Experiência de Regulação no Setor Elétrico Brasileiro



Documentos relacionados
2 O Novo Modelo e os Leilões de Energia

DESAFIOS DO SETOR ENERGÉTICO NO RIO GRANDE DO SUL

Aspectos Regulatórios e de Mercado. Março de 2010

Prof. Virginia Parente 1/20. Encontro Nacional de Operadores e Investidores em PCHs (VIEX) São Paulo - Abril 2009

Modelo de Negócio para um Novo Programa Nuclear. Otavio Mielnik. INAC International Nuclear Atlantic Conference

Assinatura Digital. Contratos de Comercialização de Energia Elétrica no Ambiente Regulado - CCEARs

AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA - ANEEL RESOLUÇÃO N 233, DE 29 DE JULHO DE 1999

Capítulo: 1 Modelo Institucional do Setor Elétrico Brasileiro

Escalada Tarifária do Setor Elétrico

Agenda Regulatória ANEEL 2014/ Destaques

Dep. Fabio Garcia PSB/MT. O Preço da Energia No Brasil

Em resumo, tarifa de energia elétrica dos consumidores cativos é, de forma um pouco mais detalhada, constituída por:

As PCHs no contexto energético futuro no Brasil

O Novo Ciclo do Mercado Livre de Energia Elétrica

O Pacote do Governo e o Impacto para o Mercado Livre de Energia Elétrica. Cristopher Alexander Vlavianos, Presidente Comerc Energia

METODOLOGIA PARA ANÁLISE DA REVISÃO ORDINÁRIA DA PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA FIRMADA ENTRE O MUNICÍPIO DE RIO CLARO E A FOZ DE RIO CLARO S/A.

Comercialização de Energia Elétrica no Brasil III Seminário: Mercados de Eletricidade e Gás Natural Investimento, Risco e Regulação

O Novo Modelo do Setor Elétrico, a ANEEL e a Geração Distribuída

Medidas divulgadas pelo Governo Federal para o fortalecimento do setor elétrico nacional

ANEEL: 13 anos de atuação no mercado elétrico brasileiro

ENERGIAS RENOVÁVEIS NO BRASIL MAIO 2010

GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA HIDRELÉTRICA-SISTEMA ELÉTRICO

. / // /

Aspectos Econômico- Financeiros do Setor Elétrico Visão do Regulador

Preço Futuro da Energia Elétrica" Paulo Cezar C. Tavares Presidente da SOLenergias

Desafios para a energia eólica e outras fontes alternativas. Deputado Federal Paulo Teixeira

CONTRIBUIÇÕES RELATIVAS AO PROCESSO DE AUDIÊNCIA PÚBLICA 014/2006

Leilões de Linhas de Transmissão e o Modelo de Parceria Estratégica Pública Privada. (*)

EARNINGS RELEASE 2008 e 4T08 Cemig D

Luciano I. De Castro Associate Professor University of Iowa. Agradecimentos e disclaimer no último slide

Regulação em Projetos Transnacionais de Infraestrutura Aspectos Econômicos. Arthur Barrionuevo FGV - Escolas de Administração e Direito

Associação de Reguladores de Energia dos Países de Língua Oficial Portuguesa

Mercado de energia elétrica: condições atuais de atendimento à carga e tendências para Manoel Arlindo Zaroni Torres

Apresentação CEI. Perspectivas no mercado de energia fotovoltaica

VI ENCONTRO NACIONAL DA ABRAPCH A importância da Geração Distribuída num momento de crise energética

COMISSÃO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Energia Alternativa - Uma Opção Viável para Equilíbrio da Oferta de Energia. Ricardo Pigatto Presidente São Paulo, 12 de setembro de 2007

FUNDOS DO SETOR ELÉTRICO ADMINISTRADOS PELA ELETROBRÁS 2009

Simpósio Brasileiro sobre Pequenas e Médias Centrais Hidrelétrica. Comercialização 1/20. DCM Diretoria Comercial

de luz está mais transparente. Conheça as bandeiras tarifárias.

4º Encontro Nacional de Agentes do Setor Elétrico - ENASE 2007

Comentários sobre o. Plano Decenal de Expansão. de Energia (PDE )

Impactos da MP nº 579

Programa de Incentivos aos Leilões de Energia e à Geração Distribuída do Governo de Pernambuco João Bosco de Almeida

Setor Elétrico Brasileiro Um Breve histórico. Pontos Básicos da regulação para a Distribuição. Desafios regulatórios Associados à Distribuição

CONTRIBUIÇÕES REFERENTES À AUDIÊNCIA PÚBLICA Nº 086/2013 NOME DA INSTITUIÇÃO:

CC76F66102 COMISSÃO DE MINAS E ENERGIA. PROJETO DE LEI N o 2.318, DE 2007 I - RELATÓRIO

Concessões de Geração, Transmissão e Distribuição de Energia Elétrica: Perguntas e Respostas

Atração de Novos Investidores no Segmento

O Novo Modelo do Setor Elétrico

Valor Online 23/11/2015 Bandeira verde pode dar alívio maior para inflação em 2016

Dinâmica Empresarial e Mecanismo de Formação de Preço Seminário Internacional de Integração Energética Brasil Colômbia

Contribuição ABRADEE AP 046 Garantias Mercado de Curto Prazo CCEE

Diversificação da Matriz Elétrica Nacional. João Mello A&C Energia

Desafios e alternativas para o setor elétrico. 8 KPMG Business Magazine

Workshop Andrade & Canellas 2010 Mercado de Energia Práticas e Expectativa. A Visão dos Geradores

Em 13 de janeiro de 2012.

Leilões de Energia. Eng. José Jurhosa Junior ANEEL

O Estado de S. Paulo 26/01/2015 Previsões apontam chuva abaixo da média

Incorporação do efeito da deseconomia de escala do Programa Luz para Todos. Cristine Juste

POR DENTRO DA CONTA DE ENERGIA. Informação de utilidade pública

EPE-21/02/2008. Bioeletricidade

Renovação de Concessões de Geração e Oportunidades de Maximização da Energia Assegurada

Parceria P ú blico-privada PPP. Novembro/2003 -

A Estrutura do Mercado de Energia Elétrica

Geração Elétrica Total. Cenário de Referência (2007)

Impactos da Polí.ca de Preços de Eletricidade e Derivados. Luciano Losekann

LINHAS DE TRANSMISSÃO DE ENERGIA LTE

REFORMA ELÉTRICA A Experiência Brasileira

O Globo 09/01/2011 Desmatobrás Construção de 61 hidrelétricas provocará desmatamento de 5,3 mil km2, equivalente à área do Grande Rio Liana Melo e

4 º Congresso de Consumidores CELESC. Copel Distribuição S.A.

Sm S a m r a t r t Gr G i r d Bruno Erik Cabral

Setor Elétrico: Oportunidades e Ameaças

3º. Seminário Nacional de Segurança e Saúde no Setor Elétrico Brasileiro

Uma introdução ao setor elétrico

O QUE ESTÁ ACONTECENDO?

GERAÇÃO DISTRIBUÍDA E COGERAÇÃO COM GÁS NATURAL: BARREIRAS TECNOLÓGICAS E INSTITUCIONAIS

INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO

Considerações da ABRAGE sobre o Vencimento das Concessões de. Brasília, 06 de julho de 2011

ENTENDENDO A FATURA DE ENERGIA ENTENDA COMO É FORMADA A FATURA DE ENERGIA ELÉTRICA E DESCUBRA POR QUE VOCÊ PAGA TÃO CARO

Financiamento a Longo Prazo. Alternativas. Capital Próprio. Prf. José Fajardo EBAPE-FGV. Ações Ordinárias Ações Preferenciais

Tecnologia, qualidade e energia a serviço da economia

EDP Energias do Brasil

III Workshop Inovação para o Estabelecimento do Setor de Energia Solar Fotovoltaica no Brasil. Nelson Fonseca Leite Presidente 06/03/2013

AGÊNCIA DE REGULAÇÃO ECONÓMICA MODELO DE GOVERNAÇÃO

Crescer agregando valor

Risco na medida certa

Riscos e Garantias para a Comercialização de Energia de PCHs Encontro Nacional de Operadores e Investidores em Pequenas Centrais Hidrelétricas

Aspectos Jurídicos 1

SEMINÁRIO CRESCE BRASIL ENERGIA

Audiência Pública nº 006/2015

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÕES

EARNINGS RELEASE 1º SEMESTRE 2007

COPASA COMPANHIA DE SANEAMENTO DE MINAS GERAIS

Perspectivas do Suprimento de Energia Elétrica

Ações ABESCO e ANEEL para Fortalecimento do Mercado de Eficiência Energética. Reive Barros dos Santos Diretor

Valor Setorial Energia (Valor Econômico) 15/04/2015 Garantia para o sistema

Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) Notas sobre o balanço de um ano do PAC

Incômodos para consumidores, impactos para a economia

Transcrição:

Experiência de Regulação no Setor Elétrico Brasileiro Edvaldo Santana Diretor da ANEEL Lisboa, 29 de maio de 2008

Sumário Descrição dos objetivos Considerações iniciais i i i Regulação e Tarifas: evolução O que explica esses resultados O que ainda precisa ser feito Considerações finais

Descrição dos objetivos Objetivos Mostrar a evolução recente do quadro regulatório do setor elétrico brasileiro i Utilizar para isso dois indicadores de governança Qualidade regulatória e Regras e leis Será discutida apenas uma das variáveis: o custo da energia comprada

Governança no Brasil Presidência Política Energética CNPE Congresso Nacional Política Energética Política Energética Ministério de Minas e Energia Diretrizes ANEEL Índices de Monitoramento Plano de expansão G&T CMSE EPE ANEEL Procedimentos de Rede Regras e Procedimentos Regulamentos Tarifas Regulamentos ONS CCEE Agentes G, T, D e C Consumidor Cativo Consumidor Livre 4

ANEEL Diretores Indicados pelo Presidente da República Aprovados pelo Congresso Nacional, após sabatina Mandatos de 4 anos não coincidentes Podem ser reconduzidos apenas uma vez Não podem ser destituídostu dos Autonomia administrativa e financeira Agência do Estado e não do Governo Processo decisório público e transparente

Considerações iniciais (1) As condições precedentes antes de 1993 O Brasil passava por grandes transformações em termos políticos e econômicos Nova Constituição i no final dos anos 80 Programa de privatização que acompanhava uma tendência mundial Grave crise na economia: risco-cambial e risco-país Desconfiança dos investidores, o que resultou: Desvalorização dos Ativos quando da privatização Maiores exigências de retorno para capitais, logo, maiores tarifas A ANEEL foi criada após o modelo, o que aumentou as incertezas regulatórias

Considerações iniciais (2) Algumas considerações conceituais A transição entre 1995 e 2008 pode ser mostrada pela análise de dois indicadores Indicadores de governança Banco Mundial Qualidade regulatória: habilidade para formular e implementar regulamentos Regras e Leis: confiança na regras e no Judiciário, empenho no cumprimento dos contratos Como esses indicadores evoluíram ao longo do tempo?

Regulação e tarifas: evolução (1) Período anterior a 1993 (até a Lei nº 8.631/93) Tarifa pelo custo do serviço Remuneração garantida Déficit tarifário de mais de US$ 25 bilhões Inadimplência generalizada Distribuidoras não pagavam pela compra de energia Elevado grau de endividamento Expansão comprometida Muitas obras de geração em atraso Ou seja, era baixíssima a reputação do setor elétrico A qualidade regulatória deixava muito a desejar, inclusive quanto ao cumprimento da lei

Regulação e tarifas: evolução (2) Lei de Concessões (Lei nº 8.987/95) Tarifa deixou de ser pelo custo do serviço, mas sim resultado de uma licitação Contrato de concessão incorpora mecanismo de revisão das tarifas Criada a figura do equilíbrio econômico-financeiro e das tarifas diferenciadas Contrato de concessão Traduz o que determina a Lei, sobretudo quanto à revisão e reajuste da tarifa e à qualidade do serviço Processos de revisão e reajuste cumprem a Lei, o Contrato e as condições para isso Bons indícios de qualidade regulatória

Regulação e tarifas: evolução (3) Lei nº 9.648/98 Modelo que vigorou até dez/2003 Criou a livre negociação na compra e venda de energia Definiu a transição dos contratos iniciais Não definiu como as geradoras estatais venderiam a energia descontratada A ANEEL estabeleceu o limite de repasse dos custos da compra de energia para as tarifas - Valor Normativo (VN) O VN era calculado por fonte e levava em conta o IGPM, a taxa de câmbio e o combustível A Lei nada dizia sobre a separação vertical Compra de energia dentro do mesmo grupo econômico pode ter aumentado o custo da energia Incompletude da Lei gerou dificuldade para cumprimento do contrato

Regulação e tarifas: evolução (4) Programa Prioritário de Termelétricas (PPT) No ano 2000, já com a expansão comprometida, o Governo criou o Programa Prioritário de Termeletricidade Tal programa assegurava o repasse do VN A compra de energia podia ser feita de empresas do mesmo grupo econômico Em 2002 a ANEEL estabeleceu apenas o VN competitivo O CNPE determinou o VN por fonte e ampliou o prazo para compra de energia de empresas do mesmo grupo Racionamento entre 2001 e 2002 e grave crise da economia; risco-país chegou a 2.500 pontos Sério comprometimento da qualidade regulatória

Regulação e tarifas: evolução (5) Lei nº 10.848/04 Novo modelo - 2004 Distribuidoras só podem comprar energia por meio de leilões Preços do 1º leilão de energia nova: Hidrelétrica: R$ 117,24/MWh Termelétrica: R$ 152,20/MWh Preços do 2º leilão de energia nova: Hidrelétrica: R$ 136,23/MWh Termelétrica: R$ 146,50/MWh Outros preços Termopernambuco: R$ 117,68/MWh Termofortaleza: R$ 141,44/MWh 44/MWh Compras da Celesc: R$ 110,41/MWh Compras RGE: R$ 117,64/MWh Compras da Cemig: R$ 84,83/MWh

Regulação e tarifas: evolução (6) Novo modelo deixou mais claro o papel da ANEEL Em 2004: últimas mudanças na Lei da ANEEL Entre 1998 e 2003 ocorreram 70 mudanças na Lei Estabilidade regulatória e confiança nas leis Resultados recentes: Leilão de Santo Antônio: R$ 78,87 /MWh (dez/07) Preço-Teto: R$ 122/MWh Leilão da UHE Jirau: R$ 71,40/MWh Preço-Teto: R$ 91,00 /MWh Tarifas de energia elétrica, quando das revisões, passam por reduções relevantes, em alguns casos acima de 15%

Regulação e tarifas: evolução (6) Conclusões imediatas Algumas distribuidoras não têm contrato com usinas do PPT (ou de parte relacionada), e as tarifas não estão entre as menores (CEMIG) Outras distribuidoras compram energia do PPT ou do mesmo grupo econômico e as tarifas estão na média (BA, PE e CE) ou entre as menores (SPc, SPi) Custo da energia comprada não explica tudo

O que explica esses resultados? (1) Compatibilidade dos custos da energia comprada, apesar de elevados: Custos refletiam condições econômicas e regulatórias da época: Elevado risco-país e elevada taxa de juros, o que exigia maiores retornos Racionamento, que sinalizava preços elevados Desconfiança dos investidores, dado o passado de inadimplência e de incertezas de leis e regulamentos Necessidade e dificuldade de aumento da oferta, o que aumentou os riscos e os custos Essas condições ou ciclo vicioso permaneceram até depois de 2006, antes dos leilões do Rio Madeira

O que explica esses resultados? (2) Redução dos custos da energia comprada e das tarifas: Melhoria das condições econômicas e regulatórias permitiu a redução do custo de capital (de 11,26% para 9,90%) 90%) A firme disposição do Governo e da ANEEL de cumprirem a Lei e o Contrato criou um ambiente institucional com menor risco regulatório Essas melhorias de condições asseguraram a redução do custo da energia comprada (ex.: Rio Madeira) São relevantes os incentivos para a redução dos custos, o que se observa no 2º ciclo de revisão Hoje a ANEEL reduz a tarifa em mais de 15% e não há contestações com argumentos defensáveis Ou seja, há um ciclo virtuoso em termos regulatórios

O que ainda precisa ser feito? (1) Redução dos custos da energia comprada Minimizar as intervenções nos projetos e na execução das obras de geração: Problemas ambientais Imprevisibilidade de conclusão de obras Perdas não-técnicas de energia (fraude e furto): Hoje equivalem às duas usinas do rio Madeira Se não há pagamento não há racionalização do uso Perdas técnicas e não técnicas representam um custo de R$ 4,862 bilhões em 2007 (8% da receita de fornecimento) Maiores perdas implicam mais necessidade de expansão com usinas mais caras Talvez pela incompreensão do tema por parte de terceiros, a ANEEL enfrenta resistências em tal área

O que ainda precisa ser feito? (3) Redução de outros custos: Custos de transmissão: As novas usinas estão mais longe do centro de carga, o que requer relevante expansão; Os leilões de transmissão reduzem de maneira importante os custos de transmissão; Reforços são autorizados para transmissores já existentes; Contratos de transmissão também são objetos de revisão das tarifas.

O que ainda precisa ser feito? (4) Redução de outros custos: Encargos e tributos: Interligação dos sistemas isolados, mas com efeitos para a redução da CCC Redução da CCC Não deveriam ser criados novos encargos e Não deveriam ser criados novos encargos e tributos, que só são criados por Lei

Considerações finais Evolução do processo de regulação no Brasil passou por momentos difíceis As tarifas passam por reduções relevantes, em um ciclo virtuoso, que decorre do cumprimento de contratos e leis As tarifas foram calculadas, revisadas e reajustadas de forma a obedecer as Leis e os Contratos Se erro é percebido, a ANEEL jamais deixa de corrigi-los O processo de decisão é público, com voto por escrito, sustentado em argumentos técnicos e legais A ANEEL tem o respaldo da Justiça na direção do cumprimento dos Contratos Atuar na modificação de contratos aumenta o risco regulatório, o que afeta os custos É essencial a qualidade regulatória e o comprimento das regras e leis