Avaliação do Processamento Numérico e de Cálculo em Pacientes com Afasia
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- Ruth das Neves da Fonseca
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1 Avaliação do Processamento Numérico e de Cálculo em Pacientes com Afasia Resumo Introdução: A alteração da habilidade de calcular, subseqüente a lesão cerebral, é conhecida como acalculia. Esta alteração pode ser definida como uma inabilidade completa ou parcial de lidar com números e representa um comprometimento no processamento numérico e de cálculo. Diversos autores relatam que pacientes afásicos apresentam alteração nos processamento numérico e de cálculo e estas estão sendo investigadas com maior freqüência na literatura internacional e nacional. Neste estudo, tivemos por objetivo verificar o desempenho de sujeitos afásicos em tarefas numéricas e de cálculo através da bateria EC 301. Método: Foram avaliados 32 pacientes com afasia, com lesão cerebral única à esquerda. Todos os sujeitos foram submetidos à avaliação das habilidades numéricas e de cálculo através da bateria EC301. Resultados: Foram encontradas dificuldades em diversas provas da bateria EC301, sugerindo alteração na ativação para os procedimentos de cálculo e suas respectivas regras aritméticas. Acreditamos que este fato, pode estar relacionado às dificuldades de compreensão, dificuldades lexicais, gráficas e visuo-espaciais, encontradas com freqüência em paciente com afasia. Conclusão: Os resultados sugerem que existe um efeito deletério da ocorrência de lesão no hemisfério esquerdo, e consequentemente da afasia, nas habilidades numéricas e de cálculos, sendo que, as tarefas de transcodificação foram a que apresentaram-se mais prejudicadas. Palavras Chaves: Afasia, matemática, processos mentais. Introdução A acalculia é definida como uma inabilidade completa ou parcial em lidar com números, representa um comprometimento do processamento numérico e de cálculo (1). Alguns estudos mostram que pacientes afásicos estão mais suscetíveis a estas alterações (2, 3, 4).
2 Não é incomum a presença de alteração no processamento numérico e de cálculo em indivíduos com afasia. Basso et al (6) realizaram um estudo com o objetivo de investigar as dificuldades aritméticas em pacientes afásicos. Os dados indicaram que os distúrbios de cálculo podem sugerir uma co-ocorrência com as alterações de linguagem encontrada nestes pacientes. A dificuldade causada por distúrbios visuo-espaciais em pacientes com lesão cerebral e com prejuízo nas habilidades de cálculo também foram estudadas (2). Os resultados mostraram que pacientes com lesão cerebral executaram as tarefas significativamente pior que o esperado, e que pacientes com lesão no hemisfério esquerdo apresentaram pior desempenho. Estes resultados sugerem que, embora diferentes fatores possam contribuir para os distúrbios de cálculo, tais como, prejuízo de inteligência, dificuldades visuo-construtivas e acima de tudo a afasia, as lesões à esquerda são particularmente propensas a produzir um prejuízo maior nas habilidades de cálculo. Desta forma, considerando-se a importância do processamento numérico e do cálculo nas atividades de vida diária e o interesse em investigar as alterações do processamento numérico e de cálculo em pacientes afásicos, realizamos o presente estudo. Método Este estudo recebeu aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da UNIFESP, protocolo nº 0346/04. Foram selecionados 32 participantes, com diagnóstico fonoaudiológico de afasia. Todos pacientes foram provenientes do Núcleo de investigação em Neuropsicolinguística da UNIFESP. Tivemos como critérios de inclusão: idade superior a 18 anos, no mínimo, um ano de escolaridade, presença de AVC isquêmico único em hemisfério esquerdo, comprovado por meio de exame de neuroimagem e diagnóstico neurológico. Foram excluídos os participantes que apresentavam diagnóstico e/ou histórico de transtornos auditivos e/ou psiquiátricos ou que fizessem uso de drogas psicotrópicas. Os indivíduos selecionados foram submetidos aos 31 subtestes que compõem a bateria EC 301, para avaliação do processamento numérico e de cálculo, São eles: 1. Sequência numérica (C1, C2, C3), 2. Contagem (C4, C5, C6, C7, C8), 3. Transcodificação (C9, C10, C11, C12, C13, C14, C15), 4. Sinais Aritméticos (C16, C17), 5. Comparação numérica (C18, C19), 6. Cálculo Mental (C20, C21), 7. Estimativa de resultado (C22), 8. Posicionamento numérico (C23, C24), 9. Escrevendo uma operação (C25), 10. Cálculo escrito (C26, C27, C28), 11. Estimativa de
3 quantidade (C29), 12. Julgamento de magnitude (C30), 13. Conhecimento numérico (C31), desenvolvida por Deloche (7). Resultados Quanto à caracterização da amostra, a média de idade encontrada entre os afásicos foi de 51,4 ± 13,7 anos e a média e escolaridade 8,0 ± 5,2 anos. 16 pacientes (50%) apresentaram afasia do tipo amnéstica, 3 (9,4%) de condução, 4 (12,5%) de Broca, 1 (3,2%) transcortical sensorial, 5 (16%) e 3 (9,4%) global. Observamos na figura abaixo, a média de porcentagem de acertos em cada subteste da bateria EC 301, nos pacientes afásicos % de acertos C1 C2 C3 C4 C5 C6 C7 C8 C9 C10C11 C12 C13 C14C15 C16C17 C18 C19 C20C21 C22C23 C24C25C26 C27 C28 C29 C30C31 Subtestes da bateria EC 301 Legenda 1. Sequencia Numérica (C1, C2, C3) 2. Contagem (C4, C5, C6, C7, C8) 3. Transcodificação (C 9, C10, C11, C12, C13, C14, C15) 4. Sinais aritméticos (C16, C17) 5. Comparação numérica (C18, C19) 6. Cálculo Mental (C20, C21) 7. Estimativa de resultado (C22) 8. Posicionamento numérico (C23, C24) 9. Escrevendo operações. (C25) 10. Cálculo escrito (C26, C27, C28) 11. Estimativa de quantidade (C29;) 12. Julgamento de magnitude (C30) 13. Conhecimento numérico (C31) Discussão As dificuldades observadas nos pacientes afásicos, no subteste C1 - contagem oral dos números, C2 contagem de e de trás para frente e C#, contagem de 3 em 3 sugerem que a familiaridade em contar números, mesmo que automaticamente, pode estar comprometida em pacientes afásicos, principalmente quando componentes práxicos estão envolvidos (8). As alterações para os subtestes C16 - nomear sinais aritméticos em voz alta e C17 - escrever sinais aritméticos ditados denominam um tipo de acalculia assimbólica, em que a trocas dos sinais ou a falha na nomeação estariam diretamente relacionadas
4 com alterações semânticas e com as anomias que são comumente encontradas em afásicos (9). Em relação às comparações de magnitude, investigadas quando o paciente deveria apontar o maior número escrito ortograficamente, a alteração encontrada pode estar relacionada às dificuldades na leitura dos números ou na compreensão da quantidade expressa pelos números (2, 10). De fato, pôde-se observar, durante a aplicação desta prova, que alguns pacientes se norteavam pelo comprimento dos números escritos, e não pela quantidade expressa pelo mesmo. Os pacientes afásicos apresentaram piores escores nos cálculos mentais simples de adição, subtração, multiplicação e divisão, apresentados na forma oral e gráfica. A adição simples foi a operação melhor executada em relação à subtração e à multiplicação. Os pacientes afásicos tiveram um desempenho significativamente pior nas contas de multiplicação, quando comparadas com as de subtração e as de divisão. Este fato pode ser justificado pela maneira como são apreendidas as regras de multiplicação, como as tabuadas, que são treinadas através de rimas verbais ou decoradas. Isso já não ocorre nas outras operações que, são estudadas menos sistematicamente, sugerindo que as regras de multiplicação são armazenadas em um nível fonológico, podendo assim gerar maior prejuízo em pacientes lesados cerebrais. (11, 12). Entretanto, interferências visuo-espaciais não podem ser descartadas, principalmente quando solicitada a resolução gráfica do cálculo com mais de um algarismo, em que regras aritméticas estão diretamente envolvidas. Vale a pena ressaltar que as provas de transcodificação foram as que apresentaram os piores resultados. Segundo Mc Closkey (5), as habilidades numéricas de transcodificação dependem de um componente central, que realiza todas as transcodificações e as operações de cálculo. Para que a compreensão numérica ou do cálculo seja realizada, são necessários mecanismos que traduzam as entradas numéricas, tanto na forma ortográfica quanto na forma arábica e verbal. Além disso, os mecanismos de produção numérica apresentam implicações que necessitam de tradução e representação abstrata das formas adequadas de saída, para cada sistema de notação (verbal, ortográfico ou arábico). Conclusão Pacientes afásicos apresentaram dificuldades de realização da maioria das tarefas de processamento numérico e cálculo propostas na bateria EC 301. As tarefas de transcodificação foram as mais difíceis para este grupo de pacientes. Os resultados sugerem que existe um efeito deletério da ocorrência de lesão no hemisfério esquerdo, e consequentemente da afasia, nas habilidades numéricas e de cálculos.
5 Agradecimentos Apoio Financeiro- FAPESP (processo número 04/ ) Referencias bibliográficas 1. Ardila A, Rosselli, M. Acalculia e Dyscalculia. Neuropsychol. Rev ; 12(4): Grafman J, Kampen D, Rosenberg J, Salazar AM, Boller F. The progressive breakdown of number processing and calculation ability: A case study. Cortex. 1989; 25: Delazer M, Girelli L, Semenza C, Denes G. Numerical skills and aphasia. J.Int. Neuropschol. Soc. 1999; 5: Basso A, Burgio F, Caporali A. Acalculia, aphasia and spatial disorders in left and right brain-damaged patients. Cortex. 2000; 36 (20): Mc Closkey M. Cognitive mechanisms in numerical processing: Evidence from acquired dyscalculia. Cognition. 1992; 44: Basso A. Caporali, P. Faglioni. Spontaneous recovery from acalculia. J. Int. Neuropsych. Soc. 2005; 11: Deloche G, Mansur LL, Rodrigues N In: Mansur LL, Rodrigues N. Temas em Neurolinguística: Acalculia e Afasia. São Paulo: Tec Art; p Martins, Ferro JM, Botelho MAS. Alexia for arithmetical signs: A cause of disturbed calculation. Cortex. 1981; 16: Dehaene S, Cohen L. Two mental calculation systems: A case study of severe acalculia with preserverd approximation. Neuropsychologia. 1991; 29: Dehaene S. Varieties of numerical abilities. Cognition. 1992; 44: Dehaene S, Cohen L. Cerebral pathways for calculation: Doublé dissociation between rote verbal and quantitative knowledge of arithmetic. Cortex. 1997; 33 (2):
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