CURIOSOS E PESQUISADORES: POSSIBILIDADES NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
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- Orlando Filipe Sousa
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1 CURIOSOS E PESQUISADORES: POSSIBILIDADES NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA Cíntia Nunes (PPGEdu/UFRGS) Apoio: CNPq Resumo: Este trabalho trata de investigar a curiosidade e a pesquisa escolar sob um ponto de vista epistemológico. Tendo como referencial teórico o autor Jean Piaget, apresenta-se a idéia de que a curiosidade pode estar vinculada à pesquisa. Um estudo vem sendo realizado com alunos das Séries Iniciais do Ensino Fundamental e até o momento verificou-se que a sala de aula movida pela curiosidade possibilita o interesse das crianças pela pesquisa, tornando a sala de aula um ambiente prazeroso para se aprender. Palavras-chaves: Curiosidade, pesquisa, Educação Básica. A curiosidade é o que movimenta e dá vida ao presente estudo. É estudando a curiosidade sob um ponto de vista afetivo que se identificou sua relação com a cognição, na medida em que alunos e professores realizam pesquisas para satisfazer suas curiosidades. Essa investigação iniciou-se no 1º ano do Ensino Fundamental (2009) com alunos de 6-7 anos, e continua sendo realizada com a mesma turma, no 2º ano (2010). Atuei como docente da turma em Tenho como pressuposto que a curiosidade que nos faz perguntar e conhecer é necessária não somente ao aluno, mas também ao professor, pois se ela mover as ações em sala de aula, os alunos farão perguntas, às vezes inusitadas, e essas perguntas incitarão também a curiosidade do professor que, em busca de respostas, viverá em constante transformação. O referencial teórico que embasa este trabalho é a Epistemologia Genética de Jean Piaget. As investigações do autor sobre a afetividade e inteligência contribuem para averiguar como construímos novos conhecimentos pesquisando o que nos interessa. A afetividade move nossas ações a partir de um interesse. Ficamos curiosos por algo de acordo com nossa relação com esse ou aquele objeto. A inteligência se constitui por meio da adaptação do sujeito ao meio externo e por uma organização interna. É ela a responsável pelas novas estruturas de conhecimento. A inteligência e afetividade apresentam aspectos distintos, mas necessitam uma da outra. Apresento a idéia de que a curiosidade está vinculada à noção de interesse, pois, segundo Piaget, o interesse é o elo que estabelece a relação entre uma necessidade
2 do sujeito e objeto que satisfará esta necessidade. É o interesse que move o sujeito para a busca do conhecimento. Defendo o termo pesquisa como o meio de busca para satisfazer uma curiosidade. Nesse sentido, pesquisar significa uma busca dirigida por um interesse. Isto envolve necessariamente, assimilação e acomodação. Porque assimilar um objeto é incorporar aos esquemas algo novo e essa assimilação pode ocorrer por meio de uma busca do próprio sujeito, sendo que os esquemas precisarão modificar-se para ajustar os novos dados. Perrenoud (1991) diz que de acordo com Piaget, podemos dizer que a criança é um pesquisador porque ela aprende agindo sobre o mundo e procura compreendê-lo. Em geral, as crianças são curiosas, pois querem saber o por quê de tudo o que nos rodeia. Interessam-se por fazer experiências como os cientistas, pelo aspecto mágico que isso possui. Aproveitar essa curiosidade torna a sala de aula um ambiente prazeroso para se aprender. Ao realizar experiências com materiais, visitar o laboratório de ciências, fazer perguntas diversas e pesquisar sobre elas, a criança vai construindo novos conhecimentos e transformando-se. O importante é colaborar para a busca do aluno e escutar suas crenças sobre as explicações que procura. Assim, ele terá referenciais para comparar o que descobriu e o que pensava anteriormente. Mesmo que o que procura seja demasiado difícil para a idade, o professor não pode ficar receoso e proibir a pesquisa. Pode, sim, deixar e colaborar para que o aluno encontre respostas que, naquele momento, possam ajudá-lo, mesmo que essas ainda não sejam totalmente detalhadas com os conhecimentos científicos. Método O Método Clínico de Piaget embasou minhas ações na busca de compreender as curiosidades das crianças e como elas construíam suas ideias sobre o que gostariam de pesquisar. Nesse método, o papel do experimentador é também intervir nas respostas dos sujeitos com o objetivo de estudar os percursos de seu pensamento. Essa intervenção vai configurando-se durante a entrevista, pois o experimentador formula perguntas, levanta hipóteses e cria novas perguntas de acordo com a resposta do sujeito. O método para a coleta de dados vem sendo utilizado nas seguintes situações: a) atividades propostas para toda a turma nas quais as crianças possam criar curiosidades devido a uma proposta docente; b) observação no dia a dia escolar evidenciando curiosidades das crianças que não estejam diretamente relacionadas com a
3 proposta; c) entrevistas individuais para verificar a crença da criança sobre a sua curiosidade e se essa crença se transforma durante a entrevista, devido às perguntas e contra-argumentações realizadas pelo entrevistador. Para a coleta de dados das situações (a) e (b) vem sendo realizados momentos de debate, registro, manuseio de objetos, saídas de campo, pesquisas na biblioteca, hora do conto, visita ao laboratório de ciência da escola, atividades com música e um cantinho da pesquisa na sala de aula 1. As entrevistas individuais também contam com algum material de manipulação e observação pela criança. Iniciei o trabalho em sala de aula enfatizando a curiosidade a partir da hora do conto do livro: A curiosidade premiada, de Fernanda Lopes de Almeida. Antes de contar o que se passava na história, perguntei às crianças o que elas imaginavam que seria a palavra curiosidade e quais as curiosidades que já tiveram. Procurei, também, observar se no coletivo (turma) há a possibilidade de ocorrer um interesse nas crianças impulsionado por algum desequilíbrio provocado por outro colega. Por exemplo, alguém apresenta uma crença diferente dos demais colegas e isso causa uma discussão no grupo, de forma que outras crianças sintam-se também desequilibradas. E se, ao se sentirem desequilibradas, procuram pesquisar, para satisfazer essa curiosidade. Ao propor uma atividade em que os alunos pesquisassem suas curiosidades, inquietava-me a ideia de por onde começar? Sabia que a pesquisa deveria partir de interesses desencadeados por curiosidades espontâneas dos alunos e não de interesses meus ou de uma lista de conteúdos. Iniciei levantando as idéias dos alunos sobre a palavra curiosidade antes de ler a história: A curiosidade premiada citada anteriormente. Então questionei: [Prof]: Alguém sabe o que é curiosidade? [alunos]: Quando a pessoa fica espionando as coisas/quando alguém está feliz/ter cuidado com as coisas. Percebendo que a idéia de alguns alunos sobre o sentido da palavra ainda não estava relacionado com o significado que estava procurando tratar a curiosidade (sentido de desejo de saber, conhecer, ter interesse em saber mais sobre o objeto do conhecimento), procurei continuar perguntando e confirmando a hipótese de que a 1 Local em que os alunos deixam suas experiências, livros e seus registros sobre a pesquisa.
4 curiosidade estaria com o sentido mais relacionado à idéia: Quando a pessoa fica espionando as coisas. Esperava com isso que crianças conseguissem utilizar a palavra curiosidade para se referir ao desejo de querer saber sobre algo. No decorrer das atividades as crianças utilizavam a palavra curiosidade para se referirem às atividades de seu interesse, chamando a atenção para atividades relacionadas à pesquisa. Para um registro das curiosidades das crianças de forma que possam consultar o que citaram como curiosidade, foi criado um personagem na sala de aula, a Papa curiosidades, que guarda as curiosidades dos alunos para serem lembradas quando necessário, contribuindo na pesquisa. Considerações No ano de 2009 as crianças pesquisaram sobre diferentes assuntos, fizeram algumas perguntas como: Qual é a forma do nosso coração? Como foi feito o olho? As flores, como que elas nascem? Qual lixo se coloca nas plantas? O que as plantas carnívoras comem? Para descobrir sobre isso realizaram as atividades descritas no método e apresentaram algumas de suas pesquisas em um evento de iniciação cientifica para a Educação Básica. Durante as aulas, por muitos momentos, os alunos utilizaram as palavras pesquisa, experiência e curiosidade para se referirem aos temas ou acontecimentos que ocorriam no ambiente escolar. Tal fato evidencia o vínculo de aprender por meio da pesquisa. Pesquisas diferentes ocorreram simultaneamente na turma devido às curiosidades serem definidas pela diversidade de experiências dos alunos. As construções de novos conhecimentos aconteceram por meio das relações estabelecidas, bem como dos conflitos e decisões decorrentes dos debates da turma. Quando os alunos apresentaram opiniões diferentes entre si, houve alguns desequilíbrios que os impulsionaram a pesquisar. Como, por exemplo, quando toda a turma acreditava que coração humano era como o desenho que utilizamos para representar amor, a não ser um aluno que gritou dizendo que não era assim. A turma começou a debater, sendo que um dos colegas disse não querer acreditar que poderia ser diferente. Então iniciaram uma pesquisa em livros e perguntaram para seus familiares até que chegaram à conclusão de que o órgão humano era diferente de como imaginavam anteriormente.
5 A curiosidade está vinculada à afetividade na medida em que se manifesta como um interesse. Tal interesse é o que move as ações de um sujeito para satisfazer a um desequilíbrio, portanto o interesse é o motor da pesquisa. Os alunos pesquisavam sobre o que lhes chamavam a atenção, como por exemplo, as plantas carnívoras. Eles acreditavam que a planta carnívora comia pessoas como aparecia nos filmes, no entanto, ao visualizar a planta carnívora em uma saída de campo no Museu de Ciências e ao debater com colegas e professora concluíram que ela era pequena demais para comer pessoas e que comia apenas alguns insetos. Essa conclusão foi resultado de implicações lógicas do sujeito, pois para chegar a essa conclusão precisaram fazer comparações entre os dados anteriores e os que foram descobrindo. O Método Clínico me deu suporte para aprender a perguntar, a fazer da resposta dos alunos novas perguntas e refletir sobre as respostas produzidas por eles. Acredito que esse trabalho possa contribuir com os demais professores no sentido de pensar a pesquisa escolar vinculada à curiosidade de seus alunos. E, com isso, favorecendo que aprender seja uma diversão. Se a sala de aula é um dos espaços formais de construção de novos conhecimentos, por que não promover um meio em que a curiosidade possa definir os rumos da aprendizagem? Permiti-se, assim, que o conhecimento seja criação dos próprios sujeitos, em um movimento constante de perguntas e descobertas. REFERENCIAS: PERRENOUD, Philippe. Lê role d une initiation a la recherchedans la formation de bases dês enseignants. In:INRP (Ed). La place de la recherché dans la formation des enseignants. Paris: INRP, 1991, p PIAGET, Jean. Inteligencia y Afectividad. Buenos Aires. Aique Grupo Editor. publicado originalmente em1954. Edição A equilibração das estruturas cognitivas: problema central do desenvolvimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1976.
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