Resumo/Abstract Introdução Materiais e métodos Resultados Discussão Conclusão Agradecimentos...

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Transcrição:

INDÍCE Resumo/Abstract... 1 Introdução... 5 Materiais e métodos... 7 Amostra...7 Imagem...8 Histopatologia...9 Análise estatística...9 Resultados... 10 Discussão... 15 Conclusão... 16 Agradecimentos... 17 Referências bibliográficas... 18

RESUMO INTRODUÇÃO: Crianças e adolescentes com Doença Hepática Crónica (DHC) necessitam de monitorização frequente da evolução da doença. Acoustic Radiation Force Impulse Imaging (ARFI) é um novo método imagiológico que calcula a rigidez mecânica dos tecidos, incluindo do fígado, através de impulsos acústicos. OBJETIVO: O objetivo deste trabalho foi avaliar a acuidade da tecnologia ARFI na determinação do grau de fibrose hepática, particularmente de grau ligeiro (F1), em pacientes de idade pediátrica. MATERIAIS E MÉTODOS: Estudo retrospetivo de crianças e adolescentes seguidos em consulta de hepatologia por DHC, onde foram comparados os resultados da análise histológica da biópsia hepática com os valores de ARFI obtidos no fígado. Os valores de ARFI foram obtidos com um equipamento Acuson S2000, Siemens Medical Solutions, utilizando o software Virtual Touch Tissue Quantification. As velocidades das ondas de propagação transversal foram medidas em várias regiões no fígado. Foi utilizado o software SPSS para a análise estatística dos dados. RESULTADOS: Foram analisados 60 casos, com idades entre os 1 e os 17 anos (média 8,05, desvio padrão 4,81) - 32 casos com score F0, 16 com score F1, 8 com score F2 e 4 com score F3 com base na análise histológica. A mediana dos valores de ARFI para cada um destes grupos foi: F0, 1.37 m/s; F1, 1.33 m/s; F2, 1.66 m/s e F3, 2.25 m/s. O resultado do teste de Mann- Whitney demonstrou a presença de diferenças estatisticamente significativas apenas quando comparando os valores de ARFI de F1 com F2 e F1 com F3. Comparando a classificação histológica com os valores de ARFI baseados na literatura, verificou-se uma sensibilidade de 40,6% para F0; 25% para F1; 25% para F2; 75% para F3. A especificidade foi de 59,1% para F0; 28,6% para F1; 33,3% para F2; 16,7% para F3. 1

DISCUSSÃO: Dos 38 casos discordantes, 27 apresentaram valores de ARFI mais elevados em relação ao esperado, dos quais 22 (81,5%) demonstraram alterações inflamatórias; 11 casos apresentaram valores inferiores ao esperado apesar da presença de fibrose histologicamente confirmada. Verificou-se uma baixa especificidade deste método diagnóstico na deteção de graus mais ligeiros de fibrose (score F1) comparativamente a graus mais avançados (F 2), o que na amostra estudada poderá ser atribuível à presença de alterações inflamatórias. CONCLUSÃO: A baixa especificidade do método no estudo de fibrose ligeira é semelhante ao descrito na literatura. Deverão ser efetuados outros estudos na população pediátrica, sobretudo para avaliar o papel da inflamação na elevação dos valores de ARFI. PALAVRAS CHAVE: Ecografia, Acoustic Radiation Force Impulse, Fibrose Hepática, População Pediátrica. 2

ABSTRACT INTRODUCTION: Children and adolescents who suffer from Chronic Hepatic Disease need regular monitoring of the progression of their liver disease. Acoustic Radiation Force Impulse Imaging is a new method to assess tissue stiffness, including the liver, through acoustic impulses. OBJECTIVE: The purpose of this study was to evaluate the acuity of the ARFI method for estimating liver fibrosis, particularly mild fibrosis (F1), in the pediatric population. MATERIALS AND METHODS: Retrospective study of children and adolescents monitored for Chronic Hepatic Disease that compared the results of the histologic analysis with the ARFI values obtained from the patient s liver. ARFI values were obtained with a Acuson S2000, Siemens Medical Solutions equipment, using the Virtual Touch Tissue Quantification software. The share wave velocities were measured in different areas of the liver. Statistical analysis was then performed using the SPSS software. RESULTS: A total of 60 cases were studied, with ages ranging from 1 to 17 (mean age, 8,05; standard deviation, 4,81); 32 scored as F0, 16 scored as F1, 8 scored as F2 and 4 scored as F3 in the histologic analysis. The median ARFI values for each of the groups mentioned above was: F0, 1.37 m/s; F1, 1.33 m/s; F2, 1.66 m/s e F3, 2.25 m/s. The Mann-Whitney test showed the presence of statistical significant differences only when comparing the ARFI values between the groups F1 with F2 and F1 with F3. When comparing the histologic fibrosis classification with the ARFI values based on literature, there was a sensitivity of 40,6% for F0; 25% for F1; 25% for F2; 75% for F3. The observed specificity was of 59,1% for F0; 28,6% for F1; 33,3% for F2; 16,7% for F3. DISCUSSION: Of the 38 discordant cases, 27 showed ARFI values higher than expected and from those, 22 (81,5%) had inflammatory alterations; the remaining 11 cases presented lower 3

ARFI values than expected despite having histologically confirmed fibrosis. It was observed a low specificity from this method on the detection of milder fibrosis stages (F1) when compared to more advanced stages (F 2), which can be possibly attributed to the presence of inflammatory alterations in the studied sample. CONCLUSION: The low specificity of the method for low stage fibrosis is concordant to what is described on the literature. Other studies should be conducted in the pediatric population, particularly to evaluate the role of inflammation in raising the ARFI values. KEYWORDS: Ecography, Acoustic Radiation Force Impulse, Hepatic Fibrosis, Pediatric Population. 4

INTRODUÇÃO A doença hepática crónica (DHC) em idade pediátrica compreende um grupo de alterações, como a hepatite autoimune, a hepatite B, as doenças metabólicas, a cirrose biliar 1,2, cuja causa pode ser congénita, metabólica, tóxica e infecciosa. 3 A maioria das doenças hepáticas diagnosticadas na infância progridem para fibrose e, finalmente, para cirrose, necessitando de transplante hepático. É fundamental nestes doentes a monitorização regular da progressão da doença. 2 A biópsia hepática é considerada como gold standard para a avaliação hepática 4, mas tem riscos e limitações. Para além de ser uma técnica invasiva que requer habitualmente o uso de anestesia geral em idade pediátrica e que pode estar associada a complicações 5, permite apenas uma análise semi-quantitativa do tecido em estudo e está sujeita a erros de colheita. 6 Nos últimos anos têm sido desenvolvidos métodos não invasivos com recurso a ultrassons na tentativa de substituir parcialmente este procedimento. As vantagens passam pela boa tolerabilidade dos pacientes, pela rapidez de execução e de obtenção dos resultados e pelo baixo custo, quer dos exames, quer dos equipamentos. 7 Após rigorosa validação, a medição da rigidez hepática com recurso ao método de elastografia transitória (TE), também conhecido como FibroScan, tornou-se um procedimento amplamente utilizado na avaliação do grau de fibrose hepática. 8 No entanto, esta técnica é principalmente utilizada em adultos e apresenta várias limitações - não é guiada em tempo real, a profundidade de medição não é alterável e, até recentemente, a sonda utilizada em adultos não era adaptável para crianças. Para além do tamanho da sonda, a vibração que é desencadeada muitas vezes não é ajustada à morfologia dos lactentes e crianças com menos de 4 anos de idade. 6 Acoustic Radiation Force Impulse Imaging (ARFI) é um novo método imagiológico integrado em ecógrafos de Modo-B convencionais que, com recurso a impulsos acústicos, 5

calcula a rigidez mecânica dos tecidos. 9-14 Com recurso à sonda de ultrassons, o examinador escolhe a região de interesse (ROI) em tempo real por forma a evitar estruturas que possam alterar erradamente os resultados Figura 1. Através de um impulso acústico são formadas ondas de propagação transversal, cuja velocidade é medida em metros por segundo (m/s). A velocidade de propagação desta onda está diretamente relacionada com a rigidez do tecido da ROI. 15 Figura 1 - Representação da medição do valor de ARFI na ROI do tecido em estudo. O objetivo deste trabalho foi, através de um estudo retrospetivo, avaliar a acuidade da tecnologia ARFI na determinação do grau de fibrose hepática, particularmente de grau ligeiro (F1), em pacientes de idade pediátrica. 6

MATERIAIS E MÉTODOS Amostra Estudo retrospetivo de 60 casos de crianças e adolescentes (30 do sexo masculino e 30 do sexo feminino) com idades compreendidas entre 1 e 17 anos (média 8,05) seguidas em consulta de hepatologia do Hospital Pediátrico - CHUC (Tabela 1). Efetuaram-se biópsias e medições ARFI, tendo estas sido realizadas no mesmo dia ou em dias consecutivos. Todos os estudos ARFI foram realizados no Serviço de Imagem Médica do Polo H. Pediátrico - CHUC e as avaliações histológicas no Serviço de Anatomia Patológica do Polo HUC - CHUC entre 2011 e 2015. O estudo foi aprovado pela comissão de ética da FMUC. Tabela 1 - Patologia hepática e sua frequência na população em estudo. Patologia Nº de casos Transplante Hepático 52 Doença de Wilson 2 Hepatite Autoimune 2 Colangite Esclerosante Autoimune 1 Doença Metabólica 1 Leucemia 1 Sindrome Colestática Crónica 1 7

Imagem Os valores de ARFI foram obtidos através de um ecógrafo Acuson S2000, Siemens Medical Solutions, equipado com transdutor de 4-MHz. A velocidade das ondas transversais foi medida utilizado o software Virtual Touch Tissue Quantification (Siemens Medical Solutions) em diferentes ROI no fígado. A sonda foi colocada a nível do espaço intercostal e/ou espaço subcostal. Foram realizadas 2 a 3 medições (Figura 2) na mesma ROI, em diferentes localizações do fígado, durante a apneia inspiratória ou expiratória, tendo sido realizadas uma média de 9 medições por doente. Durante o exame o operador observou o fígado através de modo-b, selecionando a RdI para medição dos valores de ARFI. Áreas com grandes vasos foram evitadas. A velocidade das ondas transversais foi então medida e registada. As medições foram repetidas quando, por exemplo devido a algum movimento da criança ou ao choro, o software não conseguiu calcular a velocidade. Com base na experiência do Serviço e segundo a literatura 6,8,16 foi utilizada a classificação para fibrose: F0 quando ARFI < 1,3; F1 quando ARFI 1,3 e < 1,5; F2 quando ARFI 1,5 e < 1,7; F3 quando ARFI 1,7. Figura 2 - Imagem em modo B, de fígado, com a ROI (caixa verde) onde a medição ARFI será efetuada. 8

Histopatologia As biópsias, guiadas por ecografia, foram realizadas sob anestesia, através da técnica de mão-livre. Foi utilizada uma agulha automática de calibre 16G e os fragmentos hepáticos foram recolhidos através de um acesso subcostal ou intercostal. As amostras foram fixadas em formol e embebidas em parafina. Foram analisadas por um patologista (M.A.C.) com 22 anos de experiência em histopatologia hepática com recurso ao sistema de classificação de Batts e Ludwig 17, tendo sido apenas consideradas para avaliação semi-quantitativa as amostras com 5 ou mais espaços porta. O grau de fibrose foi classificado na escala de F0-F4 onde F0 significa ausência de fibrose; F1, presença de espaços porta alargados e fibróticos; F2, fibrose peri-portal ou porto-portal com arquitetura intacta; F3, fibrose com distorção da arquitetura, mas sem cirrose óbvia; F4, cirrose provável ou definitiva. Análise Estatística A análise estatística foi realizada com recurso ao software SPSS versão 15.0 (IBM, Armonk, NY). Foi realizada análise descritiva de cada grupo. O teste não paramérico de Kruskal-Wallis foi realizado para averiguar a existência de diferenças estatisticamente significativas entre os grupos, utilizando-se posteriormente o teste não paramétrico de Mann- Whitney para comprar os grupos 2 a 2. Para comparação da classificação histológica com a classificação seguida segundo dados da literatura, utilizou-se o teste de correlação intraclasse. 9

RESULTADOS Foram analisados um total de 60 casos, 30 (50%) do género feminino e 30 (50%) do género masculino, com idades compreendidas entre os 1 e os 17 anos (média 8,05, desvio padrão 4,81). A distribuição do número de casos por score de fibrose segundo a análise histológica e a respectiva mediana dos valores de ARFI é apresentada na Tabela 2. Não foram considerados os valores médios devido ao pequeno tamanho da amostra para os grupos de score F2 e F3. Foi elaborado um gráfico boxplot com a distribuição dos valores de ARFI medidos por grupo de score de fibrose (Gráfico 1). Tabela 2 - Distribuição do número de casos por grupo de score de fibrose segundo a análise histológica e respetivas medianas dos valores de ARFI registados. Estádio Fibrose Nº casos Mediana ARFI F0 32 1.37 F1 16 1.33 F2 8 1.66 F3 4 2.25 10

Gráfico 1 - Distribuição dos valores de ARFI (m/s) em cada grupo de score de fibrose. Caixas representam os quartis superior e inferior; linhas horizontais representam os valores de mediana e whiskers. Os círculos representam valores outliers. O resultado do teste Kruskal-Wallis, p = 0.03, demonstrou existirem diferenças estatisticamente significativas entre os diferentes grupos de score de fibrose (p < 0,05 pelo que rejeitamos a hipótese nula), tendo-se recorrido ao teste Mann-Whitney (Tabela 3) para comparar os grupos 2 a 2. Tabela 3 - Valores p obtidos no teste de Mann-Whitney comparando os grupos 2 a 2. F1 F2 F3 F0 0.279 0.082 0.082 F1 0.013 0.039 F2 0.461 11

Foi realizado um teste de correlação intraclasse comparando a classificação tendo por base a análise histológica realizada neste estudo e a classificação seguida segundo os dados da literatura 6,8,16 (F0 quando ARFI <1.3; F1, ARFI 1,3 e <1,5; F2, ARFI 1,5 e <1,7 e F3, ARFI 1,7). O resultado demonstrou a existência de correlação entre os dois grupos (classificação histológica e classificação com base na literatura) p = 0.019, sendo, no entanto, fraca ICC = 0.235 18. O gráfico é apresentado abaixo (Gráfico 2). Gráfico 2 - Correlação entre a classificação histológica e a classificação com base na literatura. A frequência relativa é representada no eixo dos yy; dentro de cada categoria estão representadas as frequências absolutas. 12

Verificou-se uma sensibilidade de 40,6% (13 em 32) para F0; 25% (4 em 16) para F1; 25% (2 em 8) para F2; 75% (3 em 4) para F3. A especificidade foi de 59,1% (13 em 22) para F0; 28,6% (4 em 14) para F1; 33,3% (2 em 6) para F2; 16,7% (3 em 18) para F3. Dos 38 casos discordantes, 27 apresentaram valores de ARFI mais elevados em relação ao esperado (Tabela 4) - 19 (de n=19) para F0; 4 (de n=12) para F1; 4 (de n=6) para F2. Destes, 22 (81,5%) apresentavam alterações inflamatórias. Tabela 4 - Casos discordantes com valores ARFI acima do esperado. Classificação AP Nº de casos Nº casos c/ fibrose Nº casos c/ necrose Nº casos c/ inflamação F0 19 2 5 15 F1 4 4 0 3 F2 4 4 2 4 Os restantes casos discordantes (n=11) apresentavam valores de ARFI abaixo do esperado, apesar da presença de fibrose histologicamente confirmada (Tabela 5), sendo que 72,7% (n=8) apenas tinham score F1. 13

Tabela 5 - Casos discordantes com valores ARFI inferiores ao esperado. Classificação com base em ARFI Classificação Histológica Nº de casos F0 F1 8 F0 F2 1 F1 F2 1 F1 F3 1 14

DISCUSSÃO A quantificação do grau de fibrose hepática é de extrema importância no seguimento e tratamento de crianças e adolescentes com DHC. Apesar da biópsia permanecer como teste de referência para a avaliação destes doentes 4, a tecnologia ARFI é um método não invasivo que já provou ser útil em adultos 6. Com base na análise estatística dos dados recolhidos neste estudo e através do resultado obtido no teste de Kruskal-Wallis, inferimos à partida a existência de diferenças estatisticamente significativas para os valores de ARFI de grupos com diferente score de fibrose. Posteriormente, recorrendo-se ao teste de Mann-Whitney, verificou-se que estas diferenças eram apenas significativas quando comparando os valores dos grupos F1 com F2 e F1 com F3 (p < 0.05). Ora, com base nestes resultados podemos afirmar que existe alguma possibilidade de distinção entre graus ligeiros (F1) e moderados a severos de fibrose (F2 e F3), existindo, no entanto, uma sobreposição dos valores de ARFI quando comparando casos com score de F0 com F1 e F2 com F3, o que dificulta uma classificação mais rigorosa. Esta sobreposição de valores é também observável através da análise do gráfico Boxplot (Gráfico 1). Existe, pois, uma baixa sensibilidade do método ARFI na deteção de graus mais ligeiros de fibrose comparativamente a graus mais avançados (F 2), o que é sobreponível ao encontrado na literatura. No estudo de Hanquinet et al, foi observado um aumento significativo dos valores de ARFI para doentes com score de fibrose F3 e F4, um aumento ligeiro para doentes com score de F2 e uma dificuldade na distinção entre doentes com score de F0 e F1 6. Num estudo de 112 doentes com hepatite crónica C, Lupsor et al demonstraram também resultados concordantes. Verificou-se uma elevação dos valores de ARFI com a progressão da gravidade de fibrose, havendo, no entanto, uma sobreposição dos valores para graus de fibrose mais ligeiros e para estágios consecutivos de fibrose, nomeadamente F0-F1, F1-F2 e F2-F3 10. Quando comparando 15

a acuidade diagnóstica do método ARFI e o método TE para a deteção de fibrose hepática, ambos os métodos apresentam acuidade semelhante para fibrose severa e cirrose (89.21% e 90.19% respetivamente para o método ARFI), havendo, no entanto, melhores resultados com o método TE para graus de fibrose mais ligeiros. Recentemente, Yook KT et al demonstraram, em adultos, a elevação dos valores de ARFI quando comparando doentes com presença de alterações inflamatórias (demonstrados pela presença de uma elevação dos valores de ALT) com doentes com valores de ALT normais. 8 Assim, é, pois, necessária a integração dos valores ARFI no contexto clínico e em conjunto com os dados laboratoriais, particularmente em doentes com grau de fibrose ligeira (F1), assinalando-se que alterações inflamatórias apontam na diminuição da especificidade deste método diagnóstico. Embora prejudicando a especificidade, os valores de ARFI elevados indicam um parênquima hepático de rigidez alterada pela inflamação, o que aponta numa satisfatória sensibilidade desta tecnologia para a patologia hepática. De referir a presença de algumas limitações na realização deste estudo, nomeadamente o pequeno tamanho da amostra, o amplo espectro de patologias entre os diferentes doentes e a existência de alterações inflamatórias. CONCLUSÃO Apesar da menor acuidade para graus de fibrose ligeira, o método ARFI continua uma alternativa para estimar o grau de fibrose hepática. Outros estudos deverão ser feitos na população pediátrica sobretudo para avaliar o papel da inflamação na elevação dos valores de ARFI. 16

AGRADECIMENTOS Ao Senhor Professor Doutor Filipe Caseiro Alves, deixo o meu agradecimento por toda a ajuda proporcionada, pela simpatia, compreensão e disponibilidade demonstradas em todo este processo. À Senhora Dra. Maria José Noruegas, um especial obrigado, não só pelo apoio prestado e pelas valiosas e claras orientações dadas ao longo de todo o trabalho, mas também por se mostrar sempre disponível, prescindindo muitas vezes de tempo pessoal para responder com a maior brevidade a qualquer dúvida e ajudando a efetuar correções. 17

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