Diferenciais inexatas e o fator integrante



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Transcrição:

Métodos Matemáticos 202 Notas de Aula Equações Diferenciais Ordinárias III A C Tort 2 de outubro de 202 Diferenciais inexatas e o fator integrante imos que a EDO implícita: é exata se e apenas se: M(x, y)dx + N(x, y)dy = 0, () Suponha que M(x, y) = N(x, y). (2) não seja exata, mas que exista uma função F(x.y) tal que: P(x, y)dx + Q(x, y)dy = 0, (3) F(x, y)p(x, y)dx + F(x, y)q(x, y)dy = 0, (4) agora seja exata. O problema então é determinar esta função F(x, y) que transforma a equação diferencial original de inexata em exata. esta função é chamada de fator integrante. ejamos um exemplo simples. Exemplo Considere emos que M(x, y) = y, e N(x, y) = x. Aplicando o teste de exatidão: M(x, y) y dx xdy = 0. (5) =, N(x, y) =, (6) logo, esta EDO implícita não é exata. É fácil inferir que F(x, y) = /x 2 é um fator integrante (embora não seja o único). Multiplicando a EDO implícita por este fator integrante: y x 2 dx dy = 0. (7) x Agora temos uma diferencial exata e podemos aplicar a técnica que discutimos na última nota de aula. A determinação do fator integrante não é uma tarefa fácil. Muitas vezes podemos inferí-lo ou mesmo deduzílo por tentativa e erro. Eis um método que funciona em alguns casos. Se a Eq. (4) for uma diferencial exata então: email: tort@ufrj.br (FP) = (FQ), (8)

Notas de Aula. AC TORT 202 2 ou, desenvolvendo: F y P + F P y = F x Q + F Q x, (9) que não representa uma grande avanço. Suponha, porém, que F = F(x). Então F y = 0 e F x = F. Segue que: F P y = df dx Q + F Q x. (0) Com um pouco de álgebra podemos escrever: F df dx = Q ( P Q ). () Se o lado direito desta equação depender somente de x, isto é for uma certa função R(x), podemos integrá-la e obter: F(x) = exp R(x) dx. (2) Exemplo 2 Aqui Considere a EDO implícita: 2 sen ( y 2) dx + xy cos ( y 2) dy = 0. (3) Como: Segue que F(x) = x 3. P(x, y) = 2 sen ( y 2), Q(x, y) = xy cos ( y 2). (4) ( P Q Q ) = R(x) = 3 x. (5) EXERCÍCIO : Mostre que no exemplo acima F(x) = x 3. Se agora supusermos que F = F(y), então você pode mostrar que: df F dy = ( Q P P ). (6) Novamente, se o lado direito desta equação depender somente de y, então: F(y) = exp R(y) dy. (7) EXERCÍCIO 2: Obtenha F(y). A questão da diferencial exata é muito importante, por exemplo, na termodinâmica. Se uma quantidade termodinâmica não for uma diferencial exata, esta quantidade não pode ser associada com uma função de estado. Por exemplo, calor e trabalho não são funções de estado. Se uma quantidade termodinâmica for uma função de estado, basta saber o seu valor no estado incial e no estado final para calcular a sua variação. No caso do calor e do

Notas de Aula. AC TORT 202 3 trabalho, temos de acompanhar a evolução do sistema passo a passo e essas quantidades dependerão do caminho escolhido no espaço termodinâmico em questnao. O exemplo a seguir ilustra o que queremos dizer. Exemplo 3 A entropia de um gás ideal Seja um gás ideal monoatômico cuja energia interna se escreve: U(T) = 3 n R T, (8) 2 onde n é o número de moles, T é a temperatura e R é a constante dos gases. Se uma certa quantidade de calor dq for fornecida ao gás, a sua energia interna sofrerá uma alteração du e o gás realizará um trabalho dw. De acordo com a primeira lei da termodinâmica (conservação de energia): Lembrando que a equação de estado do gás ideal se escreve: dq = du + dw. (9) p(, T) = n R T, (20) e que dw = p d, onde é o volume do gás, temos: dq = 3 2 n R dt + n R T d. (2) Será dq uma diferencial exata? Façamos o teste da exatidão. Identificando x T e y e as funções M e N temos: e M(T, ) = 3 2 n R, N(T, ) = n R T. (22) M = 0, N T = nr. (23) Portanto, dq não é uma diferencial exata! isto significa que dq não é uma função de estado. Tentemos /T como fator integrante: Repitamos o teste: dq T = 3 2 n R dt T + n R d. (24) A quantidade diferencial: M = 0, N T = 0. (25) ds = dq T = 3 2 n R dt T + n R d, (26) é uma diferencial exata e fisicamente representa a entropia do gás ideal monoatômico. A função S é uma função de estado. Em um processo cíclico, por exemplo, S = 0. A equação de Bernoulli A EDO de primeira ordem: y (x) + p(x)y(x) = g(x)y α (x), (27) é chamada equação de Bernoulli. Para α = 0,, a equação de Bernoulli é linear. A equação de Bernoulli é um dos exemplos de EDO não-linear que pode ser formalmente linearizada sem hipóteses adicionais sobre o comportamento da solução. O processo de linearização é simples. Definindo:

Notas de Aula. AC TORT 202 4 logo, Mas, logo: w(x) = [y(x)] α, (28) w = ( α)y α y = ( α)y α y. (29) y = g y α p y, (30) ou ainda usando a Eq. (28), Rearranjando obtemos finalmente: w = ( α)y α (g y α p y) = ( α) ( g p y α), (3) w = ( α)y α (g y α p y) = ( α) (g p w). (32) Que é uma EDO de primeira ordem linear que sabemos resolver. Exemplo 4 Considere a EDO: A equação logística w (x) + ( α)p(x)w(x) = ( α)g(x). (33) ẏ(t) Ay(t) = B y 2 (t), (34) onde A e B são constantes positivas. Esta EDO descreve a evolução temporal de uma determinada população (modelo de erhulst). ejamos a sua solução geral: α = 2, p(x) = A, e g(x) = B, a versão linearizada se lê: A solução é dada por (ver a Nota de Aula anterior a esta): ẇ(t) + Aw(t) = B. (35) com u(t) g(t)dt + C w(t) =, (36) u(t) ( u(t) = exp ) p(t) dt, (37) onde agora p(t) = A, e g(t) = B. O cálculo de u(t) é imediato: u(t) = exp Adt = exp(at), (38) e Simplificando: w(t) = exp(at)b dt + C exp(at) = ( ) B/A exp(at) + C. (39) exp(at) w(t) = B + C exp( At). (40) A Podemos agora inverter a transformação dada pela Eq. (28). Lembrando que α = 2: w(t) = y(t), (4)

Notas de Aula. AC TORT 202 5 temos, finalmente y(t) =. (42) B A + C exp( At) Esta equação é também chamada de lei logística do crescimento populacional. O termo B y 2 (t) é um termo resistivo que impede que a população cresça indefinidamente. Quando B = 0, a população cresce exponencialmente (lei de Malthus): y(t) C exp( At). (43) Se o termo B/A não é nulo, a população inicial grande ou pequena tende ao equilíbrio. Como sempre, a constante C deve ser determinada com uma informação adicional, y(t 0 ) = y 0 (problema do valor inicial). 60 erhulst População (milhões) 40 20 0 800 820 840 860 880 t (anos) Figura : Modelo de erhulst de 845 para a evolução temporal da população dos Estados Unidos da América. No modelo de erhulst, A = 0.03, B =.6 0 4 e y(0) = 5.3. Problema A Figura mostra a aplicação da Eq. (42) à evolução temporal da população dos Estados Unidos da América. O modelo foi proposto pot erhulst em 845. Os dados da tabela abaixo são modernos e podem ser usados para comparar as previsões de erhulst com as observações. Compare os dados da tabela com as previsões da Eq. (42). Os dados que você precisa estão na legenda da Figura (). 800 830 860 890 920 950 980 990 5.3 3 3 63 05 50 230 250 Tabela : Dados observacionais sobre a evolução temporal da população dos Estados Unidos da América. Referências [] E. Kreyszig: Advanced Engineering Mathematics. (Wileyl: New York) 993. [2] G. E. H. Reuter: A Elementary Differential Equations & Operators. (Routledge & Kegan Paul: London) 958. [3] W. E. Boyce & R. C. DiPrima: Elementary Differential Equations and Boundary alue Problems 6th ed. (Wileyl: New York) 997.