00470 A IMPLEMENTAÇÃO DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS: SENTIDOS ATRIBUÍDOS PELOS PROFESSORES À INFÂNCIA E SUA EDUCAÇÃO Laís Cristina Sales da Silva UFPE/CAA Joane Santos do Nascimento UFPE/CAA Conceição G. N. L. de Salles UFPE/CAA RESUMO: A recente implementação do ensino fundamental de nove anos traz questões que problematizam os sentidos e lugares atribuídos à criança, a infância e a sua educação. Além de garantir o acesso à escola, é preciso refletir sobre como as práticas estão considerando as crianças, suas infâncias e a suas subjetividades. Nesse contexto, o presente trabalho, objetiva compreender os discursos veiculados entre os professores do primeiro ano dos anos iniciais do ensino fundamental, no que diz respeito à infância. Delimitamos como campo empírico: quatro Secretarias de Educação Municipal e cinco escolas de quatro cidades localizadas no Agreste Pernambucano nas quais foram entrevistadas professoras do primeiro ano do Ensino Fundamental e Diretoras de Ensino. Como instrumento de coleta de dados, utilizamos entrevistas semiestruturadas. A partir dos dados apresentados verifica-se que no que tange a implementação e à inserção da criança de seis anos no ensino fundamental, há muito que se pensar no que se refere ao lugar atribuído as crianças e suas infâncias. Os dados nos revelam, o quanto ainda é desafiador afirmar uma proposta que assegure as especificidades dessa criança e o direito de ser criança. Pelo exposto, as práticas concretas, embora tenha certa preocupação em afirmar certas concepções compatível com os conhecimentos acumulados na área dos estudos da infância, o cotidiano é fortemente marcado por uma lógica e uma cultura escolarizante do ensino fundamental que acabam por delimitar as abordagens acerca do que é alfabetizar. Palavras-chave: Infância; Ensino Fundamental; Professor
00471 Como se percebe a infância tem se tornado cada vez mais um objeto de preocupação não só em nossas vidas como também no campo acadêmico. São vários os campos disciplinares que vem se ocupando da infância: sociologia da infância, filosofia da infância, história da infância, psicologia da infância, literatura infantil e, é claro, educação da infância, educação infantil, todos têm procurado colocar a infância no centro de nossas suas preocupações. Esse crescimento das pesquisas e do campo de estudos da infância em diferentes áreas vem contribuindo significativamente para construção de novos mapas interpretativos que aponta para uma nova compreensão da infância e das crianças. Nesses estudos, uma preocupação fundamental tem sido a de apreender cada vez mais as vozes e o ponto de vista das crianças e, desta forma, romper com as visões epistemológicas adultocêntricas. Um aspecto importante na estruturação dessa problemática diz respeito à recente aprovação do ensino de nove anos, no Brasil, ação que gera importantes desafios para a área da educação da infância. Tal implantação gerou diversas interpretações e mudanças, em certa medida questionáveis, como, por exemplo, a saída das crianças de 6 anos dos espaços da educação infantil e sua ida para escolas, sobretudo, se pensarmos no aspecto referente às particularidades da infância. Tais questões têm gerado profundas movimentações nos sistemas de ensino principalmente porque sabemos que como previsto nas orientações estabelecidas para inserção das crianças de 6 anos no ensino fundamental a aprendizagem não depende apenas do aumento do tempo de permanência na escola, mas também do emprego mais eficaz desse tempo (BRASIL, 2004, p.07). Dessa forma, entende-se que o princípio da permanência da criança na escola deve estar diretamente articulado com o da qualidade, o que significa dizer que a escola mais do que um espaço de ensino e aprendizagem deve ser também um lugar que contribui efetivamente para afirmação e visibilidade da infância e não para o seu desaparecimento e sua invisibilidade como já o faz muitas outras instâncias. Nesse sentido, entendemos que compreender entre os professores o lugar reservado para a infância, é fundamental para dar efetividade às políticas educacionais, especialmente àquelas voltadas para a infância e sua educação tanto na educação infantil quanto nas séries iniciais do ensino fundamental.
00472 A referida aprovação sugere necessariamente repensar não só o Ensino Fundamental no seu conjunto como a questão da própria infância, agora chamada ao Ensino Fundamental, já que a idade cronológica não é, necessariamente, e nem pode ser na perspectiva que estamos adotando nesse plano de trabalho, o aspecto definidor da maneira de ser criança e do pensar a infância. Sensível a esse contexto, o texto ora proposto é resultado da inquietação acerca de como os professores que atuam juntos a estes sujeitos concretos, crianças, estão nomeando, enunciando e compreendendo a infância e a educação das crianças, mais especificamente no primeiro ano das séries iniciais do ensino fundamental. No que segue veremos os principais enunciados e concepções veiculados entre os professores sobre a infância no primeiro ano do ensino fundamental e seus desdobramentos. No geral os professores entrevistados, em seus discursos, enunciam e expressam um conjunto de questões que nos ajudam a compreender os sentidos e os significados atribuídos por eles à noção de infância, além de elucidarem aspectos e sentidos que merecem ser pensados no contexto de espaço escolar. Nesse contexto, um dos maiores desafios enfrentados pelas escolas tem sido o processo de implementação, sobretudo se levarmos em consideração as mudanças que a recente organização do Ensino Fundamental de nove anos requereu, tais como: nomenclatura, estrutura espacial das escolas, currículos e avaliações, tempo e rotina escolar, dentre outros. Pensar a transição da educação infantil para o ensino fundamental requer que os responsáveis pela organização do trabalho pedagógico compreendam o que efetivamente está implicado nessa mudança e, em muitos casos, constitui-se num aspecto complexo de ser abordado. O processo de implementação do Ensino Fundamental de nove anos na maioria dos municípios campo de investigação, não foi enfrentado com muita tranquilidade. Em linhas gerais, sabe-se que muitas questões permeiam esse processo de implementação. Ao mesmo tempo em que é acolhido por muitos é também objeto de críticas pelo fato de não deixar claro um conjunto de questões, gerando certo desconforto para as escolas, as famílias e, sobretudo, as crianças. Principalmente porque essa transição aconteceu, de forma abrupta, sem muito tempo para planejar as ações e entender o sentido de tal mudança.
00473 A formação é ótima. Mas, é como eu disse, no papel tudo é bonitinho, mas na prática, a utilização do recurso é difícil, a supervisão não ajuda, chega os materiais e a supervisão não explica como deve ser usado, não nos ajuda a trabalhar com eles, eu acho que eles deveriam estar de dentro (P3). O que se vislumbra é que a formação aparece mais como um treinamento do que como um processo formativo, o qual ajuda o professor a ter clareza dos objetivos que se pretende alcançar com as crianças de seis anos de idade, ou seja, reconhecer que nesse tempo e espaço existem crianças e especificidades que não devem ser desconsideradas, anuladas pelo excesso de conteúdos. E no que se refere ao nosso contexto pesquisado, essa antecipação da escolaridade, de maneira geral, tem se caracterizado como uma perda do direito de viver a infância. Embora, a maioria dos entrevistados questionem o processo e as condições concretas de implementação da política nos seus cotidianos, a quase totalidade dos sujeitos da pesquisa, curiosamente, acenaram afirmativamente no que se refere à intencionalidade e o alcance da medida. Para muitos a importância da medida foi vista como uma ação que possibilita, dentre outras coisas, melhorias, pois, trata-se de uma ação compensatória no que se refere à aceleração nas aprendizagens das crianças e, em especial, na sua escolarização [...] o primeiro ano é uma sequência da Educação Infantil, é uma preparação para o Ensino Fundamental (D3). Em concordância com a justificativa adotada pelo Ministério Público (MEC), os mesmos, reforçaram a ideia de que a implantação vem assegurar a todas as crianças um tempo mais longo de convívio escolar, maiores oportunidades de aprender e, com isso, uma aprendizagem mais ampla. Considerações Finais Dessa forma, a partir dos dados apresentados verifica-se que no que tange a implementação e à inserção da criança de seis anos no ensino fundamental, há muito que se pensar no que se refere ao lugar atribuído as crianças e suas infâncias. Os dados nos revelam, o quanto ainda é desafiador afirmar uma proposta que assegure as especificidades dessa criança e o direito de ser criança. Pelo exposto, as práticas concretas, embora tenha certa preocupação em afirmar certas concepções compatível com os conhecimentos acumulados na área dos estudos da infância, o cotidiano é
00474 fortemente marcado por uma lógica e uma cultura escolarizante do ensino fundamental que acabam por delimitar as abordagens acerca do que é alfabetizar. É fundamental a ampliação de reflexão sobre a temática aqui em foco para que a educação das crianças de seis anos se nutra de outros olhares que possa superar essa ideia reducionista de que ao entrar na escola de ensino fundamental, as crianças precisem abandonar a infância e suas especificidades em nome de uma rotina escolar historicamente instituída como formal e dura. Com base na pesquisa realizada reiteramos a necessidade de tratarmos o ingresso da criança de seis anos no ensino fundamental como fenômeno a ser cada vez mais interrogado, sobretudo, no que se refere ao impacto na vida das crianças e na infância e a influência desse novo contexto na subjetividade infantil. Assim, sem querer afirmar aqui as polarizações sou contra ou a favor ao ingresso da criança de seis anos no primeiro ano do ensino fundamental, investigar como tem se dado esse processo no cotidiano das escolas, constitui sem dúvida uma tarefa necessária tanto para entender como vem se constituindo essa implementação como para compreender às complexas questões sobre a infância, seu lugar social e sua educação que emerge nesse contexto de mudança. Referências BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Ensino fundamental de nove anos: orientações gerais. Brasília: Julho de 2004. KRAMER, Sonia. Infância e sociedade: o conceito de infância. In:. A política do pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2011. MORENO, Gilmara Lupion; PASCHOAL, Jaqueline Delgado. A Criança de Seis Anos no Ensino Fundamental: Considerações Iniciais. In: BRANDÃO, Carlos da Fonseca; PASCHOAL, Jaqueline Delgado (orgs.). Ensino Fundamental de Nove Anos: teoria e prática na sala de aula. São Paulo: Avercamp, 2009.