A COMUNICAÇÃO SEGUNDO A PROPOSTA CURRICULAR MARISTA E A DIALOGICIDADE DE PAULO FREIRE

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Transcrição:

1 A COMUNICAÇÃO SEGUNDO A PROPOSTA CURRICULAR MARISTA E A DIALOGICIDADE DE PAULO FREIRE Formação e Gestão em Processos Educativos Ingrid Roussenq Fortunato Martins Introdução Este trabalho é parte da pesquisa de Mestrado cujo objetivo foi compreender em que medida a proposta curricular efetivada no Colégio Marista de Criciúma possibilita a formação de alunos comunicadores, pesquisadores e solidários, à luz das categorias freireanas curiosidade epistemológica/ingênua, dialogicidade e solidariedade. A investigação deu-se numa abordagem qualitativa, cujos procedimentos investigativos foram a análise de documentos da referida instituição e a entrevista semiaberta com professores e gestores. As categorias curiosidade epistemológica/ingênua, dialogicidade e solidariedade de Freire ([1987] 1996) são discutidas para, em seguida, serem aproximadas ao ideal de aluno proposto por este Colégio, que destaca a formação de alunos comunicadores, pesquisadores e solidários. É importante salientar também que as categorias freireanas dessa pesquisa não são citadas nos documentos maristas, mas apresentam-se nos discursos orais da instituição.neste trabalho é apresentado apenas um recorte da pesquisa, o qual reflete sobre as aproximações e distanciamentos da dialogicidade de Paulo Freire e a comunicação, sob os discursos escritos e falados, propostos nos documentos da Instituição e na entrevista com os professores. Aproximação: Comunicação Marista X Dialogicidade Freireana Para Freire ([1987] 1996), as relações entre educador e educando na prática bancária são determinadas por sua característica narrativa/dissertativa, apresentando um caráter como algo quase morto e tendendo à petrificação.

2 A realidade não é estática e, por não possuir esta característica, não há como explorá-la de forma compartimentada, sem experenciar diferentes perspectivas, tanto de educandos quanto de educadores. Freire ([1987] 1996) propõe uma educação voltada à dialogicidade, definindo-a essência da educação como prática da libertação, fenômeno que compõe a ação e reflexão dos homens sobre o mundo para, juntos, transformá-lo. A relação professor x aluno, citada pelo autor como bancária, dá-se pelo fato de os educadores tratarem os educandos como recipientes vazios que precisam ser cheios pelos conteúdos escolares. Na negação das trocas de conhecimento professor/aluno, aluno/aluno a escola acaba não oportunizando o exercício do diálogo, e deixando de formar agentes comunicadores. A sala de aula perde a oportunidade de trabalhar com a riqueza das contradições pelo fato de ficar apenas nas certezas, comunicadas verticalmente, não promovendo uma relação horizontal entre professores e alunos. O PPP do Colégio Marista de Criciúma não conceitua as categorias comunicação, pesquisa e solidariedade, características ideais na formação de seus alunos, apenas cita-as em seus objetivos. As matrizes curriculares que especificam esse ideal de aluno são as de Biologia, Ciências, Física e Arte, mas outras utilizam o eixo linguagem com o objetivo de promover o domínio da comunicação em cada área do conhecimento. O eixo linguagem é apresentado em nove das quinze matrizes curriculares. De acordo com a Entrevistada A, a comunicaçãoé: O meio pelo qual podemos expressar os sentimentos, angústias. No caso dos alunos não é diferente. Quando ele se expressa torna-se dono daquilo que disse, mostra a valorização que dá para o mundo que o cerca. Por isso é tão importante procurar formar alguém que saiba se comunicar: assim ele poderá expressar tudo de forma clara e objetiva, não apenas os conteúdos da escola. Não me refiro a ser um aluno que domine apenas conteúdos conceituais ou factuais, mas que saiba viver e expressar-se vivo pela linguagem. Segundo a Entrevistada B, saber comunicar-se é compreender os noticiários referentes à ciência porque se apropriou da linguagem científica e consegue fazer relações com o que estudou por meio de suas pesquisas ou os conteúdos em sala de aula. Ela afirma que essa capacidade auxilia o educando

3 na intervenção no meio em que vive. A Entrevistada D concorda e afirma que as características propostas para o aluno estão relacionadas umas com as outras quando afirma que: O aluno pesquisa, mas essa investigação tem que servir para algo. Penso que para mudar a sociedade em que ele está e a apropriação das linguagens auxilia nessa transformação. Não adianta estudar ciência e não saber o que fazer com ela. O aporte teórico dado pelo Colégio deve servir para o futuro do aluno. Eu instigo meu aluno a ter autonomia na pesquisa e espero que ele saiba que seu uso não é só aqui em sala de aula. Fazemos a Multimostra aonde o aluno precisa demonstrar-se apto para apresentar seus trabalhos. Além de desenvolver a pesquisa, sempre acompanhado pelos colegas e professor, precisa defender sua proposta de trabalho. É claro que cada aluno o fará dentro de suas possibilidades. Mas por isso a importância de conhecermos nossos alunos, só assim poderemos perceber os avanços. É uma oportunidade de percebermos também até que ponto eles solidarizam-se uns com os outros. A Entrevistada F também salientou a questão da comunicação como mobilidade social, referindo-se a ela como necessária para que as pessoas se unam para melhorar seu meio social. O Entrevistado L concorda com o fato do comunicador não ser apenas aquele que faz a pesquisa, mas sabe expressá-la das mais diversas maneiras, não apenas de forma oral, mas gestos (teatro) e mídias diversificadas. De acordo com o Entrevistado N, o comunicador domina o conhecimento e sabe transmiti-lo, tendo domínio da oratória, expressando-se de forma limpa, nítida. O Entrevistado E define o aluno comunicador como aquele que se comunica bastante com o outro, tem bastante diálogo com as outras pessoas. Ao ser questionado sobre essa comunicação reforçou a ideia da fala, ou seja, a comunicação por este entrevistado é vista como conversa entre pares ou mesmo entre professores e alunos. Além de definir o aluno comunicador dessa mesma forma, o Entrevistado G acrescentou que este educando busca seus direitos sem esperar pelo professor. A pesquisa, tanto documental quanto empírica, apresenta a comunicação como competência de expressar-se bem nas diferentes áreas do conhecimento. Tanto nos eixos de linguagem apresentados nas matrizes quanto à definição do Projeto Curricular em Ação, ou nos entendimentos apresentados pelos professores,os dados se apresentaram bastantes

4 coerentes com este princípio. O que o Colégio propõe como competência é visto pelos professores também dessa maneira. O que há é um distanciamento dessa categoria com a dialogicidade no sentido freireano, pois, para Freire ([1987] 1996), dialogar não é apenas expressar ideias de maneira clara, mas é ouvir e dar o direito ao outro de dizer sua palavra. Pronunciar o mundo, percebendo-se nele e sentindo-se participante dele é existir humanamente, segundo o autor. Mesmo que este diálogo apresente-se como proposta, ele necessita efetivar-se na prática, por meio das ações educativas. Ele manifestase nas relações estabelecidas entre educador e educando no que concerne à relação de conteúdos, como também ao tempo de aprendizagem de cada grupo, e é composto de amor, humildade, fé nos homens, esperança, criticidade e rigorosidade metódica. Ser dialógico é mais que desenvolver a competência comunicativa, é tornar o outro visível, em suas ideias e expressões. Educar para o diálogo, no sentido freireano, não se limita a ensinar a expressão de ideias fragmentadas nas áreas do conhecimento, mas oportunizar que o outro seja mais para que encontre o sentido de sua humanização. O ato dialógico, para Freire ([1969] 2006), não está à mercê do tempo e dos conteúdos a serem trabalhados, pois ele problematiza os conhecimentos, sejam eles de ordem técnica ou não. O papel do educador é o de proporcionar, através da relação dialógica educador-educando, educandoeducador, a organização de um pensamento correto em ambos. (FREIRE[1969] 2006, p. 53). Esse diálogo, diferente da linguagem destacada nos documentos do Colégio, encontra-se na realidade mediatizadora em que o educador escolhe os conteúdos com os quais vai dialogar. Conteúdos esses sempre democratizados, pois partem do próprio olhar do educador sobre as necessidades dos educandos. Dessa forma, o ato dialógico não se dá sozinho e é por meio dele que os homens humanizam-se e têm oportunidade de olhar o mundo e sua existência como processo. O diálogo implica em eu formar a minha ideia em comunhão com os outros, em uma incompletude própria do ser humano, que é um vir-a-ser. Considerações Finais

5 A comunicação, apresentada como competência para o aluno Marista é expressa como capacidade de expressar-se bem nas diferentes áreas do conhecimento. Dessa forma, distancia-se da dialogicidade, pois, na perspectiva de Freire, o diálogo não é apenas a expressão de ideias com clareza, mas a competência de ouvir e dar ao outro seu direito de dizer sua palavra. O autor destaca o direito dos sujeitos pronunciarem o mundo, percebendo-se nele e sentindo-se participante dele. Ser dialógico é mais que desenvolver a competência comunicativa, é tornar o outro visível, em suas ideias e expressões. E a categoria comunicação não se apresenta no sentido de educar para o diálogo, limita-se a desenvolver nos educandos a expressão do conhecimento científico destacado em cada área do conhecimento. O próprio ato dialógico não é usual entre os professores e isso é destacado por eles pela falta de tempo de trabalho com os discentes. O professor conversa, mas não dialoga, pois o diálogo leva tempo para ser construído e necessita de sistematização. As práticas docentes, de acordo com as entrevistas, são dissertadoras, mesmo quando problematizam os conteúdos propostos. É possível encontrarmos diferentes perspectivas curriculares dentro de uma mesma instituição, já que a prática escolar é complexa e formada por uma diversidade de indivíduos que possuem necessidades que não podem ser abandonadas a despeito dos objetivos educacionais. Entretanto, são necessárias reflexões constantes sobre a prática escolar e a coerência existente entre os discursos anunciados. Educadores que, inseridos numa instituição, conseguem olhar criticamente para ela, demonstrando suas limitações e possibilidades, caminham para a superação de suas práticas narrativas. A conscientização não acontece abruptamente de forma milagrosa, mas por reflexões, críticas e autocríticas, de análise da prática e busca coletiva. Ela se dá a partir da problematização das contradições vivenciadas diariamente dentro da escola, sendo pedagógicas ou não. É o espaço para o diálogo que oportunizará a coerência educacional de discurso e prática. A ingenuidade de dicotomizar prática e teoria se dilui a partir do momento em que se percebe que elas são indissociadas. Teorizar sobre

6 educação é, em si mesmo, olhar e conceber de outra maneira as próprias ações educativas que se encontram na escola, manifestadas por todos os envolvidos. Ainda mais, é a prática que alimenta e subsidia a abertura de novas formas de refletir sobre ela. A prática não é apenas o lugar da aplicação da teoria, é muito mais ampla sua função, a de compor a compreensão dos fenômenos educativos. A organização do trabalho pedagógico, a formação do educador, o estabelecimento democrático de tomada de decisões entre os profissionais da educação possibilitam um avanço nas questões que angustiam os professores. Problematizar a prática, enfatizar os discursos documentais pode ser um caminho a percorrer com os profissionais do Colégio Marista de Criciúma. A questão escolar primordial no que concerne à aprendizagem é assegurar-lhe sentido, portanto, é preciso promover práticas educativas que garantam a apropriação do conhecimento que possa ser utilizado para o alcance do ideal proposto. O aluno aprende para a vida, para o hoje, e não para ser alguém algum dia. A simples discussão do que deve conter o currículo não é suficiente para mudarmos as práticas educacionais vigentes, mas a forma de refletirmos sobre isso expressará quem somos e o que consideramos ser verdadeiro, mesmo que seja por um tempo. Não há espaços para a exclusão do diálogo, pois é por meio dele que a escola manifestará seus problemas e possibilidades. Uma prática curricular que preze a vida, as diferentes realidades e busque dar espaço a todos abrirá horizontes para seus educandos por meio do diálogo, das indagações e do prazer de aprender. Perguntar e buscar respostas, mesmo que sejam momentâneas, faz parte do fazer educativo. E é nesse viés que o educador comprometido com o outro se constitui, percebendo-se inacabado e construtor de sua história. Entretanto, ele não se faz isoladamente, mas em comunhão com outros educadores que se encontram na mesma condição. Juntos, buscam humanizar e humanizar-se por meio do diálogo, repensando a vida em sociedade e praticando sua vocação ontológica de ser mais. Referências

7 FREIRE, Paulo. [1987] Pedagogia do oprimido. 23. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.. [1969]. Extensão ou comunicação? 13. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006.