A prática coral e a formação dos sujeitos: uma reflexão teórica e algumas práticas pedagógicas



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Transcrição:

A prática coral e a formação dos sujeitos: uma reflexão teórica e algumas práticas pedagógicas Leila Miralva Martins Dias UFBA/UFRGS Resumo: Este artigo reflete primeiramente sobre a importância da prática coral como uma possibilidade de educação musical, mostrando a visão de alguns autores que apontam os benefícios musicais, sociais e humanos da prática coral no cenário da sociedade. Além disso, compartilha algumas propostas pedagógicas que são resultantes de experiências educacionais vividas em cursos de empresas, organizações não governamentais, extensão universitária, sobretudo um projeto coral para todas as faixas etárias. Trata-se de trabalhos de educação musical utilizando a prática coral como principal recurso de musicalização já que o canto coletivo é de fácil acesso e oferece diversas oportunidades para que os sujeitos envolvidos se expressem musicalmente e artisticamente além de se desenvolverem no convívio com o outro, vencendo barreiras e ganhando autoconfiança. Algumas formas de trabalhar o aquecimento na prática coral são trazidas aqui como o enfoque principal desse artigo, por acreditar que a prática dele trouxe significativas contribuições para os envolvidos nessas experiências. Palavras-chave: Educação Musical; Prática Coral; Propostas Pedagógicas. Introdução Acreditando que a prática pedagógico musical deve ser voltada para os sujeitos e, portanto significativa, expressiva, envolvente e transformadora, este artigo primeiramente tem o objetivo de apresentar algumas reflexões acerca da importância da prática coral na vida das pessoas. Em seguida, compartilhar algumas experiências da prática coral, vividas em diversos espaços de ensino e aprendizagem musical tais como cursos de extensão, creches, escolas de bairros periféricos e organizações não governamentais. 1. A importância da prática coral na vida das pessoas Na sociedade atual, a prática coral está sendo cada vez mais presente no cenário musical como uma atividade de grande relevância não só por ter a voz humana como o instrumento de emissão sonora, portanto de fácil acesso, mas também por ser uma prática coletiva de baixo custo, o que parece ser propício, inclusive ao contexto escolar. Costa (2009) apresenta estratégias para formação e manutenção de coros nas escolas do ensino médio ao mesmo tempo em que incentiva essa prática como alternativa para a educação musical nas escolas. Pereira e Vasconcelos desenvolveram um estudo sobre as dimensões pessoal, interpessoal e comunitária dos indivíduos com o intuito de observar o processo de

socialização presente no canto coral. Eles constataram que esta prática musical conduz simultaneamente ao aprendizado e ao desenvolvimento de relações com a música, com os outros e com a comunidade. (PEREIRA e VASCONCELOS, 2008). Fucci Amato (2007), em seu artigo O canto coral como prática sócio-cultural e educativo-musical, também aborda aspectos como a motivação, a inclusão social e a integração interpessoal, que podem ser desenvolvidos a partir da participação em coros de diversas formações. Ela ainda afirma que o canto coral se constitui em uma relevante manifestação educativo-musical e em uma significativa ferramenta de ação social. A prática coral fundamentada nos moldes das preocupações contemporâneas procura valorizar a expressão do aluno e da sua subjetividade, o incentivo à imaginação e à criatividade, a afetividade, a sociabilidade, a busca pela autonomia e o alcance da teoria a partir da prática. Esse processo se desenvolve através do diálogo dos sujeitos envolvidos em prol do conhecimento do mundo do aluno e da contribuição do professor, o conhecimento global do conteúdo trabalhado e a integração das individualidades para a construção de um todo musical, artístico, educacional, sociocultural e, sobretudo, humano (SANTA ROSA, 2006). Nelson Mathias (1986) afirma que a música intervém em cinco partes principais da dimensão humana: a pessoal, grupal, comunitária, social e política assim como atravessa as estruturas de nossas identidades, harmonizando-nos com o nosso eu interior, com o outro e com a sociedade em que vivemos (MATHIAS, 1986). Em diversos contextos e faixas etárias o educador musical se depara com situações específicas o que demanda um trabalho dedicado do professor, tanto para a técnica do canto como para trabalhar as habilidades rítmicas, melódicas e harmônicas. Em muitos espaços, dificilmente há vozes suficientes para compor os naipes convencionais dos arranjos disponíveis para coro. Portanto, para grupos que conseguem cantar arranjos polifônicos, com menos de quatro vozes, demanda-se do educador arranjos adaptados ou criados para cada grupo. Além disso, o educador precisa estar atento às questões de liderança e, sobretudo, ao acolhimento das diversidades. Outras linguagens artísticas têm sido aliadas à prática coral, a exemplo dos gestuais, movimentos corporais, deslocamento e até coreografias. Com a união desses elementos, é possível também criar e montar musicais, incluindo figurinos, adereços, cenários, iluminação, sonorização, instrumentação, a depender da condição financeira e da mobilização do grupo. Estas práticas performáticas, através da integração entre diferentes linguagens artísticas, por

mobilizar mais elementos artísticos, têm contribuído, entre outras, para desenvolver de modo significativo, a habilidade de expressão dos coristas. Além disso, desenvolver a autoconfiança e o ganho da motivação, proporcionando o desenvolvimento dos educandos em outras dimensões humanas, além de provocar um maior interesse e envolvimento da platéia como assinala Santa Rosa (2006). Deste modo, tanto nos ensaios, como nas apresentações, o coro performático ocasiona aos coristas uma maior exposição de si, o desenvolvimento na habilidade de conviver com o outro, provocando maiores desafios ao indivíduo ampliando-lhe as possibilidades de aprendizagem. Diante disso, o processo de construção da performance, no coro, aparece como mais um veículo de educação musical que pode contribuir de modo significativo para a conquista da auto-estima, assim como para o desenvolvimento da sociabilidade e da valorização da pessoa humana, conforme nos adverte Santa Rosa (2006). 2. Experiências pedagógico-musicais na prática coral As atividades pedagógicas que serão aqui apresentadas são oriundas da minha experiência de alguns trabalhos de educação musical realizados em empresas, organizações não governamentais e projetos de extensão, sobretudo na coordenação de um projeto de cinco corais nos cursos de extensão da Escola de Música da Universidade Federal da Bahia, quando também regia coros de jovens e adultos, resultando na criação de uma companhia artística. Nesse projeto, criamos e montamos vários espetáculos musicais com pessoas que não estudaram música anteriormente. Acredito que os resultados obtidos se devem especificamente ao trabalho que chamaremos aqui de aquecimento. Considero que este operou de maneira significativa nos trabalhos da companhia e na vida dos coristas envolvidos, chegando a emergir solistas, cantores, regentes de coro e banda, arranjadores, instrumentistas, profissionais da música tanto em performance como em ensino, assim como especialistas na área de teatro musical. No entanto, o crescimento de cada um de nós aconteceu, não só para as práticas artístico-musicais, mas, sobretudo nas questões humanas e sociais. O aquecimento, acrescido das criações, tem como foco um trabalho atento aos sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem musical, contemplando suas subjetividades e acreditando na auto-superação e conseqüente expressão artística com confiança e apoio mútuo entre os colegas. Além dele, trataremos brevemente do vocalize e do ensaio do repertório.

Nas primeiras aulas, é necessário que todos passem a se conhecer utilizando os nomes uns dos outros, o que contribui para a afirmação das identidades. Para a memorização dos nomes ou auto-apresentação, existem, na literatura, várias atividades apropriadas para esta finalidade. Com todos em círculo, para que se vejam por igual, o professor deve conduzir trabalhos preferencialmente, musico corporais. Para começar o ensaio, é importante que todos os alunos entrem numa mesma sintonia já que farão música juntos, cantando a um só tempo e complementando um ao outro. Para esse fim, também em roda, é interessante conduzir um trabalho de alongamento, postura e respiração. Alongam-se braços, pernas, pescoço, coluna, de forma que todos possam acordar todas as partes do corpo. Em seguida, deve-se sugerir uma postura apropriada de pés paralelos, ombros relaxados, joelhos levemente flexionados e coluna ereta. Pede-se que os alunos coloquem as mãos na barriga e percebam a própria respiração, deixando entrar o ar pelo nariz e sair pela boca com a utilização de sons diversos na expiração. Depois, colocam-se as mãos nas costas promovendo a respiração intercostal. 1 Nas aulas seguintes, quando todos já se conhecem pelos nomes, após os trabalhos de alongamento, postura e respiração referidos acima, que devem ser realizados em todos os ensaios, o trabalho de aquecimento prossegue com atividades que promovam a participação de todos. Para isso, utilizo canção de roda, jogos musicais, brincadeiras rítmicas, cirandas, canções específicas para integração e trabalhos corporais com deslocamento além dos batimentos corporais tais como palmas, estalos, palmadas, além de atividades utilizando onomatopéias, sílabas, palavras, frases inteiras, provérbios e textos rítmicos (ORFF, 1972). Além disso, dinâmicas de criação devem ser adicionadas nas atividades do aquecimento, para que todos se sintam parte importante do grupo ao ver sua criação sendo executada pelos colegas e obviamente pelo professor. Enquanto cantam as canções já trabalhadas, cada pessoa cria um batimento, movimento, som ou gesto e os outros a imitam. Quanto ao modo de trabalhar essas dinâmicas, primeiro é importante ressaltar que há algumas canções que são mais apropriadas para se acrescentar essas dinâmicas de criação que outras. Segundo, que os primeiros modelos de criação devem partir sempre do educador. Os alunos não se sentem à vontade de criar modelos se o professor não o fizer inúmeras vezes antes. Somente quando os alunos estiverem soltos e envolvidos o suficiente, pode-se requisitar que cada um crie seu modelo para todos repetirem em seguida. 1 Existem várias possibilidades pedagógicas na literatura específica de coro para conhecer técnicas de alongamento, postura e respiração. Considerando que há divergências em algumas propostas, o educador musical deve consultar e vivenciar para escolher a maneira mais apropriada ao seu modo de atuar pedagogicamente.

Em síntese, o conteúdo utilizado no aquecimento do coro é constituído de trabalho alongamento, postura, respiração, brincadeiras musicais e dinâmicas de criação. Os recursos musicais, que necessariamente devem estar presentes nas brincadeiras e dinâmicas de criação, podem ser voz, textos, batimentos, gestuais, movimentos corporais com ou sem locomoção, células rítmicas e as canções devem ser simples para serem infinitamente exploradas a exemplo da unidade de tempo da canção, unidade de compasso, unidades menores e maiores, o ritmo da canção e outras sugestões que surgem do professor e dos alunos. Ouvem-se muitos coristas queixando que o vocalize é exaustivo e pouco estimulante. Assim sendo, é interessante trabalhar o vocalize inserido nas atividades do aquecimento corporal, depois ou durante o trabalho de respiração e no meio das brincadeiras musicais assim como do próprio repertório. Dessa forma, os coristas passam a compreender o real sentido do vocalize na prática coral. Entre as diversas maneiras atrativas de trabalhar o vocalize, pode-se acoplar textos como palavras dissílabas, trissílabas e assim por diante, entoadas em terças, notas ascendentes e descendentes, com cinco notas da escala diatônica, notas arpejadas, escalas cromáticas. Com o modelo melódico dado, também, pode-se trabalhar frases do dia a dia, apontar objetos da sala para que todos cantem com o nome daquele objeto, ou mesmo o nome das pessoas ali presentes. Em cada ensaio o educador deve criar atividades diferentes do ensaio anterior para não ficar repetitivo 2. No entanto, é importante ressaltar que, mesmo com adultos, o vocalize deve ser conduzido de maneira lúdica, utilizando tanto os textos como pequenas canções, modulações e improvisações de modo que os coristas possam aquecer a voz mantendo o entusiasmo pela prática coral. Após os trabalhos de aquecimento, os alunos ficam leves, respirando com consciência e descontraídos pelo efeito dos trabalhos de corpo e das brincadeiras musicais, com a auto-estima elevada, além de entrosados uns com os outros. Por conseguinte, abertos às novas aprendizagens. Esse é o momento ideal para se trabalhar repertório novo já que a compreensão musical e a capacidade de memorização estão acentuadas. O ensaio do repertório pode ser dividido em três momentos consecutivos: músicas novas, músicas em andamento e músicas prontas. Após o ensaio da música/arranjo novo, é interessante seguir trabalhando aquelas que estão em andamento para finalmente fazer uma 2 Há bastante material para o trabalho de técnica vocal com jogos musicais na literatura de educação musical (SCHMELING e TEIXEIRA, 2010; FONTERRADA, 2005; CHAN, 2004; MATHIAS 1986, entre outros).

apresentação informal das músicas prontas, especialmente para que os coristas se sintam estimulados com a construção gradual de um repertório pronto. Para aqueles coros que querem utilizar outras linguagens artísticas, a exemplo do movimento corporal, deve-se trabalhar apenas com as músicas prontas para assegurar uma melhor aprendizagem da nova linguagem. Ainda assim, é necessário voltar ao arranjo vocal eventualmente, porque, no começo, a colagem do canto com o movimento é complicada, embora seja um desafio muito apreciado pelos coristas. (SANTA ROSA, 2006). Quando se quer incluir a expressão cênica ou mesmo preparar espetáculos musicais, o texto, aliado ao trabalho de interpretação dos personagens, pode ser a próxima linguagem a ser incorporada. Para esse trabalho, quando possível, é interessante que o professor de música convide colegas das áreas de dança e teatro, evitando assim os dissabores da arte integrada. Considerações Finais Em uma perspectiva contemporânea da educação musical, na medida em que é importante contemplar as subjetividades dos envolvidos, a construção das identidades, e o convívio com a diversidade, a prática coral é aqui tratada como uma proposta de educação musical que proporcione o estímulo do corista através do desenvolvimento da sensibilidade artística e musical e, sobretudo da interação com o outro para a construção de uma nova forma de ser e estar no mundo, na medida em que as pessoas se aproximam umas das outras para a realização de um objetivo comum. Referências CHAN, Telma. Divertimentos de Corpo e Voz. XIV Encontros de Vivências Musicais. APEMBA. Salvador BA. 2004. COSTA, Patrícia. Coro juvenil nas escolas: sonho ou possibilidade? Música na Educação Básica. ABEM, Porto Alegre, v. 1, n.1 2009. FONTERRADA, Marisa. De tramas e fios: um ensaio sobre música e educação. São Paulo: Editora Unesp; 2005. FUCCI AMATO, Rita de C. O canto coral como prática sócio-cultural e educativo-musical. In: Opus, v. 13, n. 1, p. 75-96, Goiânia, 2007.

LANDIS, Beth ; CARDER, Polly. The Eclectic Curriculum in American Music Education: Contribuitions of Dalcroze, Kodaly and Orff. Music Education National Conference. USA.1972 MATHIAS, Nelson. Coral: um canto apaixonante. Musimed. Brasília, 1986. Série Musicologia. PEREIRA E, VASCONCELOS, M. O processo de Socialização no Canto Coral: um estudo sobre as dimensões pessoal, interpessoal e comunitária. Disponível em: <http://www.revistas.ufg.br/index.php/musica/article/view/1763/1715>. Acesso em 14 dez. 2008. SANTA ROSA, Amélia M. D. A Construção do Musical como Prática Artística Interdisciplinar na Educação Musical. 2006. 184f. Dissertação (mestrado em Música) - Programa de Pós-Graduação em Música da Universidade Federal da Bahia, Bahia, Salvador, 2006. SCHMELING, Agnes ; TEIXEIRA, Lúcia H. P. Atividades músico-vocais e características da voz infantil e juvenil. SOUZA, Jusamara. (Org.). Música, Educação e Cultura. Porto Alegre: [s.n]. 2010.