Número do processo: 1.0637.07.046005-9/001(1) Relator: ARMANDO FREIRE Relator do Acordão: ARMANDO FREIRE Data do Julgamento: 26/02/2008 Data da Publicação: 23/04/2008 Inteiro Teor: EMENTA: ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA. REVELIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. PRETENSÃO À PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. INTENÇÃO DE DEMONSTRAR QUE NÃO HOUVE OCORRÊNCIA SIMILAR NO PASSADO. PROVA QUE NÃO DIZ RESPEITO AO TEOR DO AUTO DE INFRAÇÃO. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. MENOR QUE CONSUME BEBIDA ALCOÓLICA EM BAR. INFRAÇÃO AO ART. 81, II, E ART. 249 DO ECA. APLICAÇÃO DE MULTA. VALOR MÍNIMO. REDUÇÃO INDEVIDA. ADMISSIBILIDADE DE PARCELAMENTO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. - O proprietário ou responsável pelo estabelecimento comercial que, dolosa ou culposamente, não cumpre o seu dever de fiscalização quanto à venda de bebidas alcoólicas, permitindo a sua aquisição e consumo por adolescente, menor de 18 anos, infringe a proibição contida no art. 81, II, e, ao descumprir determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar, comete a infração administrativa prevista no art. 249, ambos do Estatuto da Criança e do Adolescente. - Sujeita-se à pena de multa, de natureza administrativa, que pode ser fixada a partir do valor de 3 'salários de referência', o que equivale a 3 salários mínimos, conforme Lei nº 7.789/89. - É vedada a redução da multa administrativa fixada no valor mínimo previsto em lei. Entretanto, admite-se que se preveja o seu parcelamento se tal procedimento objetiva assegurar o adimplemento da pena, sem comprometer a atividade empresarial desenvolvida pelo infrator. APELAÇÃO CÍVEL N 1.0637.07.046005-9/001 - COMARCA DE SÃO LOURENÇO - APELANTE(S): BAR QUINZINHO - APELADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. ARMANDO FREIRE ACÓRDÃO Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO. Belo Horizonte, 26 de fevereiro de 2008. DES. ARMANDO FREIRE - Relator NOTAS TAQUIGRÁFICAS O SR. DES. ARMANDO FREIRE: VOTO JOAQUIM ROSA SILVÉRIO, por meio do ilustre Defensor Dativo nomeado a fl. 20, interpôs recurso de apelação (fl. 24/26) contra a r. sentença contida às fls. 11/14. O douto Juiz de Direito do Juizado da Infância e Juventude da Comarca de São Lourenço julgou subsistente o auto de infração de fl. 03, aplicando-se ao proprietário do estabelecimento comercial denominado "Bar do Quinzinho", Joaquim Rosa Silvério, vulgo "Quinzinho", a pena de multa fixada no mínimo permitido pela lei, no valor de 3 (três) salários mínimos, substitutos do salário
referência, a teor da Lei nº 7.789/89, por infração tipificada no artigo 249 da Lei 8.069/90. Determinou que a quitação deve ser dar por meio de depósito na conta do Fundo gerido pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. O recorrente alega que está sendo processado por ter, no dia 18/02/2007, fornecido bebida alcoólica ao menor Carlos André dos Santos. Alega que, todavia, quem deu a bebida para o menor foi uma pessoa, de nome Flávio Henrique do Vale, que adquiriu o produto em seu estabelecimento momentos antes. Sustenta que essa pessoa estava acompanhada de dois outros rapazes, dentre eles o referido menor. Alega que ambos os acompanhantes de Flávio "tinham o porte físico de uma pessoa de maioridade". Acrescenta que foram lavrados dois autos de infração, com o mesmo adolescente e com infratores diferentes. Ao assinar o auto de infração, o autuante nada disse que pudesse orientar o suposto infrator a apresentar defesa em 10 (dez) dias. Por fim, questiona o quantum da pena de multa. Afirma que possui condições econômicas precárias. Faz do seu comércio o ganha-pão de sua família, sendo limitado o seu lucro. Aduz que testemunhas podem comprovar que é o primeiro caso envolvendo um menor em seu estabelecimento comercial. Requer os benefícios da Justiça Gratuita e sua absolvição. O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL manifestou às fls. 27/28. Pugna pelo desprovimento do recurso. Em juízo de retratação, o digno Magistrado manteve a sentença (fl. 29). Houve a remessa dos autos do processo a este eg. Tribunal de Justiça. A douta Procuradoria de Justiça, conforme r. parecer de fls. 35/37-TJMG, opina pelo retorno dos autos à Instância de origem, para que as 2 (duas) testemunhas arroladas pelo recorrente sejam ouvidas, "sob pena de nulidade do feito por ofensa ao contraditório e ampla defesa". Assim relatado, conheço do recurso aviado, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade, observadas as regras processuais aplicáveis (art. 198, caput e incisos, ECA). Conforme Auto de Infração de fls. 3 e 4, o ora apelante, na condição de responsável pelo estabelecimento denominado "BAR DO QUINZINHO", foi autuado com fundamento nos artigo 81, II, c/c 243 e 249 do ECA (Lei nº 8.069/90. Constatou-se, às 0 hora e 45 minutos do dia 18 de fevereiro de 2007, que o menor. identificado a fl. 4, localizava-se no aludido estabelecimento comercial, fazendo uso de bebida alcoólica. De acordo com o Comissário de Menores responsável pela lavratura do auto, o proprietário vendeu bebida alcoólica para o menor, sem ao menos verificar sua idade. Certificou-se da intimação do autuado para, querendo, apresentar defesa, por intermédio de advogado legalmente habilitado, no prazo de 10 dias, a partir da data da autuação, sob pena de revelia. O documento contém a assinatura do autuado, ora recorrente. Deste modo, em primeiro lugar, não há que se falar em ausência de informações acerca do procedimento adotado pelo Juizado da Infância e da Juventude. O apelante tinha pleno conhecimento do prazo para defesa. Não se defendeu. Por conseguinte, advieram as conseqüências processuais, sendo considerados os efeitos da revelia pelo ilustre Sentenciante. Aplica-se, ao caso, a norma contida no artigo 81 do Estatuto da Criança e do Adolescente que dispõe: "Art. 81: É proibida a venda à criança ou ao adolescente de:
I - (...); II - Bebidas alcoólicas;" Apurou-se que houve violação à Portaria nº 003/2005 da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de São Lourenço. Violou-se, assim, a proibição contida em outra norma também do ECA: "Art. 249. Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao pátrio poder ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência." No caso em análise, configurou-se a descrita infração, punível segundo as orientações administrativas do Estatuto da Criança e do Adolescente. E o Auto de Infração não contém irregularidade, de modo que incumbia ao autuado contrariar a fé pública que, em tese, reveste o documento oficial lavrado pelo Comissário de Menores. Se prova alguma foi produzida pela defesa, isto se deu por omissão processual do recorrente. Outrossim, com a devida vênia do douto Procurador de Justiça (fls. 35/37-TJMG), de nada adiantaria a produção da prova oral para o deslinde do processo. O recorrente afirma que as testemunhas por ele arroladas na peça recursal serviriam para comprovar que é a primeiro vez que tal infração ocorre em seu estabelecimento comercial. Ora, ainda que tal alegação restasse provada pela prova testemunhal, o Auto de Infração não deixaria de refletir fato ocorrido. Aliás, o próprio recorrente confessa que o menor ingeriu bebida alcoólica em seu estabelecimento. Sua tese de defesa, no âmbito meritório, com a renovada vênia, não pode prevalecer. Caso contrário, estaremos instituindo um desastroso precedente jurisprudencial, permissa venia, que poderia inviabilizar a aplicação de norma geral contida no ECA em relação a eventuais casos idênticos. Os comerciantes de bebida alcoólica que cometessem a mesma infração serviriam-se da tese de defesa de que o simples fato de um adolescente aparentar ser maior de idade os tornaria isentos da respectiva pena administrativa. Algo que seria absurdo frente à nobre intenção de verdadeiramente protegermos os interesses de nossas crianças, adolescentes e jovens, sem as hipocrisias que muitos teimam em alimentar. Por isso, na condição de destinatário das provas, considero desnecessária a produção da prova testemunhal, tal como pretendido, de modo que não há que se falar em cerceamento de defesa ou em ofensa ao contraditório ou mesmo à ampla defesa. Nesse sentido, com a necessária reverência, faço minhas as oportunas palavras do Desembargador SILAS VIEIRA: "(...) A venda de bebida alcoólica a menor de 18 anos configura infração administrativa apenada com multa; não configurando cerceamento de defesa a não produção de prova oral quando ineficaz para descaracterizar o flagrante materializado em auto de infração." (Apelação Cível nº 1.0024.03.915963-7/001, 8ª Câmara Cível do TJMG, Belo Horizonte, Rel. Silas Vieira. j. 07.11.2005, unânime, Publ. 05.04.2006). Assim, considerando que é dever do estabelecimento que comercializa bebidas alcoólicas zelar pelo cumprimento do disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como na citada Portaria do Juizado da Infância e Juventude de São Lourenço, que proíbe a venda de bebidas alcoólicas a
menores de 18 anos, há que se considerarem as seguintes conclusões: houve aquisição e consumo de bebida alcoólica por adolescente no interior do aludido estabelecimento comercial; não há prova que torne ao menos questionável a imputação registrada no Auto de Infração. Subsiste, portanto, a infração administrativa, em homenagem à orientação de que o proprietário ou responsável pelo estabelecimento comercial que, dolosa ou culposamente, não cumpre o seu dever de fiscalização quanto à venda de bebidas alcoólicas, permitindo a sua aquisição e consumo por adolescente, menor de 18 anos, infringe a proibição contida no art. 81, II, e, ao descumprir determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar, comete a infração administrativa prevista no art. 249, ambos do Estatuto da Criança e do Adolescente. A presente conclusão ampara-se em respeitável linha jurisprudencial de entendimento, inclusive emanada desta douta Câmara Cível. A título de ilustração, transcrevo as seguintes ementas, in verbis: AUTO DE INFRAÇÃO - MENORES DE IDADE - VENDA DE BEBIDA ALCOÓLICA - COMPROVAÇÃO. Restando comprovada a venda de bebida alcoólica a menores de idade em estabelecimento comercial, conduta proibida pelo art. 81, II, do Estatuto da Criança e do Adolescente, o responsável deve ser condenado ao pagamento de multa. (Apelação Cível nº 1.0287.06.024691-8/001(1), 1ª Câmara Cível do TJMG, Rel. Eduardo Andrade. j. 12.09.2006, unânime, Publ. 12.10.2006). APELAÇÃO CÍVEL. AUTO DE INFRAÇÃO. VENDA DE BEBIDAS ALCOÓLICAS A MENORES DE IDADE. PENALIDADE. A venda de bebida alcoólica para menores de idade é prática repudiada pelo ordenamento jurídico, prevendo o art. 243, do Estatuto da Criança e Adolescente, pena de detenção e multa. Recurso conhecido, mas não provido. (Apelação Cível nº 1.0699.05.052420-5/001(1), 3ª Câmara Cível do TJMG, Rel. Albergaria Costa. j. 19.10.2006, unânime, Publ. 10.11.2006). MENOR. BEBIDA ALCOÓLICA. VENDA. ESTABELECIMENTO COMERCIAL. AUTUAÇÃO. FIXAÇÃO DA PENA. ART. 258 DO ECA. A venda de bebida alcoólica a menor constitui fato censurável criminal e administrativamente, sendo essa última responsabilidade apenada com advertência ou multa ao comerciante infrator "ex vi" da lei de tutela à criança e adolescente. (Apelação Cível nº 1.0024.05.570916-6/001(1), 7ª Câmara Cível do TJMG, Rel. Belizário de Lacerda. j. 05.09.2006, unânime, Publ. 24.10.2006). Multa fixada no patamar mínimo/ impossibilidade de redução / parcelamento admitido A multa possui natureza administrativa e tem por escopo inibir a reincidência da infração apurada. Seu quantum não deve ser alterado, porquanto fixado pelo nobre Sentenciante no mínimo valor previsto em lei, ou seja, 3 salários mínimos. Diante dos elementos constantes dos autos, incluídas as alegações do recorrente, e pena pecuniária
apresenta-se suficiente e adequada como fator de prevenção geral e individual, além de punir o infrator. Tal consideração não impede que adotemos neste julgamento entendimento similar àquele registrado no acórdão da Apelação Cível nº 1.0024.05.572902-4/001, de minha Relatoria. Concluímos, citando acórdãos da Apelação Cível n 1.0287.04.019445-1/001 (Relator: Des. Wander Marotta) e da Apelação Cível nº 000.235.480-1/001 (Relator: Des. Almeida Melo). A fim de amenizar a situação enfrentada pelo recorrente, diante da alegada limitação de seus recursos destinados ao amparo de sua família, admito o parcelamento da multa fixada, "mormente se tal procedimento assegurar o adimplemento da pena, sem comprometer a atividade empresarial desenvolvida". Igualmente ao caso apreciado naquela outra ocasião, entendo como razoável dividir a multa em 03 parcelas iguais, mensais e sucessivas. O presente entendimento não observa, sobretudo, os limites de apreciação do recurso. Não sendo acolhida a pretensão reducional, admite-se a amenização da forma de pagamento. Conclusão Por todo o exposto, dou parcial provimento à apelação, apenas para determinar seja a multa imposta parcelada em 03 (três) prestações iguais, mensais e sucessivas. É o meu voto. Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): ALBERTO VILAS BOAS e EDUARDO ANDRADE. SÚMULA : DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0637.07.046005-9/001