PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de Araras, em que é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, são apelados ARLINDO SIMÃO DO NASCIMENTO e WILDSON NOVAIS SILVA. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Presidente), LEME GARCIA E BORGES PEREIRA. São Paulo, 15 de março de Guilherme de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Apelação nº Comarca: Araras Apelante: Ministério Público Apelados: Arlindo Simão do Nascimento e Wildson Novais Silva VOTO Nº Apelação. Violação de direito autoral. DVDs piratas. Pedido objetivando a condenação dos apelados. Laudo pericial por amostragem lacunoso, adstrito aos aspectos extrínsecos das mídias. Ausência de perícia quanto ao eventual conteúdo dos objetos examinados. Materialidade insuficientemente demonstrada. Improvido. Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público contra sentença de primeiro grau (fls. 128), prolatada em 25 de março de 2015, pelo MM. Juiz de Direito, Dr. Rafael Pavan de Moraes Filgueira, da Vara Criminal da Comarca de Araras, que absolveu ARLINDO SIMÃO DO NASCIMENTO e WILDSON NOVAIS SILVA, da conduta delitiva tipificada pelo art. 184, 2º, do Código Penal. Irresignado, o representante do parquet interpôs recurso de apelação pleiteando, em resumo, a condenação dos apelados, ante a suficiência de provas. Em suas contrarrazões, os apelados bateram-se pelo acerto do decisum, salientando a inexistência Apelação nº

3 de provas quanto à aventada violação. A douta Procuradoria Geral de Justiça, em seu parecer, endossou as razões ministeriais, opinando pelo provimento ao apelo. É o relatório. Devidamente processado, o apelo ministerial não comporta provimento, merecendo subsistir a r. decisão atacada. De plano, faz-se mister ressaltar que a demonstração do delito de violação do direito autoral demanda a elaboração de acurada perícia, como lastro imprescindível à comprovação da materialidade delitiva, inclusive em respeito ao disciplinado pelo art. 158 do Código de Processo Penal. Nem se olvide que o objeto do crime de violação de direito autoral é a obra cujos direitos foram transgredidos, sendo, portanto, infração que deixa vestígios. Não por menos, o exame pericial mostrase indispensável não só à materialidade delitiva, mas, acima de tudo, como elemento fulcral ao juízo de convicção do magistrado, permitindo-lhe decidir de forma escorreita, porquanto escorado em análises e conclusões técnicas. Nesse sentido, vimos nos posicionando: Materialidade do crime: muitas violações de direito autoral deixam vestígios, como ocorre, por exemplo, nos casos de CDs e DVDs falsificados. Por isso, demanda-se, necessariamente, a prova pericial. Na Apelação nº

4 prática, o que se tem verificado é a realização de laudos vazios de conteúdo, indicando, apenas, que houve a falsificação, mas sem a indispensável indicação dos autores e empresas prejudicadas. A prova da existência do delito há de ser completa, sem que se possam aceitar exames mal feitos e incompletos 1. Em semelhante prisma, oportuno colacionar recentes julgados proferidos por este E. Tribunal, perfeitamente amoldáveis ao presente caso, in verbis: Violação de direito autoral. Cópias contrafeitas de CDs e DVDs apreendidas e examinadas somente quanto aos caracteres físicos. Absolvição sumária mantida. Necessidade de perícia quanto ao conteúdo de, ao menos, uma das mídias para caracterização do núcleo do tipo penal. Recurso improvido.(apelação nº , 10ª Câm. Criminal, rel. Francisco Bruno, 08/10/2015, v.u.) 1 NUCCI, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado, Forense, 14ª ed., nota 7-B do art Apelação nº

5 APELAÇÕES. AUTORIA E MATERIALIDADE. ABSOLVIÇÃO POR ATIPICIDADE DO FATO. ADEQUADAÇÃO SOCIAL DA CONDUTA. IMPOSSIBILIDADE. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. POSSIBILIDADE. PROVIMENTO DOS RECURSOS DEFENSIVOS. 1. O crime de violação de direito autoral lesa a indústria fonográfica como um todo, gera enormes prejuízos à arrecadação tributária, e desestimula a produção artística e intelectual nacionais. Portanto, não pode ser considerado socialmente adequado. 2. De outro lado, diante dos elementos probatórios dos autos, e à luz do entendimento prevalente nesta Câmara Criminal Extraordinária (necessidade de perícia no conteúdo de mídias apreendidas ou imprescindibilidade da identificação e oitiva dos titulares dos direitos violados), importa absolver os réus por insuficiência de provas, ressalvado o entendimento diverso deste Relator, que todavia cede ante o princípio da colegialidade. Apelação nº

6 3. Provimento dos recursos defensivos. (Apelação nº , 1ª Câm. Criminal Extraordinária, rel. Airton Vieira, 12/03/2015, v.u.) APELAÇÃO VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL ABSOLVIÇÃO EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO RECURSO MINISTERIAL PROVA DA MATERIALIDADE DELITIVA INSUFICIENTE PERÍCIA ANALISOU APENAS OS ASPECTOS EXTRÍNSECOS DOS CD'S E DVD'S DÚVIDA QUANTO AO CONTEÚDO OU MESMO À EXISTÊNCIA DE CONTEÚDO NAS MÍDIAS - RECURSO MINISTERIAL IMPROVIDO.(Apelação nº , 10ª Câm. Criminal, rel. Nuevo Campos, 26/05/2014, v.u.) Recurso em sentido estrito. Violação de direito autoral (art. 184, 2º, do CP) Denúncia rejeitada Ausência de materialidade Auto de exibição e apreensão que não discrimina os títulos supostamente reproduzidos sem Apelação nº

7 autorização Perícia que não analisou o conteúdo da integralidade dos DVD's e CD's apreendidos, limitando-se a declarálos "sem características de originalidade" Impossibilidade até mesmo de se determinar a vítima Rejeição mantida Recurso não provido. (RESE nº , 4ª Câm. Criminal, rel. Ivan Sartori; Comarca, 16/12/2014, v.u.) Contudo, in concreto, como bem observou o magistrado sentenciante, o singelo laudo sequer avaliou o conteúdo das mídias, não sendo possível descartar a inexistência de gravação, assim ensejando dúvida que, de per si, favorece aos recorridos. Em verdade, de nada importam os aspectos extrínsecos de praxe, tampouco a marca e o tipo dos discos examinados pelo perito que, ao invés disso, poderia aprofundar sua pesquisa e prestar informes quanto à existência ou não de gravações supostamente transgressoras de direitos autorais. Como se não bastasse à ínfima amostragem periciada, ainda pecou o perito pela elaboração de laudo tão raso e sintético, deixando de analisar a possibilidade concreta de reprodução das mídias, tampouco a existência de algum conteúdo capaz de ensejar a violação de direito autoral. Esta Relatoria tem recebido vultosa Apelação nº

8 quantidade de laudos lacunosos, supérfluos, contraditórios ou truncados, demonstrando-se, portanto, imprestáveis à comprovação da violação de direitos autorais, como no caso sub judice. O laudo carreado foi incapaz de fornecer informes quanto aos supostos arquivos contidos nas mídias, não satisfazendo dúvidas quanto à possibilidade de que os CDs fossem virgens, uma vez desprovidos de qualquer gravação. Dessa feita, além da descrição dos aspectos extrínsecos das mídias e da identificação daqueles cujos direitos foram reputados violados, mostra-se imprescindível, pelo menos, a análise da presença de eventual conteúdo no material apreendido. De tal sorte, ante a total ausência de exame quanto ao conteúdo das mídias apreendidas, de rigor a manutenção da absolvição dos apelados. Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao apelo ministerial, mantendo, in totum, a r. decisão atacada, por seus próprios e jurídicos fundamentos. GUILHERME DE SOUZA NUCCI Relator Apelação nº