Revista Observatório da Diversidade Cultural Volume 3 Nº1 (2016) Arte
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- Rebeca Gabeira Aldeia
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2 A OBRA PARA PIANO SOLO DE CLAUDIO SANTORO: Ideologia, diversidade cultural e idiossincrasia estilística. Victor Marquine da Fonseca 1 RESUMO Este artigo discorre sobre a relação entre ideologia, idiossincrasia estilística e as diversas fases composicionais encontradas na obra para piano solo de Claudio Santoro. O diálogo intercultural entre compositor e mundo resulta em uma singularidade de estilo composicional, um estilo idiossincrático, expresso pelas diversas fases composicionais. Este será exemplificado em obras escolhidas e analisadas pela relação de uma estética universal, onde será compreendida pela teoria dos topoi e busca identificar estruturas musicais que revelam essa relação dialética. Palavra chave: Claudio Santoro. Diversidade de estilos. Obras para piano solo. ABSTRACT This article discusses the relationship between cultural ideology, stylistic idiosyncrasy, and the diversity of compositional periods present in the work for piano solo by Claudio Santoro. Intercultural dialogue between the composer and the world resulting in a compositional style of uniqueness, one idiosyncratic style, are expressed by the various aesthetic compositional stages, exemplified in the works selected and analyzed the ratio of universal aesthetic that will be understood by topos theory and tries to identify the musical structures that exemplify this dialectical relationship. Keywords: Claudio Santoro. Style diversity. Works for solo piano. 1 Mestrando do Programa de Pós-graduação Música em Contexto, do Departamento de Música da Universidade de Brasília. pablomarquine@gmail.com 8
3 1. IDEOLOGIA, IDIOSSINCRASIA ESTILÍSTICA E AS FASES COMPOSICIONAIS A relação entre o homem e o mundo se estabelece numa inter-relação complexa de micro e macro dimensões, onde a propriedade fenomenológica, quando consubstanciada por uma ideologia, não depreende fronteiras culturais nem estéticas limítrofes para a produção de sentido numa intencionalidade comunicativa. Na verdade, transpassa-as com acuidade emocional e dialética, visto que a essência do discurso e sua intencionalidade significativa tornam-se objetivo principal e a estética se transforma no meio pelo qual a substância ideológica é transmitida e comunicada. Por ideologia defino aqui: [ ] Em geral, portanto, pode-se denominar I. toda crença usada para o controle dos comportamentos coletivos, entendendo-se o termo crença (v.), em seu significado mais amplo, como noção de compromisso de conduta, que pode ter ou não validade objetiva. Entendido nesse sentido, o conceito de I. é puramente formal, uma vez que pode ser vista como I. tanto uma crença fundada em elementos objetivos quanto uma crença totalmente infundada, tanto uma crença realizável quanto uma crença irrealizável. O que transforma uma crença em I. não é sua validade ou falta de validade, mas unicamente sua capacidade de controlar os comportamentos em determinada situação. (ABBAGNANO, 2007) Na Pós-modernidade, o estudo das relações complexas e da ideologia na música adveio de uma mudança de paradigma epistemológico na compreensão da própria música e da própria musicologia, de forma mais abrangente, ao não se limitar ao objeto musical propriamente, mas tentar evidenciar criticamente os detalhes e as teias de significado além da música. Uma tentativa de comprender as vozes de interlocutores, outrora ocultos. O primeiro a fazer o questionamento de uma mudança de paradigma foi Joseph Kerman no livro Contemplating Music: Challenges to Musicology. Neste livro seminal, Kerman aborda questionamentos sobre a pesquisa musicológica bem como a questão crítica além da obra musical: [...] olhar para a arte que tentam levar em conta os significados que esta carrega, o prazer que ela provoca, e os valores que assume para nós, hoje. Uma musicologia crítica lida com peças musicais e com as pessoas que as escutam, com fatos e sensações, com a vida do passado no presente [...] (KERMAN, 1985) Ao se partir da premissa de que a música possui uma qualidade de semiose, permeada de sentido e significado, ela pode ser compreendia como um discurso. Desta forma, a ideologia está no cerne discurso musical do compositor brasileiro Claudio Franco de Sá Santoro ( ), compositor de uma poiesis musical criativa e que teve em sua vida composicional 9
4 6 (seis) períodos estéticos composicionais (MENDES, 2009) que exemplificam a relação de influências estéticas e influências musicais de outros países e que demonstram a força e a paixão em sua música: Serialismo dodecafônico ( ); Período de Transição ( ); Nacionalismo ( ); Retorno ao Serialismo ( ); Período Avant-Garde ( ); Período de Maturidade ( ). Denomino o discurso musical de Claudio Santoro aqui como idiossincrático devido à relação complexa entre homem, ideologia e música, cuja inquietude e relação com diversos metiês musicais e culturais resultaram numa multiplicidade de estilos expressos por distintos paradigmas estéticos; uma idiossincrasia estilística. O principal intuito é compreender as especificidades de cada momento estético do compositor em obras escolhidas e identificar em seu discurso musical estruturas estéticas e musicais pertinentes a outros países e a outros contextos estéticos. A palavra topos significa, literalmente, lugar em grego. Os topoi (do latim, significa Tópico) ou lugares retóricos, são expressos na Retórica e na Lógica Aristotélica como lugares comuns para a produção de sentido e persuasão no discurso. Na música, a Teoria Tópica (MONELLE, 2000; 2006;) foi aplicada pela primeira vez por Leonard Ratner ao identificá-las como estilos, tipos ou gestos na música europeia do século XVIII; pode ser compreendida como um meio de análise hermenêutica complexa e intertextual entre as relações de lugares comuns referenciais expressos num conjunto de léxico musical, sua propriedade de compreensão por parte do ouvinte e a formação deste significado estabelecido por um nexus social ao longo do tempo e pertencente a uma determinada época. Essa análise aborda fatores extramusicais como o contexto sócio histórico e, inclusive, a produção de sentido mediante uma acuidade persuasiva no atendimento de expectativas para convencer o ouvinte. 2. OS PERÍODOS COMPOSICIONAIS DE CLAUDIO SANTORO 2.1 Serialismo Dodecafônico Na primeira fase, orientada pelo serialismo dodecafônico, Claudio Santoro dará início a sua carreira como compositor, tendo a oportunidade de ver suas obras estreadas e de pertencer a um metiê dotado de grandes artistas e compositores. Nessa fase destacam-se a utilização de um serialismo particular e de atonalismo livre, oriundo de sua relação com H.J. Koellreuter e a sua adesão ao Grupo Música Viva. 10
5 O primeiro período estilístico de Santoro exibe, como característica mais destacada, a recorrência das possibilidades estruturais inerentes ao método dodecafônico. Ainda que lado a lado com a escrita serial estejam igualmente incluídos, tanto o idioma cromático utilizado nas primeiras obras, ao qual o compositor se refere com as expressões modernismo instintivo ou atonalismo espontâneo, quanto os trechos em que as constrições impostas pela série são desconsideradas, prevalece, neste primeiro período, como uma espécie de característica comum às três vertentes aludidas, uma concepção musical marcada pelo rigor da construção. (MENDES, 2009, pg. 17) 2.2 Período de Transição ( ) O período de transição constitui-se pela introdução a novas perspectivas ideológicas, estéticas particulares e divergentes, e programas sócio-políticos nortearam decisões de caráter estético-estilístico em sua obra musical. As obras para piano solo que pertencem ao período de Transição são: Sonatina n. 1 (01/01/1948); Prelúdio n 4 (1ª Série) (01/1948); Sonata n 2 (03/1948); Prelúdio n 3 (1ª Série) (10/06/1948); Batucada (26/06/1948); Dança (25/07/1950); Prelúdio n 5 (1ª Série) (23/08/1950); Miniaturas (30/10/1950). À segunda fase, constituindo-se um período de transição, é possível identificar a adesão de estruturas tradicionais como o tonalismo e o modalismo, mas constante ainda o uso da linguagem serial dodecafônica, que neste momento tornou-se mais ortodoxa em comparação com a fase inicial. Por volta de 1946, adotando como bandeira o enunciado humanização da nova linguagem, Santoro passa a investir na tese da simplificação estilística com o intuito de proporcionar o acesso de um público mais amplo à sua arte. A partir deste ponto, ao qual se refere como de alta crise, preponderaria uma aproximação gradativa das práticas composicionais mais diretamente ligados à tradição, o que pode ser considerado um prenúncio das características que se solidificariam na fase nacionalista subseqüente. Abrandada em suas sonoridades mais ásperas, a técnica dodecafônica ainda seria útilizada nas primeiras experiências, vindo a desaparecer por completo nas últimas obras do período. (MENDES, 2009, pg. 69) 2.3 Período Nacionalista O período nacionalista é marcado pelo Congresso de Praga de 1948 e sua proposta ideológica, o rompimento com Koellreuter e novos materiais composicionais: modalismo, cromatismo, ostinatos, intercâmbio modal e tonal, polimodalidade e cromatismo polimodal. 11
6 As obras para piano solo que pertencem ao período de Nacionalista são: Dança Brasileira nº1 (05/1951); Dança Brasileira nº2 (05/1951); Peças Infantis (1 a 9) (1951/1952); Paulistanas (1 a 7) (1953); Frevo (08/1953); Toccata (1ª Versão) (18/10/1954); Sonata n. 3 (1955); Sonata n 4 (11/1957); Prelúdios 2ª Série 1 Caderno (1 a 12) (1957 a 1963); *O trem (1958); Prelúdio Tes yeux ( ); Prelúdio Toada (05/1957); Prelúdio (Lento) (12/1958); Estudo n.º1 03/1959; Estudo n. 2 05/03/1960; Prelúdios 2ª Série 2 Caderno (13 a 21) 1963; Prelúdio 08/02/1963. A terceira fase compreende o período nacionalista, influenciado pelo realismo-socialista do Congresso de Praga de 1948, e a adesão a uma linguagem mais popular e representa uma mudança drástica nas estruturas formais e estéticas com vínculo a uma linguagem tradicional, mas não menos idiossincrática que a anterior. Nessa fase, a utilização do tonalismo, modalismo, de ritmos folclóricos, abarcou um costume de utilização de um léxico musical tradicional, mediante os símbolos do que representam o Brasil ou a brasilidade: Lógica conseqüência das transformações estilísticas ocorridas durante o período de transição, o ingresso de Santoro no movimento musical nacionalista está diretamente relacionado à sua participação no II Congresso Internacional de Compositores e Críticos Musicais, evento realizado em Praga, entre os dias 20 e 29 de maio de Se por um lado, parte do material empregado nos anos imediatamente anteriores já antecipava alguns dos elementos que se tornariam característicos nesta nova fase, por outro lado, a conversão definitiva somente ocorreria após a realização do Congresso, momento em que Santoro decide adotar as orientações estabelecidas no evento, sedimentadas nos princípios estéticos do Realismo Socialista. (MENDES, 2009, pg 97) 2.4 Período de retorno ao Serialismo A fase do retorno ao serialismo apresenta mudanças em relação à estética nacionalista e um retorno particular e gradativo aos princípios seriais. As obras para piano solo que pertencem ao período de Retorno ao Serialismo ( ) são: Prelúdio n 14 23/04/1959; Prelúdio n 15 25/04/1959; Prelúdio n 13 (ms. 16) 1963; Prelúdio (Lento) (ms. 17) dedicado a Gisele Santoro 08/02/1963; Prelúdio n 16 03/02/1963; Prelúdio n 17 13/02/1963; Prelúdio n 18 02/1963; Prelúdio n 19 30/08/1963; Prelúdio n 20 01/09/1963; Prelúdio n 21 01/09/1963; Sonatina n 2 03/01/1964. Esta fase de retorno à estética serialista possui em seu cerne a apresentação de uma técnica serial particular, não exemplificando o caráter realmente postulado de um retorno veemente, mas de um trabalho com o material semelhante ao realizado na primeira fase: 12
7 Por volta do início da década de 1960, o percurso estilístico de Santoro seria tomado por um novo ciclo de transformações. Tanto a preocupação em dar livre curso à atualização estilística, quanto à descrença nas antigas convicções ideológicas nutridas durante o transcorrer da fase nacionalista, gradativamente, o trariam de volta à escrita dodecafônica da década de Seguro da autenticidade e do caráter burlesco de suas constantes metamorfoses composicionais, Santoro não deixaria de reconhecer, além da própria inevitabilidade da retomada do serialismo, também o aspecto transitório representado por este novo momento, uma vez que as transformações empreendidas nos discursos musicais terminariam por desaguar nos primeiros ensaios vanguardistas da fase seguinte. (MENDES,2009,pg 141) 2.6 Período Avant-Garde ( ) O período denominado Avant-Garde apresenta mudanças contrastantes em relação ao material sonoro com uma estética vanguardista, experimental, eletroacústica, aleatória, improvisação e se constitui em um momento de renovação ideológica. As obras pertencentes ao Período Avant-Garde são: Intermitências I 05/07/1967; Balada 07/11/1976. A Quinta fase, Avant-Gardes ( ), representa o período de experimentação e aleatoriedade e compreende a criação de Intermitências I, para piano solo, obra de caráter aleatório de preparação singela do piano com um papelão circular. Aqui Santoro terá possibilidades de desenvolvimento de música eletroacústica, desenvolvendo também trabalhos para o cinema: Prosseguindo com as transformações estilísticas verificadas ao longo da primeira metade da década de 1960, Santoro voltaria sua atenção, por volta de 1966, para a experimentação com os novos recursos composicionais surgidos com a expansão das fronteiras da organização sonora, tendência a qual resumiria na expressão filiação a avant-garde extrema (MENDES, 2009, pg 169). 2.7 Período da Maturidade ( ) O período da Maturidade é marcado por tendências ao ecletismo, uma conjunção final do discurso musical ao mesclar linguagens e propriedades musicais desenvolvidas anteriormente. As obras pertencentes ao período de maturidade são: Fantasia Sul América 10/04/1983; Prelúdio n 26 12/10/1983; Noturno 1984; Prelúdio n 27 14/07/1984; 13
8 Prelúdio n 28 31/07/1984; Serenata 14/06/1986; Sonata n 5 09/1988; Prelúdio n 29 (ms. 29) 01/1989. Após o exílio na Alemanha, a última fase denominada Maturidade compreende o retorno ao Brasil, tendo atuado como professor tanto como em Mannheim e Schrisheim. Claudio Santoro e a família retornam à Brasília e desenvolve aqui, até seu falecimento, uma produção eclética, reunindo não somente os princípios de experimentação natural da primeira fase, mas a construção de um discurso musical envolvendo a maioria das técnicas abordadas nos outros períodos e a consolidação de uma linguagem particular, tendo características diversas: O retorno definitivo de Santoro ao Brasil, em 1978, demarca o limite entre a etapa vanguardista e o início da última transformação em seu percurso estilístico, momento a partir do qual assumiria a retomada da experiência composicional das fases anteriores como seu principal foco de interesse. Paralelamente à reutilização de técnicas, como o desenvolvimento motívico e a polarização tonal, por exemplo, a manipulação de células intervalares seria finalmente incorporada ao idioma tardio, vindo a destacar-se como uma de suas principais ferramentas de trabalho, o que será demonstrado oportunamente. (MENDES, 2009, pg 213) 3. A TEORIA DOS TOPOI 3.1 O Estilo Erudito na Sonata 1942 O presente trecho da Sonata 1942 exemplifica um topoi estilo erudito, herdado do trabalho estético-formal das escolas de ensino europeu do século XVIII, aqui apresentado com a estética dodecafônica serial, mas que pode ser compreendido na figura abaixo a relação contrapontística, representado pela estrutura canônica e pelo diálogo motívico entre as vozes. 14
9 Figura1: Tópica Europeia: Estilo Aprendido. Sonata I Movimento, c Fonte: Sonata Edição Savart, O presente trecho da Sonata 1942 exemplifica uma figura retórica, denominada conclusio e que, mesmo fazendo parte do dispositivo, é encontrado aqui como recurso de periodicidade e finalização de seção. Figura 2: Figura Retórica: Estilo Aprendido. Sonata I Movimento, c Fonte: Sonata Claudio Santoro. Edição Savart,
10 3.2 Período Nacionalista A paulistana n 2 apresenta uma tópica brasileira, aqui denominada de sertanejo, que representam os ritmos culturais do interior do sertão, e simbolizando a figura dos boiadeiros que guiavam o boi pelo trajeto descrito da estrada com o ritmo executado pelos cascos dos animais, de melodia simples e caráter modal: Figura3: Tópica Brasileira: sertanejo. Figuras Retóricas: Ex.3. Paulistana n 2, c Fonte: Paulistanas 1-7. Claudio Santoro. Edição Savart, A imitação do ritmo da catira, apresentando um contexto harmônico e melódico totalmente distinto da obra apresentada anteriormente, com usos de modalismos, polimodalismos, ostinatos e uma música tipicamente tradicional na história brasileira. 16
11 3.3 Período Avant-Garde: topoi Avant-garde Fig.4. Tópica Avant-Garde. Estética Aleatória: Intermitências I, pg.1. Fonte: Intermitências I. Claudio Santoro. Editora Jobert, A estética aleatória permite ao intérprete tornar-se liberdade controlada, e a própria estrutura da partitura se apresenta formulada diferentemente do normal, exemplificando a tentativa de uma música à frente de seu tempo, ao romper com estruturas tradicionais e ao apresentar a bula do compositor, recurso inserido no início da partitura para se identificar os símbolos ou recursos de importância na interpretação e execução da obra. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A diversidade estética e a complexidade composicional e estrutural do discurso musical de Claudio Santoro, são apresentadas em sua obra para piano solo com acuidade inventiva e com inter-relação entre princípios estéticos internos ou externos ao cotidiano da música brasileira em sua época; essa externalização ou internalização à música tradicional brasileira é deveras dialógica a função que sua música cumpriria em cada fase composicional, pois cada léxico musical possui um significado social e particular na vida do compositor: na primeira fase, o serialismo dodecafônico simboliza o excêntrico do nacional pelo moderno. Um modernismo tardio, que encotrou seu fundamento no avançado mundo europeu présegunda guerra e que oferecia a técnica dodecafônica como uma bússola estética e, para o refinado artista que teria que pertencer ao seu tempo com a mente no futuro, uma 17
12 bússola para a substância do progresso e da modernidade cultural; o período de transição que demonstra a queda berliniana estética particular e o abandono gradativo da linguagem serial dodecafônica e o surgimento de uma ideologia social realista na terceira fase, talvez um empoderamento heróico, que tinha a missão de cumprir uma música de caráter social, uma música voltada para o povo brasileiro e de fácil entendimento. São dessa fase os topoi brasileiros, dos sertanejos ou caipiras, de mais fácil reconhecimento devido à influência de Mário de Andrade e a necessidade de uma pesquisa folclórica que embasasse e abraçasse a noção de brasilidade e identidade nacional; A quarta e a quinta fase mostra um afastamento do paradima nacional, mas não de forma ingênua. Claudio Santoro foi afastado fisicamento pelo exílio. O compositor se perfaz em sua capacidade inventiva e laboral, abraçado nas tendências estéticas que lhe aqueceram mais o ser estético do que sua própria pátria; a última fase mostra uma maturidade composicional e uma inquietude social e inimizade coletiva pela consituição de seu pensamento político e, principalmente, pela prolificidade de sua música. A análise da obra para piano solo de Claudio Santoro apresenta conexões complexas entre a música, o homem e o mundo que o cerca e dessa forma, evidencia diversas cadeias ou teias direcionais diante dessas relações que possibilitam uma construção argumentativa de significados construídos ao longo do tempo, por meio da tradição e da aceitação social ou pelo seu distanciamento e, mais específico, por sua ideologia ou ideologias, mediante sua relação em suas particularidades composicionais. Essas idiossincrasias, apresentadas na utilização de topoi específicos que cumprem uma funcão retórica, a de persuadir o ouvinte, representadas pelas diversas fases composicionais, demonstram o anseio pela busca de uma linguagem, que depreendesse sentido e tivesse significado, não somente para si, ou para um país, mas para a própria humanidade. A acuidade do discurso musical permeado pelo conteúdo ideológico, ou seja, pela luta do estabelecimento de paradigmas estéticos ou técnicos, de significações idiossincráticas ou de funcionalidades sociais, guarda em seu cerne uma premissa: as ações culturais são de certa forma, ações políticas. A idiossincrasia estilística teve como conteúdo um sentido ideológico que ora comunicava ao mundo, ora dele se afastava, e isso é a particularidade em Santoro: a vontade de sentido em sua honestidade musical que, em todas as fases, foi deveras singular. 18
13 REFERÊNCIAS ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia In. Verbete Ideologia. Martins Fontes, São Paulo, AGÀWU, Kofi. Playing with Signs: A Semiotic interpretation of Classical Music. Princenton. Legacy Library: COUTO, Carlos M. Tópica Estética: Filosofia, Música e Pintura. Imprensa Nacional: HATTEN, Robert S. Musical Meaning in Beethoven: Markedness, Correlation, and Interpretation Advances in Semiotics. Indiana University Press MENDES, Sergio Nogueira. O percurso estilístico de Claudio Santoro: Roteiros Divergentes e Conjunção Final. Tese de Doutorado. UniCAMP, MONELLE, Raymond. Sense of Music: Semiotic Essays. United Kingdom: University Press, The musical topic: Hunt, Military and Pastoral. INDIANA UNIVERSITY PRESS: Bloomington and Indianapolis, NARUM, Jessica. Sound and semantics: topics in the music of Arnold Schoenberg. University of Minnesota, PIEDADE, Acácio T. Expressão e sentido na música brasileira: retórica e análise musical. In. Revista Eletrônica de Musicologia. Vol. XI, A teoria das tópicas e a musicalidade brasileira: reflexões sobre a retoricidade na música. In: El Oido Pensante, vol.1 n 1 (2013), Argentina. RATNER, Leonard. Classical Music: Expression, Form and Style. Schrimer NY:
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