02425 IDENTIDADE DOCENTE NO NOTICIÁRIO: ANÁLISE DE UM JORNAL BRASILEIRO Resumo LIMA, Claudia Maria UNESP/Campus de São José do Rio Preto SILVA, Analigia Miranda UNESP/Campus de Presidente Prudente 1 A identidade profissional do professor, como processo individual e coletivo, em permanente construção, resulta de suas vivências cotidianas, de suas representações e das interferências oriundas do contexto social. Essas representações, que interferem na construção da identidade do professor, são oriundas dos diversos discursos presentes em todos os segmentos da sociedade, dentre esses, os da mídia. Diante dessas condições, este trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa que teve por objetivo geral identificar e analisar as representações de uma mídia impressa, especificamente do jornal Folha de S. Paulo, sobre a identidade docente. A pesquisa assumiu abordagem quanti-qualitativa com delineamento descritivo-explicativo. A coleta dos dados ocorreu durante os meses de setembro, outubro e novembro de 2013, período em que foram coletados 308 textos jornalísticos sobre Educação publicados no jornal estudado. Após a análise de conteúdo inicial foram identificados 26 textos que abordavam o professor como temática principal e esses foram objeto de uma segunda análise e classificação de categorias. Os resultados mostram que há uma prevalência de notícias temporais, marcadas por um fato específico, no caso a greve de professores do município do Rio de Janeiro e não há uma preocupação em abordar o contexto completo dos problemas que desencadearam a greve. Não há uma preocupação em retratar as dificuldades desse profissional e a luta que trava no dia a dia das escolas para tentar formar crianças e jovens brasileiros. Os resultados nos mostram que o status atribuído ao docente é de um profissional desvalorizado, excluído de conquistas e que não precisa/deve reivindicar melhores condições de trabalho. Palavras-chave: Identidade docente. Jornal. Representação social. Introdução A partir da década de 1990 temos assistido a um conjunto de reformas educacionais em todos os países do mundo. No Brasil, o avanço na universalização do acesso à educação básica suscitou preocupações maiores em relação à qualidade da educação. O professor e sua formação passaram a ser percebidos como elementos-chave da melhoria dessa qualidade. Em meio a esse cenário, as questões em torno da profissionalização da docência e da busca por uma identidade profissional daqueles que por ela se responsabilizam constituíram-se em problemáticas importantes das reformas educacionais implementadas. Mas como se constrói essa identidade profissional docente?
02426 Segundo Pimenta (1997), a identidade profissional do professor é um processo individual e coletivo, em permanente construção, resultante de suas vivências cotidianas, de suas representações e das interferências oriundas do contexto social. Essas representações que interferem na construção da identidade do professor resultam de um amálgama dos diversos discursos presentes em todos os segmentos da sociedade, dentre esses, os da mídia. Compreender como se constrói essa identidade docente passa também pelo entendimento de como os professores são representados pela mídia. Mas, a partir de onde pensar essas representações? Fundamentando o conceito de representação social, temos que o seu pressuposto é que o homem possui uma necessidade essencial de compreender e dar significado à realidade social na qual está inserido e o faz, predominantemente, de modo coletivo, ou seja, a representação social é uma construção do sujeito enquanto ser social (MOSCOVICI, 2001). Ideias e significações são estabelecidas a partir de construções e leituras da realidade social que o sujeito vivencia no meio ao qual pertence. Segundo uma definição clássica elaborada por Jodelet (2001, p.22), a representação social É uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social. Igualmente designada saber do senso comum ou ainda saber ingênuo, natural essa forma de conhecimento é diferenciada, entre outras, do conhecimento científico. Entretanto, é tida como um objeto de estudo tão legítimo quanto este devido à sua importância na vida social e à elucidação possibilitadora dos processos cognitivos e das interações sociais. Neste trabalho, temos o intuito de analisar as representações sociais da mídia sobre o ser professor, em especial, sobre sua identidade docente. Como a mídia exprime representações sociais e intervém em suas elaborações, conforme Jodelet (2001) explica, abre caminhos para influências nas compreensões, comportamentos e atitudes. Para a autora, as instâncias ou substitutos institucionais e as redes de comunicação informais ou da mídia intervêm em sua elaboração, abrindo caminho a processos de influência e até mesmo de manipulação social (JODELET, 2001, p. 21). Nessa perspectiva, as representações sociais podem refletir e divulgar o saber social que se tem sobre o ser professor. Este saber social relaciona-se a sistemas de interpretação da realidade e circula publicamente por meio da mídia e seus produtos (GOETZ, et al. 2008). Assim, as informações divulgadas pela mídia não apresentam neutralidade, mas abordam uma interpretação de elementos sociais.
02427 Diante dessas condições, a presente pesquisa buscou identificar e analisar as representações de uma mídia impressa, especificamente do jornal Folha de S. Paulo, sobre a identidade docente. Percurso metodológico A presente pesquisa é de abordagem quanti-qualitativa (GOLDENBERG, 2009), com delineamento descritivo-explicativo (GIL, 2008). A coleta dos dados foi realizada ao longo de três meses (Setembro, Outubro e Novembro de 2013). Nesse período foram levantadas todas as notícias publicadas sobre Educação na versão impressa do jornal Folha de S. Paulo. Para que a notícia fosse classificada como pertencente à área de Educação era necessário que o texto publicado fizesse menção a um tema pertinente à área educacional, independente da editoria em que fora publicado ou do conteúdo específico abordado. Após a coleta de todas as notícias que falavam sobre educação foi feita uma análise preliminar, com leitura de todos os textos, de maneira a selecionar apenas aqueles que tivessem como foco o professor, em qualquer um dos aspectos possíveis. Dessa coleta foram obtidas 308 matérias sobre educação, sendo que dessas 26 abordavam sob algum aspecto o professor. A técnica da Análise de Conteúdo, proposta por Bardin (1977), foi usada para a apreciação dos dados. Resultado e discussão As 308 matérias analisadas da Folha de S. Paulo indicam que a temática Educação não é pauta principal do jornal, e menos ainda quando se busca dentro dessa o assunto professor, especificamente. Pudemos verificar na presente pesquisa que o tema Educação faz parte mais intensamente do cotidiano do conteúdo jornalístico analisado apenas durante períodos considerados quentes pela impressa, que retratavam uma situação esporádica e não corriqueira do tema. Das 308 matérias sobre educação, publicadas ao longo dos três meses pesquisados, identificamos 26 que faziam menção ao professor, totalizando apenas 8,4% da amostra. Nesse sentido, percebemos que o fluxo maior de textos ocorreu em
02428 outubro, no ápice da greve dos professores da rede pública do município do Rio de Janeiro e de algumas ocorrências de greve da USP. Após a identificação das matérias sobre professor, procedemos a leitura e análise das mesmas para que se pudesse compreender melhor como o professor é retratado pela mídia analisada. Dos 26 textos publicados pelo jornal analisado, percebemos que há uma grande distância entre o que acontece no cotidiano das escolas do país com o que ocupa as páginas jornalísticas. Quando nos aprofundamos no conteúdo dos textos jornalísticos, percebemos que o foco das matérias sobre a greve dos professores da rede pública, que obtiveram maior frequência, por exemplo, é no confronto político que se delineava naquele instante e não nas especificidades das reivindicações dos docentes. Ou seja, pouco destaque foi dado ao que reivindicavam os docentes e muito ao número de manifestantes presentes nos protestos, aos confrontos e à ênfase da perda das aulas pelos alunos nos dias da paralisação. Em nenhuma matéria houve menção às condições de trabalho dos professores, ou mesmo informações que permitissem ao leitor compreender melhor quem são esses docentes e como trabalham. Podemos dizer que, dos dados analisados, há uma indicação do docente como um profissional que só faz greve, está descontente com a carreira e não tem a profissão compreendida pelo público em geral. E também, que só ocupa espaço nos meios de comunicação quando se rebela contra as péssimas condições de trabalho. Percebemos ainda que os dados não revelam uma atribuição de importância aos próprios docentes para expressarem suas exigências, experiências ou realidades. Ou seja, os textos jornalísticos analisados não buscam explicações na categoria profissional, mas sim no poder público envolvido ou em especialistas 2. Considerações finais Em se tratando da identidade docente, Lawn (2001) argumenta que os discursos que circulam socialmente contribuem para produzir parte das condições necessárias à produção e à regulação do docente ao definirem a categoria profissional docente como deve agir, quais suas dificuldades e problemas. Segundo Garcia, Hypolito e Vieira (2005) a identidade docente é negociada em meio a múltiplas representações que veiculam discursos que ajudam a configurar
02429 políticas de verdade sobre o que é ser professor. Os autores afirmam ainda que são diversos os veículos desses discursos e as demandas oficiais penetram os jornais, os comentários educacionais veiculados pela mídia, os periódicos especializados, etc. Assim, os resultados da presente pesquisa nos mostram que é preciso ampliar o debate sobre como o professor é retratado na mídia e o status atribuído por essa instituição a eles. Com isso, talvez em algum momento, possamos ter em diferentes jornais uma visão mais próxima do cotidiano dos professores em sua vida profissional. Referências BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. GARCIA, M. M. A.; HYPOLITO, Á. M.; VIEIRA, J. S. As identidades docentes como fabricação da docência. Educação e Pesquisa. São Paulo, v.31, n.1, p.45-56, jan./mar. 2005. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 3ª. ed., São Paulo, Atlas, 2008. GOETZ, E. et al. Representação social do corpo na mídia impressa. Psicol. Soc., Porto Alegre, v. 20, n. 2, Ago. 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/psoc/v20n2/a10v20n2.pdf>. Acesso em 14 Abr. 2013. GOLDENBERG, M. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em ciências sociais. 11. ed. Rio de Janeiro: Record, 2009. JODELET, D. Representações sociais: um domínio em expansão. In: JODELET, D (Org.). As representações sociais. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2001. p. 17-44. LAWN, M. Os professores e a fabricação das identidades. Currículo sem Fronteiras, v.1, n.2, pp. 117-130, Jul/Dez 2001. MOSCOVICI, S. Das representações coletivas às representações sociais: elementos para uma história. In: JODETET. D (Org.). As representações sociais. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2001. p. 45-66. PIMENTA, S. G. Formação de Professores Saberes da Docência e Identidade do Professor. Nuances, vol III, Presidente Prudente, 1997, p.05 14. 1 Participaram do desenvolvimento dessa pesquisa as bolsistas PIBIC/CNPq/Unesp Patrícia Carla Zarpelon, Geisinara Fernanda Busqueti Dias e Thaila Oliveira de Souza. E as pós-graduandas Thaisa Sallum Bacco, Francisnaine Priscila Martins de Oliveira e Joyce Galdino Gomes. 2 Especialista nesse estudo foi caracterizado pelos dados da pesquisa como sendo o professor universitário que possui uma formação mais ampla.