Nesta aula iremos discutir sobre: 1) Percepção e suas abordagens fundamentais; 2) teorias da percepção; e 3) déficits perceptivos.

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Transcrição:

Aula 03 PERCEPÇÃO Olá! Nesta aula iremos discutir sobre: 1) Percepção e suas abordagens fundamentais; 2) teorias da percepção; e 3) déficits perceptivos. Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: A) Compreender o conceito e processamento perceptual; B) Identificar as principais teorias da percepção; C) Entender os principais déficits perceptivos. Boa aula! A percepção é o conjunto de processos que permitem reconhecer, organizar e entender as sensações provenientes dos estímulos ambientais. Vamos nos ater especificamente à percepção visual durante nossa aula. Olhe a figura abaixo: 31

FONTE: STERNBERG, 2000 Ao olhar a figura, você identifica pontos e sombreados, sem bem saber se formam alguma imagem com significado. Com algum esforço é possível identificar um cachorro no centro da imagem, farejando algo no chão. Este é um exemplo do fenômeno da percepção. Agora, olhe para as figuras abaixo: FONTE: STERNBERG, 2000 O triângulo negro no centro do painel esquerdo e o triângulo branco no centro do painel direito parecem que saltam aos olhos, mas quando se olha cuidadosamente para cada um dos painéis, pode-se ver que os triângulos, na verdade não estão ali. O preto que forma o triângulo central no painel esquerdo parece mais escuro ou mais preto do que o preto ao seu redor, mas não é. Nem o triângulo central branco no painel direito é mais claro ou mais branco do que o branco que o cerca. Os dois triângulos centrais são ilusões de ótica, que compreendem a percepção da informação visual fisicamente não presente no estímulo visual sensorial. Essas ilusões perceptivas sugerem que aquilo obtido pelos órgãos dos sentidos não é necessariamente percebido na mente. Essa noção mostra que a cognição é responsável pela manipulação das informações, criando representações mentais de objetos, propriedades e ambientes (STERNBERG, 2000). Ao se estudar como o homem percebe estímulos, é importante compreender alguns conceitos básicos que compõem este fenômeno. São eles: constância perceptiva e percepção de profundidade. 32

Constância perceptiva Esse conceito se refere à noção de que o sistema perceptivo deve lidar com uma variabilidade de análises dos objetos no campo perceptivo, ou seja, a percepção de um objeto permanece igual, mesmo quando as noções de proximidade estão alteradas. Essa constância perceptiva é que explica como o homem ajusta sua percepção em casos de proximidade e distância, mantendo as noções de tamanho e forma. A constância de tamanho indica a permanência da noção de tamanho e um objeto apesar de mudanças no tamanho do estímulo proximal, ou seja, o mesmo objeto colocado em distâncias diferentes projeta imagens de tamanho diferente na retina (STERNBERG, 2000). Vamos observar a figura abaixo, que apresenta a ilusão de Ponzo. Os dois objetos são de tamanho igual ou diferente? FONTE: STERNBERG, 2000 Na figura, os sistemas sensoriais e perceptivos são enganados pela mesma informação, que normalmente auxilia o indivíduo a ter noção de tamanho. A impressão perceptual é de que as linhas horizontais são de tamanhos diferentes, com uma ilusão criada pela impressão de profundidade. Assim como a constância de tamanho, a constância de forma está relacionada à percepção das distâncias, mas de um modo diferente. Já a constância de forma é entendida como a percepção de que um objeto mantém a mesma forma, apesar das mudanças na forma do estímulo mais próximo (STERNBERG, 2000). Vamos a um exemplo? Observe a figura abaixo: FONTE: STERNBERG, 2000 33

Na figura, observamos uma ilusão na forma em que o objeto é percebido, lavando em conta a orientação do objeto. À medida que a forma real da imagem da porta se altera, algumas partes da porta parecem mudar de modo diferente em relação à distância do espectador, mas o formato da porta sempre permanecerá o mesmo. Outro conceito importante é a percepção de profundidade, que permite ao homem se orientar visualmente num espaço em três dimensões. Profundidade é a distância de uma superfície utilizando o próprio corpo como referência em termos de percepção. O conceito de profundidade é útil, por exemplo, quando se dirige um carro e precisamos visualizar a aproximação de outro veículo. Outros exemplos são observados até na modulação do volume da voz para chamar um conhecido do outro lado da rua. A decisão sobre a aproximação de um veículo ou do volume da voz são baseadas em como você percebe a distância entre os objetos (STERNBERG, 2000). VOCÊ SABIA? Pistas binoculares são referentes ao modo como usamos o posicionamento relativo dos olhos, esta distância é suficiente para levar informações de disparidade binocular e convergência binocular ao cérebro. Na disparidade binocular, ambos os olhos enviam imagens cada vez mais diferentes ao cérebro, à medida que os objetos se aproximam e o cérebro interpreta o grau de disparidade com indicação da distância até o espectador. Além disso, para os objetos vistos em lugares relativamente próximos, o espectador usa as pistas de profundidade baseadas na convergência binocular. Na convergência binocular, os dois olhos viram cada vez mais para dentro à medida que os objetos se aproximam e o cérebro interpreta esses movimentos musculares como indicações da distância (STERNBERG, 2000). Abordagens para percepção de objetos e formas A abordagem Gestaltista sobre a configuração perceptiva dispõe sobre como o homem organiza objetos em uma disposição visual coerente. Desenvolvida por Kurt Koffka (1886-1941), Wolfgang Kõhler (1887-1968) e Max Wertheimer (1880-1943), essa abordagem sobre a percepção de formas entende que o todo é diferente da soma de suas partes individuais. Com a Lei de Prágnanz (ou seja, pregnância perceptiva), temos a tendência de perceber qualquer disposição visual de forma organizando do modo mais simples todos os elementos de forma coerente e estável. Isso quer dizer que não misturamos sensações desorganizadas, por exemplo, pense no que acontece quando você entra em um recinto conhecido, algumas coisas se sobressaem (ex.: os rostos nas fotografias ou quadros) e outras somem ao fundo (ex.: paredes e pisos sem decoração). Figura é entendida como qualquer objeto que se 34

percebe como importante e é quase sempre percebida em contraste com algum tipo de fundo recuado ou não ressaltado (STERNBERG, 2000). Olhe a imagem abaixo: FONTE: http://ilusionario-blog.blogspot.com.br/2014/01/la-copa-de-rubin.html Na imagem acima, observamos um conceito conhecido como figura-fundo, um princípio da Gestalt que indica uma tendência a perceber que um objeto em um campo perceptivo ou um aspecto desse objeto parece proeminente (FIGURA), enquanto outros aspectos ou objetos recuam para o plano de fundo (FUNDO). Você provavelmente percebeu que a imagem é composta por um vaso branco contra um fundo mais escuro ou dois rostos olhando um para o outro contra um fundo branco. É praticamente impossível ver os dois conjuntos de objetos simultaneamente, mas você pode alternar rapidamente entre os rostos e o vaso. A abordagem gestáltica oferece outros princípios amplamente estudados para a percepção humana, leia cuidadosamente a tabela abaixo: Princípios de percepção visual da Psicologia da Gestalt Figura-Fundo Quando se percebe um campo visual, alguns objetos (figuras) parecem destacar-se e outros aspectos do campo recuam no fundo. 35

Proximidade Quando se percebe uma variedade de objetos, tende-se a ver os que estão próximos como um grupo. Semelhança A tendência é agrupar objetos com base em sua semelhança. Continuidade A tendência é perceber formas que fluem de modo regular ou contínuo ao invés de formas interrompidas ou não contínuas. Fechamento Tende-se a fechar ou completar objetos que, na realidade, não são completos. Simetria Tende-se a perceber objetos como se formassem imagens de espelho ao redor do próprio centro. As imagens de rostos são percebidas ao mesmo tempo, são agrupadas, pois tem a mesma proporção. FONTE: STERNBERG (2000); http://www.linguagemvisual.com.br/gestalt.php ; http://www.ufrgs.br/psicoeduc/ gestalt/figuras-sobre-psicologia-da-gestalt/. Para Sternberg (2000), cada um desses princípios sustenta a abrangente Lei de Prãgnanz (pregnância perceptiva) e, dessa maneira, cada um deles ilustra a tendência a perceber configurações visuais de modo a organizar, de modo mais simples possível, os elementos 36

díspares em umaforma estável e coerente. Por um momento, pare e olhe parao ambiente à sua volta. Você perceberá uma configuração coerente, completa e contínua de figuras e fundo, mas não perceberá furos nos objetos onde o livro os tapa, isto é, bloqueia sua visão. Se o livro obscurece parte do canto da mesa, ainda assim, você irá perceber a mesa como uma entidade contínua e não interrompida. Ao olhar para o ambiente, a tendência é perceber agrupamentos. Veem-se agrupamentos de objetos próximos (proximidade) ou de objetos parecidos (semelhança). Veem-se também grupos de objetos completos em vez de parciais (fechamento), linhas contínuas ao invés de interrompidas (continuidade), bem como padrões simétricos em lugar de assimétricos. Teorias sobre a percepção Além da teoria da Gestalt sobre a percepção, existem outras abordagens teóricas sobre a percepção. Como ligamos aquilo que se percebe com o que está armazenado na mente? James J. Gibson (1904-1980) estudou essa associação e formulou uma Teoria da Percepção Direta. Para este cientista, o conjunto de informações nos receptores sensoriais, inclusive o contexto sensorial, é tudo de que o homem necessita para perceber qualquer coisa, ou seja, o ser humano não necessita de processos cognitivos superiores ou qualquer outra coisa para mediar experiências sensoriais e as percepções. Gibson enfatizava o contexto e que o homem é biologicamente regulado para analisar as relações estáveis entre as características de objetos e ambientes do mundo real (STERNBERG, 2000). As Teorias Ascendentes (bottom-up) explicitam o processamento de um nível elementar, acionadas por dados ou estímulos. Outros autores preferem não estudar os dados sensoriais dos estímulos, enfocando as Teorias Descendentes (top-down), estudando os processos cognitivos superiores e considerando dados sensoriais como estímulos perceptivos. Entretanto, para considerarmos uma teoria completa é preciso que ela compreenda tanto os processos ascendentes como os descendentes. Dessa forma, olhe a tabela abaixo que apresenta as principais teorias sobre a percepção: 37

A teoria do gabarito indica que as pessoas possuem em sua mente grande quantidade armazenada de padrões, como moldes que as pessoas poderão reconhecer. Esse reconhecimento é feito como num conjunto de padrões. Um exemplo são as impressões digitais ou o processamento de produtos por códigos de barras. A chave é uma única correspondência para o estímulo reconhecido. Mas, no cotidiano, o sistema perceptivo raramente funcionaria se necessitasse reconhecer uma correspondência exata de cada estímulo, como por exemplo, processar cada detalhe de um rosto ou expressão facial (STERNBERG, 2000). Já a Teoria dos protótipos indica uma alternativa à correspondência de gabaritos, apresentando uma correspondência por protótipos. Um protótipo é um modelo que representa da melhor forma um padrão, mas não oferece uma correspondência exata ou idêntica. Assim, a correspondência seria da integração média dos traços mais característicos (STERNBERG, 2000). Como alternativa aos protótipos, as Teorias de correspondência de traços ou características estabelecem que a percepção se dá pela associação entre as características armazenadas na memória, sem relacionar um padrão inteiro, gabarito ou protótipo. Segundo estes modelos, pode-se fazer uma distinção de características globais que formam o estímulo, seu formato geral. Evidências de pesquisas neurológicas apoiam esta teoria, mapeando que determinados neurônios do córtex visual respondem a diferentes estímulos apresentados em regiões específicas da retina, numa estrutura hierárquica quanto ao grau de complexidade nas reações. Em geral, o tamanho do campo receptivo aumenta, assim como aumenta a complexidade do estímulo exigido para desencadear uma reação imediata (STERNBERG, 2000). A Teoria da descrição estrutural explica como são formadas representações mentais estáveis de objetos em 3D, com base na manipulação de formas geométricas mais simples. Essas formas geométricas são chamadas de geons, que formam objetos simples e que facilitam seu reconhecimento de muitas perspectivas. Na figura ao lado, é possível perceber os geons básicos que formam figuras mais complexas e, assim, organizam a percepção visual. Limitações são referentes às noções mais próximas em similaridade ao estímulo real, pois normalmente percebemos linhas de forma mais fluida e não tão geométricas. (STERNBERG, 2000). 38

Até agora, vimos exemplos de teorias ascendentes (bottom-up). Vamos agora, estudar sobre as teorias descendentes (top-down). Na percepção construtiva, a percepção ocorre com a construção de uma representação cognitiva do estímulo, usando informações sensoriais como base para a estrutura, além de usar outras fontes de informação para construir a percepção. Esse ponto de vista também é conhecido como percepção inteligente porque diz que o pensamento de ordem superior cumpre um papel importante na percepção. Assim, a ênfase está no papel do aprendizado na percepção. Um exemplo seria se você estivesse dirigindo por uma estrada pela qual nunca passou. Ao se aproximar de uma intersecção sem visibilidade, vê um sinal octogonal vermelho, escrito em branco com as letras "PA_E". Um galho de árvore grande demais encobre parte do A e do E. E possível que, a partir da sua percepção, você construa a sensação de uma placa de PARE. Dessa forma, sua reação será certa. É assim que os construtivistas sugerem que as percepções de constância de forma e tamanho indicam que os processos construtivos de alto nível estão operantes durante a percepção (STERNBERG, 2000). Para os construtivistas, a percepção gera várias hipóteses acerca dos estímulos, baseados em três fatores. O primeiro é o que se percebe pelos sentidos (dados sensoriais). O segundo é o que se conhece (conhecimento armazenado na memória) e o terceiro é o que se pode inferir (usando-se os processos cognitivos de alto nível), considerando as expectativas anteriores. Por exemplo, ao ver a aproximação de um amigo com o qual se tenha marcado um encontro, o que se sabe sobre o contexto também determina a percepção. No exemplo da placa de PARE, as informações sensoriais informam que a placa é um grupo de consoantes sem significado e organizadas de forma estranha. Entretanto, o aprendizado anterior passa uma mensagem importante: que uma placa dessa cor e dessa forma, colocada em um cruzamento, contendo essas três letras e nessa sequência, provavelmente significa que você deve parar para pensar nessas letras estranhas e pisar no freio. A percepção construtiva bem-sucedida requer inteligência e pensamento para combinar a informação sensorial com o conhecimento obtido a partir da experiência anterior (STERNBERG, 2000). Se pensarmos de forma radical, a abordagem descendente pode significar subestimar a importância dos dados sensoriais, por exemplo, quando se espera ver um amigo e outra pessoa aparece, é possível que se considere de modo inadequado as diferenças perceptíveis entre o amigo e a outra pessoa. Dessa forma, uma abordagem construtivista extrema da percepção estaria altamente suscetível a erro e, portanto, ineficiente. Entretanto, uma abordagem ascendente (bottom-up) radical não permitirá qualquer influência da experiência anterior ou conhecimento sobre a percepção. Em vez de considerar essas teorias como incompatíveis, podemos aprender mais sobre a percepção considerando-as complementares. A informação 39

sensorial pode ser mais informativa e menos ambígua na interpretação de experiências do que imaginam os construtivistas, mas pode ser menos informativa do que afirmam os teóricos da percepção direta. O mais provável é que se use uma combinação de informações de receptores sensoriais e o conhecimento anterior para entender aquilo que se percebe, numa abordagem integrada da percepção (STERNBERG, 2000). Déficits perceptivos Ao estudarem os caminhos visuais da percepção no cérebro, cientistas verificaram duas hipóteses, uma para explicar o reconhecimento de objetos e outra para explicar suas localizações. Essas duas explicações são denominadas de hipótese do que/onde, por causa de uma pesquisa com macacos. Um grupo de macacos com lesões no lobo temporal conseguiam indicar onde as coisas estavam, mas não conseguiam reconhecer o que eram. Em contrapartida, macacos com lesões no lobo parietal foram capazes de reconhecer o que as coisas eram, mas não onde estavam. Outras explicações consideram que os dois caminhos são sobre o que são os objetos e como funcionam, chamada de hipótese do que/como. Esta hipótese sustenta que a informação espacial a respeito de alguma coisa está localizada no espaço e está sempre presente no processamento da informação visual. O que diferencia os dois caminhos é se a ênfase reside em identificar o que um objeto é ou, ao contrário, de como situar-se de forma a alcançar os objetos. Assim, a questão aqui é determinar se é mais importante saber o que o objeto é ou como alcançá-lo (STERNBERG, 2000). Essas duas noções são sustentadas por dois tipos de déficits. A agnosia explica o processamento que/onde. Quem apresenta a agnosia, um grave déficit em perceber as informações sensoriais. Existem várias formas de agnosias, mas enfocaremos aquelas visuais. Pessoas com agnosia visual possuem sensações normais do que está diante delas, mas não conseguem reconhecer o que são e ocorrem em consequência de lesões cerebrais. Por exemplo, um paciente agnósico, ao olhar para um par de óculos, primeiro notou um círculo, depois outro, depois que havia uma haste e, finalmente, imaginou que estivesse olhando para uma bicicleta. Na agnosia espacial, o indivíduo tem grande dificuldade em se orientar no ambiente cotidiano e pode, por exemplo, se perder de casa, virar em lugares errados no trajeto diário e até mesmo não conseguir reconhecer as referências mais familiares. A prosopagnosia resulta em uma deficiência grave na capacidade de reconhecimento de fisionomias e, por exemplo, pode ser que nem mesmo reconheça a si próprio no espelho (STERNBERG, 2000). Sobre o caminho do como, observamos a ataxia óptica, um defeito na capacidade de usar o sistema visual para orientar os movimentos, dificuldade para alcançar coisas. Por exemplo, ter medo de deixar as luzes da casa apagadas por não ser capaz de, na volta, enxergar a fechadura e ficar tateando até acertar a chave no buraco da fechadura. A impossibilidade de se perceber cores é chamada de agnosia da cor, ou seja, a pessoa percebe a cor, 40

mas não consegue nomeá-la ou notar diferença entre as cores. A aquinetopsia é uma perda seletiva da percepção do movimento, o indivíduo não consegue perceber o movimento. Ao contrário, o movimento lhe parece apenas uma série de instantâneos. Já a acromatopsia é uma disfunção hereditária que provoca a ausência de cones na retina, causando dificuldade de ver core e têm dificuldade para enxergar detalhes (STERNBERG, 2000). Em síntese: Na aula 03, estudamos sobre a percepção humana, um fenômeno que nos permite organizar as sensações que recebemos dos órgãos dos sentidos. Como vimos na aula, nem sempre percebemos algo da mesma forma como está no ambiente, nossa cognição manipula as informações e cria representações mentais de cada estímulo. A constância perceptiva e a percepção de profundidade são fundamentais na determinação de como formamos essas imagens mentais. Diversas teorias impactaram nossos conhecimentos sobre a percepção. Dentre elas, a Psicologia da Gestalt permitiu que utilizássemos seis princípios no estudo da percepção: figura-fundo, proximidade, semelhança, continuidade, fechamento e simetria. Mas, os estudos da percepção também contam com outras teorias: as Ascendentes e Descendentes, as Teorias do Gabarito, Protótipo e das Características, além da Descrição estrutural e Teorias Construtivistas. Por fim, compreendemos que existem alguns déficits perceptivos, que impedem a o reconhecimento e organização dessas sensações oriundas do ambiente externo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS STERNBERG, R. J. Psicologia Cognitiva. Porto Alegre: Artmed, 2000. 41