Habeas Corpus n , da Capital Relator: Des. Luiz Cézar Medeiros DESPACHO
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- Lavínia Faria Salazar
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1 Habeas Corpus n , da Capital Relator: Des. Luiz Cézar Medeiros DESPACHO 1 João Henrique Bergamasco impetrou habeas corpus preventivo em seu nome contra o Secretário de Segurança Pública e Defesa do Cidadão do Estado de Santa Catarina, requerendo "seja concedida a ordem liminarmente para o fim de deferir ao Paciente o direito de negar-se a imposição ao teste de alcoolemia (bafômetro) em diligência policial, e não seja conduzido, nem obrigado a comparecer em repartição policial, nem seja lavrada multa, muito menos penalidade administrativa de suspensão do direito de dirigir e nem seja apreendido o veículo, SALVO EM CASO DE EMBRIAGUEZ VISÍVEL COM DIREÇÃO ANORMAL E PERIGOSA e, em sede de mérito, confirmada, com a conseqüente expedição de Salvo-Conduto, evitando a concretização da ameaça ao direito de locomoção do paciente" (fl. 6). 2 Primeiramente, necessário declarar o cabimento da presente medida para evitar a inconstitucional coação à liberdade do cidadão (CF, art. 5º, LXVIII). Alinho-me àqueles que emprestam exegese mais dilargada ao preceito constitucional em apreço. A garantia patrocinada pela via do habeas corpus não se cinge simplesmente à locomoção na acepção de ir e vir. Ela assegura acima de tudo a liberdade de agir ou não agir; evita, no sentido físico da locução, a que o indivíduo seja obrigado a fazer algo que não queira, ou mesmo a não fazer algo a que não esteja impedido por lei e principalmente pela Constituição da República. Essa é a questão; a Lei n /2008 impõe, mesmo sem motivos justificadores, a que o cidadão se submeta ao "teste do bafômetro", sob pena de automaticamente ser alvo de rigorosas sanções. Mesmo demonstre ele, depois da negativa, que não havia ingerido qualquer dosagem de bebida alcoólica, a multa será irreversível. Noutros termos, há manifesta coação para que o motorista faça algo a que não deveria estar obrigado, a menos, repita-se, que a exigência se justificasse. Como visto, não se está atacando as sanções administrativas? multa, apreensão do veículo e da carteira de habilitação?, o que seria viável somente em mandado de segurança, e sim o ato coativo imposto pela novel legislação.
2 E frise-se, se a violação do direito fundamental constitucional é fundada em ato ilegal, é mais um motivo a corroborar a pertinência de habeas corpus preventivo. A Suprema Corte já se manifestou no sentido da admissibilidade de habeas corpus para evitar coação ou ameaça indireta à liberdade individual: "CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS: CABIMENTO. INCONSTITUCIONALIDADE INCIDENTER TANTUM. I. - Não é somente a coação ou ameaça direta à liberdade de locomoção que autoriza a impetração do habeas corpus. Também a coação ou a ameaça indireta à liberdade individual justifica a impetração da garantia constitucional inscrita no art. 5º, LXVIII, da C.F. II. - Possibilidade da discussão da constitucionalidade de norma legal no processo do habeas corpus. Precedentes do STF. III. - Recurso provido" (RHC n , Min. Carlos Velloso). 2 Trânsito Brasileiro: 3 A respeito da matéria em discussão, dispõe o Código de "Art Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº , de 2008) "Infração - gravíssima; (Redação dada pela Lei nº , de 2008) "Penalidade - multa (cinco vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses; (Redação dada pela Lei nº , de 2008) "Medida Administrativa - retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação. (Redação dada pela Lei nº , de 2008) "Parágrafo único. A embriaquez também poderá ser apurada na forma do art "Art Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de dirigir sob a influência de álcool será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado. "[...] 3º Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo (Incluído pela Lei nº , de 2008)" (Grifou-se). Da análise isolada do 3º do art. 277 do Código de Trânsito
3 Brasileiro pode-se concluir que as penalidades administrativas previstas no art. 165 do referido Código são aplicadas automaticamente em caso de negativa à submissão ao teste de acoolemia ou a outros exames congêneres. Esse entendimento, porém, como argumenta o impetrante, de fato afrontaria direitos constitucionais expressamente previstos no art. 5º. A própria legislação especial esclarece que "as penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação do documento de habilitação serão aplicadas por decisão fundamentada da autoridade de trânsito competente, em processo administrativo, assegurado ao infrator amplo direito de defesa" (CTB, art. 265). Porém, necessário ressaltar que a ilegalidade da exigência é verificada somente nos casos em que o condutor do veículo apesar de não aparentar encontrar-se sob a influência do álcool? pois a suspeita de alcoolização é pressuposto expressamente previsto no Código de Trânsito Brasileiro, art. 277, caput? e, como consectário da negativa de submeter-se ao teste de alcoolemia, suporta as penalidades administrativas que lhe são impostas automaticamente. Portanto, não há qualquer abuso ou ilegalidade, quando o motorista demonstra estar sob a influência de álcool e, mesmo sem se submeter ao teste de alcoolemia? cuja imposição conforme dito é ilegal, pois ninguém pode ser obrigado a produzir prova contra si mesmo?, é impelido às penas administrativas, com fundamento no 2º do art. 277 do Código de Trânsito Brasileiro, sob as formalidades previstas no art. 2º da Resolução n. 206/2006 do Conselho Nacional de Trânsito? Contran. Nessa hipótese, frise-se, o procedimento tomado é acautelatório, com o objetivo de evitar a concretização dos riscos que a conduta representa. O que se visa tolher com a presente medida é a penalização administrativa de condutores que, apesar de não se submeterem ao teste de alcoolemia, demonstram estar absolutamente aptos a conduzir seus veículos. Nesses casos não há a necessidade e nem a obrigatoriedade por parte da autoridade de trânsito de aplicar as penas administrativas previstas no art. 165 do Código de Trânsito Brasileiro. Interessante o raciocínio do Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Rizzatto Nunes, a respeito da questão ora enfrentada: "Veja o caso da atual e chamada lei seca e das ações praticadas contra os cidadãos de bem. A pessoa é parada na via pública pela polícia, apenas e tão somente porque acabou de sair de um restaurante. Pergunto: qual o elemento objetivo e legal que permite esse tipo de abordagem? Nenhum. Não há suspeita, não há comportamento perigoso, não há desvio de conduta nem manobra capaz de causar dano a outrem. "Há, apenas, o fato de estar dirigindo um veículo após ter saído de um estabelecimento comercial ou nem isso: apenas porque está passando naquele local naquele momento. Isto é, trata-se de uma circunstância 3
4 corriqueira de exercício da cidadania. Nessas condições a abordagem é ilegal. É assombroso, para dizer o mínimo. "De onde o Estado extrai o direito de evitar a locomoção de um pai de família que sai para jantar com sua esposa ou filhos? Ou com amigos, depois de um árduo dia de trabalho? "Dou exemplo de quando é possível a abordagem: se a pessoa entra cambaleando num veículo para dirigi-lo, eis o dado objetivo. Nesse caso o policial é testemunha ocular e tem o dever de agir. Ou, se o veículo faz zigue-zague na rua, é preciso pará-lo. Na verdade, se é para fazer blitz, então é muito mais simples manter policiais em cada porta de bar, danceteria, boate, discoteca, rave ou o que seja e impedir que o ébrio entre no veículo. "Mas, se a pessoa está na rua livremente, apenas exercendo seu direito de locomoção assegurado constitucionalmente, não pode ser abordado e nem se lhe pode impingir conduta que ele não se disponha a fazer, sem base objetiva para tanto, como por exemplo, exigir o teste do bafômetro" (Disponível em: < Consulta em ) (Grifou-se). 4 No mesmo sentido, entende o jurista Luiz Flávio Gomes, ao comentar a nova redação do art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro: "O que significa estar 'sob a influência' de uma substância psicoativa? O estar 'sob influência' exige a exteriorização de um fato (de um plus) que vai além da embriaguez, mas derivado dela (nexo de causalidade). Ou seja: não basta a embriaguez (o estar alcoolizado), impõe-se a comprovação de que o agente estava sob 'sua influência', que se manifesta numa direção anormal (que coloca em risco concreto a segurança viária). Note-se, não se exige a prova de risco concreto para uma pessoa determinada. Não é isso. Basta que a direção tenha sido anormal (em zig-zag, v.g.): isso já é suficiente para se colocar em risco a segurança viária. Em outras palavras: não se trata de um perigo concreto determinado (contra pessoa certa), sim, de um perigo concreto indeterminado (risco efetivo para o bem jurídico coletivo segurança viária, mesmo que nenhuma pessoa concreta tenha sofrido perigo)" (Disponível em < Consulta em ). Verificados, portanto, os requisitos autorizadores da medida liminar em habeas corpus, ante o fundado receio de aplicabilidade da Lei n /2008 em dissintonia com os preceitos constitucionais aplicáveis.
5 4 Ressalto, ainda, que respeito as razões expostas pelo eminente Desembargador Vanderlei Romer ao indeferir a liminar pleiteada no Habeas Corpus n , mas não concordo com a afirmação de que a subjetividade da aferição de estar o motorista sob a influência do álcool traria dificuldade intransponível no caso concreto (HC n ). Evidente que o juiz dessa aferição seria a autoridade de trânsito que, no caso de abuso, responderá pelo seu ato. O relevante é que o motorista pelo menos terá a chance de provar que não estava sob efeito do álcool e, nos termos da ordem, afastar a imotivada multa pela compulsoriedade da submissão ao "bafômetro". Por derradeiro, o fato de alguém "cometer um homicídio em acidente de circulação, com salvo-conduto da Justiça em baixo do braço", significaria apenas que a exemplo do que sempre ocorreu e continua ocorrendo, houve falha na fiscalização? por impossibilidade ou por incúria da autoridade de trânsito? já que o salvo-conduto apenas impede a aplicação das sanções administrativas por quem se nega ao teste de alcoolemia sem apresentar "qualquer sinal exterior de embriaguez", ou seja, o cidadão sério, cumpridor de seus deveres e cônscio das responsabilidades inerentes à direção de veículos. 5 5 Assim sendo, defiro a liminar para que o paciente não seja automaticamente penalizado administrativamente (CTB, arts. 165 e 277, 3º) tão-somente pelo fato de se recusar a se submeter ao exame de alcoolemia, salvo se aparentar estar sob a influência de álcool. Justiça. Notifique-se o impetrado para que preste as informações. Após, remetam-se os autos à douta Procuradoria-Geral de Intimem-se. Florianópolis, 5 de agosto de Luiz Cézar Medeiros RELATOR
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