1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO DÉCIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021845-29.2009.8.19.0209 APELANTE: AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL LTDA(ré) APELADO: GEOVANA DE OLIVEIRA PAULA REP/P/S/RESP ALEX SANDER DA SILVA DAMÁSIO (autora) APELADOS: OS MESMOS RELATORA: DES. SIRLEY ABREU BIONDI Juiz sentenciante: Dr. Antonio Aurélio Abi Ramia Duarte Vara de Origem: 2ª Vara Cível da Barra da Tihjuca Plano de saúde. Amil no pólo passivo. Necessidade de internação para realização de tomografia, sendo o caso classificado como de urgência. Negativa de autorização do procedimento, sob alegação de carência. Sentença de procedência. Inconformismo da ré que pretende a reforma do julgamento, ou a redução do quantum indenizatório. Correta a sentença. O atendimento de urgência ou emergência do segurado de plano de saúde não está condicionado a período de carência nem à limitação temporal. A ré, além de descumprir o contrato firmado entre as partes e o comando legal específico, agiu de forma a atentar contra o princípio da dignidade humana, consagrado pela CRFB/1988 e pelas normas de proteção ao consumidor, ferindo a própria função social do contrato, que é a de resguardar a incolumidade e a vida do autor. A Lei nº 9.656/1998, no art. 12, V, c, estatui prazo máximo de carência de 24 horas para a
2 cobertura dos casos de urgência e emergência. Súmula nº 209 do TJRJ. Responsabilidade civil da empresa, que deve arcar com a indenização pelos danos morais causados à segurada. Nexo de causalidade evidenciado. Aplicação do CDCON. Dano moral in re ipsa. Indenização fixada em R$ 8.000,00. Sucumbência total por parte da ré, abrangendo o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no montante de 10% sobre o valor da condenação. Precedentes nas diversas Câmaras Cíveis, o que permite o julgamento de plano pela Relatoria, nos termos do art. 557 do CPC, motivo pelo qual NEGO SEGUIMENTO AO RECURSO, mantendo na integra a sentença atacada. DECISÃO Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA proposta por GEOVANA DE OLIVEIRA PAULA REP/P/S/RESP ALEX SANDER DA SILVA DAMÁSIO em face de AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL LTDA, sob o argumento de não ter a ré autorizado a internação da autora (8 meses de idade) em Hospital credenciado para a realização de tomografia computadorizada de crânio e orbitas, pois corre o risco do seu quadro evoluir para perda do órgão, metástase e morte, conforme laudo médico, havendo suspeita da autora ser portadora de Retinoblastoma (tumor ocular). Requer a titulo de tutela que seja determinada a internação da autora para realização do exame necessário. Pugna pela condenação da ré em danos morais. fls. 13/32. Inicial as fls.02/12 com documentos de Deferimento da liminar pleiteada, consoante decisão em plantão noturno as fls. 39/40.
3 Contestação as fls.53/59 com documentos as fls.60/125, alegando, em síntese, que a recusa da cobertura foi contratual e legal, desta forma, não cometeu qualquer conduta ilícita a ensejar reparação. Requer a improcedência dos pedidos. Sentença (fls. 140/148), JULGANDO PROCEDENTE O PEDIDO, determinando que a empresa ré realize todos os procedimentos clínicos/médicos/cirúrgicos necessários ao restabelecimento da parte autora, na forma postulada na inicial, bem como o pagamento, por parte da ré, a indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), reajustados conforme a tabela da Corregedoria e juros de 0,1% ao mês. Custas e honorários advocatícios em 10% do valor da condenação, a cargo da ré. Inconformada, insurge-se a Assistência Médica ré com seu apelo (fls. 150/170), requerendo a reforma da sentença, para julgar improcedente o pedido nos termos da peça de bloqueio, ou para reduzir a indenização por danos morais. Contrarrazões da autora às fls. 175/183. Procuradoria de Justiça as fls.190/195, através da ilustre Procuradora, Dra. Gisele Lobão Salgado, opinando pelo desprovimento do recurso. Eis os fatos por ora discutidos e sucintamente relatados. Inicialmente impõe-se o registro de que a demanda nenhuma complexidade apresenta, já tendo sido alvo de discussões, debates e julgamentos perante várias Câmaras Cíveis desta Corte, impondo-se, destarte, o
4 julgamento na forma do art. 557 do CPC, em observância aos princípios da efetividade e celeridade processual. Ademais, importante ser assinalado, a respeito do julgamento monocrático, que essa possibilidade veio com a salutar função de desobstruir a Justiça, ensejar a possibilidade de decisões mais céleres e propiciar, a par da resposta muito mais eficiente, a significativa redução de tempo, com acentuada repercussão econômica; necessário se considere, além do dispêndio de tempo, o custo de toda a tramitação do recurso, quando possível, desejável e recomendável seja ele apreciado imediatamente (grifos nossos artigo a respeito da matéria, em 09/04/2003, constando do site www.mundojuridico.adv.br - Maria Berenice Dias - Mestre em Direito Processual Civil e Desembargadora do Estado do Rio Grande do Sul). Ao exame detalhado dos autos, verifica-se que a seguradora ré, AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL LTDA, insurge-se contra a sentença de procedência prolatada pelo juízo a quo, sob o argumento de descumprimento por parte da autora, da carência contratual. Registre-se que a sentença determinou a realização dos procedimentos necessários, postulados na inicial, bem como condenou a ré ao pagamento de indenização a titulo de danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais). Cumpre ser observado que a relação jurídica mantida entre as partes é de consumo, pois presentes os seus requisitos subjetivos (consumidor e fornecedor artigos 2 o e 3 o da Lei 8078/90) e objetivos (produto e serviço 1 o e 2 o do artigo 3º da mesma lei), regulando-se, então, pelo disposto na Lei 8078/90, a qual positiva um núcleo de regras e princípios protetores dos direitos dos consumidores enquanto tais - inclusive no que se refere à possibilidade de inversão do ônus da prova e a natureza da responsabilidade do réu.
5 Incidindo, pois, o CDCON, norma cogente, de ordem pública, de aplicação imediata e de interesse social (artigo 1º, da Lei nº. 8078/90), a matéria sub judice deve ser interpretada de forma mais favorável ao consumidor (artigo 47, Lei n o. 8078/90), parte hipossuficiente na relação jurídica. A hipótese ora sob o crivo recursal versa sobre um contrato cativo, de longa duração, com o desiderato de assegurar o consumidor contra os riscos envolvendo a sua saúde. Versa, portanto, sobre um serviço assistencial, cuja prestação se protrai no tempo. Sabido é que os planos de saúde estão intimamente ligados aos anseios sociais de controle dos riscos ao segurado e seus dependentes. Deve-se atentar para o fato de que o consumidor é a parte mais vulnerável da relação jurídica, estando em jogo direitos personalíssimos, quais sejam, a vida, a saúde, a integridade física e psíquica, além da dignidade humana, que também deve servir de norte para a interpretação da lei e do contrato trazido à colação. Ao exame detalhado dos autos, vê-se que a autora, em 30/07/2009, contratou o plano de saúde da AMIL, vindo a necessitar de exame de urgência durante o período de carência, consoante se constata, especialmente, pelo documento médico de fls. 22, pois apresentava forte suspeita, levantada pelos exames realizados, de RETINOBLASTOMA, tumor ocular com grande risco de perda do órgão e envio de metástase, correndo risco de morte, se não for diagnosticado e tratado rapidamente. Diante da negativa da empresa ora apelante em autorizar a necessária internação para
6 realização da tomografia computadorizada, a apelada, através de seu representante, buscou a tutela jurisdicional. Em que pese a existência de cláusulas contratuais que condicionam a internação da apelada ao cumprimento do prazo de carência, não há como considerá-las lícitas na hipótese dos autos, pois colocam em xeque os princípios da dignidade da pessoa humana, do direito à vida e à saúde. Tenha-se presente que a licitude de cláusula limitativa de responsabilidade pelo fornecedor de serviços depende de aferição no caso concreto. Na hipótese sob análise, afigura-se ilegítima e injustificada a negativa de cobertura da internação emergencial da autora, que por sua própria natureza não pode sofrer limitações temporais. Assinale-se que a ré, além descumprir o contrato firmado entre as partes e o comando legal específico, agiu de forma a atentar contra o princípio da dignidade humana, consagrado pela CRFB/1988 e pelas normas de proteção ao consumidor, ferindo a própria função social do contrato, que é a de resguardar a incolumidade e a vida do autor. Ademais, a própria Lei nº 9.656/1998, no art. 12, V, c, estatui prazo máximo de carência de vinte e quatro horas para a cobertura dos casos de urgência e emergência. Inegável, pois, é a comprovação in re ipsa dos danos extrapatrimoniais sofridos pela autora, ora apelada.
7 Tendo por base os princípios norteadores para a fixação do valor indenizatório e com especial atenção para o quantum que tem sido fixado pelos julgadores que integram a Décima Terceira Câmara Cível, observando-se a extensão do dano, os limites do razoável e da prudência, a condição econômica da ré, a justa compensação pelos danos sofridos pela parte autora, visando a atender ao caráter punitivo e pedagógico, mas sem ensejar enriquecimento sem causa, tenho como correta a importância de R$ 8.000,00 (oito mil reais). Para ilustrar este arrazoado, trago à baila os seguintes arestos oriundos deste Tribunal (grifos nossos): I) Plano de Saúde. Ação de obrigação de fazer e indenizatória por danos morais. Negativa de autorização para internação e cirurgia de que necessitava o autor, com apenas três meses de idade, em caráter de urgência. Sentença de procedência. - II) O atendimento de urgência ou emergência do segurado de plano de saúde não está condicionado a período de carência nem à limitação temporal. Cláusula abusiva. Arts. 51, CDC e 12-V, c e 35-C da Lei 9.656/98. Precedentes jurisprudenciais. - III) A recusa, além de abusiva, é suficiente para interferir sobremaneira no estado psicológico do indivíduo e configurar o dano moral puro, indenizável. - IV) Valor da indenização fixado em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando os fatos ocorridos, razão pela qual não merece qualquer redução ou majoração. - V) Recursos manifestamente improcedentes. Negativa liminar de seguimento. Art. 557, CPC (Apelação 0065417-77.2009.8.19.0001 rel. DES. PAULO MAURICIO PEREIRA - Julgamento: 16/06/2011 - QUARTA CAMARA CIVEL).
8 AÇÃO ORDINÁRIA. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA. CARÊNCIA. ATENDIMENTO EMERGENCIAL. CLÁUSULA ABUSIVA. INFRINGÊNCIA DO CDC. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTIFICAÇÃO. Recusa de cobertura a procedimento de emergência pela operadora de saúde, diante do quadro de apendicite apresentado pela autora, é considerada abusiva. As carências contratuais somente devem ser aplicadas quando a situação se configura como não sendo de urgência ou emergência. A injusta recusa de realização de cirurgia emergencial pela empresa operadora de saúde causou à autora grande angústia e sofrimento, o que ultrapassou o mero aborrecimento. Verba indenizatória fixada em R$ 7.000,00 (sete mil reais), em observância aos princípios da proporcionalidade, razoabilidade e vedação ao enriquecimento sem causa. RECURSO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO, COM FULCRO NO ARTIGO 557, CAPUT, DO CPC (Apelação 0004673-19.2009.8.19.0001 rel. DES. ELISABETE FILIZZOLA - Julgamento: 02/06/2011 - SEGUNDA CAMARA CIVEL). Apelação cível. Indenizatória. Plano de saúde. Recusa na realização de cirurgia emergencial sob alegação de não cumprimento do prazo de carência. A lei que regulamenta os planos de saúde estabelece carência máxima de vinte e quatro horas para os casos de urgência (art. 12, V, "c", da Lei nº 9.656/98). Nulidade da cláusula contratual que aumenta este prazo para 180 dias. Recusa injustificada. Dano moral. Ocorrência. Súmula nº 209 desta Corte. Verba reparadora corretamente arbitrada em R$ 15.000,00. Recurso a que se nega seguimento. Aplicação do art. 557, caput, do CPC (Apelação 0034644-25.2009.8.19.0203 rel. DES. AGOSTINHO TEIXEIRA DE ALMEIDA FILHO - Julgamento: 10/06/2011 - VIGESIMA CAMARA CIVEL).
9 Convém transcrever a Súmula nº 209, deste egrégio Tribunal: Enseja dano moral a indevida recusa de internação ou serviços hospitalares, inclusive home care, por parte do seguro saúde somente obtidos mediante decisão judicial. Por fim, não merece reparo, ainda, a condenação da empresa ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 20, 4º do CPC. Diante do exposto, nos termos do art. 557 do CPC, NEGO SEGUIMENTO AO RECURSO, mantendo integralmente a sentença atacada. RJ, 05/09/2012. SIRLEY ABREU BIONDI DES. RELATORA