NO TEATRO HÁ PERSONAGEM OU PESSOA? 1
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- Bruna Duarte Almada
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1 NO TEATRO HÁ PERSONAGEM OU PESSOA? 1 d.o.i / v1n10p250 HERLAN JOSÉ TENÓRIO FERREIRA 2 (UPE) RESUMO: O mundo de possibilidades (verossímil) pertence à personagem, ao ser fictício, pois o autor cria suas personagens a partir das pessoas que estão em seu meio, por isso será verossímil, próximo da realidade, que se faz valer a partir do espetáculo, da dramatização do texto escrito, uma vez que o teatro foi feito pra ser visto, ser sentido, é transformado em livro por questão de transporte e difusão da obra. (TAVARES, 2005) Ao ler um livro percebe-se que as palavras vão se encaixando e formando a figura de uma pessoa, ou melhor, uma figura dramática, uma personagem. A leitura atrelada ao conhecimento de mundo é que vai fazer com que as personagens sejam perfeitas para cada leitor; os recursos usados pelo autor fazem as personagens se mostrarem aos poucos e tudo passa a fazer sentido 1 Artigo aceito para apresentação no IV Encontro Gêneros na Linguística e na Literatura, realizado no período de 5 a 7 de agosto, em Recife, promovido pela Pós Graduação em Letras da UFPE e pela Pós Graduação em Linguagem e Ensino da UFCG. 2 Atualmente, como discente, faz parte do Programa de Pós Graduação latu senso em Língua Portuguesa e sua Literatura da Universidade de Pernambuco (UPE Campus Garanhuns). Possui artigo publicado no VI Encontro Nacional de Língua Falada e Escrita (ELFE) promovido pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e na XXIV Jornada Nacional do Grupo de Estudos Linguísticos do Nordeste (GELNE). Também possui trabalho apresentado no I Encontro Internacional e II Nacional de Linguística e Literatura: O canto da palavra, promovido pela Universidade de Pernambuco (UPE); Sua área de pesquisa está centrada na análise de textos de literatura oral como: música, teatro e cordel, além de junto a teoria literária analisar fenômenos linguísticos ocorrentes nestes textos. Revista Diálogos N. 10 Novembro de
2 e ficar interligado. Este trabalho tem por tema de debate a personagem do teatro, vivendo em um mundo verossímil que passa a ser real quando se materializa no palco, fazendo com que haja encontro entre observadores e observados, momento este que faz as personagens se tornarem pessoas e, consequentemente, a plateia passa a fazer parte da história. Palavras-chave: Teatro, Personagem, Pessoa, Personalidade. INTRODUÇÃO Quando lemos um livro percebemos que as palavras vão se encaixando e formando a figura de uma pessoa, ou melhor, a formação de uma figura dramática, de uma personagem. A continuação da leitura faz com que você deixe um pouco de lado o físico desta personagem e comece a formar o seu cognitivo, a sua personalidade. Como nos fala Brait (1985, p. 67) Nesse mundo de palavras, nessa combinatória de signos, o leitor vai se alfabetizar, vai ler o mundo e decifrar a sua existência. A leitura atrelada ao conhecimento de mundo é que vai fazer com que as personagens sejam perfeitas para cada leitor, os recursos usados pelo autor fazem as personagens se mostrarem aos poucos e tudo passa a fazer sentido e ficar interligado. O discurso apresentado nos livros literários pode aparecer das mais variadas formas, desde a narração em primeira ou terceira pessoa à um monólogo. As técnicas, os recursos e os critérios utilizados para determinado texto formará a partir, também, das influencias recebidas pelo autor assim como lembra Marcuschi (2008, p. 17): O enunciado ou discurso não é um ato isolado e solitário, tanto na oralidade como na escrita. O discurso diz respeito aos usos coletivos da língua Revista Diálogos N. 10 Novembro de
3 que são sempre institucionalizados, isto é, legitimados por alguma instancia da atividade humana socialmente organizada. É o escritor quem dá condições de suas personagens ganharem vida, atribuindo-lhe valores, características a partir de alguma experiência do cotidiano ou apenas através de sua imaginação. Porém, é na imaginação do leitor que essas personagens vêm à vida tendo não apenas uma característica física, mas ganhando uma personalidade, essa, já pré-definida pelo autor. Assim como na vida real, a personalidade de uma personagem é desenvolvida a partir de fatores genéticos e ambientais. O autor assume o ponto genético e dá o ponta pé inicial as personagens da obra, a partir da sua imaginação ou de alguma vivencia sua, já o fator ambiental desenvolve-se a partir do desenrolar do enredo da obra, no qual, as personagens ganham vida e vão construindo sua própria personalidade, pois como afirma Torres (Apud BRAIT, 1985, p. 72) Engatada a primeira frase, eles, os seres reais que me serviram de ponto de partida para o romance, vão desaparecendo e dando lugar ao que chamamos de personagens. Uma gente que se cria, anda por suas próprias pernas e nos impõe o seu próprio destino. A partir da narrativa, dos recursos linguísticos é que vemos, cada vez mais nítido a personagem se formando e que não é obrigatório que ela seja fictícia. O que quero dizer é que alguns autores se utilizam de pessoas ao seu redor para tomá-las como referencial, seja no modo de falar, de andar, ou comportamental, e assim dando mais realidade e firmando a personagem como sendo mais real, mais humana, fazendo com que o leitor fique mais próximo. Como comenta Suassuna (2010, p. 26) ao se referir ao personagem avarento da peça O Santo e a Porca: (...) foi em Taperoá, com uma pessoa avarenta, por sinal da minha família. (...). Revista Diálogos N. 10 Novembro de
4 RELAÇÃO: PERSONAGEM E PESSOA No que concerne à relação entre personagem e pessoa discute-se muito quanto à existência da primeira, falando-se que esta só existe linguisticamente, que faz parte de um mundo de papel, mundo este que não pode ser imaginado nas entrelinhas de uma obra, sendo apenas permitido ao receptor/leitor imaginar a personagem apenas na maneira como ela é descrita pelo autor. No livro A personagem, Beth Brait traz uma citação do dicionário enciclopédico organizado por Oswald Ducrot e Tzvetan Todorov, no qual, eles trazem uma definição entre a relação pessoa, personagem que diz o seguinte: Uma leitura ingênua dos livros de ficção confunde personagens e pessoas. Chegaram mesmo a escrever biografias de personagens, explorando partes de sua vida ausente do livro ( O que fazia Hamlet durante seus anos de estudo? ). Esquecese que o problema da personagem é antes de tudo linguístico, que não existi fora das palavras, que a personagem é um ser de papel. Entretanto recusar toda relação entre personagem e pessoa seria absurdo: as personagens representam pessoas, segundo modalidade de ficção. (DUCROT; TODOROV; Apud BRAIT, 1985, p. 11) Assim, a personagem torna-se pessoa, um ser social a partir da linguagem. É tomando essa ideia como pressuposto que afirmamos que o mundo é reflexo de nosso conhecimento e, é nesse âmbito também que podemos elencar a personagem como Revista Diálogos N. 10 Novembro de
5 sendo um produto da linguagem, não como um simples processo de criação, inventado pelo autor, mas como uma imagem, uma reprodução da realidade, já que, as palavras ali dispostas no papel vão influenciar de algum modo, tanto, na vida do autor quanto na vida do receptor, sendo este atingido com maior impacto, pois, além de processar os discursos que ali estão ainda precisará em certo grau do processo de inferência, este essencial para uma boa compreensão da obra. É seguindo essa premissa que verifica-se que permeia um imenso elo entre pessoa e personagem, percebe-se essa relação, como sendo, um processo rotativo que tem como ponto inicial o individuo / pessoa e vai prosseguindo até a personagem e retorna para o mesmo ponto de onde surgiu. Assim, não podemos desassociar ser vivo de ser fictícia, pessoa de personagem, pois todos estão interligados. Quando observamos o diagrama, vemos que entre o ser vivo e a personagem está o autor, pois os seres vivos que rodeiam o autor irão influenciá-lo no momento da construção de suas Revista Diálogos N. 10 Novembro de
6 personagens. A sociedade, também, irá influenciar o autor e de acordo com suas intenções é que iremos perceber a sua formação ideológica, seja ela machista ou feminista; religiosa ou materialista; porém, algumas vezes, essa ideologia poderá ser mostrada como sendo alvo de crítica, como sendo posta em posição contrária à ideia do autor, o que irá determinar é a sua intenção com a obra. O mundo de possibilidades (verossímil) pertence à personagem, ao ser fictício, pois o autor, influenciado pela sociedade em que vive, vai criar as personagens a partir das pessoas que estão em seu meio, por isso será verossímil, próximo da realidade, que se faz valer a partir do espetáculo, da dramatização do texto escrito, pois o teatro foi feito pra ser visto, ser sentido, é transformado em livro por questão de transporte e difusão da obra, logo, as personagens ganham vida, se tornam pessoas, o ambiente (cenário) ganha importância e todos passam a conviver no mundo real, passam a fazer parte da história. Neste diagrama não há fatores dicotômicos, há uma ideia de contrariedade quando falamos em mundo real e mundo de possibilidades, porém, não é uma dicotomia, na verdade esses mundos se complementam, uma vez que as pessoas que vivem no mundo real, ao assistir um espetáculo, irão encontrar personagens vivendo num mundo verossímil e estarão carregadas da ideologia do autor. Agora, há um encontro entre observadores e observados, ambos fazendo parte do mesmo mundo, compartilhando das mesmas vivencias, mesmo que momentâneas; encontro esse que vai fazer com que quem vive no mundo real quer ir para o mundo de possibilidades e quem vive neste se mostra disponível para influenciar quem viaja até ele. Foi através destas ideias que se constituiu este diagrama e, a partir dele teve-se a pretensão de mostrar o quanto o teatro não pode ser desvinculando do mundo real, o quanto ele só pode ser entendido na dimensão do real, pois o homem torna-se racional a partir da linguagem, da influência do meio, como também, a Revista Diálogos N. 10 Novembro de
7 personagem só vem a existir a partir da linguagem, da influência sofrida pelo autor do meio em que vive, assim, a personagem ao ser dramatizada é elevada ao status de pessoa, voltando assim, ao estágio de onde emergiu, passando agora a influenciar e a ser influenciada pelo meio. Assim, cada personagem para cada leitor vai agir de uma forma diferenciada de acordo com seu conhecimento de mundo e a partir da intenção do criador daquela personagem a ideologia vai ser implantada ou não, mas quando a ideologia fica aquela personagem poderá modificar a vida do ser humano. Pensando um pouco sobre o que diz Mário Guidarini (1992) sobre o jogo cênico: Na encenação teatral, o jogo cênico exerce o papel de conectivo entre os atores, representantes dum mundo possível, e os espectadores, provenientes da prática social. Os atores do faz-de-conta emergem dum espaço-tempo criado pelo olhar dos espectadores que aceitam o jogo cênico como dimensão humana do colocar-se no lugar do outro. Como pode ser observado na fala de Guidarini as cenas que compõe o espetáculo teatral serve como ponto de ligação entre atores e espectador, tendo o primeiro a responsabilidade de tornar o mundo imaginário num mundo possível através da encenação, ou como diz Guidarini: jogo cênico. Já o segundo vale-se de sua prática social para captar o que está sendo representado no palco e assim, inserir-se nesse mundo de possibilidades junto com os atores. Todavia, a realidade do mundo verossímil é criada num determinado tempo, num determinado espaço e só existem pelo simples fato do espectador entrar no jogo cênico junto com os atores e esses penetrarem no campo do humano, havendo assim, uma troca de valores, de realidades. Por isso que, ao assistirmos ou lermos uma peça de Ariano Suassuna, dele em especial por suas peças serem a fonte Revista Diálogos N. 10 Novembro de
8 dessa pesquisa, penetramos no mundo idealizado em sua obra com muita facilidade, talvez porque elas foram extraídas, em boa parte, dos contos populares nordestinos, cordel, ou a partir de sua própria vivencia ou pelo simples fatos delas retratarem coisas comum do cotidiano como: a ganância pelo dinheiro, que é o objeto de desejo em algumas de suas principais obras, temor ao divino, adultério, trapaças e mentiras, além de outras coisas do nosso cotidiano. CONSIDERAÇÕES FINAIS Aqui debatemos uma noção da relação entre as personagens e pessoas. Vale ressaltar que, essa não é uma proposta já finalizada, ainda há lacunas a serem vistas, estudadas e pesquisadas para que futuramente, possamos concluir este trabalho, porém, concomitantemente a isso, acreditamos que esta temática é ampla e seu fim, sua conclusão, não ocorrerá de uma hora para outra. Pois o campo da pesquisa na literatura não se faz valer de momentos simples, mas sim de momentos contínuos, construtivos. REFERÊNCIA BRAIT, Beth. A personagem São Paulo: Ática, GUIDARINI, Mário. Os pícaros e malandros de Ariano Suassuna. São Paulo: Ateniense, MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros textuais e ensino: contribuições do interacionismo sócio-discursico. In: KARWOSKI, Acir Mário; GAYDECZKA, Beatriz; BRITO, Karim Siebeneicher (orgs.). Gêneros textuais reflexões e ensino 3 ed. rev. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, Revista Diálogos N. 10 Novembro de
9 SUASSUNA, Ariano. O Santo e a Porca. 23ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, Revista Diálogos N. 10 Novembro de
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