apresentados, a teoria espiral de desenvolvimento musical, também contém duas fases para cada estágio e corresponde aos dois lados do espiral (esquerdo-direito). O lado esquerdo do espiral enfatiza a maneira egocêntrica do indivíduo de responder à música em cada um dos quatro estágios, ao passo que o lado direito corresponde ao movimento em direção a respostas socialmente compartilhadas (Hentschke, 1993). O Espiral como modelo de desenvolvimento musical, resultou das investigações de Swanwick (1986) sobre a origem teórica do desenvolvimento da experiência musical, por meio do estudo do Jogo na perspectiva de Piaget (1978). Nesta comparação, Swanwick entende a música como forma de jogo ampliado, que consta de um triângulo de três partes constituído pelos conceitos piagetianos de: domínio (referese a controle dos materiais musicais), imitação (corresponde aos momentos de

8 representação, ou seja, quando há referências aos eventos da vida; um ato de acomodação) e jogo imitativo (cria-se um mundo de novas relações, além dos elementos ao nosso redor). Figura 2. Representação do modelo espiral de desenvolvimento musical (Swanwick & Tillman, 1986). Subjacente à compreensão musical estão os processos cognitivos, sociais e afetivos, cuja evolução é gradativa e supõe um progresso que pode ser representado nos dois aportes teóricos por uma espiral que indica que para todo processo de crescimento deve haver espaço para a reorganização e reflexão. O desconhecimento ou o desrespeito a este progresso paulatino, no ato de ensinar música ou qualquer outra disciplina escolar, é prejudicial ao desenvolvimento do aluno. De acordo com Valent (2007), esse processo gradativo que constitui a espiral permite a passagem dos aspectos figurativos aos operativos na produção do conhecimento. Enquanto os aspectos figurativos são responsáveis pelas sensações e percepções, os operativos referem-se à lógica e compreensão. No período préoperacional, são tarefas de desenvolvimento a construção das classes e da inclusão dos objetos nas mesmas, a capacidade de nomear e de incorporar as informações advindas do meio social. De igual modo Swanwick sugere que no desenvolvimento musical, existe uma sequência, um desdobramento metódico de comportamento musical, que existem estágios cumulativos através dos quais o comportamento musical da criança pode ser traçado (1988, p.53). A evolução do pensamento que vai dos aspectos figurativos aos operativos, depende da interação que é o ponto alto do processo de aprendizagem e ocorre exatamente pela preservação da experiência individual inserida num contexto social. Em Piaget (1976), o desenvolvimento cognitivo se interliga ao desenvolvimento social,

9 tanto no início das atividades da criança sobre o meio, como no período das operações lógicas. Swanwick (1988) salienta o mesmo em sua teoria adotando em cada período uma fase mais pessoal e intuitiva e outra mais analítica, formal, onde há uma interação musical socialmente compartilhada. Com relação ao aspecto operativo Piaget (1983) afirma que este: (...) é relativo às transformações e se dirige assim a tudo o que modifica o objeto, a partir da ação até as operações. Chamamos operações às ações interiorizadas (ou interiorizáveis), reversíveis e se coordenando em estruturas, ditas operatórias, que apresentam leis de composição caracterizando a estrutura em sua totalidade, como sistema (p. 248). Para compreendermos a teoria espiral como uma teoria de desenvolvimento, buscamos subsídios no conceito de desenvolvimento de Green (1985) e nas características que ele propõe para a espiral. Estas características segundo Green (Hentschke et al., 1993) são: Temporalidade, Cumulatividade, Direcionalidade, Novo Modo de Organização, e Aumento da Capacidade de Auto-Controle. Passamos a elucidar estas características: Temporalidade todo o desenvolvimento implica no elemento temporalidade, significando que as mudanças ocorrem ao longo do tempo. Na teoria do modelo espiral esta compreensão permite identificar como as crianças de diferentes idades respondem à música de forma qualitativa ao longo do desenvolvimento musical. Essa teoria defende a ideia de que as respostas musicais não são determinadas pelas idades, mas os dados de pesquisas demonstram grande correspondência entre as produções composição e apreciação das crianças em relação as suas idades. Mesmo tendo como pressuposto que o desenvolvimento musical não está preso á faixa-etária há que se reconhecer que o tempo é uma importante variável desse processo. O tipo de educação formal, o meio ambiente, e seu desenvolvimento cognitivo estão intrinsecamente relacionados ao tempo, pois o tempo permite que o indivíduo seja exposto ao processo de educação musical, às vivências e experimentações. Dimensão importante a ser considerada, portanto. Cumulatividade sugere que o processo do desenvolvimento musical é acumulativo. Isto implica considerar que o domínio dos primeiros estágios é condição

10 necessária, embora não suficiente para o desenvolvimento dos estágios subseqüentes. Dessa forma compreendemos o porquê dos estágios de criticismo musical aparecerem no processo de desenvolvimento nesta ordem assegurando que sejam seqüenciais e hierárquicos. Direcionalidade significa que as mudanças de desenvolvimento são progressivas e de certa forma duráveis e irreversíveis. Analisa Hentschke (1993) que mudanças no desenvolvimento musical são progressivos à medida que caminham em direção a uma maior complexidade na maneira que as pessoas respondem a música (p. 57). Por outro lado o indivíduo poderá ou não responder a música em seu estágio de desenvolvimento musical atual. Nesse sentido o indivíduo pode responder a uma apreciação musical se concentrando basicamente nos estágios materiais e expressão, sem levar em consideração os aspectos formais da obra musical (Hentschke, 1993, p. 58). Outro aspecto importante apontado por Swanwick (1988) é que toda vez que nos deparamos com uma nova situação musical - por meio da apreciação, execução ou composição -, todo o processo Espiral de desenvolvimento é reativado. Para o autor, a primeira e mais surpreendente impressão da música é sempre sua superfície sensorial, especialmente se estivermos privados de música por algum tempo (Swanwick, 1988, p. 82). No âmbito da apreciação musical, por exemplo, o aprendiz pode iniciar sua crítica dizendo que se trata de um duo piano-violino e em seguida estabelecer uma crítica mais formal daquela escuta. O Modo de Organização implica por sua vez, em novas propriedades não manifestadas nos estágios anteriores, apresentando um novo pensamento ou modificação da estrutura do indivíduo. Ou seja, cada novo estágio de desenvolvimento musical supõe um novo modo de organização, promovendo ao sujeito uma nova maneira de responder a um mesmo objeto uma obra musical. Na teoria espiral, as respostas dos primeiros estágios não deixam de existir independentemente do quanto o indivíduo está desenvolvido musicalmente. Neste caso, a forma hierárquica que explica como estão divididas as dimensões do espiral sugere uma diferenciação qualitativa dos estágios. A compreensão dos elementos musicais parte dos estágios superiores exigindo diferentes graus de compreensão musical. Em uma apreciação musical o indivíduo pode estender sua crítica para além da simples identificação dos materiais e relacionar esses mesmos materiais a aspectos mais formais da estruturação do discurso musical. Nesse

11 caso temos presente não só o elemento da cumulatividade, mas também um novo modo de organizar as respostas frente a uma obra musical. Aumento da Capacidade de Auto-Controle o indivíduo é capaz de desenvolver-se musicalmente de forma mais independente, ultrapassando o conhecimento musical culturalmente estabelecido. Nesse caso, o indivíduo é capaz de criar novos sistemas transcendendo o ambiente e os idiomas musicais culturalmente estabelecidos (Hentschke, 1993). Implicações Pedagógicas Swanwick (2003) nos apresenta duas visões distintas de educação musical. A primeira, denominada por ele de visão receptiva ou tradicional, onde o professor inicia o aluno nas tradições musicais e ensina técnicas necessárias, enfatizando o estudo do instrumento, a leitura e escrita musical e a familiarização com obras e compositores consagrados. Isto representa um processo de transmissão de conhecimento do professor no qual o aluno é tido como mero receptor. Em contrapartida, o autor apresenta a visão criativa que nos últimos anos vem dando à educação musical uma nova perspectiva. Essa visão enfatiza a expressão, sentimento e envolvimento, representando uma trajetória por meio da qual o professor estimula seu aluno a construir o conhecimento através da exploração e da criatividade. Nesse caso, o aluno é visto como um inventor, um improvisador, um compositor. De igual modo o papel do professor transforma-se de diretor musical para o de facilitador do aluno, estimulando-o, promovendo reflexões e questionamentos, aconselhando e orientando, ao invés de somente demonstrar o som, a composição, o que foi criado e constitui o acervo universal da música. Todavia, muitos alunos desenvolveram-se segundo a visão receptiva e aprenderam a tocar, compor, apreciar e foram motivados a gostar de música. Então, deve-se respeitar o valor dessa visão no processo de construção do saber, da tradição, da habilidade e da qualidade musical, porém a visão criativa proporciona a oportunidade do aluno ser um inventor musical (Swanwick, 1991). Com essa visão criativa, Swanwick apresenta na teoria Espiral um equilíbrio entre o lado direito e esquerdo. Conforme discutimos anteriormente, o lado esquerdo representa a resposta egocêntrica da música, refere-se aos aspectos pessoais, intuitivos, imaginativos e subjetivos do desenvolvimento musical. O lado direito representa as

12 respostas compartilhadas socialmente, refere-se aos aspectos analíticos, formais e objetivos (Hentschke, 1993). A Teoria Espiral engendra os lados direito e esquerdo (pessoal e social) em um processo cíclico, mostrando que ambos são necessários e complementares no desenvolvimento musical. O equilíbrio entre os lados esquerdo e direito da espiral são análogos à compreensão dos processos de assimilação e acomodação da teoria de desenvolvimento de Piaget (1976). A teoria espiral de desenvolvimento musical pode ser utilizada como fundamentação teórica para a construção de um currículo de ensino de música, como comprova as pesquisas de Swanwick (1994), Hentschke (1993) e Oliveira (1998). A viabilidade da utilização dessa teoria como suporte para um currículo em música, ocorre juntamente com o Modelo de Atividades ou Parâmetros da Experiência Musical (T)EC(L)A 4 de Swanwick (1988). Consiste num modelo de parâmetros ou atividades musicais, os quais, segundo Swanwick (1988) são indispensáveis para o desenvolvimento da construção do conhecimento musical. No processo de educação musical, os parâmetros primordiais na estruturação curricular são composição, execução e apreciação, sendo a técnica e a literatura colaboradores desse processo. A junção de conhecimento e atividade é ideal no sentido de que são complementares no desenvolvimento musical do indivíduo. Os parâmetros de composição, execução e apreciação encontram-se na base da estruturação curricular, sendo que os parâmetros de técnica e literatura são considerados como complementares no processo de educação musical. A utilização da combinação desses dois modelos de conhecimento e de atividade justifica-se na medida em que ambos são complementares para o desenvolvimento musical do indivíduo (Hentschke, 2000). Segundo Hentschke (1993) a teoria espiral pode ser considerada a primeira sequência de desenvolvimento fundamentada na natureza da experiência musical (p. 69). Nesse sentido essa teoria promove um suporte aos educadores musicais para a elaboração de um currículo em música, que leve em conta os estágios de desenvolvimento musical, dá subsídios aos aspectos relacionados a avaliação musical, além de promover reflexões sobre o valor da música no processo de educação e desenvolvimento do indivíduo. 4 1998). (T)- Técnica; E - Execução; C - Composição; (L)- Literatura; A Apreciação (Oliveira,

13 Considerações Finais Ao relacionarmos esses dois teóricos Piaget e Swanwick, pudemos perceber que ambos levam em consideração o fato do sujeito transitar pelos estágios de desenvolvimento de forma dinâmica. Por exemplo, se o indivíduo na música apresentar conteúdo de desenvolvimento relacionado ao pensamento operatório formal, não significa que ele apresentará conteúdo de aprendizagem (operatório formal) em todas as áreas de conhecimento. Entretanto, a forma de raciocínio operatório formal está disponível para a aprendizagem de todos os conhecimentos com os quais o sujeito se deparar. Se o mesmo não desenvolveu o lado perceptivo, sensorial para música, este aplicará a estrutura que possui no seu desenvolvimento musical. Os estágios de desenvolvimento, tanto para Swanwick quanto para Piaget, são dinâmicos e não estruturas estáticas que não se articulam entre si. Os quatro critérios da teoria do desenvolvimento musical apresentam uma grande semelhança com as características da estrutura de pensamento em cada estágio do desenvolvimento cognitivo proposto por Piaget tal como descrevemos anteriormente. Essa solidariedade é interessante e ratifica a importância do estudo, da pesquisa como subsidiadores do trabalho do professor que pretende compreender os processos de ensino e de aprendizagem. Essa compreensão no ensino de música é solidária às discussões em outras áreas da educação e engendra a reflexão sobre a mudança de postura, de concepções e significações nos processos de ensinar e aprender. Convida à reflexão sobre a relação que proporcionamos na escola com o saber, que valorização é dada ao que se aprende e aos modos de lidar com o aprender. Implica pensar sobre o erro como construtivo em um processo que é gradativo e espiralado e que, portanto envolve momentos de crescimento, outros de organização nos quais o erro é importante sinalizador da estrutura de pensamento. Enfim, as discussões que desencadeamos neste ensaio teórico indicam a importância de continuidade de estudo dos processos envolvidos no ensinar e aprender música na escola. Referências

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