Por. Professor Catedrático Jubilado de Psiquiatria da F.M.C.

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Transcrição:

Por Professor Catedrático Jubilado de Psiquiatria da F.M.C.

- Stress e trabalho - Que significa Burnout? - Como se reconhece que alguém sofre de Burnout? - Prevalência do Burnout - Factores da pessoa que propiciam Burnout - Burnout em profissionais de Saúde Mental - Que se pode fazer para evitar o Burnout

Vamos começar pelo stress no trabalho

Ross e Altmaier (1994, pág. 12) definem stress no trabalho como: A interacção das condições de trabalho com características do trabalhador de tal modo que as exigências que lhe são criadas ultrapassam a sua capacidade em lidar com elas.

O stress no trabalho tem repercussões muito importantes: - É considerado uma das causas que mais frequentemente determina mau humor no indivíduo o que - Pode ter implicações negativas no ambiente familiar e sobre terceiras pessoas que nada têm a ver com o meio profissional. - Pode trazer um prejuízo tanto para a saúde física como psíquica do trabalhador. - Igualmente pode ter efeitos negativos sobre o funcionamento da empresa e custos de produção.

Referem Sutherland e Cooper (2000) que é útil existir no ambiente de trabalho um certo nível de estimulação, pois este ajuda a optimizar o desempenho. Se esta optimização for conseguida o trabalhador sente-se: - Mais criativo. - Calmo e - Mais motivado para o desempenho das suas tarefas.

Contudo, se o nível de activação for demasiado elevado e exceder a capacidade do trabalhador poder ir ao encontro das exigências estabelecidas a pessoa passa a apresentar sentimentos de Burnout e de exaustão, podendo atingir o limite da sua resistência. Por outro lado, se um indivíduo não se sente desafiado e estimulado pelo seu trabalho, ou não acredita que a sua contribuição é valorizada, é possível que comece a manifestar sentimentos de apatia, aborrecimento e falta de valor pessoal.

O stress no trabalho pode ocorrer tanto por excesso como por defeito, como no caso do indivíduo ter: - Demasiado número de tarefas para fazer num determinado período de tempo ou - Ter muito poucas tarefas a desempenhar no seu tempo de trabalho.

Estabelecidas estas considerações gerais vamos agora definir o que é Burnout

O termo Burnout foi introduzido em 1974 por Freudenberger. Definiu-o como: Um estado de fadiga ou de frustração surgido pela devoção por uma causa, por uma forma de vida ou por uma relação que fracassou no que respeita à recompensa esperada. Contudo há autores que preferem outro tipo de definição.

Pines e Aronson referem-no como sendo um estado de exaustão : - Física, - Emocional e - Mental causado pelo envolvimento, por longo tempo, em situações emocionalmente desgastantes (Pines, 1993).

Contudo, o Burnout costuma usualmente ser considerado em três componentes diferentes: - Exaustão emocional, - Despersonalização e - Realização profissional. Quando o Burnout é acentuado o indivíduo costuma sentir: 9 Valores elevados de exaustão emocional 9 Uma acentuada despersonalização e 9 Uma fraca realização profissional.

Nem imaginam como tenho andado Vamos descrever agora como se reconhece que alguém está a sofrer de Burnout

Pines (1993) refere que esta situação se detecta pela presença de três tipos de manifestações: 1) - De natureza física 2) - De natureza emocional e 3) - Uma mudança de atitudes

Nas manifestações de natureza física: - A pessoa sente-se num estado crónico de fadiga, esgotada, com cefaleias e alterações frequentes do sono e do peso, distúrbios gastro-intestinais, dores musculares, agravamento do síndroma pré-menstrual ou de doenças crónicas já existentes; - É levada a consumir café, tabaco, bebidas alcoólicas, tranquilizantes ou drogas ilicitas para combater o estado em que se sente.

Nas manifestações de natureza emocional sente-se interiormente: - Fracassada, - Desiludida, - Sem esperança, - Não vendo no seu trabalho qualquer significado e, - Devido a este contexto, tende a desenvolver sentimentos depressivos.

Quanto à mudança de atitudes a pessoa passa a mostrar-se: - Cínica e com atitudes negativas em relação: - Ao trabalho, - A colegas, - A supervisores e - À própria instituição.

A presença destas atitudes negativas tem três consequências que podem ser prejudiciais: A. - Por um lado, é susceptível de criar novos atritos, quer em relação aos colegas, quer em relação às direcções de pessoal de que o indivíduo depende.

Consequências prejudiciais das atitudes negativas: B. - Por outro lado, vai fazendo com que a pessoa se sinta cada vez mais isolada no seu meio de trabalho, deixando-lhe como válvula de escape o ambiente de casa, podendo por esta forma o Burnout vir a repercutir-se no casamento.

A terceira consequência repercute-se no trabalho: - O tempo de permanência no trabalho passa a ser o mínimo indispensável; - Cria-se um ambiente de hostilidade, de desconfiança e de desrespeito mútuo entre colegas; - A pessoa fica predisposta a acidentes de trabalho e executa de uma forma menos perfeita as suas tarefas. - Tende a faltar ao emprego e a desejar mudar para outro local.

Abordados estes problemas vamos agora referir-nos à prevalência do Burnout Prevalência

Embora haja numerosas investigações sobre Burnout, tanto em Portugal como no estrangeiro, devido às condições específicas que o geram, é difícil generalizar de uma prevalência encontrada em determinados estudos para uma prevalência global.

Kirsi Ahola et al. (2006), num estudo de 3.424 finlandeses empregados, com idades compreendidas entre 30 e 64 anos, comprovaram que o Burnout pode ocorrer em todas as profissões. - A idade não protege contra o Burnout. - Um grau de instrução e um estatuto social baixos constituem possíveis factores de risco de Burnout nas mulheres. - Como possíveis factores de risco nos homens encontraram uma associação com o facto de serem solteiros, viúvos ou divorciados.

Num trabalho dinamarquês, realizado por Marianne Borritz et. Al. (2006), os autores efectuaram um estudo prospectivo de 5 anos, respeitante a 2.391 empregados de diferentes organizações: - Segurança social, - Serviços prisionais psiquiátricos, - Instituições para pessoas gravemente incapacitadas, - Hospitais e - Serviços de cuidados domiciliários.

Comprovaram que as enfermeiras parteiras e os trabalhadores de cuidados domiciliários tinham os níveis mais elevados de Burnout relacionados quer com o tipo de trabalho, quer com os clientes. 9 Os trabalhadores dos serviços prisionais psiquiátricos foram aqueles que revelaram o nível mais elevado de Burnout relacionado com os clientes.

O Burnout relacionado com o trabalho revelou as correlações mais elevadas com: - A insatisfação com o trabalho, - Os aspectos quantitativos das exigências feitas, - Os conflitos relacionados com o papel social e exigências emocionais. - A abstenção do trabalho devido a doença foi de 13,9 versus 6,0 dias entre os participantes no quartil mais alto e mais baixo do Burnout relacionado com o trabalho.

Destes estudos ressalta a impressão de que o Burnout pode estar relacionado com certos factores, entre os quais: - Um grau de instrução pobre, - Um estatuto social baixo, - O estado civil (situações em que haja menos apoio) - O exercício de certas actividades profissionais que criam níveis grandes de exigência.

Em estudos efectuados em diversas partes do mundo ocidental reconhece-se que as profissões ligadas aos cuidados de saúde estão bastante expostas a desenvolver situações de Burnout. O facto decorre das exigências inerentes ao exercício da própria profissão, da gravidade das situações clínicas com que se deparam, da urgência das intervenções que há a fazer.

Associam-se ainda aos factores mencionados outros tipos de factores como, por exemplo, o bom ou mau relacionamento entre colegas, ou o apoio que obtêm ou não quando precisam de ultrapassar situações difíceis. A prevalência de Burnout tem sido considerada elevada, em profissionais de saúde, com valores que oscilam entre os 23 e os 28 %.

Uma pessoa pode sobreviver num emprego exigente e com stress desde que sinta que o seu trabalho é significativo e apreciado. A situação de Burnout costuma decorrer de um ambiente de trabalho em que aquilo que um indivíduo faz é depreciado e em que há igualmente conflitos com colegas. A associar a estes aspectos a pessoa usualmente sente uma sobrecarga de trabalho sobre a qual não consegue ter controlo.

Até aqui referimos que os factores do meio profissional estão muito ligados ao Burnout. Mencionámos também que um indivíduo solteiro, viúvo ou divorciado, com menor apoio familiar, desenvolve mais facilmente Burnout do que pessoas comparáveis com um diferente estado civil.

No entanto podemos agora acrescentar que há igualmente factores inerentes à pessoa que facilitam o desenvolvimento de Burnout.

Belfer (1989) é de opinião que as circunstâncias indutoras de stress que são inerentes à prática médica, só precipitam transtornos psiquiátricos nas pessoas predispostas. O perfil usual, refere o autor, corresponde a indivíduos: - Ambiciosos, - Inflexíveis, - Com uma história familiar de distúrbios mentais e - Uma infância instável ou infeliz.

McCranie e Brandsma (1988), num estudo relativo a médicos de meia-idade, cujo comportamento pôde ser analisado 25 anos antes, referiram que estão mais predispostos ao Burnout gaqueles que já revelavam anteriormente tendências maladaptativas da sua personalidade.

Segundo McCranie e Brandsma (1988), correspondiam a: - Baixa auto-estima, - Sentimentos de inadequação e disforia com - Tendência para preocupações obsessivas, passividade, ansiedade social e afastamento do convívio dos outros. Estes autores não encontraram qualquer relação do Burnout com a idade, sexo, tipo de especialidade, horas de trabalho ou contacto directo com doentes.

- J. Pereira (2004), num estudo de Burnout em 56 bancários, concluiu que os indivíduos vulneráveis ao stress (23 QVS 43), em comparação com os não-vulneráveis, apresentavam médias mais elevadas de exaustão emocional e despersonalização e uma média mais baixa de realização profissional, sendo a diferença estatística de p<.001.

A maneira de ser de um indivíduo que propicia que se torne mais facilmente uma vítima de Burnout corresponde a um perfil psicológico em que se observa: Uma baixa tolerância à frustração, Dificuldade em confrontar e resolver problemas, Falta de capacidade de auto-afirmação, Preocupação excessiva com os acontecimentos do dia-a-dia e Uma emocionabilidade elevada.

Percepção de controlo Auto-afirmação Perfeccionismo Emocionabilidade Fraca tolerância à frustração Auto-estima pobre Vulnerabilidade ao stress

Vamos agora considerar o caso específico dos Profissionais de Saúde Mental

Olkinuora et al. (1990) salientam que há profissões que tem índices elevados de Burnout, particularmente aquelas cujos membros tratam doentes crónicos, incuráveis ou que estão atingidos por doenças fatais. - Incluem nesta situação as especialidades de oncologia, de pneumologia e de psiquiatria. - As que apresentam um menor índice de Burnout são as que lidam com doentes de prognóstico mais favorável, como a obstetrícia e a ginecologia ou a otorrinolaringologia e a oftalmologia.

Fontes de stress nos Psiquiatras: Umas, são relativas aos enfermos psicóticos que, devido à perda da crítica da realidade, não aceitam que os considerem doentes e, por isso, não aderem nem colaboram facilmente com qualquer proposta terapêutica. Outras, correspondem ao envolvimento que os familiares dos doentes lhes procuram fazer para tomarem partido em relação a determinado tipo de problema.

Fontes de stress nos Psiquiatras: Noutros casos, têm de ser o espectador resignado de conflitos familiares. Há por vezes enfermos com uma personalidade tão dependente que procuram que o clínico se torne um gestor da sua vida. Noutras circunstâncias, têm de lidar com uma personalidade querelante e hostil.

Ayala Pines e Christina Maslach (1978) recolheram informação de 76 membros do pessoal que trabalhava em várias áreas de saúde mental em San Francisco (EUA). Verificaram ser estatisticamente significativo que, quanto mais tempo estavam a trabalhar no campo da saúde mental: - Menos gostavam de trabalhar com doentes, - Menos êxito sentiam terem com eles e - Menos humanísticas eram as atitudes com a saúde mental.

Ayala Pines e Christina Maslach recomendavam, para reduzir o Burnout, permitir: - Afastamentos temporários dos cuidados directos com os doentes e - Nas reuniões do pessoal facilitar a mudança de funções.

Chemtob et al. (1988) num estudo relativo a 131 psiquiatras registaram que 65 já tinham tido enfermos que se suicidaram. - Este acontecimento tinha-os deixado perturbados, tal como a qualquer pessoa a quem falece um familiar. - As repercussões individuais variavam em função da idade, sendo os mais jovens os mais afectados por este tipo de acontecimento.

Bressi et al. (2009) efectuaram um estudo em 81 psiquiatras que trabalhavam em Departamentos de Psiquiatria do S.N.S. Italiano, na cidade de Milão. Os psiquiatras mostravam níveis elevados de exaustão emocional e despersonalização. As causas principais estavam relacionadas com o ambiente de trabalho. 9 A variável mais predictiva de Burnout era um nível baixo de satisfação profissional. Afirmaram que os psiquiatras têm níveis mais elevados de Burnout que os médicos de clínica geral.

Antonella Gigantesco et al. (2010) efectuaram um estudo em 196 profissionais de Saúde Mental, a trabalhar em Roma. A maior parte dos participantes não estava satisfeito com muitos aspectos do seu trabalho. O nível de satisfação era significativamente mais baixo no pessoal que trabalhava nas enfermarias em confronto com os que efectuavam apenas trabalho de ambulatório ou prestavam cuidados residenciais. Os resultados levam a sugerir a importância que tem promover a satisfação com o trabalho, particularmente no pessoal que trabalha em enfermarias.

Chris Lloyd e Robert King (2004) efectuaram um estudo que incluiu um total de 304 terapeutas ocupacionais e assistentes sociais que trabalhavam em Serviços de Saúde Mental australianos. Ambos os grupos experimentavam uma exaustão emocional elevada, uma despersonalização moderada e um elevado sentido de realização pessoal. Os níveis de Burnout não eram significativamente diferentes no pessoal que trabalhava com doentes internados ou na comunidade.

S. Evans et al. (2006) efectuaram um estudo no Reino Unido em 237 Assistentes Sociais que trabalhavam em Serviços de Saúde Mental. - Comprovaram que apresentavam níveis elevados de stress e exaustão emocional e níveis baixos de satisfação com o trabalho. - 111 casos (47%) apresentavam sintomatologia relacionada com o stress, duas vezes superior ao nível referido por estudos semelhantes feitos em psiquiatras.

S. Evans et al. (2006) referiam ainda: Os factores que contribuíam para uma satisfação pobre com o trabalho e muitos dos aspectos de Burnout era: - Sentirem-se desvalorizados no trabalho que realizavam - Terem exigências excessivas no desempenho das suas tarefas - Uma fraca possibilidade de intervir na tomada de decisão e - Sentirem-se infelizes com o lugar destinado aos assistentes sociais nos serviços modernos de Saúde Mental.

Spear et al. (2004) efectuaram um estudo sobre satisfação com o trabalho e Burnout em 116 elementos que trabalhavam em serviços de saúde mental para pessoas idosas. Comprovaram que: - O trabalho em grupo, - O apoio social e - Funções definidas com clareza - Tinham um efeito positivo na satisfação com o trabalho.

Thomsen et al. (1999) num estudo que envolveu 1.051 psiquiatras e enfermeiras de saúde mental na cidade de Estocolmo, comprovaram que as características da Organisação eram mais importantes do que as características individuais a predizerem exaustão e realização profissional nos profissionais de saúde mental.

Spear et al. (2004) comprovam também que: - O pessoal que trabalhava na comunidade sentia níveis mais elevados de satisfação do que o pessoal que trabalhava nas enfermarias. - Os enfermeiros referiam um nível mais elevado de Burnout e uma satisfação menor com o trabalho do que outros profissionais do serviço de saúde mental. - Os membros do pessoal seleccionados para trabalhar em novos modelos de prestação de serviços apresentavam maior satisfação com o trabalho do que os que trabalhavam em modelos mais tradicionais.

Victor e Eric (1987) num estudo de 94 profissionais de Saúde Mental comprovaram que os ambientes de trabalho: - Associados a um forte compromisso com o trabalho, - Em que eram encorajadas as boas relações entre colegas e - Existia uma boa supervisão de apoio - Estavam relacionados com níveis baixos de Burnout, medido pelo Maslach Burnout Inventory.

Fixem o essencial!

Pines sugere que se faça uma intervenção tendo em conta três níveis diferentes: - Organização, - Grupo e - Indivíduo.

No que respeita à Organização: Devem ser instituídas condições de natureza física, social e administrativa que não se tornem nocivas para o trabalhador e, ao mesmo tempo, haja a possibilidade de serem gratificados os aspectos positivos da actividade profissional.

Quanto ao grupo em que o indivíduo se insere: - É importante avaliar até que ponto são legítimas as exigências que lhe estabelecem. - Por sua vez é preciso que a pessoa em causa aprenda a lidar com elas e a saber tirar partido daquelas pessoas que possam dar-lhe auxílio efectivo, sob o ponto de vista técnico, emocional e todos os outros em que se sente carente.

Na intervenção sobre o indivíduo: - Deve fazer-se-lhe sentir que a crise que atravessa se pode tornar uma fonte de crescimento pessoal desde que seja capaz - De avaliar o que o descompensa e - Aprenda a lidar, até ultrapassar, as dificuldades que sente.

Na intervenção sobre o indivíduo: - O primeiro ponto passa por uma avaliação do que constitui para si um problema; - Os recursos que tem para lidar com ele; - Finalmente, como desenvolver as aptidões pessoais ou criar acesso a apoio social que lhe possa permitir modificar as condições do trabalho.

Para além destes aspectos há que considerar ainda o estado clínico em que alguém se encontra. Em função do que se observa pode ser necessário instituir uma medicação antidepressora e ansiolítica ou ainda algum outro fármaco que ajude a corrigir os transtornos do sono.

Um psiquiatra que trate uma pessoa com Burnout deve tornar-se empático, isto é, saber colocar-se na situação do doente e ver o mundo tal como ele o observa. Cria assim condições para o compreender e ajudar. Além disso, deve tornar-se um elemento incentivador que o ajude a confrontar-se com as dificuldades que sente e a ultrapassálas com êxito, tal como foi atrás mencionado.