EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE UMA DAS VARAS CÍVEIS DA JUSTIÇA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO SP

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1 EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE UMA DAS VARAS CÍVEIS DA JUSTIÇA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO SP O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por sua representante legal que esta subscreve, vem à presença de Vossa Excelência, com fulcro no art. 127, caput, da Constituição Federal, no art. 6º, XIV, g, da Lei Complementar 75/93, nos artigos 11 e 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92 e no art. 5º, 1º, da Lei 7.347/85, propor a presente MEDIDA CAUTELAR DE BUSCA E APREENSÃO COM PEDIDO DE LIMINAR INAUDITA ALTERA PARTE em face de REDE RECORD DE TELEVISÃO, situada na Rua da Várzea, 240 Barra Funda CEP nº São Paulo/SP, na pessoa de seu representante legal, pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos.

2 DOS FATOS Esta Procuradora Regional dos Direitos do Cidadão recebeu, no dia 03 de fevereiro de 2005, às 16:57 horas, arquivo eletrônico contendo denúncia feita por cidadão brasileiro de grave fato, consistente em veiculação pela Rede Record de programação com conteúdo ofensivo à liberdade de crença e ao livre exercício de cultos religiosos, garantias previstas no art. 5º, inc. VI, da Constituição Federal. De acordo com a denúncia, tais cenas teriam sido exibidas no dia 02 de janeiro de 2005, às 1:17 h., ou no dia 03 de janeiro de 2005, no mesmo horário. A denúncia foi remetida à Procuradoria Geral da República em Brasília e, por motivos alheios à nossa vontade e conhecimento, nos foi encaminhada apenas nesta data, 03 de fevereiro de Ocorre que o artigo 58, parágrafo 1º da Lei nº 5.250, de 09 de fevereiro de 1967 (Lei de Imprensa), é no sentido de que as emissoras têm a obrigação de conservarem seus arquivos apenas pelo prazo de 30 (trinta) dias. Assim, caso venhamos a oficiar requisitando a referida gravação, a resposta padrão é a de que não têm mais cópia da programação em seu acervo. Ora, é de conhecimento geral que a praxe das emissoras é manter cópia de seus programas arquivados por muitos anos, pois sempre acabam reprisando cenas, precisando de imagens de arquivos para notícias futuras, etc. No entanto, não queremos colocar em dúvida aqui a veracidade dessas costumeiras respostas pois, mesmo que a Rede Record pretenda destruir a fita na qual encontram-se gravados os programas dos dias 02 e 03 de janeiro, é bastante provável que não o façam exatamente no dia seguinte ao término do lapso de 30 (trinta) dias. Daí nossa esperança em recorrer ao Poder Judiciário que pode determinar, de imediato a busca e apreensão das fitas respectivas. I - DO CABIMENTO DA MEDIDA CAUTELAR 2

3 O Ministério Público tem amplo poder de investigação, não necessitando do Poder Judiciário para expedir notificações, proceder a diligências, requisitar condução coercitiva, documentos ou a prestação de informações, entre outras atividades previstas no artigo 8 o da Lei 75/93. Mas o Ministério Público não tem poder para realizar efetivamente a busca e apreensão de documentos, pois nossa Constituição, dentre outras garantias, prevê a da inviolabilidade de domicílio (art. 5º, XI da CF). A Constituição e a Lei não conferiram ao Ministério Público, poder para realizar materialmente a busca e apreensão de documentos, independentemente de ordem judicial. Dessa forma, as suas requisições não têm o atributo da executoriedade, apesar de exigíveis, sob pena de responsabilidade. Nesse caso, deve o Ministério Público obter através do Poder Judiciário a concretização material do objeto da requisição. É justamente esta a hipótese aqui ventilada. Se viermos a expedir ofício requisitório, e o mesmo não for atendido, não dispomos de meios para verificar imediatamente se a cópia da programação ainda existe ou não, ou se foi efetivamente destruída. Por outro lado, o simples fato de encaminharmos ofício solicitando programação exibida há mais de 30 (trinta) dias, poderá fazer com que tais gravações sejam imediatamente eliminadas. II - DA COMPETÊNCIA Conforme a Lei Orgânica do Ministério Público da União (Lei Complementar nº 75/93), em seu artigo 5º, inciso II, alínea d, é função institucional do Ministério Público da União zelar pela observância dos princípios constitucionais relativos à seguridade social, à educação, à cultura e ao desporto, à ciência e à tecnologia, à comunicação social e ao meio ambiente. O legislador constituinte no artigo 220, 3º,inciso II, conferiu à União competência para editar lei federal para estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de 3

4 programas ou programações de rádio e televisão que contrariem os princípios constitucionais dispostos no art Por outro lado, a Rede Record é uma concessionária de um serviço público FEDERAL, qual seja o de difusão de sons e imagens (art. 21, inciso XII, alínea a ). Daí, conclui-se que a competência é federal. Por isso mesmo é que a representação foi encaminhada ao Ministério Público Federal. No entanto, na presente cautelar, não incluímos a União no pólo passivo, o que poderia gerar dúvida a respeito da competência da Justiça Federal. Porém, tal dúvida não se justifica pois a competência aqui deve ser definida, antes de tudo, da condição do Ministério Público Federal como autor na espécie. Além disso, há razões muito lógicas para a não inclusão, por ora, da União no pólo passivo. A medida cautelar é preparatória e a apresentação da fita é imprescindível para que se verifique se é mesmo o caso de propositura de uma ação civil pública, aí sim, na qual a União deverá figurar no pólo passivo, com a provável opção de poder atuar em litisconsórcio ativo. Entendemos que não é o caso de se fazer isso agora. Ainda que facilite a definição da competência, seria um gasto inútil de energias processuais e de dinheiro público ao se movimentar a Advocacia da União numa causa preparatória que está se fazendo necessária apenas por conta da conduta comum da Requerida, e também de outras emissoras, em não apresentar gravações ao Ministério Público de programas exibidos há mais de 30 (trinta) dias. E mais, estando o Ministério Público Federal no pólo ativo da ação, o foro competente só pode ser o da Justiça Federal. Para tanto, vale citar o entendimento unânime da Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARTE COMPETÊNCIA JUSTIÇA FEDERAL Se o Ministério Público Federal é parte, a Justiça Federal é competente para conhecer do processo. (CC nº DF, DJU de 4/10/93, Rel. Min. Humberto Gomes Barros) 4

5 III - DO PERICULUM IN MORA A Constituição da República conferiu ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, conforme se verifica no artigo 127 da CF, atribuindo-lhe diversas funções institucionais, inclusive a promoção do inquérito civil e da ação civil pública para a proteção a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (art. 129, CF). Assim, é dever constitucional do Ministério Público investigar fatos que cheguem ao seu conhecimento emitindo juízo de valor e, consequentemente propor eventual Ação Civil Pública que entenda cabível. Todavia, este órgão ministerial está impossibilitado de exercer suas funções em razão de não conseguir, através da via administrativa, obter um documento, qual seja, uma cópia da fita de vídeo VHS de programa da Rede Record de Televisão, exibido no dia 02 ou 03 de janeiro de 2005, entre 0:00 e 02:00 horas da manhã,veiculado na cidade de Recife e, provavelmente em rede nacional. Tendo em vista que o lapso temporal de 30 dias previsto na Lei de Imprensa, conforme já mencionado, expirou-se no dia 02 de fevereiro, não se sabe agora qual é o prazo que a fita em questão vai permanecer nos arquivos da demandada, podendo até mesmo ser inutilizada a qualquer momento, o que impediria a apuração dos fatos narrados na denúncia em anexo por parte desta instituição. É de se ressaltar a importância de a presente liminar ser deferida antes da citação da parte contrária, pois esta é justamente a hipótese prevista no artigo 804, do Código de Processo Civil, já que a Ré, se citada, pode tornar a medida ineficaz. No entanto, aguarda este órgão ministerial que o MM. Juiz deixe de determinar a prestação de caução prevista no mesmo artigo, primeiro em razão do fumus boni juris adiante explicitado, segundo em razão de que sendo autor o Ministério Público Federal, está incapacitado de fazê-lo. IV - DO FUMUS BONI IURIS 5

6 O programa em questão refere-se a uma pregação religiosa, na qual pastores da Igreja Universal, explorando imagens da catástrofe provocada pelo tsunami, na Ásia, diziam que aquela tragédia havia ocorrido em um domingo, dia das pessoas estarem na igreja, e não na praia, como elas estavam. Além disso, relacionavam a tragédia com a religião dos povos dos países atingidos, justificando que era porque elas tinham outro Deus que não era o Deus vivo. Ainda como justificativa, apresentavam matérias de jornal mostrando que pessoas que estavam em templo Católicos e Muçulmanos também foram mortas. O Ministério Público Federal não quer, e nem poderia se imiscuir em questões ligadas à religião. É que a programação televisiva é um espaço público, que pode ser explorado por entes privados, com a devida observância dos princípios constitucionais. Um desses princípios é o que diz respeito à liberdade de crença e do exercício de cultos religiosos. A associação de uma tragédia com a noticiada com o culto, credo religioso, ou até ausência deste, de quem quer que seja, a princípio, não nos parece respeitadora dessa garantia constitucional. Assim, feita uma análise superficial, ao transmitir pregação consistente em menosprezar outras religiões e credos, culpando-os de atrair catástrofes, a demandada violou ainda todos os princípios constitucionais contidos no artigo 221, da Constituição Federal que deveriam nortear sua atuação, quais sejam: dar preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; promover a cultura nacional e regional e estimular à produção independente que objetive sua divulgação; regionalizar as produções cultural, artística e jornalística; principalmente respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família. Como se nota, não há como inserir nessas diretrizes constitucionais o fato aqui descrito. A fumaça do bom direito está em pelo menos garantir que tal fato seja esclarecido, possibilitando-se o acesso à gravação respectiva. DO PEDIDO Pelo exposto, requer o Ministério Público Federal, LIMINARMENTE, e sem a oitiva da requerida, sob pena de frustração da medida, independentemente de prestação de caução, a URGENTE expedição de 6

7 mandado de Busca e Apreensão, na sede da TV Record, das fitas de vídeo VHS ou outro aporte, em que contenham as gravações dos programas religiosas exibidos nos dias 02 e 03 de janeiro de 2005, entre 0:00 e 02:00 horas da manhã,veiculados na cidade de Recife e, provavelmente em rede nacional. Para garantir a atividade dos (as) oficiais de Justiça de execução do mandado, requer sejam requisitados, com a URGÊNCIA NECESSÁRIA, à Polícia Federal, dois agentes e um perito do respectivo instituto de criminalística, de preferência com conhecimento sobre reprodução de imagens e gravações de programas. Requer, ainda, no ato de cumprimento da medida liminar (artigo 802, CPC), seja a demandada citada na pessoa de seu representante legal no endereço indicado no início desta petição. Requer, finalmente, a concessão definitiva, da medida cautelar aqui pleiteada, julgando-se procedente o pedido formulado pelo Ministério Público Federal. Informa desde já que a ação principal a ser proposta, caso se confirme os fatos aqui narrados através da análise da fita de vídeo, será Ação Civil Pública de cunho condenatório. Protesta pela produção de provas por todos os meios em direito admitidos, inclusive com o depoimento pessoal do representante legal da emissora. direito. Dá-se à causa o valor de R$ 100,00 para os fins de Termos em que, Pede deferimento São Paulo, 03 de fevereiro de EUGÊNIA AUGUSTA GONZAGA FÁVERO Procuradora da República Procuradora Regional dos Direitos do Cidadão 7