ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA

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1 Órgão : QUINTA TURMA CÍVEL Classe : APC - APELAÇÃO CÍVEL Num. Processo : Apelante(s) : ROBERTO BATISTÃO SALIBA Apelado(a)(s) : MIDAS FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA Relator Des. : ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA Revisora Des. : HAYDEVALDA SAMPAIO E M E N T A AÇÃO ANULATÓRIA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DA- NOS MORAIS. INCLUSÃO DO NOME DO AUTOR NO CADASTRO DE INADIMPLENTES. NEGÓCIO JURÍDICO REALIZADO ENTRE O AUTOR E A EMPRESA "MODEL COZINHA LTDA.". EMPRESA DE FACTORING. PORTADORA DE BOA-FÉ. TÍTULO EM CIRCU- LAÇÃO. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA AUTONOMIA, DA ABSTRAÇÃO E DA INOPONIBILIDADE DAS EXCEÇÕES PESSO- AIS AOS TERCEIROS DE BOA-FÉ. O cheque, como título de crédito autônomo e abstrato, uma vez colocado em circulação, não está ligado ao negócio jurídico que deu causa à sua emissão. Assim, não procede a ação de indenização por danos morais em desfavor da empresa de factoring que, agindo licitamente, protestou o cheque que estava em seu poder. A C Ó R D Ã O Acordam os Senhores Desembargadores da Quinta Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA - Relator, HAYDEVALDA SAMPAIO Revisor(a) e DÁCIO VIEIRA - Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA em CO- NHECER. NEGAR PROVIMENTO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas. Brasília (DF), 12 de fevereiro de Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA Presidente Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA Relator

2 R E L A T Ó R I O Adoto o relatório da sentença de fls. 87/93, in verbis: ROBERTO BATISTÃO SALIBA ajuizou ação de conhecimento pelo rito ordinário em face de MIDAS-FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA. para obter a anulação de protesto bem como para pleitear indenização por danos morais. Alega o autor que adquiriu da loja Model Cozinhas LTDA., situada no Setor Sudoestes de Brasília-DF, um conjunto completo de armários para cozinha e uma guarda-roupas de sete portas pelo preço de R$ (quatro mil e quinhentos reais) representados por 06 (seis) cheques no valor de R$ 750,00 (setecentos e cinqüenta reais) emitidos contra o Banco de Brasília S.A, agência 059, pós-datados para 15/12/96, 15/01/97, 15/02/97, 15/03/97, 15/04/97 e 15/05/97, não tendo sido expedida nota fiscal. Alega, ainda, que houve a entrega do guarda-roupa, não, contudo, do conjunto de armário para cozinha até a presente data, razão pela qual o autor, após a compensação do primeiro cheque, solicitou a sustação dos demais junto ao banco. Sustenta que, ao efetuar compras na loja O Boticário, foi surpreendido com a informação de inclusão do seu nome no cadastro de consumidores inadimplentes em decorrência de protesto efetuado pela ré, cujo ato abalou o crédito e a honra do autor. Citou doutrina, requereu a citação da ré, a anulação do protesto e a condenação daquela ao pagamento de indenização de R$ ,00 a título de danos morais. Requereu, ainda, a antecipação da tutela quanto à retirada de seu nome do cadastro de inadimplentes. Instruiu a inicial com o instrumento de mandato de fl. 21 e os documentos de fls. 22/27. yt Gabinete do Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA 2

3 A ré juntou o instrumento de mandado de fl. 38, os documentos de fls. 32/37 e apresentou contestação na qual argüiu, como preliminar, a ilegitimidade ativa ad causam do autor sob o fundamento de que este carece de legitimidade e interesse de agir uma vez que a ré é terceiro de boa-fé que atua no Distrito Federal no ramo de desconto de créditos. Alega que o cheque é um título de crédito autônomo e abstrato cuja causa debendi não se discute uma vez posto em circulação, sendo a contra-ordem do autor insuficiente para prevenir terceiros de boa-fé. Sustenta, ainda, que os cheques preenchem todos os requisitos legais, sem defeito de forma, pelo que a ré pode valer-se de todos os meios colocados pelo Estado à sua disposição, inclusive o protesto, para obter a satisfação do seu crédito. Sustenta, ainda, que o autor provavelmente pretende ilidir a prova constituída pelos cheques com a prova testemunhal, o que é inadmissível uma vez que o valor destes excede, em muito, o décuplo do salário mínimo, previsto no art. 401 do CPC. Afirma, no mérito, que desconhece a origem da transação, confirma que fez uso do protesto em razão da inadimplência do autor bem como que este está se utilizando do processo com o fim escuso de frustar o pagamento dos títulos e obter o enriquecimento sem causa, além do que, não demonstrou a fórmula para encontrar o valor de R$ ,00 pleiteado. Citou jurisprudência e requereu o indeferimento da inicial em decorrência do acolhimento da preliminar, a condenação do autor por litigância de má-fé e, no mérito, a improcedência do pedido. Apresentou rol de testemunhas e juntou os cheques acostados à fl. 48. A ré apresentou reconvenção às fls. 49/55. Alega, na inicial da reconvenção, que não feriu nenhum direito do autor reconvindo, uma vez que apenas exercitou um direito colocado pelo Estado à yt Gabinete do Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA 3

4 sua disposição. Alega, ainda, que aquele ajuizou a ação sem razão, o que causou à ré reconvinte tantos danos morais como materiais, uma vez que, para se defender, contratou Advogado por cujos serviços pagou R$ (três mil reais) além de despesas com transporte, tendo o nome da ré reconvinte sido lançado nos arquivos da Justiça do Distrito Federal. Repete os argumentos da contestação, cita vasta jurisprudência e requer a condenação do autor reconvindo ao pagamento dos prejuízos que sofreu no valor dos honorários que a ré reconvinte pagou ao seu advogado e sobre o valor da reconvenção, bem como ao pagamento de danos morais no mesmo patamar pleiteado na ação, ou seja, R$ ,00. Juntou os documentos de fls. 56/58. O autor reconvindo apresentou réplica à reconvenção às fls. 61/78. Apresentou, ainda, contestação à reconvenção às fls. 70/78 na qual alegou, em breve síntese, que está provado o nexo de causalidade entre o protesto indevido efetuado pela ré reconvinte e os danos morais, fato incontroverso nos autos, bem como que a autonomia, a literalidade e demais requisitos dos títulos de crédito não foram objeto de alegações do autor, sendo Jurisprudência citada pela ré é inaplicável ao caso dos autos. Sustenta a sua legitimidade para propor a ação com espeque no art. 76 do CPC, cita doutrina e os julgados nos quais se baseou ara alcançar o valor pleiteado a título de danos morais. Sustenta, ainda, que a ré reconvinte admitiu, na contestação, Ter efetuado o protesto, que é suficiente par embasar a ação, sendo descabida a alegação de prejuízo sofrido pelo fato de o nome da ré constar dos arquivos judiciários do TJDFT. Ratificou os termos da petição inicial e requereu o julgamento antecipado da lide. Cópia da exceção de incompetência às fls. 80/82. Foi realizada audiência de conciliação que transcorreu conforme o termo de fl. 85. Acrescento que a MM Juíza de 1º grau julgou improcedente o pedido formulado pelo autor condenando-o ao pagamento das custas processuais e honorários advoca- yt Gabinete do Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA 4

5 tícios fixados em R$ 300,00 (trezentos reais). Julgou, ainda, igualmente improcedente o pedido formulado na reconvenção e condenou a ré reconvinte a pagar as custas processuais e honorários advocatícios da reconvenção, arbitrando-o em R$ 300,00 (trezentos reais). Assim, julgou extinto o processo, com apreciação de mérito, com fundamento no art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil. Irresignado, apelou o autor (fl. 95). Em razões, ratifica os argumentos constantes da inicial e traz entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca da matéria em discussão. Preparo regular à fl A ré apresentou contra-razões (fls. 110/114), pugnando pela manutenção da sentença de 1º grau. É o relatório. V O T O S O Senhor Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA Relator dele conheço. Presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso, O juiz a quo julgou improcedente o pedido formulado pelo autor de indenização por danos morais, condenando-o a arcar com o ônus sucumbencial arbitrado em R$ 300,00 (trezentos reais). O bom entendimento da causa não me permite discordar do juízo singular, vejamos por quê. O cheque, como título de crédito, regido pela Lei Uniforme de Genebra, adotada no Brasil pelo Decreto nº , de 24/01/66, submete-se aos princípios inerentes ao direito cambiário, dentre os quais o princípio da autonomia dos títulos de crédito, o qual reza que as obrigações representadas pelo mesmo título são independentes entre si. Do princípio da autonomia pode-se extrair outros dois princípios: o da abstração e o da inoponibilidade das exceções pessoais aos terceiros de boa-fé. yt Gabinete do Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA 5

6 Pelo que se depreende do princípio da abstração, quando o título está em circulação, este pode circular sem qualquer ligação com a causa a que deu sua origem. Já o princípio da inoponibilidade das exceções pessoais aos terceiros de boa-fé garante a estes a segurança na aquisição do título de crédito. De acordo com tal princípio, não se pode opor exceções pessoais ao possuidor de boa fé, eis que este exercita direito próprio, que não pode ser restringido ou destruído em virtude das relações existentes entre os anteriores possuidores. Assim leciona o professor Rubens Requião 1 em comentário ao princípio da imponibilidade das exceções: "É necessário que na circulação do título; aquele que o adquiriu, mas que não conheceu ou participou da relação fundamental ou da relação anterior que ao mesmo deu nascimento ou circulação, fique assegurado de que nenhuma surpresa lhe venha perturbar o seu direito de crédito por quem com ele não esteve em relação direta. O título deve, destarte, passar-lhe às mãos purificado de todas as questões fundadas em direito pessoal, que porventura os antecessores tivessem entre si, de forma a permanecer límpido e cristalino nas mãos do novo portador. Tal princípio está consagrado, também, no artigo 25 da Lei nº 7.357, de 02 de setembro de 1985, a saber: "Quem for demandado por obrigação resultante de cheque não pode opor ao portador exceções fundadas em relações pessoais com o emitente, ou com os portadores anteriores, salve de o portador o adquiriu conscientemente em detrimento do devedor. yt Gabinete do Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA 6

7 A propósito, registro entendimento deste egrégio Tribunal de Justiça acerca da questão ora analisada: TÍTULO DE CRÉDITO - AUTONOMIA E ABSTRAÇÃO - I- NOPONIBILIDADE DAS EXCEÇÕES PESSOAIS - PORTADOR DE BOA FÉ - FACTORING - PRESCRIÇÃO. SÃO INOPONÍ- VEIS CONTRA PORTADORES DE BOA FÉ, ASSIM CONSIDE- RADOS OS QUE SE DEDICAM, LICITAMENTE, À ATIVIDA- DE DE FACTORING, AS EXCEÇÕES DE CARÁTER PESSOAL, ESPECIALMENTE AS QUE DIGAM RESPEITO À INEXECUÇÃO DO CONTRATO QUE DEU ORIGEM AO CHEQUE REGULARMEN- TE TRANSFERIDO. PRESCRITA A AÇÃO CAMBIAL, JUSTI- FICA-SE O MANEJO DA AÇÃO MONITÓRIA PARA SE OBTER A EFICÁCIA EXECUTIVA DO TÍTULO, PERDIDA PELO DE- CURSO DO TEMPO (APC DF,07/12/1998,4ª Turma Cível, Relator.Des. Mário Machado, 12/05/1999,pág.57). No caso em tela, o negócio jurídico foi realizado entre o a- pelante e a empresa Model Cozinhas LTDA., que, segundo consta da inicial, descumpriu o acordado não entregando os armários no prazo avençado. Das provas carreadas aos autos pode-se inferir que o cheque foi regularmente transferido para a apelada - empresa de factoring - a qual não teve qualquer ligação com o negócio que deu causa à presente ação, ou mesmo com a ilicitude do negócio. Depreende-se, também, que o cheque já estava em circulação no momento da sustação. Desse modo, conclui-se que a apelada é "terceiro de boafé", razão por que, de acordo com os princípios supracitados, não se podia exigir comportamento diverso da apelada a não ser o de protestar os títulos que estavam em seu poder, eis que exercia direito próprio. Por essa razão, não procede a presente ação de indenização por danos morais em desfavor da empresa MIDAS FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA. 1 In Curso de Direito Comercial, 2º volume, editora Saraiva, 1993, pág yt Gabinete do Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA 7

8 Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO e MAN- TENHO ÍNTEGRA A SENTEÇA de primeiro grau pelos seus próprios fundamentos. É como voto. A Senhora Desembargadora HAYDEVALDA SAMPAIO - Revisora Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Cuida-se de Ação Anulatória cumulada com Indenização proposta por ROBERTO BASTITÃO SALIBA em desfavor de MIDAS FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA, pleiteando a anulação de protestos de títulos de crédito e a condenação da Ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ ,00 (cento e setenta e cinco mil reais). A MMa. Juíza julgou improcedente o pedido, bem como a reconvenção. Contra a primeira decisão, insurge-se o Apelante, reiterando os argumentos constantes da contestação. Razão não assiste ao Apelante, pois, como bem assinalou a douta Magistrada, como título de crédito, o cheque submete-se aos princípios cambiários, dentre eles, o da abstração segundo o qual, os direitos decorrentes do título não dependem do negócio que deu lugar à emissão do título, denominado negócio jurídico fundamental ou subjacente, ou, ainda, relação jurídica fundamental. Acrescentou, ainda, que os títulos de crédito regem-se, a- inda, por outro princípio de grande relevância para o Direito Cambiário: o princípio da autonomia, segundo o qual as obrigações assumidas por alguém no título não se vinculam nem se subordinam a nenhuma outra, ou seja, são autônomas, independentes, Consequentemente, cada obrigado se obriga não apenas com a pessoa a quem transfere o título mas com o portador da cártula, seja ele quem for. yt Gabinete do Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA 8

9 Com efeito, considerando a autonomia de que gozam os títulos de credito, quando postos em circulação, ao terceiro de boa-fé não podem ser opostas as exceções pessoais que porventura possa ter o devedor junto ao primitivo credor. Como a Apelada não participou do negócio jurídico realizado pelo Apelante com Loja Model Cozinhas Ltda, não constitui qualquer ilegalidade o protesto dos títulos. Não há que se falar, em conseqüência, em dano moral a ser reparado. Pelos motivos expostos, nego provimento ao recurso. É como voto. O Senhor Desembargador DÁCIO VIEIRA - Vogal Com a Turma. D E C I S Ã O Conhecido. Negou-se provimento. Unânime. yt Gabinete do Desembargador ASDRUBAL NASCIMENTO LIMA 9