PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos do Agravo de Instrumento nº , da Comarca de Itaquaquecetuba, em que é agravante ITAÚ UNIBANCO S/A ( ATUAL DENOMINAÇÃO DE BANCO ITAÚ S/A ), são agravados PETITE MARIE QUIMICA FINA INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS QUIMICOS LTDA (EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL), L ESSENCE INDUSTRIA E COMERCIO LTDA (EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL) e LAPIENDRUS INDUSTRIA E COMERCIO LTDA (EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL). ACORDAM, em 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores JOSÉ REYNALDO (Presidente) e LÍGIA ARAÚJO BISOGNI. São Paulo, 30 de setembro de Araldo Telles RELATOR Assinatura Eletrônica

2 COMARCA DE ITAQUAQUECETUBA AGRAVANTE: ITAÚ UNIBANCO S.A. AGRAVADAS: PETITE MARIE QUÍMICA FINA INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE PRODUTOS QUÍMICOS LTDA. E OUTRAS (EM REC. JUD.) VOTO N.º EMENTA: Recuperação Judicial. Plano. Aprovação. Deságio, carência e prazo. Admissibilidade, desde aceitos pela maioria dos credores, incidentes juros e correção monetária. Recuperação Judicial. Plano. Tratamento diferenciado entre credores de classes diversas. Irrelevância. Legalidade confirmada. Recurso desprovido. A casa bancária que figura como agravante, inconformada com a concessão da recuperação judicial das agravadas, interpõe o presente agravo de instrumento e sustenta, em resumo, ser cabível o exame da legalidade do plano pelo Poder Judiciária. No caso, prossegue, há flagrante tratamento diferenciado entre as diversas classes de credores de modo a direcionar a aprovação do plano apresentado, já que os créditos com garantia real não sofrerão deságio e serão pagos integralmente, inclusive com correção monetária, no primeiro ano seguinte à concessão do benefício. Observa que, na classe III, o quorum por cabeça desaprovou o plano, que só foi aprovado, nessa classe, pelo valor dos créditos presentes em razão do tratamento que se conferiu aos credores da classe II. Adianta que não há clareza nos valores que serão Agravo de Instrumento nº Voto

3 pagos, havendo insuportável prazo de carência, que, inclusive, conduzirá os pagamentos para o período posterior ao biênio de supervisão. Não admite, por fim, o desconto proposto para essa classe. Processado, o recurso foi contrariado, opinando, o Administrador Judicial, pelo não conhecimento por falta de peça essencial e, se conhecido, pelo desprovimento. A Procuradoria Geral de Justiça opina pelo conhecimento, mas propõe que seja desprovido. É o relatório. O instrumento está completo, inclusive com cópia da r. decisão agravada e respectiva certidão de intimação (fls. 39/40), pelo que deve ser conhecido o recurso. São inúmeros os reclamos do credor, considerando o sistema adotado pela Lei /05, mas não se justificam. De efeito, como a recuperação tem natureza contratual, é elementar que se confira ao devedor um prazo, que, claro, deve ser razoável, para início dos pagamentos, admitindo-se, então, que haja carência, desde que admitida pelos credores em assembleia ou pela tácita aceitação do plano. Prevê-se, no caso, para credores comuns, carência de doze meses, seguindo-se pagamento de juros em seis parcelas, iniciandose o principal e juros em seguida. Não se trata de prazo extremamente dilatado ou intolerável, mas consentâneo com as necessidades de reformulação do empreendimento. Descontos, chamados de deságio, também são comumente aceitos pelos credores, desde que, também aqui, razoáveis. Agravo de Instrumento nº Voto

4 No caso concreto, a proposta é de deságio de 25% a ser implementado como espécie de prêmio ao devedor pontual e a ser implementado ao fim dos pagamentos, o que soa bastante razoável. Não há, igualmente, ilegalidade em não se definir valores e datas dos pagamentos porque, consoante dedução lógica, os valores devidos serão divididos pelo número de parcelas, acrescendo os respectivos juros e poderão ser realizados no curso do mês. A data não me parece imprescindível, embora fosse recomendável a definição. Como o mês tem trinta dias, é de se admitir tempestivo o pagamento que se faça até o seu último dia útil. Não mais que isso. Também não importa, sob o aspecto legalidade, que parte dos pagamentos esteja prevista para data posterior ao biênio de fiscalização porque, então, os credores estarão munidos de títulos executivos e, de qualquer forma, sob supervisão judicial, já se terá desencadeado o efetivo cumprimento do plano. A aprovação do plano de recuperação em assembleia, todavia, poderia ensejar sérias dúvidas acerca do direcionamento do resultado. Com efeito, os dois credores que portam garantias reais (fls. 61), são, igualmente, quirografários e, enjeitada a proposta na contagem por cabeça, só foi aprovada pelo valor dos créditos presentes graças ao voto favorável daqueles (fls. 62). Ocorre que ambos sofrerão as mesmas consequências, em seus créditos, dos demais credores comuns, não se revelando admissível, por mera suposição, que fossem abrir mão de melhor tratamento de seus créditos comuns apenas porque o receberam nos que detêm garantia real. Agravo de Instrumento nº Voto

5 Convenha-se, ademais, que, embora não esteja explícito, pode-se revelar conveniente a liberação de tais garantias de forma antecipada, ao mesmo tempo em que o montante de créditos comuns soma um valor várias vezes superior. O que se tem procurado coibir nos julgamentos das Câmaras Reservadas é o tratamento discriminatório entre credores da mesma classe, criando-se subclasses com privilégios para apenas parte delas. Isto, todavia, não ocorre na hipótese dos autos, quando a diferença de tratamentos tem origem na própria diversidade de qualidade dos créditos. Em suma, não diviso, considerando os argumentos deduzidos nas razões de recurso, qualquer anormalidade no plano apresentado pela devedora e aprovado pela maioria dos credores, aplicado adequadamente o cram down, razão de propor o desprovimento do recurso. É como voto. JOSÉ ARALDO DA COSTA TELLES RELATOR Agravo de Instrumento nº Voto