O SENTIDO DA APRENDIZAGEM ESCOLAR PARA JOVENS DE MEIOS POPULARES. PALAVRAS-CHAVE: prática de ensino, escola, fracasso escolar.
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- Maria Laura Gomes Bicalho
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1 03060 O SENTIDO DA APRENDIZAGEM ESCOLAR PARA JOVENS DE MEIOS POPULARES Sueli de Lima Moreira Faculdade de Educação USP GEPEFE Tese orientada por Maria Isabel Almeida RESUMO O artigo apresenta algumas reflexões sobre as relações de estudantes de meios populares com o saber escolar a partir, principalmente, do referencial teórico de Bernard Charlot. A sociedade brasileira é marcada pela ausência e ocultamento de diversos grupos sociais. Valorizar e dialogar com as vozes que habitam as escolas é um desafio ainda para as práticas de ensino. Este desafio têm deixado os estudantes de meios populares em defasagem: são jovens, aprendizes e pobres ; possuidores de uma voz ainda não ouvida dentro das escolas. Reagir a este desafio é um dos objetivos a que se propõe esta pesquisa. Superar esta lógica bipolar de um lado, o professor, do outro, o estudante exige que possamos instaurar condições pedagógicas para o diálogo. Se compreendida como parte do projeto democrático na sociedade brasileira, a escola não pode esquecer que a cidadania e a cultura nascem das relações entre sujeitos. São os sujeitos, através de seus diálogos, desafios e disputas que elaboram os processos sociais, sejam eles democráticos ou não. A escola é assim desafiada a configurar novas relações pedagógicas capazes de dialogar de forma mais horizontal com outras instâncias que também produzem conhecimento na sociedade. PALAVRAS-CHAVE: prática de ensino, escola, fracasso escolar. PROBLEMÁTICA Educação é o primeiro direito social elencado no artigo 205 da Constituição Federal do Brasil de 1988, entretanto, sua garantia a todos os brasileiros, quase 25 anos depois da promulgação da Constituição, ainda está distante de ser assegurada. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios proporcionar os meios de acesso à educação. A Carta Magna aponta, entre outros direitos, a igualdade de condições e acesso e permanência na escola, mas essa diretriz ainda desafia gestores e profissionais da área educacional. Freitas (2012), afirma que a educação é tratada pela sociedade brasileira e pelo empresariado como um dos problemas centrais na agenda do desenvolvimento econômico. Este aspecto dificulta ainda mais o desenvolvimento de um projeto de educação pelos pesquisadores e professores brasileiros e nos mantêm submissos a interesses econômicos gigantescos. Seria interessante ampliar o debate em torno do que
2 03061 seria uma boa educação e questionar que dimensões precisam constituir a educação de qualidade. A educação em curso estaria a serviço de que projeto de país? De acordo com o IBGE (2010), a média nacional de crianças e adolescentes dos 6 aos 14 anos fora da escola era de 3,3% isto, é, ainda temos 963 mil crianças em idade escolar fora da escola. Na faixa dos 15 aos 17 anos, a taxa de evasão escolar brasileira era de 16,5%. De acordo ainda com o IBGE (2010), a taxa de analfabetismo na população de 15 anos ou mais caiu de 13,63% em 2000 para 9,6% em Do ponto de vista da distribuição geográfica, 29,3% do total de analfabetos em 2010 se encontrava nas regiões Norte e Nordeste e apenas 11,2% no Sul e no Sudeste. Na Educação Infantil, metade das crianças brasileiras está fora das creches. Em 2011, a taxa de escolarização das crianças de 0 a 3 anos e de 4 a 5 anos de idade era de 20,8% e 77,4%, respectivamente (IBGE, 2012). Neste contexto é importante lembrar, a educação, como nos ensinou Paulo Freire, é um lugar de conflito, em que o diálogo precisa ser conquistado. Esta pesquisa quer colaborar para a conquista de condições capazes de promover esse diálogo, buscando ouvir de estudantes de classes populares suas contribuições para as práticas pedagógicas. Através do diálogo com Charlot (2000, 2001, 2005, 2006, 2009), investigo a relação de estudantes com o saber, buscando compreender quais condições facilitam a aprendizagem. Para isso, ouvirei estudantes moradores de área de vulnerabilidade social, com distintas relações com a escola, todos portadores de frágil vida escolar. Encontro no pensamento de Charlot categorias, articuladas entre si, que me auxiliam a investigar o problema: a leitura positiva, que busca compreender o estudante a partir de sua condição epistemológica, o fracasso escolar, que interpreta o fenômeno a partir das situações que os estudantes vivenciam, e a mobilização para o saber, que provoca a didática a fazer a ponte entre o eu empírico e o eu epistêmico dos estudantes. Com essas referências teóricas, acrescentadas pela inclusão de outros autores relevantes, o trabalho tem como principal objetivo investigar quais relações os estudantes do Ensino Fundamental, entre 10 e 14 anos, estabelecem com os saberes escolares, buscando sistematizar suas contribuições para o debate pedagógico. Os objetivos específicos são identificar, a partir da investigação da relação dos estudantes com as escolas que frequentam, as relações que desenvolvem com o saber escolar; sistematizar as contribuições advindas desses estudantes a respeito de que
3 03062 processos poderiam facilitar suas aprendizagens e indicar caminhos para a elaboração de práticas pedagógicas articuladas às contribuições de estudantes. Para desenvolver uma pesquisa científica a partir de fontes que são historicamente construídas como as relações de estudantes com a escola, entro num campo complexo e contraditório em que o pesquisador e o objeto estabelecem uma relação dialogal em meio ao próprio campo investigado. A pesquisa proposta tem como referência metodológica o Grupo Dialogal (DOMINGUES, 2006) que, em alguns aspectos, se relaciona com o Grupo Focal (FLICK, 2009). Como nos fala Domingues (2009), a observação qualitativa, principalmente de práticas sociais como a educação, tem um caráter vivencial. Não observo um fenômeno externo, imóvel, em laboratórios, mas um fenômeno do qual faço parte e pelo qual sou igualmente modificada por ele. Já o Grupo Focal, para Flick (2009), permite uma ampliada coleta de dados a partir do contexto investigado, pois cria uma situação de investigação que permite o encontro do investigador com o objeto investigado. Trata-se de uma entrevista com um pequeno grupo sobre um tópico específico. Esta prática faz com que as diferentes posições do grupo possam se manifestar sob o olhar do próprio grupo, o que permite que opiniões falsas e radicais sejam questionadas. No processo, além dos pontos de vista individuais, o pesquisador pode ter acesso ao ponto de vista do grupo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Desenvolver uma pesquisa científica a partir de fontes historicamente construídas, como as relações de estudantes com os saberes escolares, exige a reunião de condições epistemológicas capazes de auxiliar a investigação de um campo complexo e contraditório, em que o pesquisador e o objeto estabelecem uma relação dialogal. A complexidade desta pesquisa é marcada pela adoção de métodos que consideram as relações entre o pesquisador e os pesquisados parte constituinte da pesquisa. Desenvolvo o trabalho respeitando essa complexidade, adotando uma estratégia metodológica interessada na formulação de um campo de pesquisa constituído de sujeitos no qual as subjetividades do pesquisador e dos pesquisados são parte integrante. Os estudantes brasileiros experimentam nas escolas condições muito contraditórias. Entre elas destaco o reverso da aprendizagem, quando o professor não desenvolve uma relação de parceria com o estudante, não o auxiliando na sua relação
4 03063 com o mundo e consigo mesmo, mas sim o atrapalha. Tornar a escola um local de partilha de saberes, um fórum de culturas, requer a criação de condições pedagógicas estruturadas sob a prática do debate democrático. As afirmações de autores que auxiliam na construção da pesquisa, como Franco (2005, 2008, 2009) e Charlot (2000, 2001, 2005, 2006) quando articuladas às vozes de estudantes, nos permitem afirmar que as condutas educativas marcadas por posturas autoritárias não são pedagógicas, pois estas dependem de uma intencionalidade conduzida exclusivamente pela crítica reflexiva, que é substancialmente democrática. Para transformar a escola através da prática pedagógica é preciso rever nossas concepções de educação, que se refletem não só nos processos de ensino aprendizagem, mas nos saberes, culturas e práticas escolares. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CHARLOT, Bernard (Org.). Os jovens e o saber perspectivas mundiais. Porto Alegre: Artmed, A pesquisa educacional entre conhecimentos, políticas e práticas: especificidades e desafios de uma área de saber. Revista Brasileira de Educação, v. 11, n. 31, A mistificação pedagógica: realidades sociais e processos ideológicos na teoria da educação. São Paulo, Cortez, A relação com o saber nos meios populares. Uma investigação nos liceus profissionais de subúrbio. Porto: Legis, Da relação com o saber. Porto Alegre: Artmed, Relação com o saber, formação de professores e globalização. Porto Alegre: Artmed, DOMINGUES, Isaneide. O coordenador pedagógico e o desafio da formação contínua do docente na escola Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, FLICK, Uwe. Desenho da pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Artmed, FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. São Paulo: Paz e Terra, 2006.
5 Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, FREITAS, Luiz. A agenda dos reformadores empresariais pode destruir a educação pública no Brasil. Revista Adusp, São Paulo, out A agenda dos reformadores empresariais pode destruir a educação pública no Brasil. Revista Adusp, São Paulo, out IBGE. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão/Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese dos Indicadores Sociais Rio de Janeiro: IBGE, Disponível em: < os/sinteseindicsociais2012/default.shtm>. Acesso em: 23 abr IBGE. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão/Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010/Educação e Deslocamento/Relatório Resultado da Amostra. Rio de Janeiro: IBGE, Disponível em: < nto/default.shtm>. Acesso em: 23 abr 2014.
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