E no futuro, existirão primaveras? Talvez, se com Arte ampliarmos o olhar sobre a natureza
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- Pedro Carreiro Ramalho
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1 E no futuro, existirão primaveras? Talvez, se com Arte ampliarmos o olhar sobre a natureza Márcia Maria de Sousa A solução dos problemas ambientais tem sido considerada cada vez mais urgente para garantir o futuro da humanidade e depende da relação que se estabelece entre sociedade/natureza, tanto na dimensão coletiva quanto na individual. [...] É fundamental, na sua abordagem, considerar os aspectos físicos e biológicos e, principalmente, os modos de interação do ser humano com a natureza, por meio de suas relações sociais, do trabalho, da ciência, da arte e da tecnologia. (PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS - Temas Transversais, 1998, p. 169). Meio Ambiente e Sustentabilidade foi o tema do Fórum Sócio Cultural 1 do INEI-COC (Instituto de Educação Integral - Colégio Osvaldo Cruz) de Uberlândia em agosto Ainda recém chegada à escola e buscando atender a solicitação da Coordenação Pedagógica da mesma para que a área de Artes integrasse efetivamente a programação do evento, convidei a Coordenadora Geral do Pólo UFU da Rede Arte na Escola 2 para ministrar um vídeo-debate no qual foram apresentados e discutidos partes dos DVDs Araquém Alcântara 3 e a natureza e Siron Franco 4 : natureza e cultura. Durante o vídeo-debate, uma questão enfatizada pela ministrante, e que chamou minha atenção, foi exatamente a singularidade do olhar e da conseqüente poética de cada um desses artistas ao tratarem das questões ambientais, fosse para contemplar a natureza em sua magnitude, como faz Araquém Alcântara em suas fotografias, ou para 1 O Fórum Sócio-Cultural é um evento anual que faz parte das atividades curriculares do INEI-COC Uberlândia desde Tem como objetivo discutir um tema atual do ponto de vista de várias áreas do conhecimento e conta com a participação de palestrantes convidados. 2 Por ser um centro de referência local dos professores de Artes em termos de materiais didáticos e no desenvolvimento ações educativas em Artes, o Pólo UFU da Rede Arte na Escola foi convidado a participar do Fórum expondo dois documentários de artistas brasileiros que constam de seu acervo. 3 Araquém Alcântara (Florianópolis SC 1951) é fotógrafo, jornalista e professor. Seu trabalho em fotografia tem um cunho documental e ambientalista, É autor de 17 livros de fotografia, sendo a maioria sobre os ecossistemas nacionais. Além das atividades fotográficas, atua como professor em worshops em vários Estados do Brasil. Fonte: 4 Siron Franco (Goiás Velho GO 1947) é pintor, escultor, ilustrador, desenhista, gravador e diretor de arte. Sua obra caracteriza-se pela crítica que desfere sobre a realidade social do país. Fonte:
2 denunciar e criticar as ações devastadoras do homem, como alerta Siron Franco em suas pinturas e instalações. A partir do Fórum, foi realizado com os alunos do 1º ano do Ensino Médio um percurso educativo em artes visuais que teve como intuito orientá-los para participar de uma Mostra de Fotografias que aconteceria no final do ano letivo. A Mostra de Fotografias foi a forma encontrada pela Coordenação do Fórum de valorizar a participação dos alunos no evento, ampliar as discussões empreendidas durante o Fórum e avaliar a repercussão e extensão das visões apresentadas pelos palestrantes no conhecimento construído pelos alunos sobre as questões relacionadas a Meio Ambiente e Sustentabilidade. As fotografias seriam realizadas pelos alunos como um trabalho complementar ao qual seria conferido uma nota mínima a todos os participantes e uma nota adicional de até dois pontos aos três melhores trabalhos de cada sala. As fotografias seriam avaliadas por uma comissão julgadora composta por professores de Geografia, Física e Literatura da escola e convidados externos: fotógrafos profissionais, professores de Artes e artistas plásticos da cidade. Dessa forma, desenvolvi com os alunos, durante os meses de agosto, setembro e outubro, um percurso educativo em artes visuais para orientá-los na obtenção de fotografias compatíveis com as idéias e percepções sobre Meio Ambiente e Sustentabilidade que os impactaram e que gostariam de apresentar. Nesse processo os alunos tiveram aulas sobre princípios técnicos, plásticovisuais e culturais da fotografia, informações sobre a história da fotografia e leitura de imagens fotográficas contemporâneas que discutem e abordam a temática ambiental, além de visitas a duas exposições sobre fotografia em museus da cidade. Esse percurso contemplou informações e imagens sobre Meio Ambiente de fontes diversas como revistas, internet, catálogos de exposições, livros e vídeos, como forma de articular o tema a conteúdos específicos da área de artes visuais. Princípios técnicos, plástico-visuais e culturais da fotografia Numa etapa inicial discuti com os alunos a definição de fotografia como processo de gravar imagens por meio da luz, cujo desenvolvimento envolve conhecimentos e recursos técnicos, plástico-visuais e sócio-histórico-culturais. Esclareci que os conhecimentos e recursos técnicos referiam-se aos equipamentos e materiais
3 utilizados na gravação e reprodução das imagens, que por sua vez envolvem conhecimentos e princípios da Física sobre luz (radiação, intensidade, refração) e sobre lentes (côncavo-convexo); e da Química sobre propriedades de alguns elementos e reações químicas (sais de prata, albumina e outros elementos fixadores). Para explicar as possibilidades de utilização de conceitos e princípios da linguagem visual (Composição, Luz e Sombra, intensidade e contraste das Cores, Perspectiva, Planos, Representação e Abstração) na fotografia, utilizei como exemplo imagens de fotógrafos brasileiros de diferentes épocas cujas visualidades remetiam a questões ambientais, entre eles Manuel da Costa (fotografias da Série Plano Branco de 1996), Sebastião Salgado (obra México de 1980), Paulo Jares (obra Natureza Pollock de 2000) e Marcos Santilli (fotografia do Projeto Nharamaã, anos 70) 5. Quanto aos princípios sócio-histórico-culturais, discuti o fato da fotografia ser uma linguagem que remete diretamente à realidade visual, e que por isso serve como registro e documentação de fatos, memórias e costumes. Expliquei também sobre a relação, aparentemente contraditória, entre a ética e a estética, esclarecendo que o olhar do fotógrafo, por vezes, ao enfatizar um determinado aspecto sobre o tema poderia apresentar uma imagem desagradável do ponto de vista ético, mas visualmente bela pelo modo como tirou partido dos recursos plástico-visuais. Essa primeira etapa foi considerada de extrema importância para atentar o olhar dos alunos a buscar uma autonomia expressiva e não apenas captar imagens relacionadas ao tema, porém sem sentido para eles. História da fotografia Para melhor fundamentar os trabalhos em fotografia, os alunos tiveram algumas aulas sobre a história da fotografia nas quais puderam observar o impacto da fotografia nos modos tradicionais de arte, quando da sua difusão como meio inovador de captar cenas e fatos reais em meados de 1826, e consequentemente, nas formas de olhar e representar a realidade. Além de observarem a influência recíproca entre a fotografia e as outras linguagens plásticas, os alunos conheceram a importância dos avanços tecnológicos no 5 Essas imagens foram selecionadas do livro Visões e Alumbramentos (ver referências bibliográficas).
4 desenvolvimento de câmeras e equipamentos fotográficos ao longo dos séculos XIX e XX e a distinção entre os processos da fotografia analógica e da fotografia digital. Esses conhecimentos foram importantes para que os alunos compreendessem a fotografia como uma linguagem que prescinde de um meio técnico e cujas especificidades implicam na interação entre homem-máquina-objeto. Visitas a exposições de fotografias em museus da cidade No mês de setembro, em horário extra-turno, portanto com a presença de aproximadamente um quarto dos alunos, visitamos duas exposições que abordavam tanto a fotografia como a questão ambiental: a exposição Cidade Invadida no MUnA - Museu Universitário de Arte da Universidade Federal de Uberlândia, que tratava da relação homem-cidade e a Exposição de Câmeras Fotográficas do acervo do Museu Municipal de Uberlândia. As visitas a esses espaços culturais tiveram como conseqüência mostrar aos alunos que a fotografia, além do valor histórico, conferido por seu caráter de registro e documento, é uma forma de arte amplamente utilizada na contemporaneidade e que permite expor as relações do homem com os espaços urbanos, repercutindo um dos motes de discussão das questões ambientais tratadas no Fórum. Leitura de imagens fotográficas contemporâneas que discutem a abordam a temática ambiental. Como forma de propiciar aos alunos uma visão mais próxima do processo de seleção e registro de imagens sobre o tema proposto, apresentei um ensaio fotográfico (seqüência de oito fotos sobre o tema árvore florida ) realizado por mim com uma câmera digital em uma praça da cidade. Tal ensaio serviu como uma referência visual para discutirmos as etapas envolvidas no processo de criação das fotografias: a procura e seleção do lugar ou objeto a ser fotografado, a definição do olhar do fotógrafo (se contemplativo, denunciativo, crítico, criativo, tradicional ou inusitado), a pesquisa das condições de luminosidade e melhor ângulo de captação das imagens e a experimentação das potencialidades do equipamento disponível.
5 Finalizando essa etapa de fundamentação e preparação, apresentei algumas imagens de Araquém Alcântara, Franz Krajcberg 6, Sebastião Salgado 7 e Vik Muniz 8 enfatizando como os diferentes olhares desses artistas e fotógrafos configuravam imagens que, apesar de distintas, remetiam ao mesmo tema: a relação do homem com o Meio Ambiente. Ao final do percurso, cada aluno entregou à Coordenação da Mostra duas imagens, perfazendo um total de 218 fotografias que após serem avaliadas e discutidas pela comissão avaliadora quanto à utilização dos conhecimentos e recursos da linguagem visual e à criatividade e criticidade na abordagem do tema, foram expostas na escola juntamente com trechos das avaliações escritas pelos alunos ao final do processo. FIGURA 1 [...]não há nada igual quando você sente o perfume de uma flor, quando você vê ela se desabrochar, quando você cuida para que a planta não morra e possa dar mais flores no ano seguinte; não há nada igual à espera da outra primavera... Foi então que eu me perguntei: E no futuro, existirão próximas primaveras? Ainda existirão flores para se abrirem? Fiquei desejando que sim para que outras pessoas possam sentir o prazer de cuidar de uma flor e serem recompensadas com um dos melhores perfumes que existe! (Fotografia entitulada Outubro e trecho da avaliação da aluna Amanda Alves Bacarim). Analisando as imagens e textos produzidos quanto à utilização dos conhecimentos e recursos da linguagem visual, percebemos a utilização deliberada dos conteúdos específicos da linguagem visual que foram trabalhados durante as aulas, assim como a criatividade e a criticidade presentes nas diferentes formas de abordagem do tema e que em alguns casos, remetem aos recursos visuais e técnicos utilizados pelos fotógrafos e artistas estudados. 6 Frans Krajcberg (Kozienice Polônia 1921). Escultor, pintor, gravador, fotógrafo naturalizado brasileiro. Sua obra é marcada pela pesquisa e utilização de elementos da natureza, em especial da floresta amazônica, e a defesa do meio ambiente. Fonte: 7 Sebastião Salgado (Aimorés MG 1944) é fotógrafo cuja produção tem como característica registrar as condições da vida humana em várias regiões do mundo como uma forma de denunciar a miséria e os problemas sociais no mundo. Fonte: 8 Vik Muniz (São Paulo SP 1961) é fotógrafo, desenhista, pintor e gravador. Desde 1988 realiza séries de trabalhos nas quais investiga temas relativos à memória, à percepção e à representação de imagens do mundo das artes e dos meios de comunicação, abordando questões relacionadas à circulação e retenção de imagens. Seu processo de trabalho consiste em compor as imagens com materiais, normalmente instáveis e perecíveis, sobre uma superfície e fotografá-las. Fonte:
6 FIGURA 2 FIGURA 3 Guilherme Henrique Azevedo Santos Gabriela Vieira Azevedo O resultado desse processo revela a diversidade de olhares e percepções com os quais os alunos foram capazes de expressar visual e verbalmente os aprendizados sobre Meio Ambiente e Sustentabilidade seja do ponto de vista crítico, ao denunciar a degradação causada pela ação humana, ao propor soluções e outras possibilidades de tratar o espaço urbano, ou do ponto de vista contemplativo, ao apresentar a beleza e a diversidade de formas e cores da natureza em sua plenitude. Dessa forma, concluo que este percurso educativo foi de extrema importância no sentido de proporcionar a esses jovens experiências nas quais puderam desenvolver sua consciência ambiental e sua consciência estética, entrelaçando visualidades e informações na construção de conhecimentos efetivos e significativos para suas vidas. Referências Bibliográficas BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos: apresentação dos temas transversais / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998, 436p. PAIVA, Joaquim (org.). Visões e Alumbramentos: fotografia contemporânea Brasileira na Coleção Joaquim Paiva. São Paulo: BrasilConnects, Fontes Videográficas Todo o passado dentro do presente. São Paulo: Quark/ TV Cultura/Instituto Arte na Escola, s/d. Siron Franco: natureza e cultura. São Paulo: Rede SescSenac de Televisão, 2001, 23 Série O Mundo da Arte. Direção Sarah Yakhni. Araquém Alcântara e a natureza. São Paulo: Rede SescSenac de Televisão, 2001, 23 Série O Mundo da Fotografia. Direção Mariana Cronenberger. Fontes Eletrônicas
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