A INFLUÊNCIA DA LINGUAGEM PARA A CONSTITUIÇÃO DAS RELAÇÕES HUMANAS NO CONTEXTO EDUCATIVO SEGUNDO A TEORIA DE HUMBERTO MATURANA
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1 A INFLUÊNCIA DA LINGUAGEM PARA A CONSTITUIÇÃO DAS RELAÇÕES HUMANAS NO CONTEXTO EDUCATIVO SEGUNDO A TEORIA DE HUMBERTO MATURANA Pâmela Negri Tedesco 1 IFSC, Campus de Xanxerê Eixo Temático 2: Educação, Ambiente e Economia Resumo Este artigo tem por objetivo compreender os reflexos da linguagem no contexto educativo como um processo de construção consensual nas relações de viveres na perspectiva de Humberto Maturana. Assim sendo, os procedimentos metodológicos adotados foram, a pesquisa bibliográfica, em nível explicativo, seguida de uma abordagem qualitativa, com a inclusão da análise de conteúdo. Concluise que em perspectiva da multidisciplinariedade é possível aprofundar os viveres nas relações humanas como um experienciar na amorosidade para constituição relações de sensibilidade em um profundo auto-respeito de si e do Outro, como formas colaborativas de ser Ser Humano no contexto da educação. Palavras-chave: Maturana. Linguagem. Educação. 1. INTRODUÇÃO A presente investigação busca compreender a formação humana por meio da linguagem nos processos de construção social na perspectiva de Humberto Maturana. O contexto da pesquisa se justifica no autor que pode ser considerado um estudioso que nos desafia a sairmos da passividade, do conforto, rumo a um caminho estimulante, que é a procura da compreensão do ser humano como ser vivo. Além disso, sabe-se que um dos fatores primordiais para que seja possível uma interação social entre os sujeitos constituintes de uma sociedade é a linguagem. Nesses termos a questão central deste estudo se configura na seguinte problemática: Qual é a influência da linguagem para a constituição das relações humanas no contexto educativo, segundo a teoria de Humberto Maturana? 1 Graduada em Letras Português / Inglês pela Universidade do Oeste de Santa Catarina, Campus de Xanxerê (Unoesc). Pós Graduanda em Concepções Multidisciplinares de Leitura pelo Instituto Federal de Xanxerê (IFSC). pamectedesco@gmail.com Revista Conversatio ISSN Vol. 3 Número 6. Jul/Dez página 326
2 Entendemos que a linguagem surge como uma possibilidade, dada a condições biológicas, e se desenvolve mediante o contexto em que estamos envolvidos. Nessa perspectiva o objetivo geral desta pesquisa consiste em identificar a característica chave da linguagem, que se constitui e se modifica de maneira tão radical nos domínios comportamentais humanos, possibilitando novos fenômenos, como a reflexão e a consciência embasadas nos escritos de Humberto Maturana. Já os objetivos específicos se constituem nos seguintes questionamentos: a) Analisar como surgiu a linguagem na perspectiva teórica de Humberto Maturana b) Compreender como se estabelecem as relações entre a linguagem e a sociedade, especificamente no contexto escolar (aula de filosofia) c) Observar a interferência do meio na aquisição/constituição da linguagem. Neste sentido, o ponto de partida ocorre nas constatações de Humberto Maturana, como possibilidade de compreensão da constituição do linguajar nos processos formativos dos seres humanos. Em um segundo momento procura-se apresentar como o pensamento de Maturana pode ser aplicado aos contextos educativos para evitar a compartimentação do ensino que nos impõe rumo a uma fragmentação da formação do ser humano. Além disso, serão trazidas as diferenças básicas entre a cultura matrística e a cultura patriarcal ou matriarcal. Sendo que, a diferença básica reside no fato de que a cultura patriarcal/matriarcal está centrada nas relações de dominação e submissão, exigências, desconfianças e controle. De outro modo, uma cultura matrística, que vem a ser antecessora da cultura patriarcal/matriarcal, está centrada em relações de muito respeito e, portanto, de colaboração. Na cultura patriarcal/matriarcal não há colaboração, o centro, o fundamental é a relação de dominação e submissão. 2. REVISÃO DA LITERATURA Humberto Maturana é um biólogo Chileno, nasceu no ano de 1928, em Santiago. Iniciou seus estudos em medicina na Escuela de Medicina de La Universidad de Chile (1948), dando continuidade ao curso na Inglaterra (1954). Em 1958, obteve o título de PHD em Biologia na Universidade de Harvard. Recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Livre de Bruxelas, o Prêmio McCulloch da Sociedade Americana de Cibernética e o Prêmio Nacional de Ciências da Academia Nacional de Ciências do Chile. Em 1960, no Chile, Maturana estudava os fenômenos de percepção da cor, perguntando-se: O que ocorre no fenômeno da percepção? Qual é a organização da vida ou o que é vida? No final desse período, já havia conseguido articular estes dois aspectos: a Revista Conversatio ISSN Vol. 3 Número 6. Jul/Dez página 327
3 cognição e o processo de viver com um único e mesmo fenômeno. Maturana (1997a, p. 42) destaca: [...] quando digo que conhecer é viver, e viver é conhecer, o que estou dizendo é que o ser vivo, no momento em que deixa de ser congruente com sua circunstância, morre. Ou seja, quando acaba seu conhecimento morre. Humberto Maturana, entre outros autores como Edgar Morin e Gregory Bateson, empenhou-se em estudos que transcendem o caráter objetivista e organicista do pensamento sistêmico tradicional e propõe o estudo da realidade a partir de uma perspectiva sistêmica que é processual e contextual. Os sistemas vivos são encarados como totalidades integradas, suas propriedades são propriedades do todo e não podem ser reduzidas a partes menores, o que envolve relações de organização das partes em um mesmo sistema. O pensamento sistêmico surgiu em 1950, a partir das proposições da teoria dos sistemas com Ludwing Von Bertalanffy ( ), biólogo austríaco. O seu objetivo era abandonar a prática do reducionismo e da fragmentação, na tentativa de encontrar uma forma unificada de fazer ciência. Maturana (1997a) afirma que uma visão sistêmica de mundo não se limita às atividades de cunho científico, mas voltase, além de inúmeros outros aspectos, ao social, a um contexto mais amplo da vida do sujeito. De um modo geral, o pensamento sistêmico (ROSSETTO, 2010, p. 2 4). A concepção sistêmica vê o mundo em termos de relações de integração. Os sistemas são totalidades integradas, cujas propriedades não podem ser reduzidas às de unidades menores. Todo e qualquer organismo desde a menor bactéria até os seres humanos, passando pela imensa variedade de plantas é uma totalidade integrada e, portanto, um sistema vivo (PISTÓIA, 2009, p. 69). Maturana estabelece um entrelaçamento permanente e contínuo entre o biológico, o social e o cultural ao dizer que os seres vivos e o mundo não podem ser vistos em separado, mas em constantes interações, isto é, [...] os indivíduos em suas interações constituem o social, mas o social é o meio em que esses indivíduos se realizam como indivíduos, [...] não há contradição entre o individual e o social, porque são mutuamente gerativos (MATURANA, 1997a, p. 43). Refere-se ao ser humano como um ser vivo autônomo, autoprodutor, que não foi criado para receber as informações passivamente. Conforme o autor, para compreender a história evolutiva do humano, é preciso que realizemos considerações sobre o modo de vida que ao conservar-se tornou possível a origem da linguagem e o modo de vida que surgiu com ela, e que por se manter até hoje nos caracteriza pela linhagem humana que nos constitui. Maturana, explicita o caráter comportamental da linguagem quando afirma que: a Revista Conversatio ISSN Vol. 3 Número 6. Jul/Dez página 328
4 linguagem é um fenômeno, como um operar do observador, não ocorre na cabeça nem consiste num conjunto de regras, mas ocorre no espaço de relações e pertence ao âmbito das coordenações de ação, como um modo de fluir nelas. Se minha estrutura muda, muda meu modo de estar em relação com os demais e, portanto, muda meu linguajar. Se muda meu linguajar, muda o espaço do linguajeio no qual estou, e mudam as interações das quais participo com meu linguajeio. Mas a linguagem se constitui e se dá no fluir das coordenações consensuais de ação, e não na cabeça, ou no cérebro ou na estrutura do corpo, nem na gramática ou na sintaxe. ( MATURANA, 1999, p. 28 ) O autor faz uso do termo linguajar para enfatizar o caráter de atividade, de comportamento, para evitar que o termo seja unicamente associado a uma competência própria do ser humano, como tradicionalmente se faz. Neste sentido, buscando outra maneira de fazer ciência, conhecimento, filosofia e educação, o autor parte da compreensão do fenômeno biológico humano como um fenômeno que não ocorre somente no corpo e na fisiologia, mas que opera no entrelaçamento das mudanças na fisiologia e nas relações que vivemos. Maturana e Varela ressaltam que [...] nada mais difícil de entender e aceitar do que a espontaneidade dos fenômenos biológicos, em uma cultura como a nossa, orientada ao explicar propositivo ou finalista do todo relacionado com o vivo (MATURANA; VARELA, 1995, p. 27). Os autores argumentam que o que predomina nas explicações da biologia tradicional são formulações metafóricas espelhadas em suposições culturais racionalistas, propositivas e finalistas. De acordo com Maturana a definição de seres vivos sistêmicos resolve o problema da dicotomia entre seres só biológicos ou só racionalistas. E na interação destas duas áreas de conhecimento que se forma um ser completo e capaz de conhecer. Logo, o contexto que se apresenta sobre nos causa influencia e determina uma boa parte de nosso comportamento e aprendizagem. Isso se aplica a linguagem que é o objeto desta pesquisa, aprendemos primeiro a imitar os sons, depois tentamos reproduzir o que escutamos e quando dominamos as palavras começamos a expor nossos sentimentos. Segundo Maturana, toda a realização humana se estabelece na linguagem e, ao mesmo tempo, toda realização humana se dá a partir de uma emoção; sendo que nada humano acontece fora dessas duas instâncias, resultando que os humanos vivem sempre em um conversar. Sendo que para ele, a palavra conversar vem da união de duas raízes latinas: CUM, que quer dizer com e VERSARE, que quer dizer dar voltas com o outro. (MATURANA, 1999, p. 167). Revista Conversatio ISSN Vol. 3 Número 6. Jul/Dez página 329
5 As relações entre os componentes que definem uma unidade composta como uma unidade simples de um dado tipo constituem sua organização. Portanto, a organização de uma unidade composta define sua identidade de classe e conservase como um conjunto invariante de relações, ao conservar sua identidade de classe. Se organização de uma unidade composta muda, sua identidade de classe muda e a unidade original se desintegra (MATURANA, 1997a, p. 83). Sobre a perspectiva do autor, a cultura se define por uma grande rede de conversações que caracterizam modos de viver. Sendo importante ressaltar o fato de que participamos de várias conversações e existimos como humanos no entrecruzamento de várias conversações e estas exercem conseqüências em nossa dinâmica corporal e as modificações corporais exercem influências nas emoções, que trazem mudanças na linguagem, gerando novas formas no fluir das conversações. (COSTAS et al., 2002, p. 73). Para Maturana e Varela (2001), uma organização autopoiética se expressa em uma unidade autopoiética celular, em que seus componentes deverão estar dinamicamente relacionados em uma rede contínua de interações, ou seja, rede de produções de componentes, na qual esses elementos produzem o sistema circular que os produz. [...] a autopoiesis sucede en un domínio en el cual las interaciones de los elementos que los constituyen producen elementos del mismo tipo [...] (p. 124). A célula inicial que funda um organismo constitui sua estrutura inicial dinâmica, aquela que irá mudando como resultado de seus próprios processos internos, num curso modulado por suas interações sociais. Segundo uma dinâmica histórica na qual a única coisa que os agentes externos fazem é desencadear mudanças estruturais determinadas nessa estrutura. O resultado de tal processo é um devir de mudanças estruturais contingente com as sequências de interações do organismo que dura desde seu início até sua morte como um processo histórico, porque o presente do organismo surge em cada instante como uma transformação do processo do organismo nesse instante. O futuro de um organismo nunca está determinado em sua origem. É com base nessa compreensão que devemos considerar a educação e o educar (MATURANA, 1997b, p. 28). 3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para a execução deste trabalho serão utilizados alguns elementos primordiais na realização de pesquisas científicas. Num primeiro momento será realizada uma Revista Conversatio ISSN Vol. 3 Número 6. Jul/Dez página 330
6 pesquisa bibliográfica das obras de Humberto Maturana para compreensão da origem da linguagem de acordo com o pensamento do autor, objetivando reunir dados e informações que servirão de base na construção da proposta a partir do tema. Ao passo que, num segundo momento será utilizado o método da abordagem qualitativa que, preocupa-se em conhecer a realidade segundo a perspectiva dos sujeitos participantes da pesquisa, sem medir ou utilizar elementos estatísticos para análise dos dados (ZANELLA, 2007, p. 99). Será enfatizado o caráter subjetivo dos sujeitos analisados. Visto que, a proposta contempla um estudo de caso por meio da observação no contexto educacional, com estudantes pertencentes ao ensino fundamental: A Observação Participante é realizada em contacto direto, frequente e prolongado do investigador, com os atores sociais, nos seus contextos culturais, sendo o próprio investigador instrumento de pesquisa. Requer a necessidade de eliminar deformações subjetivas para que possa haver a compreensão de factos e de interações entre sujeitos em observação, no seu contexto. É por isso desejável que o investigador possa ter adquirido treino nas suas habilidades e capacidades para utilizar a técnica. (CORREIA, 1999, p. 31) Assim sendo, seguindo os direcionamentos da abordagem qualitativa, o enfoque será na pesquisa a observação participante. Sobre o ponto de vista de que cada sujeito analisado possui uma existência na linguagem e na comunicação e não há a existência de um conhecimento sem a interferência de quem o constitui e a sala de aula é um espaço de convivência e de aceitação recíproca. Por fim, serão avaliados os resultados referentes à compreensão das relações humanas no contexto educativo por meio da linguagem utilizando como base o pensamento de Humberto Maturana. THE INFLUENCE OF LANGUAGE FOR THE CONSTITUTION OF HUMAN RELATIONS IN THE EDUCATIONAL CONTEXT ACCORDING TO THE THEORY OF HUMBERTO MATURANA Abstract This article aims to understand the reflexes of language in the educational context as a process of consensual construction in the relations of living in the perspective of Humberto Maturana. Therefore, the methodological procedures adopted were, the bibliographic research, at an explanatory level, followed by a qualitative approach, with the inclusion of content analysis.it is concluded that in the perspective of multidisciplinarity it is possible to deepen the living in human relations as an experience in the amorousness to the constitution of sensitive relationships in a deep self-respect of self and the Other as collaborative forms of being Human in the context of education. Keywords: Maturana. Language. Education. REFERÊNCIAS Revista Conversatio ISSN Vol. 3 Número 6. Jul/Dez página 331
7 COSTA, Fabiane et al, O processo de construção da linguagem a partir dos aportes de Piaget e Maturana. Educação v.27- n CORREIA, M. C. (1999). A Observação Participante enquanto técnica de investigação. Pensar Enfermagem, 13(2), MATURANA, H. R. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte, MG: UFMG, MATURANA, H. Cognição, ciência e vida cotidiana. Belo Horizonte: UFMG, MATURANA, H. Emoções e linguagens na educação e na política. Belo Horizonte: UFMG, MATURANA, H. R. Moral o ética? Santiago, Chile: Instituto Matriztico, 2007b. Disponível em: MATURANA, H. R. A ontologia da realidade. Belo Horizonte: UFMG, 1997a. MATURANA, H. R.; PÖRKSEN, B. Del ser al hacer. Santiago, Chile: Jcsáez editor, MATURANA, H. R.; VERDEN-ZÖLLER, G. Amar e brincar: fundamentos esquecidos do humano do patriarcado à democracia. São Paulo, SP: Palas Athena, MORIN, E. O Método 3. Porto Alegre: Ed. Sulina, 4ª edição MONTE, M. Gentileza. Memórias, Crônicas e declarações de amor. Rio de Janeiro: EMI, PELLANDA, N. Maturana e a Educação. Belo Horizonte: Pensadores & a Educação. Ed. Autêntica, PEREIRA, M. Z. C. Currículo e Autopoiese. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, ZANELLA, L. C. H. Metodologia de pesquisa. Florianópolis: Departamento de Ciências da administração/ufsc, Revista Conversatio ISSN Vol. 3 Número 6. Jul/Dez página 332
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