REORGANIZAÇÃO SUCESSÓRIA E SEUS ASPECTOS por Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme Sócio de Almeida Guilherme Advogados e Maria Eugênia Gadia Ulian Advogada de Almeida Guilherme Advogados I. Introdução As sociedades familiares representam, nos dias de hoje, a forma empresarial predominante na economia mundial e crescente fonte de emprego e riquezas no mercado. Segundo publicado na revista Fortune, cerca de 40% (quarenta por cento) das 500 (quinhentas) maiores empresas do mundo são controladas ou de propriedade de famílias. Assim sendo, a proteção da atividade empresarial familiar e a expansão da vida útil dessas empresas são de grande importância para a evolução da economia mundial, além de sustentar a origem de empregos e de fonte de renda, o que se torna possível através da sucessão empresarial. Contudo, essa etapa consiste, muitas vezes, em um obstáculo na evolução das sociedades, vez que a transferência da gerência para os herdeiros, ou até mesmo para terceiros, gera grandes conflitos entre os fundadores das sociedades, herdeiros e envolvidos, afora a grande falta de preparo dos sucessores e sucedidos para enfrentar tal processo. Por esse motivo, a reorganização sucessória vem sendo cada vez mais explorada por empresários, garantindo sucesso na continuidade da atividade empresarial, por meio de planejamento sucessório eficaz, que possibilite a preservação do negócio e desenvolvimento futuro da sociedade. P á g i n a 1 d e 6
II. A importância da reorganização sucessória Como já dito, a reorganização sucessória possui papel fundamental para a evolução e continuidade dos negócios, principalmente, para que subsistam além de seus instituidores. Entretanto, na maioria das vezes, não é dada a devida importância para a sucessão empresarial, vez que os sócios se prendem às questões ligadas à constituição, expansão e busca de resultados da sociedade, dificilmente promovendo um projeto sucessório satisfatório na empresa, o que implica na redução da vida útil empresarial, a qual poderia ser estendida desde que bem delineada. Ao desenvolver um planejamento de curto prazo, focado na resposta financeira instantânea e no crescimento célere e constante da empresa, é indispensável, também, a criação de um planejamento estratégico que estruture a sociedade caso esse crescimento seja bem sucedido. Após a profissionalização, contratação de novos funcionários e expansão empresarial, surge, igualmente, a dificuldade de manter-se estável no mercado e de lidar com a crescente concorrência, a queda na produção, e demais dificuldades financeiras decorrentes da complexidade de manter um mercado competitivo. Essa situação gera a necessidade de rever os processos de gestão da sociedade, os quais deverão ser alterados, bem como a renovação das tecnologias, o que requer, além de investimento e preparo, novas habilidades para gerir a empresa. Inclusive, se não houver tal transformação nas atividades da empresa, esta correrá grandes riscos de estar fadada à falência. Verifica-se, assim, que o imediatismo cultivado pelos sócios na sociedade, os quais se preocupam apenas com resultados imediatos da empresa, sem se dispor a criar um planejamento para a sucessão da sociedade, se torna letal à continuidade da boa administração e perenidade da atividade empresarial. Portanto, é indispensável a criação de estratégias de longo prazo, como a implementação de um plano sucessório adequado para empresa, e com antecedência, definindo suas regras e condições, a fim de possibilitar uma evolução duradoura no mercado, solidificando a atividade empresarial. P á g i n a 2 d e 6
III. Os fatores que podem obstar a sucessão e motivos para proceder à reorganização No entanto, diversos fatores tornam a sucessão empresarial um processo intrincado, já que, em muitos casos, há a confusão patrimonial entre o capital da empresa e da família, que acaba utilizando-se dos recursos empresariais além dos que deveriam, o que prejudica, inclusive, a idoneidade da sociedade, além dos conflitos familiares que surgem com a nova situação empresarial. Outrossim, há a dificuldade, por parte dos sócios proprietários, de reconhecerem, tanto o momento correto para promover a sucessão, quanto a necessidade de adequação da empresa à nova conjuntura econômica, além da dificuldade de encontrar um sucessor na família profissionalmente preparado para a gestão dos negócios. Não basta que haja herdeiros interessados na continuidade da atividade empresarial. Estes devem estar preparados com o intuito de alcançar um desempenho satisfatório, como o obtido na gestão antecedente. Caso não haja tal indivíduo no seio da família, deve-se optar pela contratação de terceiros que sejam qualificados. Em relação ao momento adequado para o afastamento do sucedido, esse normalmente emana de fatores como a idade avançada, problemas de saúde ou morte, dificuldade de manter a competitividade empresarial exigindo-se nova estrutura organizacional, queda dos resultados, entre outros fatores que indiquem que a empresa está entrando em crise, e necessita de renovação no seu comando, com maior motivação para o desenvolvimento das atividades empresariais. Todavia, quando não há regras pré-estabelecidas e um projeto sucessório bem estruturado, podem surgir, com a sucessão, diversos conflitos e rivalidades entre os herdeiros e demais empregados da sociedade. Desta feita, a fim de se impedir certas situações indesejáveis e desgastantes à sociedade, aos seus sócios e funcionários, aconselha-se a elaboração de uma estratégia sucessória, evitando-se, sobretudo, qualquer prejuízo à reputação da empresa no mercado, que possa ser ocasionado por uma sucessão embaraçosa. Além disso, muitas famílias dependem diretamente dos rendimentos da sociedade, sendo que uma sucessão mal planejada pode prejudicar aqueles que dela se beneficiam. P á g i n a 3 d e 6
IV. Possíveis estratégias de reorganização societária Um dos primeiros passos a serem tomados na reorganização é a separação das figuras dos membros da família, com a definição do nível sucessório desses, dos administradores e empregados da empresa, e de seus acionistas, que apenas atuam na sociedade com a participação no seu capital, distinguindo os direitos e deveres de cada um desses grupos. Tendo em vista que esses diferentes personagens possuem interesses e objetivos distintos, a ocorrência de disputas e conflitos se torna muito frequente entre os mesmos. Isso porque, enquanto uns se preocupam tão-somente com a percepção dos proveitos gerados pela sociedade, no caso, os acionistas, outros, que efetivamente trabalham na empresa, se interessam na aplicação desse lucro na própria sociedade, além de visarem à expansão profissional. Portanto, a estrutura de cada empresa deve ser analisada individualmente, verificando-se a natureza do patrimônio empresarial, a abrangência que os possíveis conflitos poderão tomar, avaliando e ajustando as prioridades e escopos, estrutura e organização empresarial, a fim de se promover a estabilidade e desempenho organizacional satisfatório. Uma estratégia frequentemente utilizada consiste na constituição de uma holding, empresa criada com o objetivo de deter bens, participando no capital de outras sociedades, e que pode ser constituída sob a forma de sociedade limitada ou por ações, conforme as necessidades do caso concreto. Há duas espécies de holdings, a denominada pura, que consiste apenas na participação no capital de outras sociedades, e a mista, a qual explora alguma atividade empresarial, além da participação no capital. De qualquer forma, essa empresa acaba detendo a maior parte do capital das empresas de seu grupo. Desse modo, o controle da administração das empresas passa a ser transferido para a holding, o que impede a intervenção dos sócios das empresas controladas, que terão sua capacidade de investimento concentrada. Assim, mantém-se maior controle societário, bem como a separação do ativo das sociedades, que terá como principal proprietária a holding criada. Tal mecanismo visa proteger o patrimônio familiar, facilitando sua gestão e reduzindo os tributos fiscais, como a não incidência em alguns casos, por exemplo, do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação, além de criar barreiras para que se atinja os bens das sociedades. O incentivo fiscal dessa modalidade estratégica vem expresso, inclusive na legislação, P á g i n a 4 d e 6
conforme dispõe o 3º do artigo 2º da Lei das Sociedades por Ações (Lei n. 6404/76): Art. 2º Pode ser objeto da companhia qualquer empresa de fim lucrativo, não contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes. (...) 3º A companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades; ainda que não prevista no estatuto, a participação é facultada como meio de realizar o objeto social, ou para beneficiar-se de incentivos fiscais. De fato, a constituição de uma empresa holding apresenta diversas vantagens, além dos benefícios fiscais, já que a empresa fica preservada e as discussões passam a ocorrer no âmbito da holding. As empresas passarão a ser reguladas pelo Contrato ou Estatuto Social da holding, estruturado de acordo com os interesses dos sócios, com regras claras e inequívocas de administração, estabelecendo o direito de voto, participação, critérios de eleição, quórum, o que reduz os litígios sobre a posse e administração do patrimônio empresarial. Pode-se, utilizar, inclusive, de Cláusula Arbitral para solução dos conflitos e questões advindas da sucessão, conforme a Lei n. 9.307/96. Outra vantagem da constituição de uma holding é a possibilidade de realizar a sucessão hereditária de maneira célere e com custo reduzido, em comparação ao processo judicial de inventário, o qual torna a partilha morosa e dispendiosa, podendo refletir negativamente no desenvolvimento da empresa. Ademais, uma fonte alternativa de diluição de riscos para o patrimônio empresarial, principalmente quando a sociedade se encontra em crise econômico-financeira, é a criação de fundos de investimento, que além de beneficiar o próprio quotista, retira o risco do reinvestimento. O fundo de investimento implicará necessariamente no aporte de capital para a empresa, e a possibilidade de recuperação de crédito. Por fim, no intuito de planejamento e implementação da gestão empresarial, podem ser utilizadas práticas de governança corporativa, que além de promover aumento nos rendimentos, torna a empresa atrativa para investidores, já que aprimora a imagem da sociedade no mercado. De qualquer forma, a estratégia de sucessão deverá ser definida conforme as características e peculiaridades de cada empresa, analisando-se os objetivos e interesses dos sócios, e os meios mais adequados para satisfazer esses escopos. P á g i n a 5 d e 6
V. Conclusão Ante o exposto, verifica-se que a sucessão empresarial trata-se de etapa inevitável das empresas que pretendam subsistir além de uma geração, e, para que seja feita de maneira escorreita, é indispensável seu planejamento a fim de evitar conflitos familiares, desgastes emocionais e perda de recursos. Portanto, tendo em vista as inúmeras dificuldades que um processo sucessório mal delineado pode acarretar para a continuidade de uma empresa, é necessário um planejamento prévio, elaborado de acordo com as necessidades, características e objetivos de cada estrutura empresarial, a qual deve ser realizada conforme o acordo dos sócios. Desta maneira, garante-se tanto a proteção patrimonial como a perenidade da atividade empresarial, controlando-se eventos futuros, tornando possível a segurança financeira e estabilidade dos familiares e acionistas, e é isso que almeja nosso escritório assessorando nossos clientes. P á g i n a 6 d e 6