FORMAÇÃO CONTINUADA A SUPERAÇÃO DE UM SABER

Documentos relacionados
OS ALUNOS PODEM APRENDER MAIS DO QUE O PLANEJADO PELO PROFESSOR 1

Material Para Concurso

A UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS TECNOLÓGICOS NO PROCESSO DE ENSINO DOS PROFESSORES DE TRÊS ESCOLAS MUNICIPAIS DE IMPERATRIZ-MA 1

ALFABETIZAÇÃO MATEMÁTICA DAS CRIANÇAS NOS ANOS INICIAIS NO ENSINO FUNDAMENTAL: A IMPORTÂNCIA DA ARGUMENTAÇÃO

FORMAÇÃO Professores de Física.

Projeto TRILHAS Evento de Lançamento

Gilmara Teixeira Costa Professora da Educação Básica- Barra de São Miguel/PB )

PNME Sólidos Geométricos e Planificações. Uma aplicação pedagógica para a Astronomia

ANOTAÇÕES DE ESTÁGIO: UMA ABORDAGEM DIFERENCIADA SOBRE O TEOREMA DE PITÁGORAS NO TRIÂNGULO RETÂNGULO

RESENHA DO ARTIGO O QUE PENSAM OS PROFESSORES SOBRE A FUNÇÃO DA AULA EXPOSITIVA PARA A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA. Bolsista:

FORMAÇÃO DE PROFESSORES ALFABETIZADORES: CONCEPÇÃO E PRÁTICA DE ALFABETIZAÇÃO EM QUESTÃO NO ÂMBITO DO PIBID

o que é? Resgatar um conteúdo trabalhado em sala de aula, por meio de novas aplicações ou exercícios

Colégio Valsassina. Modelo pedagógico do jardim de infância

Metodologia Científica. Construindo Saberes

A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DE GEOGRAFIA PARA O INGRESSO DE ESTUDANTES NO NÍVEL SUPERIOR ATRAVÉS DO EXAME NACIONAL DO ENSINO MÉDIO ENEM

Atividade Investigativa em aula de Ciências, um olhar. para uma ação.

A INSERÇÃO DO PIBID NA SALA DE AULA: RELATO DE UMA PRÁTICA DE ENSINO VIVENCIADA 1

A BNCC e sua implantação. José Francisco Soares Conselho Nacional de Educação (CNE)

O propósito geral do trabalho é investigar a percepção de professores - estudantes do curso de Pedagogia do PARFOR / UFPI com relação à contribuição

APRENDER E ENSINAR: O ESTÁGIO DE DOCÊNCIA NA GRADUAÇÃO Leise Cristina Bianchini Claudiane Aparecida Erram Elaine Vieira Pinheiro

Aprendizagem em Física

DIFICULDADES ENCONTRADAS PELOS ALUNOS EM RESOLVER QUESTÕES DE PROBABILIDADE

DESENHO E PINTURA COMO INSTRUMENTOS PEDAGÓGICOS NA APRENDIZAGEM DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL. Resumo

A TABELA PERIÓDICA NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM DE ALUNOS DO ENSINO MÉDIO DE UMA ESCOLA PÚBLICA

PLANO DE ENSINO DADOS DO COMPONENTE CURRICULAR

Considerações finais

CURSO: LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS 2º PERÍODO

1. A comunicação e a argumentação em sala de aula

No entanto, não podemos esquecer que estes são espaços pedagógicos, onde o processo de ensino e aprendizagem é desenvolvido de uma forma mais lúdica,

O ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Literacia Científica

Atuação do professor em Sala de Aula e Inovação do Ensino. Anne L. Scarinci

ADULTOS, COM A CONFECÇÃO DE PRODUTOS DE LIMPEZA. Maria Amélia de Mello Silva 1

ALIANDO A TEORIA E A PRÁTICA DOCENTE NO COTIDIANO DA ESCOLA ATRAVÉS DO PIBID

AS NECESSIDADES DE PRÁTICAS EXPERIMENTAIS NAS AULAS DE FÍSICA DO ENSINO MÉDIO DO MUNICÍPIO DE ARARUNA-PB

PEDAGOGIA NO SISTEMA PRISIONAL E A QUESTÃO DA RESOCIALIZAÇÃO

A experimentação e o ensinoaprendizagem

PEDAGOGIA DA AUTONOMIA Saberes necessários à prática educativa Paulo Freire. Observações Angélica M. Panarelli

CARTOGRAFIA ESCOLAR: UMA EXPERIÊNCIA DO PIBID DE GEOGRAFIA

Universidade Federal de Roraima-UFRR,

Formador Escolar: acompanhamento do uso coletivo do material Trilhas

XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

OS PROCESSOS INVESTIGATIVOS E A UTILIZAÇÃO DE MATERIAIS CONCRETOS NO ENSINO E NA APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA

Presente em 20 estados Unidades próprias em Curitiba Sede Administrativa em Curitiba Parque Gráfico em Pinhais - Pr

CONCEPÇÕES DE FORMAÇÃO CONTINUADA ENTRE DOCENTES DE ENSINO SUPERIOR: A EDUCAÇÃO FÍSICA EM QUESTÃO

O ENSINO DA MATEMÁTICA E AS DIFICULDADES NA RESOLUÇÃO DE SITUAÇÕES PROBLEMAS. Autora: Lisangela Maroni (UNINTER) 1.

Atividades de orientação em docência: desafios e oportunidades

IX Ciclo de Palestras sobre Novas Tecnologias na Educação

que se tem visto na academia são práticas culturais ainda descomprometidas com a vida em coletividade.

OS DESAFIOS DA PESQUISA NA FORMAÇÃO DOS ESTUDANTES DO CURSO DE PEDAGOGIA OFERECIDO PELA PLATAFORMA FREIRE, NO MUNICÍPIO DE BOM JESUS DA LAPA BA

Eixo Temático: Eixo 01: Formação inicial de professores da educação básica. 1. Introdução

A Prática Profissional terá carga horária mínima de 400 horas distribuídas como informado

A OFICINA DIDÁTICA NUMA PERSPECTIVA PROBLEMATIZADORA: METODOLOGIAS ALTERNATIVAS PARA O ENSINO DE FÍSICA

ATHAYDE, Beatriz A. C. de Castro 1 ; FALCONI, Simone 2 ; MATOS, Kédima F. de Oliveira 2 ; BORGES, Rita de Cássia Pereira 3

O que sabe uma criança que parece não saber nada

Aula 5 OFÍCINA TEMÁTICA NO ENSINO DE QUÍMICA

1 Apresentação e público alvo Duração e carga horária Temas dos cursos Metodologia de Ensino Materiais para estudo...

O JOGO COMO RECURSO METODOLÓGICO PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS

RELAÇÃO TEORIA E PRÁTICA: Docência e Prática pedagógica

SISTEMATIZAÇÃO COLETIVA DO CONHECIMENTO COMO ALTERNATIVA METODOLÓGICA PARA O ENSINO DE FÍSICA DO ENSINO MÉDIO

INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA. TIPOS DE ATIVIDADES PEDAGÓGICAS -Introdução -Trabalho Sistemático -Consolidação -Avaliação -Retomada

A Informática Na Educação: Como, Para Que e Por Que

Sebastião Gomes Ferreira. Competências Gerais da BNCC. 06/02 10:00h 30min.

Natália Sarmento 1 Ednaldo de Paiva Pereira 2. Doutor em Ciências em Planejamento Energético PPE/COPPE/UFRJ.

INVESTIGAÇÃO PROBLEMATIZADORA DOS CONCEITOS DE CALOR E TEMPERATURA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

Iris Maciel Pantoja

TÍTULO: ALFABETIZAÇÃO TECNOLÓGICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS - EJA

A avaliação no ensino religioso escolar: perspectiva processual

TÍTULO: FAMÍLIA E ESCOLA: PARCERIA E ADMINISTRAÇÃO DE CONFLITOS CATEGORIA: EM ANDAMENTO ÁREA: CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS SUBÁREA: PEDAGOGIA

Palavras chave: Monitoria; Relato de Experiência; Educação de Jovens e Adultos; Projeto de TCC.

Wynne Harlen. Lisboa, Setembro

COMO SER UM PROFESSOR AUTÔNOMO? DA TEORIA À PRÁTICA, REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DE ALEMÃO COMO LE

REGULAMENTO DOS PROJETOS INTEGRADORES

de ideias, de pontos de vista, de práticas, para que, em confronto com as próprias experiências, cada um possa chegar a conclusões pessoais que

ALUNOS E ESTAGIÁRIOS: UMA RELAÇÃO DESAFIADORA DE APRENDIZAGEM

Práticas de leitura e de escrita auxiliando na interpretação e resolução de problemas 1

Sérgio Camargo Setor de Educação/Departamento de Teoria e Prática de Ensino Universidade Federal do Paraná (UFPR) Resumo

FORMAÇÃO E PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE

ESTEQUIOMETRIA PARA APRENDER: JOGO DIDÁTICO UTILIZADO NO ENSINO DE QUÍMICA

Iluminação Cênica e uma construção do espetáculo: uma abordagem pedagógica.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP JÚNIOR TEODORO DA SILVA

EXPERIMENTANDO A PRÁTICA E A APLICAÇÃO DE JOGOS NO UNIVERSO INFANTIL NO MÊS DA CRIANÇA: RELATO DE EXPERIÊNCIA

A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE E O ENSINO AULA 2

AS RELAÇÕES INTERATIVAS EM SALA DE AULA: O PAPEL DOS PROFESSORES E DOS ALUNOS. Zabala, A. A prática Educativa. Porto Alegre: Artmed, 1998

OS JOVENS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EM BUSCA DA SUPERAÇÃO NO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO

Resumo expandido A IMPORTANCIA DO DOCENTE NO PROCESSO EVOLUTIVO DO ESTUDANTE, NO CONTEXTO DE SUA APRENDIZAGEM

Como elaborar um plano de aula

A UTILIZAÇÃO DE MATERIAL CONCRETO E JOGOS NO ENSINO DO SND - SISTEMA DE NUMERAÇÃO DECIMAL

ESPAÇO SIDERAL: AÍ VOU EU?

CRIATIVIDADE E PRODUÇÃO TEXTUAL: PRÁTICAS DE INCENTIVO À LEITURA

Título: Viajando pelo Universo da Leitura Justificativa:

FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DE PROFESSORES NAS LICENCIATURAS: PERCURSOS E PERCALÇOS. Antonia Edna Brito/UFPI

CUBO MÁGICO: uma estratégia pedagógica utilizada nas aulas de matemática 1

As Três Caixas Magnéticas

PIBID UMA BREVE REFLEXÃO ENTRE TEORIA E PRÁTICA DOCENTE

Palavras-chave: formação continuada; prática docente; metodologia de ensino.

AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS EM MATÕES-MA

Agente de transformação social Orientador do desenvolvimento sócio-cognitivo do estudante Paradigma de conduta sócio-política

PARTICIPAÇÃO FAMILIAR NA GESTÃO ESCOLAR: ESTUDO DE CASO EM BALSAS MARANHÃO

Transcrição:

FORMAÇÃO CONTINUADA A SUPERAÇÃO DE UM SABER PACCA, JESUÍNA L. A. Universidade de São Paulo Instituto de Física Palavras-chave: formação continuada, diálogo significativo, interação na sala de aula. OBJETIVOS Este trabalho analisa um curso para formação continuada e o trabalho de dois professores participantes com seus cursos particulares. Destaca os resultados surpreendentes além daqueles concretamente planejados; o que parece significativo são as conquistas individuais, particulares e diferenciadas, que, devidamente incluídas no processo, levam à superação de competências e à transposição de procedimentos vivenciados para a sala de aula. Os resultados são considerados com referência em teorias construtivistas. REFERENCIAL TEÓRICO Os trabalhos sobre o tema, publicados na literatura específica da pesquisa em ensino de Ciências são variados e em geral estão apoiados em concepções de aprendizagem que podem ou não estar explícitas mas que certamente moldam os procedimentos presentes. Trataremos aqui de relatar ações efetivamente realizadas e interpretar os resultados com referenciais construtivistas, com Vigotsky, sobre a construção do conhecimento e da linguagem científica, e mais especialmente P. Freire sobre a aprendizagem significativa, efetiva e duradoura; ambas referências consideram o protagonismo imprescindível do sujeito que aprende, inserido no contexto que o envolve e que o desafia de fato. Ao formador cabe abrir espaço para o exercício do bom senso, no entendimento de Paulo Freire (1996), quanto mais pomos em prática de forma metódica a nossa capacidade de indagar, de comparar, de duvidar, de aferir, tanto mais eficazmente curioso nos podemos tornar e mais crítico se pode fazer o nosso bom senso. DESENVOLVIMENTO DO TEMA No tabalho com a formação continuada por vários anos, procuramos uma forma de atuar onde a participação do professor ocupa a maior parte do tempo e se dá a partir da sua proposta real e atual de ensino, aplicada na realidade da sua aula (Villani y Pacca,1996). Os resultados desses programas têm sido surpreendentes. Existem claramente alguns atribuídos a objetivos concretamente planejados, mas o que parece muito mais significativo são as conquistas individuais, particulares e diferenciadas, que parecem contribuir decisivamente para a própria valorização profissional e inserção do professor num processo contínuo de aprender e de gostar de ensinar. Considerando o produto dessa formação, analisamos os cursos de dois professores; acreditamos que a 1

transposição dos procedimentos experimentados na formação continuada para a sala de aula ocorreu de forma natural e autêntica fazendo com que o aprendizado também superasse expectativas e resultados não planejados explicitamente ou mesmo conscientemente. Os resultados inesperados/surpreendentes a que nos referimos, tanto dentro do programa de formação continuada como nos cursos dos professores que aplicam seus conhecimentos ai adquiridos, mostram características comuns de competências estabelecidas que podem ser atribuidas ao desenvolvimento individual do sujeito e ao do grupo de pares. Um curso para a formação continuada. O curso reuniu 7 professores de Física do ensino médio oficial que se propunham a ensinar Eletricidade, um conteúdo mal desenvolvido na escola e considerado difícil. Iniciando o curso, propuseram os seus planos para as aulas, que enfatizavam ora os conceitos de corrente elétrica ora os de carga elétrica; esse material seria efetivamente aplicado com seus alunos e os resultados continuamente discutidos no grupo que incluía o formador. Os primeiros encontros trataram da discussão desses planos a partir de questões orientadoras: O que se quer com esse objetivo declarado? Qual a atividade real do aluno nesse ponto? O que os alunos costumam realizar/responder? As questões levavam cada um a pensar no seu instrumento pedagógico e tomar consciência do significado da seqüência e das atividades escolhidas. Paralelamente propos-se ao grupo realizar atividades escolhidas dentre as que eles planejaram. Com isso os professores tiveram oportunidade de aprender e aprofundar seu conhecimento através de longa discussão coletiva, assessorada pelo formador; com este mesmo objetivo foram sugeridas outras atividades para estudo e pesquisa do tema. O passo importante seguinte foi a aplicação do plano em sala de aula, com a tarefa de registrar as respostas e comportamentos, tanto os desejáveis como os não desejáveis, dos alunos. Os registros eram relatados no grupo e a discussão dirigida principalmente para os resultados negativos que deveriam ser compreendidos e iriam se constituir em realimentação para a próxima aula e reelaboração do instrumento pedagógico. Esse procedimento sistemático parece ter ajudado os professores a desenvolverem seus sensores para conduzir o plano elaborado no início e modificá-lo no que fosse possível sem perder a orientação para o conteúdo planejado e garantido algum conforto para si. A atenção do formador procurava ser sempre dirigida para o indivíduo, auxiliando-o nas dificuldades, mas a inclusão de todos na discussão do problema veiculado era fortemente estimulada e controlada. Os planos iniciais eram diferentes, as aulas e as interações eram também diferentes, os alunos eram diferentes e imprevisíveis. Os professores, dependendo da segurança que iam adquirindo, poderiam encaminhar-se para pesquisas e soluções também diferentes; o curso esperava e estimulava oportunidades de utilizarem suas capacidades individuais, seus estilos e suas preferências. Depois de 3 meses alguns mais ousados arriscavam mudar seus planos, criticavam os livros didáticos e dispunham-se a escrever os textos; dois deles propuseram analisar criticamente diversos livros didáticos procurando incoerências, um escreveu seu próprio texto, submetido à análise pelo grupo; em geral todos se mostravam satisfeitos com o comportamento de seus alunos. As sugestões consideradas interessantes e os relatos de ocorrências da sala de aula que começavam a se tornar significativos, passavam a se constituir acervos pedagógicos abertos para todos, porém a serem incorporados no instrumento pedagógico de cada um desde que se mostrem adequadas ao momento e às necessidades individuais. Os depoimentos registrados ao longo desse curso mostraram as preferências de cada um, as capacidades para ouvir e incluir o aluno no processo de aprendizagem, as motivações para pesquisar novos elementos do plano, bem como a capacidade crítica e a reflexão sobre sua atuação profissional. Um curso no ensino médio. Trataremos aqui do curso ministrado por uma professora participante, analisado a partir dos seus relatos. Focalizaremos os resultados na sala de aula e a valorização de comporta- 2

mentos não previstos. A construção do plano aplicado teve como objetivo desenvolver os conceitos de eletricidade tendo como eixo a corrente elétrica que se estabelece num circuito simples constituido por uma lâmpada, pilha e fios. O curso começou com o levantamento das concepções prévias sobre corrente elétrica, solicitando que, através de um desenho, representassem o interior do um fio condutor. Um exemplo da participação dos alunos e inclusão das suas idéias sobre os fios da ligação: eles já haviam apresentado sua concepção de átomo e depois de acender a lâmpada eles deviam testar outros materiais na ligação do circuito, explicando o resultado. Com os metais a lâmpada acende, O material condutor tem eletrização, parece a experiência da caneta com os papel picado, O grafite conduz eletricidade. Nota-se uma situação de investigação (os alunos manipulam os materiais, fazem tentativas com outros, fazem hipóteses diferentes e particulares para explicar fenômenos, questionam) que constitui um momento especial para o diálogo significativo. O por quê? torna-se um processo natural de curiosidade. O professor evita dar uma idéia pronta, mas o aluno é levado a pensar na sua; ele tem necessidade de encontrar respostas e para isso faz perguntas. Ele problematiza uma situação, onde um fenômeno físico está em questão, e procura chegar a respostas que encontrem sentido para o aluno e sejam coerentes com conceitos científicos. Na sequência o professor questionou o que existe nos metais que faz a lâmpada ficar acesa, se com outros materiais isso não acontece? A busca de respostas pelo grupo foi incentivada e procurava-se nas diferentes interpretações conexão com a questão; curiosamente a consulta à tabela periódica apareceu no grupo como uma saida. Numa avaliação individual a seguir, o aluno seria levado a pensar sobre as atividades realizadas, onde ele foi agente e teve acesso à toda a discussão. O plano das aulas sofreu alterações continuamente. O interesse e a participação nas aulas de Física foram muito maiores, inclusive daqueles que demonstravam desinteresse total durante as aulas tradicionais. Durante as atividades os alunos faziam muitas perguntas e conseguiam verbalizar concepções importantes. O envolvimento num problema com a oportunidade de visualizar e descrever/explicar os fenômenos, e fazer perguntas por mais inesperadas que sejam para o professor parece ter criado uma situação de diálogo entre aluno e professor, que antes não existia. Os alunos passaram a procurar o professor para falar de suas idéias sobre as atividades realizadas, de pesquisas feitas por iniciativa própria e conversa com outras pessoas. Esses resultados nem sempre são percebidos pelo professor mas agora nos parecem significativos como medida de aprendizagem: envolviam-se espontaneamente nas discussões ouvindo os colegas, não faltavam as aulas, procuravam o professor com novidades dizia a professora. Pareceu importante a capacidade do professor problematizar as situações e conduzir à resposta enquanto buscava compreender o pensamento de cada um e incluir as contribuições de todos na sequência da aula. Um curso para o Ensino Fundamental. Trataremos aqui do curso de astronomia ministrado por uma professora na 5a série do ensino fundamental, com nove alunos entre 10 e 11 anos. O estudo foi feito em forma de projeto pedagógico, com o título O Sistema Solar e Além dele e desenvolvido em três partes: identificação das pré-concepções, estudo de fenômenos astronômicos do cotidiano, e discussão de outros eventos astronômicos. Da segunda parte do curso constava uma saída de estudos para observação do céu noturno. A aplicação da proposta de ensino desenvolveu-se basicamente através de atividade oral com participação interativa do grupo de alunos onde as pré-concepções eram evidenciadas, analisadas e discutidas; o foco da discussão foram as contradições. A metacognição foi estimulada ao longo do trabalho ou em avaliações individuais e considerada uma atividade regular. Considerar as idéias prévias dos aprendizes teve dois propósitos principais: evidenciar incoerências na forma de pensar dos educandos, propiciando o surgimento de problemas significativos que os alunos deveriam resolver e favorecer o processo metacognitivo com apercepção das suas próprias concepções e do conflito com as informações recebidas. Na segunda parte do curso, foram disponibilizados objetos como bolas de isopor, palitos de madeira e massa de modelar para descrição e explicação dos fenômenos. Nesse período, foram confiscados os livros didáticos. Após o estudo dos fenômenos astronômicos básicos, foi feita 3

uma observação direta do céu noturno em data propícia para melhor observação das estrelas e planetas visíveis; como atividade planejada, foram reunidos instrumentos necessários e os alunos instruidos a fazerem observações, registrarem e fotografarem o que parecia interessante. De volta à sala de aula, as informações coletadas foram apresentadas e discutidas com entusiasmo, permitindo refinar as explicações necessárias sobre as observações. O acesso ao livro didático foi então permitido e surpreendentemente os alunos tomaran-no com interesse por conhecer seu conteúdo e imediatamente perceberam dificuldades com figuras e textos pouco explicativos para quem não sabia astronomia ainda ; por isso propuseram escrever um livro para ensinar astronomia. A forma de abordagem do tema tomou como foco principal de aprendizagem o desenvolvimento do raciocínio lógico das crianças, a exposição de idéias, a formulação de hipóteses e a defesa de argumentos, contra-argumentação e busca de leis gerais. Com a sequência do projeto, os alunos passaram a recorrer menos à professora e a dar mais crédito aos seus próprios raciocínios; levaram para casa as dúvidas e perceberam que as explicações dos pais não davam conta dos fenômenos que eles observaram; pediram para levar as bolas de isopor para casa, para explicar aos pais. Uma maior autonomia foi percebida no decorrer do curso, também pela livre movimentação dos alunos para a busca de informações; estas eram treazidas e discutidas pelo grupo todo, sob o referencial dos conhecimentos já adquiridos. No confronto de informações, emergiam perguntas, que eram esclarecidas pelos próprios alunos ou anotadas para posterior reflexão junto com a professora. O confisco do livro didático nos pareceu afinal como proposta interessante porque favoreceu a busca sempre desejável por materiais de pesquisa. Evidentemente o livro acabou tornando-se necessário e foi resgatado quando os alunos já tinham subsídios para entendê-lo, analisá-lo e criticá-lo. O mais surpreendente para nós foi a idéia de produzir um livro para ensinar os pais. CONCLUSÕES Planejando o diálogo o indivíduo e o grupo. Nossa primeira surpresa foi com a transposição de procedimentos e planejamentos, posteriormente com relatos dos professores e constatação de surpresas positivas e agradáveis. O planejamento do curso para a formação continuada teve como prioridade a valorização do diálogo, o que significa saber ouvir as expressões dos aprendizes, procurar usar esse momento para orientação e construção de novas idéias, dar seqüência com registros escritos de modo que não tenha fim apenas no certo ou errado, mas sirva de referência para eventual procura de novos caminhos. Paulatinamente passou a valorizar as novidades presentes nas iniciativas dos professores, além de dedicar atenção às barreiras para progredir na direção do objetivo. A participação e vivência do aprendiz adequadamente conduzidas e valorizadas puderam levá-lo a aprender muito mais do que estavamos supondo; parece que a atitude do formador onde os resultados inesperados são incluídos continuamente no programa pôde facilitar o desenvolvimento pessoal do indivíduo e a colaboração com os pares. Concluindo, o inesperado, a surpresa parecem ser indícios de caminhos para a superação de patamares de saber e por isso precisam ser notados e valorizados. Talvez sejam a melhor evidência do crescimento individual, portanto saber autêntico, duradouro e transferível. Mais concretamente, alguns elementos foram importantes na construção desse saber: partir do conhecimento prévio, explicitá-lo e questioná-lo através de questões orientadoras; estabelecer e manter o diálogo entre pares e com o formador, sem permitir exclusões; apresentar desafios adequados ao conhecimento atual e à meta desejada, apontando sempre para um nível superior de conhecimento. O diálogo constante pode alimentar o crescimento do aprendiz, na interação com os pares, estabelecendo-se critérios e limites e com o formador, encontrando orientação e reforço para prosseguir. 4

O mote da formação do professor poderia ser comece com o que você já sabe fazer e com a certeza e expectativa de que pode melhorar sempre. Levar para as aulas o que ele é capaz de fazer e procurar melhorar sua atuação a cada aula, ficando atento e valorizando as idéias antes de excluí-las, assim estimulando a curiosidade e enfrentando as novidades. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS VIGOTSKY, L. S.(1989) A Formação Social da Mente.São Paulo.Martins Fontes. VILLANI, A. y PACCA, J. L. A.(1996). Un curso de actualización y Cambios Conceptuales en Profesores de Fisica. Enseñanza de las Ciencias, 14(1), 25-33. FREIRE, P. (1996) Pedagogia da Autonomia-saberes necessários à prática educativa. São Paulo. Paz e Terra. 5