Supremo Tribunal Federal

Transcrição

1 MEDIDA CAUTELAR EM MANDADO DE SEGURANÇA DISTRITO FEDERAL RELATOR IMPTE.(S) ADV.(A/S) IMPDO.(A/S) ADV.(A/S) : MIN. LUIZ FUX :MAURILIO FIGUEIRA DE FERREIRA LIMA : LIVIA CARVALHO GOUVEIA E OUTRO(A/S) :PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO MANDADO DE SEGURANÇA. ANISTIADO POLÍTICO. INDENIZAÇÃO. PROVENTOS. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E DE IMPOSTO DE RENDA. IMPOSSIBILIDADE. ART. 9º DA LEI /2002. CARÁTER ESSENCIALMENTE ALIMENTAR DO ESTIPÊNDIO FUNCIONAL. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA CONFIGURADOS. PEDIDO LIMINAR DEFERIDO. DECISÃO: Cuida-se de mandado de segurança, aparelhado com pedido liminar, impetrado por Maurílio Figueira de Ferreira Lima, contra ato do Presidente da Câmara dos Deputados, que promoveu e continua promovendo ilegalmente a retenção na fonte de imposto de renda e de contribuição previdenciária sobre parcelas de subsídios recebidos pelo impetrante decorrentes de declaração da anistia política. O impetrante narra, inicialmente, que foi reconhecida sua condição de anistiado político e que, por meio da Portaria 1.173/2001 da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, foi reconhecido como tempo de serviço para todos os efeitos o período de 13 de dezembro de 1968 a 28 de agosto de 1979, nos termos do art. 1º, III, da Medida Provisória 2.151/2001. Prossegue aduzindo que, posteriormente, requereu sua aposentadoria junto à Câmara dos Deputados, que foi deferida após

2 consulta do Tribunal de Contas da União. A Presidência da Câmara dos Deputados deferiu pedido do impetrante para que fosse acrescentado ao tempo de exercício de mandato parlamentar, para efeito de aposentadoria, o período de 13/12/68 a 28/8/79. Em seguida, o impetrante informa que solicitou à Receita Federal a isenção do imposto de renda sobre os pagamentos recebidos com base na Lei de Anistia (Lei /2002), tendo a Delegacia da Receita Federal em Recife concluído que as aposentadorias, pensões ou proventos de qualquer natureza pagos aos anistiados políticos são isentos de imposto de renda. Alega que, não obstante, a Câmara dos Deputados procedeu aos descontos previdenciários e de imposto de renda em seus proventos, contrariando expressa disposição legal. Inconformado, o impetrante pediu o reexame do pedido de suspensão do desconto do imposto de renda, mas o pleito foi indeferido. Contra essa decisão, foi impetrado mandado de segurança, e a liminar foi deferida para determinar a suspensão dos descontos relativos ao imposto de renda e à contribuição previdenciária até o julgamento final do writ. No entanto, a liminar foi cassada e o impetrante foi notificado pela Câmara dos Deputados de que seria descontado o equivalente a 30% de seus proventos até a plena quitação do montante relativo ao período de suspensão da cobrança decorrente da liminar deferida. O impetrante sustenta, em suma, a ilegalidade do desconto do imposto de renda sobre a parcela acrescida aos proventos pagos em decorrência da averbação do tempo de serviço reconhecido como direito do anistiado político. Assevera, para tanto, que o art. 9º da Lei /2002 é cristalino ao prever que os valores pagos a título de indenização a anistiados políticos são isentos de imposto de renda. Acrescenta que a referida isenção está igualmente assegurada pelo Decreto 4.987/2003. Salienta que a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de reconhecer a ilegalidade da incidência do imposto de renda sobre valores 2

3 decorrentes de anistia política. Pugna, ao final, pelo deferimento da medida liminar para determinar a suspensão dos descontos relativos ao imposto de renda e à contribuição previdenciária sobre seus proventos até o julgamento final deste writ. No mérito, pede a concessão da segurança para reconhecer o direito líquido e certo de não incidir o imposto de renda e a contribuição previdenciária nos seus proventos. É o relatório. Passo a apreciar o pedido liminar. Como é cediço, a concessão da medida acauteladora exige o preenchimento de dois requisitos, quais sejam, a existência de fundamento relevante e a possibilidade de ineficácia da medida que vier a ser deferida ao final. Em um primeiro exame dos autos, verifico a presença dos requisitos que autorizam a suspensão do ato impugnado. Constato a existência de plausibilidade jurídica das alegações do impetrante no que tange à ilegalidade dos descontos em questão. Isso diante da manifesta contrariedade ao que expresso na Lei /2002 e no Decreto 4.897/2003. A Lei /2002 dispõe, em seu art. 9º, que: Art. 9º Os valores pagos por anistia não poderão ser objeto de contribuição ao INSS, a caixas de assistência ou fundos de pensão ou previdência, nem objeto de ressarcimento por estes de suas responsabilidades estatutárias. Parágrafo único. Os valores pagos a título de indenização a anistiados políticos são isentos do Imposto de Renda. O Decreto 4.897/2003, que regulamenta o parágrafo único do art. 9º da Lei /2002, por sua vez, tem o seguinte teor, no que interessa ao deslinde da questão: Art. 1o Os valores pagos a título de indenização a anistiados políticos são isentos do Imposto de Renda, nos termos do parágrafo único do art. 9o da Lei no , de 13 de novembro de o O disposto no caput inclui as aposentadorias, pensões ou proventos de qualquer natureza pagos aos já anistiados políticos, civis 3

4 ou militares, nos termos do art. 19 da Lei no , de Nesse contexto, a contrariedade do ato questionado ao texto legal salta aos olhos. Vislumbra-se, igualmente, a presença de periculum in mora a justificar o deferimento da medida liminar em face do caráter alimentício dos valores discutidos neste mandamus, circunstância que revela, per se, o perigo da demora na prestação jurisdicional, sobretudo se considerada a afirmação do impetrante no sentido de que a Câmara dos Deputados irá proceder ao desconto de 30% sobre seus proventos com vistas a quitar os valores não descontados no período em que vigorou a liminar deferida em mandado de segurança anterior. Destaco, por oportuno, que analisando idêntica situação, a Ministra Cármen Lúcia, nos autos do MS /DF, deferiu a medida de urgência para ordenar à autoridade coatora a suspensão dos descontos em questão, sob os seguintes fundamentos: As normas acima transcritas e a jurisprudência predominante na matéria direcionam-se no sentido de fundamentar devidamente a narrativa do Impetrante. Não se há também de deixar de relevar a natureza alimentar do pagamento de que aqui se cuida e que há de ser ponderado neste exame preambular da questão posta a exame. Os descontos que vêm sendo feitos no pagamento da indenização devida ao Impetrante parecem - pelo menos numa apreciação preliminar e precária, como própria dessa fase processual - contrastantes aos ditames legais. Mostra-se, portanto, relevante o fundamento a ensejar o deferimento da liminar, na forma requerida. E, pela natureza alimentar do pagamento, a sua não entrega pode comprometer os fins a que ele se destina no processamento da presente ação. Ex positis, defiro a medida liminar para determinar ao Presidente da Câmara dos Deputados que se abstenha de efetuar qualquer desconto sobre os proventos do impetrante a título de imposto de renda e de contribuição previdenciária, nos termos da Lei /

5 Comunique-se, com urgência, a autoridade coatora, do teor desta decisão, inclusive por fax. Notifique-se, ainda, a referida autoridade para que preste as informações no prazo legal (art. 7º, I, da Lei /2009). Dê-se ciência ao órgão de representação judicial da Câmara dos Deputados para que, querendo, ingresse no feito. Após, ao Ministério Público Federal para que se manifeste na qualidade de custos legis, dentro do prazo improrrogável de 10 (dez) dias, na forma do art. 12, caput, da Lei nº /09. Publique-se. Brasília, 12 de setembro de Ministro LUIZ FUX Relator Documento assinado digitalmente 5