Os países emergentes diante da crise financeira global 1. Daniela Magalhães Prates 2 e Marcos Antonio Macedo Cintra 3



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Os países emergentes diante da crise financeira global 1 Daniela Magalhães Prates 2 e Marcos Antonio Macedo Cintra 3 Resumo: A profundidade e amplitude da crise das finanças desreguladas, liberalizadas e pouco supervisionadas, deverão implicar em mudanças na regulação e supervisão dos sistemas financeiros. Todavia, essas mudanças dificilmente resultarão em uma reforma estrutural na arquitetura financeira internacional e na reversão da globalização financeira. As principais propostas de reorganização em debate também tendem a ignorar a posição subordinada dos países em desenvolvimento no sistema monetário e financeiro internacional. Procura-se, então, discutir as implicações da crise para os países periféricos que se inseriram na globalização financeira, se convertendo em mercados emergentes. Como as estratégias implementadas após as crises financeiras dos anos 1990 revelaram-se insuficientes para blindá-los contra a volatilidade intrínseca dos fluxos internacionais de capitais, sugere-se a retomada dos debates em torno dos controles e técnicas de gestão desses fluxos, que envolvem, igualmente, regras prudenciais sobre as operações com moeda estrangeira e/ou vinculadas com derivativos cambiais pelas instituições financeiras desses países. Palavras-chave: países emergentes; controles de capitais, globalização financeira, crise financeira global Abstract: The depth and width of the crisis of deregulated, liberalized and poorly supervised finances will entail changes in the regulation and supervision of financial systems. However, these changes are very unlikely to result in a structural reform of the international financial framework and in the reversion of financial globalization. The main proposals for reorganization currently being discussed tend to take no consideration of the subordinate position of developing countries in the international monetary and financial system. This article thus seeks to discuss the implications of the crisis for peripheral countries which have become part of the financial globalization, turning into emerging markets. Since the strategies implemented after the crises of the 1990s have proven insufficient to protect them against the intrinsic volatility of international capital flows, the article proposes to rekindle debate concerning controls and management techniques for these flows, which also involves prudential regulation on operations with foreign currency and/or linked with financial derivatives by the financial institutions of such countries. Key-words: emerging countries, capital controls, financial globalization; global financial crisis. 1 Artigo elaborado com informações disponíveis até o final de 2008. 2 Professora do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisadora do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (Cecon/IE/Unicamp). Pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) 3 Professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). 1

Introdução A crise financeira iniciada em meados de 2007, com a elevação da inadimplência e da desvalorização dos imóveis e dos ativos relacionados às hipotecas americanas de alto risco (subprime), assumiu dimensões sistêmicas no segundo semestre de 2008, após a falência de várias instituições bancárias e não-bancárias (em especial, do banco Lehman Brothers, no dia 15/09/2008). A desconfiança dos investidores nos sistemas financeiros se espalhou, resultando em movimentos de pânico nos mercados de ações, de câmbio, de derivativos e de crédito, em âmbito global. Diante do medo e da insegurança, os investidores procuraram reposicionar suas carteiras, vendendo os ativos mais arriscados e desencadeando quedas acentuadas nos seus preços e nas moedas fracas. Nesse movimento, buscaram ficar líquidos, preferencialmente na moeda reserva internacional e/ou em títulos do Tesouro americano, os ativos de última instância do sistema monetário global, ainda sob o comando do Estado Nacional americano, provocando um movimento de fuga para o dólar, a despeito de Wall Street ser um dos epicentros da crise. A crise sistêmica ampliou a desconfiança entre as instituições financeiras, bloqueando os fluxos de recursos nos mercados interbancários, estimados em US$ 23,3 trilhões, em março de 2008, pelo Bank for International Settlements (BIS). Com isso, as taxas de juros subiram abruptamente, sobretudo, a Libor (London Interbank Offered Rate) um indicador da liquidez do mercado interbancário de Londres, instaurando uma tendência de contração dos empréstimos bancários. As pequenas e médias instituições financeiras foram ameaçadas por saques e cortes nas linhas de crédito. As corporações também enfrentaram dificuldades para renovar e/ou obter novos empréstimos. Entre inúmeras decisões, as autoridades dos principais centros monetários trataram de garantir as operações interbancárias, procurando ampliar a circulação dos recursos líquidos, concentrados nas grandes instituições financeiras, e capitalizar os bancos mais fragilizados. Neste contexto, o governo americano disponibilizou US$ 2,25 trilhões (sendo US$ 1,5 trilhão para garantir novas dívidas emitidas pelos bancos, US$ 500 bilhões para os depósitos nos fundos mútuos e US$ 250 bilhões para capitalizar os grandes bancos). O Federal Reserve aumentou para US$ 900 bilhões seus acordos de troca de moedas com nove bancos centrais para ampliar a liquidez em dólares nos mercados financeiros globais. Os países da União Européia (Alemanha, França, Holanda, Espanha, Áustria, Portugal, Reino Unido e Suécia) e a Noruega, por sua vez, disponibilizaram US$ 2,75 trilhões. Além disso, a Itália anunciou disponibilizar o quanto for necessário e a Polônia sinalizou plano semelhante. No primeiro semestre de 2008, a crise começou a se espraiar para alguns países emergentes, mas, somente em meados de setembro, quando ela se converteu num fenômeno sistêmico (após a falência do banco de investimento Lehman Brothers), observou-se seu transbordamento praticamente generalizado para esses países. Nem mesmo aqueles com bons fundamentos e políticas econômicas consideradas saudáveis ficaram incólumes. Em resposta ao efeito-contágio da crise, os governos da maioria desses países acionaram, seguindo o exemplo dos seus congêneres nos países avançados, um conjunto de iniciativas para atenuar a depreciação de suas moedas, bem como seus impactos adversos sobre os sistemas financeiros domésticos seja diretamente (no caso dos sistemas mais dependentes de funding externo ou com presença expressiva de bancos estrangeiros), seja indiretamente (pelas perdas das empresas com derivativos cambiais e pelo aumento da preferência pela liquidez dos agentes diante do quadro de elevada incerteza). Essas iniciativas têm tido como denominador comum, em sua maior parte, a ação anti-cíclica, contrariamente ao padrão de política econômica adotado nas situações pregressas de instabilidade cambial e financeira. Assim, outra dimensão inédita da crise atual (além da sua origem no centro do sistema) consiste na mudança de postura desses governos, que tem priorizado a sustentação da atividade econômica (salvo algumas exceções, como a Hungria, que elevou sua taxa de juros após firmar um acordo com o FMI). Essas duas dimensões inéditas podem estar relacionadas. Nas crises precedentes, a adoção de políticas pró-cíclicas (ou seja, restritivas), defendidas pelos organismos multilaterais e pelos governos 2

do G-7, tinham o objetivo de reconquistar a credibilidade dos mercados financeiros, que seria uma précondição para o retorno dos fluxos de capitais externos (Ocampo, 2000 e 2001). No contexto atual, diante da natureza sistêmica da crise, os governos dos países emergentes parecem estar conscientes de que essas políticas, além de totalmente inócuas, contribuem para agravar seus desdobramentos indesejados, ao criarem um círculo vicioso entre depreciação cambial, contração do crédito, deflação de ativos e redução das receitas e da capacidade de pagamento das dívidas pelas empresas. Agravando ainda mais o cenário de enorme incerteza nos sistemas financeiros, num primeiro momento as perspectivas de contração da demanda mundial de bens e serviços e, num segundo momento, a retração efetiva da economia global, contaminaram as cotações das commodities (agrícolas, minerais e energia) exportadas pelos países em desenvolvimento (Rússia, Brasil, México, Nigéria etc.), reforçando as pressões em prol da depreciação de suas moedas. Os países do Leste Europeu, alguns com déficit em conta corrente de dois dígitos em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), ficaram sob enormes tensões. A Ucrânia negociou um empréstimo de emergência junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) de até US$ 16,5 bilhões; a Hungria, um empréstimo de 5 bilhões com o Banco Central Europeu. No dia 15 de novembro de 2008, foi realizado o primeiro encontro dos países do G20 para discutir a reforma da arquitetura financeira internacional. Após resistências, o presidente George W. Bush concordou em convocar os líderes mundiais a Washington a fim de promover a compreensão mútua quanto às causas da crise e formular um conjunto comum de princípios para a reforma dos regimes regulatórios e institucionais dos setores financeiros mundiais. Alguns pesquisadores defendem a formação de um cartel de bancos centrais das doze maiores economias, a fim de coordenar as políticas de regulação, supervisão e de liquidez global. Esse grupo se reuniria com freqüência, possivelmente substituindo o G8 (inclui a Rússia) 4. Outros defendem um novo G8 (Arábia Saudita, Brasil, China, EUA, Japão, Índia, Rússia, União Européia) para discutir e acordar as políticas associadas à economia global e aos sistemas financeiros. Sabe-se que o enfraquecimento das instituições multilaterais criadas no Acordo de Bretton Woods (1944), sobretudo do Fundo Monetário Internacional, significou a entrega das funções de regulação da liquidez global e de emprestador de última instância ao Federal Reserve e ao Tesouro americano, gestores exclusivos da moeda reserva internacional, a partir de 1947 (Plano Marshall). Diante das assimetrias provenientes da posição americana e das dificuldades de coordenação, o presidente francês Valéry Giscard d Estaing tomou a iniciativa, em 1975, de reunir os chefes de Estado e de governo dos países centrais para discutir as principais questões mundiais. As preocupações desse fórum (G7) giravam em torno dos ajustes das políticas econômicas de curto prazo entre os países participantes. No mesmo período, em 1974, foi criado o BCBS (Basel Committee for Banking Supervision), no âmbito do BIS, para funcionar com um fórum de discussões e debates visando o aperfeiçoamento dos processos de supervisão bancária e de cooperação entre os diferentes órgãos 4 O professor da Yale University, Garter (2008), vai mais longe. Ele defende a necessidade de uma nova autoridade monetária mundial (AMM). Uma AMM funcionaria como central de resseguro ou casa de desconto para determinadas obrigações detidas por bancos centrais. Avaliaria as atividades regulatórias das autoridades nacionais de forma mais eficaz que o FMI e fiscalizaria a implementação de um número limitado de regulamentos mundiais. Monitoraria os riscos internacionais e estabeleceria um sistema efetivo de alerta antecipado, com mais moral para soar alarmes do que era o caso do BIS. A instituição também funcionaria como tribunal de falências para a reorganização mundial de companhias financeiras com tamanho superior a um determinado limite. As maiores companhias financeiras mundiais teriam de se registrar junto à AMM e estariam sujeitas à sua monitoração, ou seriam incluídas em uma lista negra. Isso incluiria empresas comerciais e bancos, mas também fundos soberanos de investimento, fundos de hedge de grande porte e empresas de capital privado. O conselho da AMM seria formado por dirigentes de bancos centrais não apenas dos Estados Unidos, do Reino Unido, da zona do euro e do Japão mas também da China, da Arábia Saudita e do Brasil. A instituição seria financiada por contribuições compulsórias de todos os países capazes de pagar e por prêmios à maneira de seguros pagos pelas empresas financeiras do planeta -as de capital aberto, as estatais e as de capital fechado igualmente. 3

nacionais. Embora sua representação permanecesse restrita aos países que compunham o G-10 5, os entendimentos e acordos celebrados neste Comitê tiveram influência sobre os instrumentos de regulação e de supervisão dos demais países. No âmbito desse Comitê foram negociados os Acordos de Basiléia I e II. Diante da magnitude das perdas e dos recursos públicos envolvidos na tentativa de se restabelecer a confiança ficou evidente a fragilidade do sistema financeiro desregulamentado, liberalizado e supervisionado de forma displicente. O resgate das agências hipotecárias (Fannie Mae e Freddie Mac) e da seguradora American Insurance Group (AIG), bem como a falência dos bancos de investimento independentes de Wall Street (Bear Sterns e Lehman Brothers), de hedge funds e de private equities funds aceleraram um processo de enxugamento de um gigantesco sistema financeiro que proliferou inovações cada vez mais complexas e opacas. As instituições bancárias e não-bancárias concederam empréstimos para compra de imóveis por meio de diferentes tipos de hipotecas, atraindo tomadores de maiores riscos. Em seguida, esses empréstimos foram reunidos e empacotados na forma de títulos passíveis de ser vendidos a deferentes investidores, em âmbito global. Os fluxos de pagamentos desses títulos foram divididos em tranches de diferentes riscos, compensando os detentores mais arriscados com juros mais elevados. As agências de classificação de risco de crédito certificaram esses títulos para que pudessem ser adquiridos pelos fundos de pensão e companhias seguradoras. Para facilitar a distribuição de alguns títulos mais arriscados foi introduzido um derivativo de crédito (credit defaut swaps), ampliando a segurança contra a inadimplência dos emissores desses títulos. Em geral, esses ativos eram negociados em mercados de balcão, por meio de acordos bilaterais e sem câmara de compensação. Esse modelo de geração e distribuição de crédito, envolvendo um amplo conjunto de instituições e mercados, tem sido chamado de global shadow financial system, vale dizer, um sistema financeiro na sombra ou paralelo. Essas instituições captavam recursos no curto prazo, operavam altamente alavancadas e investiam em ativos de longo prazo e ilíquidos. Mas, diferentemente dos bancos, eram frouxamente reguladas e displicentemente supervisionadas, sem reservas de capital, sem acesso aos seguros de depósitos, às operações de redesconto e às linhas de crédito de última instância dos bancos centrais. Dessa forma, eram altamente vulneráveis, seja a uma corrida dos investidores (saque dos recursos ou desconfiança dos aplicadores nos mercados de curto prazo), seja a desequilíbrios patrimoniais (Farhi & Cintra, 2008). A despeito da elevada incerteza e dos riscos envolvidos, as autoridades americanas procuraram acelerar os processos de ajuste de segmentos mais opacos do sistema financeiro, com a quebra das instituições insolventes e a eliminação dos instrumentos financeiros mais exóticos, promovendo uma reconfiguração forçada de seu sistema financeiro e, por conseguinte, do sistema global. Tratou-se de reduzir suas ramificações obscuras e conter as fontes de instabilidade. Isso significou forçar uma reorganização da arquitetura financeira, sob a regulação e supervisão do Federal Reserve System, acompanhado pelos outros bancos centrais (Reino Unido, União Européia, Suíça, Japão, Canadá etc.). Significou também forçar um aprimoramento dos sistemas de regulação e supervisão. As novas regras para o funcionamento dos sistemas financeiros parecem caminhar para um aperfeiçoamento do Acordo de Basiléia II em âmbito global, naquilo que vem sendo chamado de auto-regulação supervisionada, com alguma regra sobre o grau de alavancagem, testes de stress para novos instrumentos e governança corporativa que reflete as responsabilidades fiduciárias das instituições financeiras (Guttmann, 2008) 6. As instituições financeiras internacionalmente ativas ou não serão 5 Composto pelos seguintes países: Alemanha, Bélgica, Canadá, França, Holanda, Itália, Japão, Suécia, Suíça, Reino Unido, Estados Unidos, Luxemburgo e Espanha. 6 No âmbito do Basel Committee for Banking Supervision (BCBS) persistem as negociações e aperfeiçoamentos dos modelos e dos mecanismos de gestão e monitoramento dos riscos: In April 2008, the Basel Committee has announced a series of steps to help make the banking system more resilient to financial shocks. These included: a) enhancing various 4

enquadradas nas normas de capital ponderado pelos riscos, nos sistemas de monitoramento e gestão de riscos cada vez mais sofisticados. Os mercados de derivativos de balcão, sobretudo, os derivativos de crédito, serão negociados em mercados organizados, com contratos padronizados e câmaras de compensação. 7 Após essa breve introdução, na primeira seção apresenta-se um resumo das principais propostas para o aperfeiçoamento do sistema regulatório global. Na segunda seção, discutem-se as implicações da crise para os países periféricos que se inseriram na globalização financeira, se convertendo em mercados emergentes. Procura-se argumentar que as propostas que emergiram até o momento praticamente ignoram essas implicações, que são específicas, associadas a sua posição subordinada no sistema monetário e financeiro internacional. Ademais, esses países deveriam rever as estratégias adotadas após as crises financeiras dos anos 1990, que se revelaram insuficientes para blindá-los contra a volatilidade intrínseca dos fluxos internacionais de capitais. Na terceira seção, a título de considerações finais, destaca-se a necessidade de retomar o debate sobre as técnicas de gestão dos fluxos de capitais nos países emergentes, que envolvam tanto os controles de capitais estrito senso, como regras prudenciais sobre as operações dos bancos vinculadas a moedas estrangeiras e/ou a operações com derivativos cambiais. 1. Agenda de discussão para aperfeiçoamento do sistema regulatório A complexidade e sofisticação dos novos instrumentos, que veio à tona com a crise financeira recente, mascararam incertezas e o entrelaçamento de riscos, tanto para os bancos como para as autoridades regulatórias. A proliferação de inovações exige constante monitoramento (pelos próprios bancos e pelas autoridades) porque não há nenhum mecanismo de segurança que impeça um movimento de percepção de risco que vai numa única direção (altista ou baixista, bulls and bears, na linguagem keynesiana). Caso ocorra uma polarização de opiniões comandada pelos baixistas, a formação de preços se torna errática, para não dizer inexistente. As flutuações pronunciadas nos preços dos ativos podem comprometer a liquidez e a solvência de todos os agentes (bancos, fundos de aspects of the Basel II Framework, including the capital treatment of complex structured credit products, liquidity facilities to support Asset-Backed Commercial Paper (ABCP) conduits, and credit exposures held in the trading book. At the same time, the Committee noted the importance of prompt implementation of the Basel II framework, as this will help address a number of the shortcomings identified by the financial market crisis; b) initiating efforts to strengthen banks' risk management practices and supervision related to stress testing, off-balance sheet management, and valuation practices, among others; c) enhancing market discipline through better disclosure and valuation practices (available at http://www.bis.org/press/p080416.htm). Em setembro de 2008, o BCBS (2008b) divulgou um novo documento, Principles for Sound Liquidity Risk Management and Supervision, segundo o qual: Guidance has been significantly expanded in a number of key areas. In particular, more detailed guidance is provided on: the importance of establishing a liquidity risk tolerance; the maintenance of an adequate level of liquidity, including through a cushion of liquid assets; the necessity of allocating liquidity costs, benefits and risks to all significant business activities; the identification and measurement of the full range of liquidity risks, including contingent liquidity risks; the design and use of severe stress test scenarios; the need for a robust and operational contingency funding plan; the management of intraday liquidity risk and collateral; and public disclosure in promoting market discipline. Possivelmente, a reação das instituições bancárias a essas iniciativas será o desenvolvimento de modelos cada vez mais complexos. Para uma discussão dos possíveis impactos do Acordo de Basiléia II nos países em desenvolvimento, ver, Freitas (2008) e Griffith-Jones; Kregel & Ocampo (2007). 7 O relatório do Counterparty Risk Management Policy Group III (CRMPG III, 2008), por exemplo, recomendou: a) criação de uma câmara de compensação para os derivativos de balcão; b) exigências que as contrapartes em certas operações no mercado de balcão sejam suficientemente sofisticadas para entender as operações e seus riscos ; c) mudanças na contabilização dos ativos lastreados em crédito incluindo os já existentes que deixariam de ser considerados fora de balanço e passariam a ser incluídos nos balanços. Essa última recomendação provocaria um forte aumento do capital regulatório e obrigaria muitas instituições a captar elevados montantes de capital. Todavia, por mais custosas que venham a ser essas reformas, esse custo será minúsculo se comparado às centenas de bilhões de dólares em créditos em liquidação que as instituições financeiras tiveram de enfrentar nos últimos meses, para não falar das distorções e dos deslocamentos econômicos ocasionados pela crise. 5

investimento, hedge funds, empresas e famílias). Tampouco há formas de impedir que nos movimentos de euforia os próprios bancos façam má avaliação de crédito, concentração de ativos e superalavancagem. As implicações da crise para a governança do sistema financeiro internacional ainda são incertas. Alguns agentes (como o Institute of International Finance http://www.iif.com), a despeito de apoiarem as decisões de ampliação da liquidez global, promovida pelos principais bancos centrais, receiam uma radicalização da regulamentação, que cercearia excessivamente a atuação dos bancos e demais instituições financeiras (Dallara, 2008). A deficiência inerente a esta governança em termos técnicos está longe de ser superada: a inexistência de um órgão regulador global. Reguladores e instituições dos mercados financeiros persistem organizados em bases nacionais. Enquanto a regulação é nacional, as finanças são multinacionais, impondo um déficit de governança global. As propostas para o aperfeiçoamento dos mecanismos de regulação deste sistema, que emergiram após a eclosão da crise global, têm como foco a configuração dos sistemas financeiros dos países avançados e do sistema financeiro internacional (Aglietta & Rigot, 2008; Roubini, 2008; Buiter, 2008a). Essas propostas não oferecem uma solução para esse déficit, ou seja, não questionam o status quo, todavia, algumas delas, sintetizadas a seguir, provavelmente resultariam, se implementadas, na atenuação da instabilidade intrínseca à ordem vigente. Em primeiro lugar, a consolidação das diversas agências regulatórias, tanto na Europa como nos Estados Unidos. A crise subprime revelou a obsolescência da estrutura de supervisão descentralizada, dado o grau de imbricação entre as diversas instituições financeiras (bancos, fundos de pensão, seguradoras, fundos de investimento) e mercados (de crédito, de capitais e de derivativos). Vale mencionar que esse problema já foi reconhecido pelo governo americano. Um dos pilares da proposta de reestruturação da estrutura regulatória do sistema financeiro dos Estados Unidos, anunciada no final de março de 2008 pelo secretário do Tesouro, Henry Paulson, consiste exatamente na consolidação das diversas agências reguladoras do país. Ademais, nessa proposta, o Federal Reserve teria poderes ampliados, passando a supervisionar, além das holdings financeiras, os bancos de investimento, seguradoras e fundos de investimento (inclusive hedge funds). Em segundo lugar, a imposição de limites ao avanço da securitização, mediante uma série de iniciativas, dentre os quais: (i) os reguladores poderiam colocar restrições à complexidade de instrumentos que poderiam ser emitidos e adquiridos pelas entidades reguladas; (ii) os bancos centrais poderiam aceitar como colateral nas operações compromissadas ou de redesconto somente classes suficientemente transparentes de ABS; (iii) um requerimento regulatório poderia ser instituído obrigando o originador a reter a equity tranche; isto porque, quando o originador dos empréstimos está muito distante do investidor, são menores os incentivos para uma originação cuidadosa; uma forma de mitigar esse problema seria o originador reter a tranche mais arriscada; (iv) poderia ser promovida uma re-intermediação, com a incorporação das instituições fora de balanço (Conduits, SIV, quasi-banks) nos balanços dos bancos. 8 Em terceiro lugar, a revisão do papel das agências de classificação de risco e dos modelos de ratings internos dos bancos. A crise subprime explicitou as deficiências desses dois modelos do Pilar 1 de Basiléia II. Como sugere Buiter (2008b), o papel regulatório das agências de rating e dos modelos internos de precificação do risco de crédito deveria ser eliminado. Essas instituições deveriam se tornar one-product firms, ou seja, somente oferecer o serviço de classificação de risco de crédito. Os conflitos de interesse potenciais quando uma agência presta serviço de consultoria e assessoria na estruturação 8 Para a Unctad (2008: p.2): the problem with these investment vehicles is that they had a built-in maturity mismatch, and once they lost access to the market for asset-backed commercial paper, the parent banks had to step in and provide the necessary liquidity. Thus, a liquidity crisis which originated outside the banking sector immediately spilled over into the sector. This suggests that the involvement of banks with lightly regulated agencies that could conceivably transmit liquidity and solvency problems to the banking system should be either prohibited or reported in a fully transparent way. 6

de títulos é inevitável. Mesmo a venda de produtos e serviços que não entre em conflito direto com o processo de rating é indesejável, pois pode criar um incentivo para viesar os ratings em troca de oportunidades de negócios em outras áreas. A existência de firmas especializadas também deve reduzir as barreiras à entrada e aumentar a concorrência. O pagamento pelo emissor deve ser extinto. O pagamento pelo investidor não constitui uma solução ideal, pois eliminaria o conflito de interesse, mas criaria um problema de ação coletiva ou free rider. Em uma possível solução, os ratings seriam pagos por um órgão representativo dos investidores institucionais, financiado a partir de uma taxa paga por esses agentes e pelos emissores das securities. Assim, os conflitos de interesses seriam evitados, na medida em que nenhum emissor individual pagaria por seu rating. Em quarto lugar, o questionamento da utilidade dos modelos internos de precificação dos riscos em tempos de turbulências, pois estes são construídos com base em parâmetros estimados a partir de informações passadas. Esses modelos supõem que os preços dos ativos não estão correlacionados e, que as oscilações são relativamente brandas. Mas, quando a crise eclode, os preços dos ativos tornamse correlacionados e; as oscilações, abruptas, produzindo perdas acentuadas. Ademais, the risk sensitivity approach is upside down. Statisticians need to stand back a little and look at the broad sweep of financial history. Financial market crashes do not emerge randomly, but follow booms. What fuels the boom are market estimates that risks are low. This optimism encourages imprudent lending, which eventually leads to the next crash. Boom-time is the best time for financial institutions to make provisions, but the incentives are for banks to respond to falling margins of a maturing boom by chasing after the marginal borrower. Current regulations do not pull them back but let them run ahead. Market-price-based, risk-sensitive models tell banks in the up-cycle that risks have fallen and capital is sufficient for more risk-taking (Goodhart & Persaud, 2008). Finalmente, para tentar conter a exacerbação dos ciclos de ativos financeiros, impulsionada pelo crédito bancário, Goodhart & Persaud (2008) propõem: that bank capital requirements should not only be contra-cyclical but also related to the rate of change of bank lending and asset prices in the relevant sectors. The capital adequacy requirement on mortgage lending could be linked to the rise in both mortgage lending and housing prices, and lending to construction and property companies to the rise in such lending and in commercial property prices. Where there are less reliable guides to asset prices, more weight would be placed on the growth of bank lending by itself, perhaps supplemented by prices in the relevant equity market sector. The purpose of the exercise is not to end the cycle, but to build up reserves and to restrain bank lending during asset price booms, so as to release them during asset price depressions. 9 2. As implicações da crise para os países em desenvolvimento As propostas de aperfeiçoamento dos mecanismos de regulamentação, que surgiram até o momento, além de terem como foco os sistemas financeiros dos países avançados e o sistema financeiro internacional 10 (como já destacado na seção anterior), abstraem duas questões fundamentais, intrinsecamente relacionadas, destacadas por Keynes. Em primeiro lugar, a natureza hierárquica e assimétrica do sistema monetário internacional. Em segundo lugar, as características desse sistema (além desta natureza, a forma da moeda internacional, o regime de câmbio e o grau de mobilidade dos capitais) moldam o perfil das finanças internacionais em cada período histórico. Apesar das diferentes características dos sistemas monetários internacionais que se sucederam desde o século XIX, a solução prática para a inexistência de uma verdadeira moeda internacional 11 foi 9 O Global Financial Stability Report (IMF, 2008) destacou a relação entre os padrões contábeis de acordo com o fair value e a prociclicidade (http://www.imf.org/external/pubs/ft/gfsr/2008/02/index.htm). 10 Uma exceção tem sido os trabalhos desenvolvidos no âmbito da Unctad (Trade and Development Report, 2004 e 2007). 11 Alguns autores heterodoxos enfatizam a impossibilidade lógica de uma moeda nacional exercer as funções de uma moeda internacional, como Guttmann (1994) e Schmitt (1975 e 1977). Este autor, o principal representante da teoria do circuito 7

semelhante. Como destaca Brunhoff (1996), a partir de um compromisso entre os países avançados (ou desenvolvidos), que reflete as relações de poder subjacentes, estabelece-se uma divisa-chave 12, a moeda do país hegemônico, que passa a exercer as funções da moeda em âmbito internacional, quais sejam: meio de pagamento, unidade de conta e de denominação dos contratos e reserva de valor. No entanto, este compromisso tem um caráter ambíguo, ou melhor, contraditório, já que a divisa-chave, situada no topo da pirâmide, também é um ativo financeiro, em concorrência com outras divisas. Ademais, essas divisas também se posicionam de forma hierárquica. Além da posição superior da divisa-chave, existe uma assimetria no sistema monetário internacional entre as divisas conversíveis dos países desenvolvidos, que ocupam uma posição intermediária na hierarquia pois desempenham de forma secundária as funções da moeda em âmbito internacional e aquelas dos países em desenvolvimento que se inseriram na globalização financeira, se convertendo em países emergentes 13. As moedas emitidas por esses países são, de forma geral, incapazes de desempenhar essas funções, constituindo, assim, divisas inconversíveis, que se situam no piso da hierarquia. No sistema monetário internacional que emergiu após a ruptura do sistema de Breton Woods e se consolidou com a retomada da hegemonia americana, a hierarquia de moedas revelou-se ainda mais assimétrica, em função do caráter fiduciário da moeda-chave, que garante aos Estados Unidos um grau de liberdade quase ilimitado na gestão das suas políticas cambial, monetária e fiscal. As demais características desse sistema câmbio flexível e livre mobilidade de capitais reforçaram essa autonomia e, ao mesmo tempo, imprimiram ao sistema uma instabilidade intrínseca, que atingiu de forma perversa os países emissores de divisas inconversíveis. Isso porque, esses países estão sujeitos a duas assimetrias intrinsecamente vinculadas. À assimetria monetária, que se refere à natureza hierárquica do sistema monetário internacional, sobrepõe-se a assimetria do sistema financeiro internacional, a qual possui duas dimensões. A primeira refere-se aos determinantes dos fluxos de capitais direcionados para os países emergentes. Esses fluxos dependem, em última instância, de uma dinâmica exógena a esses países, que estão permanentemente vulneráveis à sua reversão, decorrente seja de mudanças na fase do ciclo econômico e/ou na política monetária dos países centrais, seja do aumento da preferência pela liquidez dos investidores globais. A segunda dimensão diz respeito à sua inserção marginal nos fluxos de capitais globais. A despeito do crescimento da participação dos ativos emitidos por esses países nos portfólios dos investidores residentes nas economias avançadas ao longo dos anos 1990, essa participação ainda é residual (Obstfeld & Taylor, 2004). As assimetrias monetária e financeira, que se auto-reforçam, têm dois importantes desdobramentos para a dinâmica dos mercados cambiais e financeiros dos países emergentes. Em primeiro lugar, esses mercados são especialmente vulneráveis à volatilidade intrínseca dos fluxos de capitais. Nos momentos (como o atual) de reversão do ciclo e de aumento da preferência pela liquidez, os ativos financeiros emergentes, por não desempenharem a função de reserva de valor e, assim, não cumprirem o papel de receptáculo da incerteza em âmbito mundial, são os primeiros alvos dos movimentos de fuga para a qualidade dos investidores globais. Em segundo lugar, o fato de uma proporção marginal dos fluxos ser alocada nesses mercados monetário de produção, desenvolve uma análise detalhada desta impossibilidade, a partir da idéia de uma hierarquia da moeda-crédito (sobre essa abordagem, ver Freitas, 1997). 12 Utilizam-se aqui os conceitos de moeda e de divisa propostos por Aglietta (1986), segundo o qual a moeda é soberana no seu espaço nacional e se torna uma divisa quando passa a circular em âmbito internacional. 13 A globalização financeira refere-se à eliminação das barreiras internas entre os diferentes segmentos dos mercados financeiros, somada à interpenetração dos mercados monetários e financeiros nacionais e sua integração aos mercados globalizados (Chesnais, 1996). Todavia, a globalização financeira é, além de assimétrica (questão que desenvolveremos a seguir), excludente. Somente um pequeno grupo de países em desenvolvimento tornou-se destino dos fluxos de capitais privados nos anos 1990 e 2000. 8

contribui, igualmente, para a sua maior volatilidade. Isso porque, se, de forma geral, o grau de instabilidade das aplicações é maior no caso dos ativos estrangeiros em relação aos nacionais (Plihon, 1996), no caso dos ativos emergentes, essa instabilidade é ainda maior, dados os impactos igualmente marginais da venda desses ativos sobre a rentabilidade dos portfólios globais. Todavia, a despeito da sua natureza residual, os efeitos potencialmente instabilizadores dos fluxos de capitais sobre os mercados de câmbio e financeiros das economias emergentes são significativos, uma vez que, em relação ao tamanho desses mercados, o volume alocado pelos investidores globais não é marginal (Akyüz & Cornford, 1999). Adicionalmente, como esses mercados, em sua maioria, são pouco líquidos e profundos, vendas por parte desses investidores resultam em depreciações cambiais e quedas significativas dos preços dos ativos, com potenciais repercussões deletérias sobre outros segmentos do mercado financeiro, bem como sobre a dinâmica macroeconômica e o nível de atividade (Studart, 2003). Essas repercussões também estão associadas ao chamado currency mismatch dos balanços dos bancos, empresas e governos com dívidas em moeda estrangeira, que constitui uma das conseqüências da assimetria monetária (associada, especificamente, à incapacidade das divisas inconversíveis exercerem a função de unidade de denominação de contratos no mercado internacional). Esses desdobramentos adversos ficaram ainda mais evidentes na crise atual que, ao contrário das crises financeiras dos anos 1990, originou-se no centro do sistema, nos Estados Unidos. Como enfatizado na Introdução, esta crise converteu-se numa crise sistêmica, se espraiando, por meio de diversos mecanismos de transmissão, para os países em desenvolvimento, cujas empresas e bancos não tinham nenhum vínculo com os títulos vinculados às hipotecas subprime. 14 Contudo, exatamente em função das assimetrias, esses movimentos tiveram efeitos muito mais instabilizadores sobre os mercados de câmbio desses últimos países (ver Gráfico 1). Como detalhado a seguir, nem mesmo economias emergentes com fundamentos macroeconômicos relativamente sólidos ficaram incólumes ao efeito-contágio da crise. 15 Após essas considerações sobre a natureza hierárquica e assimétrica do sistema monetário e financeiro internacional contemporâneo e suas implicações para os países emergentes, é importante relembrar a proposta de Keynes na Conferência de Bretton Woods. A idéia básica de Keynes era estender à esfera internacional os princípios bancários aplicados ao âmbito nacional. A International Clearing Union, um banco central dos bancos centrais, emitiria uma moeda bancária internacional de natureza pública, o bancor, que liquidaria posições entre os bancos centrais: déficits e superávits dos países resultariam em, respectivamente, reduções e aumentos dos bancor dos bancos centrais nacionais junto à International Clearing. Os negócios privados seriam realizados nas moedas nacionais, que estariam vinculadas ao bancor mediante um sistema de taxas de câmbio fixas, mas ajustáveis (Keynes, 1943 e 1944). O bancor não seria passível de entesouramento pelos agentes privados assim seria eliminada a demanda pela moeda-chave enquanto ativo financeiro e instrumento universal da preferência pela liquidez. Nesse sistema, os problemas de liquidez ou solvência dos países de menor poder financeiro isto é, que ocupam posições inferiores na hierarquia monetária, no contexto atual, os emergentes, cujas moedas não se convertem em divisas, pois não desempenham em âmbito internacional as funções monetárias não teriam mais que ser resolvidos mediante a busca da confiança nos mercados de capitais (Belluzzo & Almeida, 2002: 60). O banco central dos bancos centrais teria a função de administrar de forma consciente as necessidades de liquidez do comércio internacional e os desequilíbrios de balanço de pagamento entre credores e devedores. Com isso, os ajustamentos 14 Como sugere a The Economist (2008: p.23): Unlike many previous emerging-market crises, today s mess spread from the rich world, largely thanks to increasingly integrated capital markets. 15...even countries with comparatively solid balance sheets are seeing their outlook darken as access to credit tightens and global economic growth slows sharply (Slater, 2008). 9

deflacionários seriam evitados e as economias nacionais poderiam sustentar suas trajetórias em direção ao pleno emprego. Gráfico 1. Variação das taxas de câmbio de grupos de países em períodos selecionados (em %) 15,3 17,1 18,3 17,0 6,5 10,6 24,8 23,6-13,1-14,6 Média Países Emerg.(1) Média América Latina Média Ásia Média Leste Europeu Média Países Avanç.(2) 15/09/08 a 31/12/2008 01/08/2007 a 31/12/2008 Fonte: Bloomberg. Elaboração própria. Notas: (1) Países emergentes = Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México, Peru, China, Cingapura, Coréia do Sul, Hong Kong, Filipinas, Índia, Indonésia, Malásia, Tailândia, Taiwan, Vietnã, Bulgária, Romênia, Ucrânia, Rússia, Letônia, Estônia, Turquia, África do Sul. (2) Países avançados = Canadá, Zona Euro, Inglaterra, Japão, Noruega, Suécia, Suíça. Assim, essa proposta tinha como um dos seus elementos centrais a redução das assimetrias entre países credores e devedores, evitando os ajustamentos deflacionários que distanciavam as economias do pleno emprego (Belluzzo, 2005). Atualmente, uma reforma do sistema monetário e financeiro internacional nos moldes propostos por Keynes e que atenuasse as assimetrias deste sistema certamente contribuiria para ampliar a autonomia da política macroeconômica bem como reduzir a vulnerabilidade dos países periféricos aos sudden stops dos fluxos de capitais e, pour cause, a episódios de instabilidade cambial, que podem culminar em graves crises financeiras. Esse tipo de reforma, todavia, continua sendo uma utopia monetária, mesmo após a eclosão da crise atual, indubitavelmente, a mais profunda desde 1929. O movimento de fuga para o dólar, mencionado na Introdução, evidencia o papel ainda inquestionável da moeda americana como divisachave do sistema. Então, quais seriam as alternativas de política disponíveis para que os países emergentes ampliassem seu raio de manobra na gestão macroeconômica para atingir níveis elevados de emprego e progresso social, bem como minimizassem sua suscetibilidade às vicissitudes do mercado financeiro internacional? A crise atual revelou que a adoção de políticas macroeconômicas prudentes e o acúmulo de volumes expressivos de reservas cambiais pelos países emergentes foram insuficientes para os tornar imunes aos riscos sistêmicos intrínsecos à globalização financeira e às finanças de mercado. Vale lembrar que no contexto pós-crise, na América Latina e na Ásia, os regimes de câmbio administrado (fixo ou bandas cambiais) que se provaram extremamente suscetíveis à apreciação da taxa de câmbio real e a ataques especulativos cederam lugar aos regimes de câmbio flutuante, com graus 10

diferenciados de intervenção 16. Ou seja, foram substituídos por um sistema intermediário, os regimes de flutuação suja, nos quais a presença dos bancos centrais constituiu a regra e não a exceção (BIS, 2005a e b). As intervenções constantes e expressivas dos bancos centrais nos mercados de câmbio mediante a compra de divisas estiveram vinculadas ao chamado motivo mercantilista (a manipulação da taxa de câmbio no sentido de garantir uma inserção comercial virtuosa) e/ou à ampliação da capacidade potencial de sustentação da liquidez externa em momentos de reversão dos fluxos de capitais (a chamada demanda precaucional por reservas 17 ). Enquanto entre 1998 e 2002, tal padrão foi mais nítido nos países do Sudeste Asiático (Aizenman et al., 2004, Dooley et al., 2004), após 2003, beneficiadas pela alta dos preços das commodities, várias economias da América Latina passaram a replicar a estratégia asiática de acumulação de reservas (IMF, 2006); essa alta também possibilitou à região tornar-se superavitária em transações correntes entre 2003 e 2007. Já os países do Leste Europeu não seguiram seus congêneres asiáticos e latino-americanos. Pelo contrário, num contexto de regimes cambiais com taxas de câmbio estáveis em relação ao euro, dada a estratégia de integração na União Européia, acumularam déficits expressivos em transações correntes, tornando-se dependentes dos fluxos de capitais externos para fechar seus balanços de pagamento (ver Tabela 1). 18 Tabela 1. Fluxo líquido de capitais privados e resultado em conta corrente dos países emergentes - US$ bilhões 2000 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 (a) Fluxo Líquido Capital Privado 71,6 77,1 162,5 236,5 248,7 223,0 632,8 528,6 Investimento Estrangeiro Direto 172,0 156,6 166,2 189,0 261,8 246,0 379,0 443,6 Portfólio 16,0-91,9-13,0 12,7-20,4-107,3 54,5-6,6 Outros (b) -116,3 12,4 9,2 34,8 7,3 84,4 199,5 91,8 Fluxo Oficial Líquido -34,2-1,0-50,5-71,1-109,9-158,0-140,7-158,6 Conta Corrente (Emergente) 86,9 76,9 144,5 215,1 445,9 617,0 634,2 784,9 Ásia 38,6 64,6 82,5 89,3 161,5 277,6 403,4 380,0 América Latina 48,3-16,3 7,8 20,6 35,2 47,7 16,4-37,3 Oriente Médio 71,5 30,3 59,1 97,0 204,7 253,9 257,0 438,6 África 8,1-8,8-4,1 2,1 15,6 27,8 4,0 40,1 Memorandum Exportadores de Petróleo 151,7 61,6 106,4 185,8 353,9 439,6 405,5 711,3 Europa Central e Leste (c ) -31,4-23,1-36,8-57,6-59,4-87,7-120,7-164,4 Reservas Internacionais (emergentes) 801,1 1.072,9 1.395,6 1.848,5 2.339,6 3.095,8 4.308,4 5.552,7 Fonte: IMF, World Economic Outlook (http://www.imf.org). Notas: (a) Projeções; (b) Inclui empréstimos bancários, emissão de bônus, commercial papers, notes etc.; (c) Exclui a Rússia, que apresenta superávit em conta corrente desde 1999. 16 Uma exceção foi o regime de câmbio fixo adotado pela Malásia entre setembro de 1998 e julho de 2005. Na esteira da mudança do regime cambial promovida pelo Banco Popular da China que comunicou, no dia 21/7/2005, a adoção de um regime de flutuação controlada baseada na oferta e demanda de mercado, com referência a uma cesta de moedas, a Malásia também passou a adotar um regime de flutuação cambial. 17 A esse respeito, ver: Dooley, Folckerts-Landau e Garber (2005) e Aizenman et. al (2004). 18 A maioria dos países em desenvolvimento aproveitou a abundância de reservas para liquidar as dívidas contraídas com o FMI, resultando em um fluxo de recursos oficiais negativo. Com isso, o FMI acumulou disponibilidade de US$ 200 bilhões para empréstimos suplementares. Esse organismo estuda a possibilidade de viabilizar uma linha de crédito de curto prazo (3 a 6 meses), limitada a até cinco vezes a cota de cada país, sem condicionalidades, a fim de oferecer liquidez imediata a países com problemas de fluxo de recursos (não de solvência). Sobre a reestruturação do FMI, ver Akyüz (2006). 11

Apesar de alguns analistas defenderem que a demanda precaucional e não o motivo mercantilista seria o determinante mais geral da política de acúmulo de reservas pelos países asiáticos e, em menor medida, latino-americanos (Aizenman et al., 2004), estes objetivos estão estreitamente vinculados e se auto-reforçam. Isto porque, essa manipulação é fundamental para a obtenção de superávits em conta corrente e, assim, de um ingresso líquido de divisas genuinamente obtidas pelos países. Não há dúvida de que reservas acumuladas com base nesses superávits (e nos fluxos de investimento externo direto) são mais robustas do que aquelas obtidas a partir do ingresso de fluxos de capitais voláteis (investimento de portfólio e empréstimos bancários de curto prazo). A importância da composição dos superávits externos (e, assim, das reservas internacionais) explicitou-se com os impactos diferenciados da crise sobre as taxas de câmbio dos países emergentes. Esses impactos foram mais significativos não somente em países, como África do Sul e Turquia, com elevados déficits em transações correntes (7,1% e 7,3% do PIB respectivamente em 2007, segundo o IMF), mas também naqueles que ampliaram seu grau de abertura financeira durante a fase de abundância de liquidez internacional (2003-2007) e absorveram volumes expressivos desses fluxos (e/ou possibilitaram transações de hedge e especulação nos mercados de derivativos de câmbio). Nesse grupo encontra-se o Brasil e a Coréia, cujas moedas também sofreram fortes depreciações desde a eclosão e o aprofundamento da crise (ver Gráfico 2), a despeito de terem registrado superávits em transações correntes em 2007 (que se converteram em déficit em 2008) e possuírem volumes elevados de reservas internacionais (em setembro, US$ 205,5 bilhões e US$ 239,7 bilhões, segundo a The Economist). Gráfico 2. Variação das taxas de câmbio de países emergentes em períodos selecionados (em %) 70 60 50 40 30 20 10 0 Argentina Brasil Chile Colômbia México Peru China Cingapura Coréia Hong Kong Filipinas Índia Indonésia Malásia Tailândia Taiwan Vietnã Bulgária Romênia Ucrânia Rússia Estônia Letônia Turquia África do Sul América Latina Ásia Leste europeu Outros 15/09/08 a 31/12/2008 01/08/2007 a 31/12/2008 Fonte: Bloomberg. Elaboração própria. Todavia, o fato de a crise, num primeiro momento, ter se circunscrito aos países avançados, somado à situação macroeconômica saudável da maioria das economias emergentes (contas fiscais equilibradas, superávits em transações correntes e acúmulo de expressivos volumes de reservas internacionais) e ao desempenho favorável da atividade econômica no primeiro semestre de 2008, levaram vários analistas a defender a hipótese do descolamento (decoupling). De acordo com essa hipótese, essas economias que foram responsáveis por cerca de 60% do crescimento da economia 12

mundial no qüinqüênio 2003-2007 (Cepal, 2008) seriam capazes de sustentar seu dinamismo e de se manter imunes ao contágio da crise. Os proponentes da idéia do descolamento desconsideraram a natureza assimétrica do sistema monetário e financeiro internacional contemporâneo, destacada acima, bem como as múltiplas relações de interdependência entre esses dois grupos de países (avançados e emergentes), associadas ao contexto de globalização financeira e produtiva. Essas relações de interdependência resultaram na existência de vários canais de irradiação da crise financeira para os países emergentes, muitos dos quais se autoreforçaram (Cepal, 2008; The Economist, 2008; IMF, 2008a, 2008b, 2008c e 2009 19 ). Dentre os mecanismos de transmissão que surtiram impacto direto sobre os mercados de câmbio e o balanço de pagamentos (conta corrente ou capital e financeira), se destacam: (i) a retração dos investimentos de portfólio num contexto de crescente aversão ao risco e preferência pela liquidez; (ii) a diminuição e, após a falência do Lehman Brothers, a virtual interrupção dos créditos externos, inclusive daqueles direcionados ao comércio exterior; (iii) a diminuição dos fluxos de investimento direto externo diante da desaceleração nos países avançados; (iv) a queda da demanda externa desses países e dos preços das commodities; (iv) o aumento das remessas de lucros pelas filiais das empresas transnacionais e dos bancos estrangeiros; (v) a redução das transferências unilaterais dos imigrantes. Dois canais adicionais, que não tem impacto direto sobre as contas externas, se verificaram em alguns países. Em primeiro lugar, a retração mais forte do crédito interno pelas filiais dos bancos estrangeiros. Em segundo lugar, as operações com derivativos cambiais, que tiveram um papel importante nas depreciações cambiais na Coréia, Brasil e México. Contudo, os impactos desses diversos mecanismos sobre os países diferenciaram-se em função de um conjunto de fatores, além da situação das contas corrente e financeira (já mencionada acima), dentre os quais: dos regimes cambiais e monetários vigentes; do perfil da inserção comercial; do grau de abertura financeira; das características dos mercados financeiros internos, e; do grau de internacionalização da estrutura produtiva e financeira. No caso de várias economias da Europa central e do leste (como Ucrânia, Romênia, Hungria, Letônia e Estônia), com elevada dependência da absorção de fluxos de capitais para financiar os expressivos déficits em transações correntes, a reversão desses fluxos explica as desvalorizações expressivas das suas moedas da (ver gráficos 1 e 2) 20. Nos anos precedentes, essas economias absorveram volumes expressivos de empréstimos externos, que fomentaram ciclos de crédito e bolhas imobiliárias, semeando fragilidades nos respectivos sistemas bancários. A oferta e a demanda por esses recursos foram estimuladas pelo diferencial entre os juros externos e internos e pelas taxas nominais de câmbio estáveis ou com tendência de apreciação. Essa combinação de preços-chave associada às políticas monetárias restritivas voltadas à contenção das pressões inflacionárias provenientes da alta dos preços das commodities e das taxas elevadas de crescimento estimulou operações de arbitragem (conhecidas como carry-trade) a partir da captação de recursos em moedas com baixas taxas de juros 19 O FMI, no capítulo 4 do World Economic Outlook divulgado na terceira semana de abril (IMF, 2009), que examinaos mecanismos de contágio da crise para os países emergentes, também destaca essas relações de interdependência, enfatizando o papel dos vínculos financeiros na transmissão da crise. Contudo, como era de se esperar, mantém a defesa da integração financeira internacional. Vale reproduzir algumas passagens, que sintetizam as principais conclusões deste capítulo: For emerging economies, the current level of financial stress is already at the peaks seen during the 1997-98 Asian crisis. There is a strong link between financial stress in advanced and emerging economies, with crises tending to occur at the same time. The large common impact of the current crisis, across all regions of emerging economies, is therefore not unexpected. Transmission is strong to emerging economies with tighter financial links to advanced economies ( ) Taking a long-term perspective, financial integration is an essential part of prospering world economy. As growing financial linkages increase the transmission of stress, there is a need to enhance multilateral insurance against external financial shocks, especially to well-governed countries that have opened their economies to the rest of world (IMF, 2009: 140-142). 20 As moedas de várias dessas economias somente sofreram depreciação após a crise assumir dimensões sistêmicas. O seu atrelamento ao euro (que se apreciou em relação do dólar no primeiro semestre do ano) e suas taxas de juros internas elevadas contribuem para explicar essa surpreendente resistência. 13

(principalmente iene e franco suíço), bem como o endividamento imobiliário nessas moedas. Ademais, a elevada presença dos bancos estrangeiros nos sistemas financeiros domésticos foi um canal adicional de contágio, já que estes têm contraído suas operações locais diante das perdas nos países de origem, levando ao estouro das bolhas imobiliárias (IMF, 2008a e b; Unctad, 2008; The Economist, 2008). Nas demais posições de destaque no ranking das moedas que mais perderam valor aparecem países com superávits em transações correntes (ou pequenos déficits) e volumes expressivos de reservas internacionais, mas que ampliaram sua abertura financeira nos últimos anos e absorveram montantes expressivos de recursos de curto prazo (investimento de portfólio e/ou empréstimos bancários), como Rússia, Índia, Chile, México, Brasil e Coréia do Sul (ver gráfico 2). Nos três últimos casos, a desmontagem das operações realizadas nos mercados de derivativos de câmbio também tiveram um papel fundamental nas trajetórias das taxas de câmbio após o aprofundamento da crise. Esses países (Brasil, México e Coréia do Sul) adotaram após as respectivas crises cambiais dos anos 1990 a mesma combinação de política macroeconômica regimes cambiais de flutuação suja e metas de inflação e aprofundaram sua integração financeira com o exterior. O maior risco cambial, associado ao aumento da participação de investidores externos 21, resultou no aprofundamento (aumento da liquidez e dos volumes negociados) dos respectivos mercados de derivativos financeiros, seja organizados, seja de balcão. A presença de bancos estrangeiros (elevada no caso do México e relevante nos casos do Brasil e da Coréia) também contribuiu para esse aprofundamento, na medida em que essas instituições têm expertise na montagem de operações com esses instrumentos nos mercados domésticos e estrangeiros (que negociam, por exemplo, o chamado Non-Deliverable Forwad NDF). Outro denominador comum das experiências brasileira, mexicana e coreana foi a combinação de preços-chave vigente nos últimos anos. Diante do aumento das pressões inflacionárias associadas à alta dos preços das commodities, a adoção de políticas monetárias com viés restritivo e a apreciação cambial foram os mecanismos utilizados para lograr o cumprimento das metas de inflação. Apesar das diferenças de intensidade (ambos mecanismos foram levados ao limite no caso brasileiro), nos três países essa combinação gerou não somente distorções macroeconômicas (deterioração do resultado em transações correntes), mas também microeconômicas. Isto porque, a perda de competitividade das exportações induziu a busca de hedge e/ou de ganhos especulativos (exatamente para atenuar essa perda) pelas empresas exportadoras mediante operações com derivativos vinculados à taxa de câmbio. Nos três casos, predominaram complexos contratos de balcão, introduzidos pelos bancos estrangeiros e rapidamente mimetizados pelas instituições domésticas. Todavia, enquanto os mercados coreano e mexicano são deliverable ou seja, as perdas ou ganhos com as operações são liquidadas em dólares, como na maioria dos países no Brasil a liquidação das operações é feita em reais. Essa diferença de institucionalidade contribui para atenuar a demanda por moeda estrangeira em momentos de depreciação cambial. A depreciação mais expressiva do real em relação ao peso mexicano após o aprofundamento da crise está associada ao volume bem mais elevado desses contratos no Brasil, em função da apreciação cambial mais expressiva no período anterior e do seu vínculo com operações de crédito no mercado doméstico. Os contratos negociados no mercado brasileiro variaram de forma (o chamado target forward acoplava uma operação de dólar a termo com uma opção cambial, enquanto o tarn envolvia várias opções de compra e venda de dólar 22 ), mas sempre resultavam na seguinte assimetria: desde que 21 No Brasil, a participação, sem restrições, desses investidores nos mercados de derivativos financeiros domésticos foi autorizada pela Resolução n. 2.689 de 26/01/2000. Esta resolução também ampliou o grau de abertura dos demais segmentos do mercado financeiro doméstico, ao extinguir as diferentes modalidades de aplicação dos investidores nãoresidentes mediante o então mercado de câmbio comercial (Anexos I, II, III e IV, Fundos de investimento estrangeiros) e instituir uma nova modalidade de investimento no mercado financeiro, pela qual esses investidores têm acesso às mesmas aplicações disponíveis aos investidores residentes. 22 Sobre os contratos de derivativos cambiais e as operações de empréstimos vinculadas, ver: Lucchesi et al (2008); Brandimarte et al (2008), Balthazar (2008), Adachi (2008). 14

o real continuasse se valorizando, garantiam às empresas maiores lucros do que os contratos convencionais (ou a redução do custo do financiamento no caso dos contratos acoplados a operações de crédito 23 ); em contrapartida, se o real se depreciasse (mais especificamente, se a sua cotação superasse o preço do exercício da opção de compra vendida pela empresa ou a taxa de câmbio a termo), as perdas se duplicavam. Os bancos, por sua vez, incorriam somente em risco de crédito (isto é, de não pagamento pelas empresas em caso de prejuízo), já que realizavam operações espelho na Bolsa de Mercadorias e Futuros - BM&F (o mercado organizado de derivativos financeiros no Brasil) ou no mercado internacional, neutralizando o risco cambial No caso da Coréia do Sul, cuja moeda registrou uma depreciação ainda mais intensa que o real entre agosto de 2007 e dezembro de 2008 (ver gráfico 2), a singularidade reside no vínculo entre as operações de derivativos e a elevada dívida de curto prazo em dólares contraída pelos bancos sulcoreanos. Para viabilizar e tornar lucrativas as operações nos mercados de derivativos, os bancos sulcoreanos vendiam contratos em won às empresas (que compravam esses contratos diante da expectativa de manutenção da trajetória de apreciação) e contraíam empréstimos em dólares para fazer face às suas posições nesses mercados (Kim & Yang, 2008). Esses empréstimos cumpriam duas funções: proviam os dólares necessários para liquidar essas operações (que geravam prejuízos aos bancos e lucros às empresas enquanto essa trajetória manteve-se); e possibilitavam a aplicação de recursos nos mercado doméstico de renda fixa, resultando em ganhos de arbitragem superiores a esses prejuízos. Com a eclosão da crise e o credit crunch no mercado financeiro internacional, diante das dificuldades crescentes de refinanciar esses empréstimos, os bancos passaram a comprar dólares para liquidar seu passivo externo, exercendo pressões em prol da depreciação do won. Essa depreciação gerou prejuízos às empresas que estavam apostando na apreciação dessa moeda e precisavam entregar aos bancos os dólares correspondentes, parte dos quais tiveram de ser obtidos no mercado de câmbio, o que reforçou as pressões. Nas economias abertas, com amplos fluxos de capitais e mercados de derivativos líquidos e profundos, possibilitando a formação de posições especulativas (que contaminam a evolução dos preços nos mercados spots), a taxa de câmbio reflete a demanda e a oferta das divisas enquanto ativos financeiros e não os preços relativos entre os bens produzidos internamente e aqueles de produção externa 24. Fosse esse o caso, a taxa de câmbio se moveria em razão dos resultados da conta corrente, ou seja, seus movimentos seriam reflexos dos déficits ou superávits nessa conta. As antecipações, intrinsecamente pró-cíclicas, sobre as variações das paridades cambiais provocam ajustamentos entre a moeda nacional e a moeda-chave, desvinculadas desses resultados. No caso das divisas inconversíveis, esses ajustamentos são especialmente bruscos, devido a sua posição assimétrica no sistema monetário e financeiro contemporâneo. A trajetória do won desde a eclosão da crise e do real após o seu 23 Os bancos acoplavam à operação de empréstimo a venda de uma opção de compra de dólares pela empresa, que, assim, pagava ao banco um prêmio. Enquanto a cotação do real ficasse abaixo do preço de exercício da opção (que dependia da cotação do dólar à vista e foi fixado, na maioria dos casos, na faixa de R$1,73 a R$1,90), a empresa se beneficiava de uma redução do custo do empréstimo, que variava de 25% a 50% dos juros do Depósito Interfinanceiro (CDI). Esse desconto correspondia, exatamente, ao prêmio da opção (que não era exercida pelo banco). Se a taxa de câmbio ultrapassasse esse preço, a empresa passava a pagar a variação cambial a partir de uma cotação pré-determinada. Esse mecanismo de altíssimo risco para os tomadores e por conseqüência para os ofertantes do crédito parece ter contribuído para perpetuar a escalada da relação crédito/pib nos oito primeiros meses de 2008 ao reduzir o custo do crédito num contexto de elevação da taxa de juros básica. 24 Aglietta (1986) destaca a natureza contraditória da taxa de câmbio num sistema monetário e financeiro internacional após o colapso da Bretton Woods: por um lado, elemento da formação dos preços dos ativos financeiros denominados em diferentes moedas; por outro lado, preço relativo entre os bens domésticos e externos. São exatamente essas duas dimensões que estão implícitas nas duas teorias mais antigas de determinação da taxa de câmbio nominal, respectivamente, a teoria da paridade descoberta das taxas de juros e a teoria da paridade do poder de compra. Vale mencionar que ambas foram discutidas por Keynes no Tratado da Moeda e resgatadas pelos economistas do mainstream nos anos 1970 (ver, por exemplo, Dornbusch, 1976). 15

aprofundamento revelam o potencial destrutivo da combinação de um elevado grau de abertura financeira com a existência de mercados de derivativos financeiros, que amplificam a correia de transmissão da instabilidade externa para a dinâmica das taxas de câmbio e dos preços dos ativos emergentes. Como sugere Belluzzo (2008): Os gestores das moedas nacionais são, ademais, partícipes de um sistema universal e hierarquizado de pagamentos e de liquidez. Os que administram moedas conversíveis (...) estão relativamente protegidos das flutuações entre suas moedas. Para elas há quase sempre um ponto de compra ou existem mercados de hedge líquidos e profundos, onde os agentes comprados e vendidos nas distintas moedas podem buscar proteção contra eventuais flutuações cambiais a um custo conveniente. Ainda assim, num momento de fuga desabalada para a liquidez, os detentores de riqueza correm para a moeda-reserva, último refúgio dos capitais outrora destemidos, agora medrosos. Já os que emitem moedas inconversíveis estão obrigados, no mundo globalizado, a segurar as reservas em moeda forte e manter os excedentes comerciais de forma permanente. Esses bons fundamentos podem, no entanto, não ser suficientes para impedir as vendas maciças da moeda local. Os bancos centrais ficam dilacerados: conter a desvalorização da moeda local ou impedir a invasão de seu território pelas forças recessivas que dominam a economia global. Expostos à fuga de capitais, os países de moeda inconversível dificilmente serão capazes de aplacar com a elevação dos juros os movimentos abruptos de desvalorização do câmbio. Enfim, o prêmio de liquidez implícito na posse da moeda de reserva internacional (o dólar) é, nos momentos de desconfiança e pânico, o objeto mais cobiçado nos mercados globais. 3. Considerações finais A incapacidade de o colchão de reservas imunizar vários países emergentes contra o contágio da crise sistêmica e os efeitos potencialmente deletérios das trajetórias de apreciação das moedas emergentes evidenciados pelos casos brasileiro e sul-coreano não somente na dimensão macroeconômica (manutenção do superávit em transações correntes), mas também microeconômica (montagem de estratégias de proteção e atenuação das perdas pelas empresas exportadoras, bem como, no caso brasileiro, de operações de crédito por empresas exportadoras e não-exportadoras, vinculadas a contratos de derivativos) torna premente a retomada da discussão sobre a importância da manutenção de uma taxa de câmbio competitiva e o papel dos controles de capitais. Rodrik (2006) chamou a atenção para a forma desbalanceada de inserção desses países na globalização. Nas suas palavras, os países em desenvolvimento responded to financial globalization in a highly unbalanced and far-from optimal manner. They have over-invested in the costly strategy of reserve accumulation and underinvested in capital account management policies to reduce short-term foreign liabilities (2006: p.12). A manutenção de reservas elevadas seria o preço a ser pago pelos governos que não desejam ou são incapazes de regular os fluxos de capitais, devido, entre outras razões, aos interesses financeiros contrários a esta segunda alternativa. Parte-se da hipótese de que as mudanças na regulação financeira global (que devem se concretizar nos próximos anos) dificilmente resultarão em uma reforma estrutural no sistema monetário e financeiro internacional e na reversão da globalização financeira, entre outras razões, porque os EUA não abdicarão pacificamente da gestão exclusiva da moeda reserva internacional. Ademais, as manifestações dos governos europeus em relação à crise têm evidenciado a preponderância dos interesses nacionais na região e a inexistência de uma visão convergente em relação a uma nova ordem monetária internacional, na qual esses interesses seriam subordinados aos interesses multilaterais. Assim, é fundamental refletir não somente sobre esses controles, mas sobre as técnicas de gestão dos fluxos de capitais (Epstein; Grabel & Jomo, 2004), que envolvam, igualmente, regras prudenciais sobre as operações dos bancos vinculadas a moedas estrangeiras e/ou a operações com derivativos cambiais. 16

Essas técnicas, ao afetarem o grau de abertura financeira da economia 25, ampliam o raio de manobra da política cambial (atenuando os conflitos com a política monetária) e a eficácia da intervenção, em momentos de excesso e escassez de divisas. Isso quer dizer que a relação entre o acúmulo de reservas internacionais e os controles de capitais não é necessariamente de substituição, como sugere Rodrik (2006). Pode-se afirmar que após a adoção dos regimes de flutuação suja por vários países periféricos, emergiu um novo papel para as técnicas de gestão dos fluxos de capitais, que incluem esses controles. Além de ampliarem o grau de autonomia da política econômica e reduzirem a vulnerabilidade desses países a crises financeiras 26 (Epstein; Grabel & Jomo, 2004; Carvalho & Sicsú, 2006; Ferrari Filho & Paula, 2006), esses controles e os instrumentos de regulamentação prudencial revelam-se uma precondição à adoção de políticas cambiais mais flexíveis, funcionando como filtros que atenuam os efeitos instabilizadores dos fluxos de capitais de curto prazo (Greenville, 2000). Como salientam Mohanty & Scatigna (2005), a regulação dos fluxos de capitais as capital account policies constitui um instrumento coadjuvante às intervenções nos mercados de câmbio na gestão dos regimes de câmbio flutuante nas economias periféricas, ao reduzir o patamar mínimo de reservas necessárias para conter movimentos especulativos e aliviar as pressões sobre a taxa de juros nos momentos de saída de capitais. Referências bibliográficas ADACHI, Vanessa. Mais de 300 clientes de "middle market" do Itaú têm derivativos. Valor Econômico. 30 de outubro de 2008. AGLIETTA, M.; RIGOT, S. La réglementation des hedge funds face à la crise financière: une contribution au débat. Paris: Ouest la Défense/EconomiX et Cepii, 2008. AGLIETTA, M.; MOREAU, L.; ROCHE, A. De la crise financière à l enjeu d une meilleure évaluation des crédits structurés. Paris: Ouest la Défense/EconomiX et Cepii, Avril 2008. AGLIETTA, M. La fin des devises clés: essai sur la monnaie internationale. Paris: Éditions La Découverte, 1986. AKYÜZ, Y. Reforming the IMF: back to the drawing board. Research papers for the Intergovernmental Group of Twenty-Four on International Monetary Affairs and Development (G-24 Discussion Paper, n.38), Nov., 2005. Available at http://www.unctad.org. Financial liberalization: the key issues. Genebra: United Nations Conference on Trade and Development, 1993 (UNCTAD Discussion Papers, n.56). AIZENMAN, J.; LEE, Y. & RHEE, Y. International Reserves Management and Capital Mobility in a Volatile World: policy considerations an case study of Korea. Cambridge, MA: National Bureau of 25 De acordo com Akyuz (1993), a abertura financeira diz respeito à facilidade com que os residentes podem adquirir ativos e passivos denominados em moeda estrangeira e do acesso de não-residentes ao mercado financeiro doméstico. Três níveis de abertura financeira são identificados. O primeiro nível diz respeito às inward transactions entrada de não-residentes no mercado financeiro doméstico e captação de recursos externos pelos residentes e o segundo nível às outward transactions saída de capitais pelos residentes e endividamento de não-residentes no mercado financeiro doméstico. Já o terceiro nível refere-se à conversibilidade interna da moeda, ou seja, à permissão de transações em (ou denominadas em) moeda estrangeira no espaço nacional (como depósitos no sistema bancário doméstico e emissão de títulos indexados à variação cambial). 26 Como destaca Ocampo (2000), essas técnicas contribuem para aprimorar a estrutura de maturidade das dividas em moeda estrangeira, constituindo um instrumento da política de administração dos passivos, fundamental nos países periféricos sujeitos ao currency mismacht. Um importante exemplo é a imposição de requerimentos de reservas sobre os passivos em moeda estrangeira, adotada no Chile e na Colômbia nos anos 1990. 17

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