Colonização por vegetação nativa e exótica no Setor Grotão I do Núcleo Pinhal de Miranda, Cubatão, SP Walter Rogério Lira de Oliveira 1 ; Mara Angelina Galvão Magenta 2 1 Mestrando Universidade Santa Cecília Curso de Mestrado em Ecologia 2 Docente Universidade Santa Cecília Curso de Mestrado em Ecologia Foi realizado um estudo de campo para registrar as espécies de plantas pioneiras em três locais recentemente desocupados, em um fragmento de Mata Atlântica. Foram coletados 135 indivíduos, representando18 famílias, com 23 espécies representadas por um gênero cada. As famílias mais representativas foram Araceae, Asteraceae, Poaceae e Solanaceae, com duas espécies cada. Entre as espécies coletadas, quatro são árvores, quatro são arbustos ou subarbustos, uma é trepadeira, uma é epífita e a maioria (13) é apresenta hábito herbáceo. Palavras-chave Regeneração ambiental; Mata Atlântica; espécies colonizadoras Colonization by native and exotic vegetation in Sector I Grotão Nucleus Pinhal de Miranda, Cubatão, SP A field study was conducted to record the pioneer plant species at three locations recently vacated, in a fragment of Atlantic Forest. 135 individuals were collected, representing 18 families, with 23 species, each one represented by one genus. The most representative families were Araceae, Asteraceae, Poaceae and Solanaceae, with two species each. Among the species collected, four are trees, four are shrubs or subshrubs, one is climbing, one is epiphyte and most (13) are herbaceous. Kew words Environmental regeneration; Atlantic Forest; colonizing species INTRODUÇÃO A Mata Atlântica foi o primeiro bioma a sofrer as intervenções antrópicas no início da colonização do Brasil, como indicam os levantamentos feitos por (EGLER 2001) onde o autor comenta que os assentamentos urbanos primeiramente ocorreram na franja costeira com adensamentos no Saliente Nordestino e nos Recôncavos das Baías de Todos os Santos e da Guanabara, e em estuários e baixadas costeiras, como a Santista. A instalação de um polo industrial no município de Cubatão atraiu para a região um enorme contingente de trabalhadores para o parque industrial da cidade e para o porto de Santos. Outro fator de incremento na população do município foi a construção das Rodovias Anchieta e dos Imigrantes, que exigiu a construção de alojamentos nas encostas da Serra para acomodá-los. Ao término da construção, e com o parque industrial sem oferecer vagas de emprego a todos, os trabalhadores excedentes começaram a ocupar as encostas da Serra do Mar ou os antigos alojamentos abandonados durante a construção da Via Anchieta, em busca de moradias mais baratas, dando-se início ao surgimento dos bairros Cotas. UNISANTA BioScience p. 44-48; Vol. 1 nº 2, (2012) Página 44
A Mata Atlântica, com baixa resiliência, é extremamente sensível as intervenções antrópicas, pois quanto menor a resiliência, mais frágil é o ecossistema (ENGEL & PARROTA, 2003). Esse é o caso da região dos bairros Cotas, que por ter sofrido alterações em suas propriedades físicas, químicas e biológicas, teve comprometida a estabilidade do ecossistema, que apresenta sérios riscos de desabamento em vários pontos. Diante dos fatos, o governo estadual decidiu retirar os moradores dos bairros-cota, uma intervenção feita através do Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar (BR-T117). Uma das áreas inseridas nesse programa é o bairro Cota Pinhal do Miranda, onde se localiza o Setor Grotão, objeto deste estudo, foi a primeira área desocupada por ser o local de maior risco (R4) de deslizamentos (PIAGGESI & MILEWSKI, 2009) devido às suas condições geotécnicas, pois além de possuir uma inclinação bastante significativa, seu solo é argiloso, oferecendo pouca compactação, agravado pelo desmatamento e pela incidência de chuvas na região, característica do bioma. Trabalhos de acompanhamento da colonização por espécies vegetais são de vital importância para a compreensão da dinâmica de recuperação de áreas sujeitas a deslizamentos (OLIVEIRA, 1998; MARTINS, 2004; SANTOS-JUNIOR, 2010) fornecendo subsídios para futuros projetos de restauração ambiental, apontando para uma possível necessidade de intervenções que possam promover a resiliência. MATERIAL E MÉTODOS O núcleo conhecido como Pinhal de Miranda (antiga Cota 95), onde fica o Setor Grotão, está afastado cerca de três quilômetros do centro de Cubatão e localiza-se à margem da pista descendente da Via Anchieta, no km 52/53. Situa-se entre o Córrego do Grotão e a Companhia Santista de Papel (atualmente desativada). Ocupa uma área de cerca de 45,5 ha e conta com 7.054 habitantes. Seu relevo e formado por aclives e declives, dando a característica de um pequeno vale; o acesso é feito por pequenas trilhas. Para o levantamento florístico, foram selecionadas três áreas do grotão e, em cada uma, marcadas 200 parcelas de 1 x 1 m, totalizando 600 parcelas. A área 1, está localizada nas coordenadas 23 o 53 03 S; 46o 27 53 W, em local próximo à Rodovia Anchieta; a área 2 em 23 o 53 05 S; 46 o 27 53 W, e a área 3 em 23 o 53 06 S, 46 o 27 27 W. Todas as plantas foram coletadas e identificadas, sempre que possível, em nível de espécie. O material foi depositado no Herbário da Unisanta (HUSC). RESULTADOS e DISCUSSÃO A listagem das plantas pioneiras é apresentada na tabela 1. Foram coletados 135 indivíduos, representando um total de 23 espécies com um gênero cada, e distribuídas em 18 famílias. As famílias mais representativas foram Araceae, Asteraceae, Poaceae e Solanaceae, com duas espécies cada. No primeiro trimestre de trabalho, a família predominante era Solanaceae, que se adapta rapidamente aos solos descobertos; com a evolução da ocupação do solo e a produção de serapilheira, a maior incidência passou a ser de indivíduos da família Piperaceae. Entre as espécies coletadas, quatro são árvores, quatro são arbustos ou subarbustos, uma é trepadeira, uma é epífita e a maioria (13) é herbácea. A predominância de colonização por espécies herbáceas já foi apontada por outros autores, como & Singh (2012). Embora metade das espécies encontradas seja exótica, a grande maioria já ocorre no País como subespontânea há muito tempo. UNISANTA BioScience p. 44-48; Vol. 1 nº 2, (2012) Página 45
Nessa primeira fase de recuperação ambiental, as plantas herbáceas dominam a flora local; das espécies coletadas, apenas quatro espécies, Citrus limon (L.) Burm. f., Artocarpus heterophyllus Lam., Cecropia pachystachya Trec. e Tibouchina pulchra (Cham.) Cogn. apresentam hábito arbóreo. A primeira é um limoeiro e provavelmente foi cultivada antes da desocupação; a segunda é popularmente conhecida como jaqueira e foi introduzida da Índia, atualmente ocorrendo como subespontânea em áreas de Mata Atlântica; espécies exóticas sabidamente pode alterar o equilíbrio ambiental, favorecendo, por exemplo, a proliferação de algumas espécies de mamíferos, em detrimento de espécies insetívoras, necessárias ao equilíbrio da fauna entomológica da floresta. Fabricante et al. (2012) constataram que A. heterophyllus altera de forma contundente a riqueza de espécies, a diversidade da vegetação e os solos dos sítios invadidos. Em contrapartida, as duas outras são árvores nativas pioneiras (WHITMORE, 1989) e representativas da Floresta Alta Submontana de entorno, apontando para o início do processo sucessional que incorrerá na recuperação da área. C. pachystachya produz frutos o ano inteiro e suas muitas sementes são dispersas por aves e morcegos (GANDOLFI, 2000) cuja presença pode também beneficiar outras árvores nativas, seja como dispersores ou fornecedores de matéria orgânica ao solo da floresta. Além disso, as cecrópias são poleiros naturais, contribuindo para formação de núcleos de vegetação ao seu redor, dando início ao processo sucessional em áreas degradadas (PASSOS et al., 2003). T. pulchra (quaresmeira) contribui com a produção da maior parte da Serapilheira no início das etapas de sucessão. As espécies arbustivas e herbáceas agem como cicatrizantes e auxiliam na proteção dos solos contra a erosão, além de fornecerem sombreamento, proporcionando um ambiente ideal para a instalação de espécies secundárias iniciais. Assim, embora a presença constante de Melinis minutiflora P. Beauv (capim-gordura) possa estar atrasando o processo de recuperação, por ser capaz de formar uma grande biomassa em relação às demais (MARTINS et al., 2004) e Plectranthus barbatus Andrews (falso-bolso) talvez afete negativamente o desempenho fisiológico de sementes de outras plantas, por ter efeito alelopático (AZAMBUJA et al., 2010) os resultados mostram que as áreas de estudo estão recuperando aos poucos a resiliência e, respeitadas as fases sucessionais da vegetação, a área degradada tem grandes possibilidades de se recuperar, sendo para isso de fundamental importância a fiscalização para que não ocorram novos assentamentos. UNISANTA BioScience p. 44-48; Vol. 1 nº 2, (2012) Página 46
Tabela 1. Plantas colonizadoras surgidas em um período de nove meses em uma área desocupada de Mata Atlântica, Núcleo Pinhal do Miranda, Setor Grotão, Cubatão, SP (Disp. = dispersão; trep. = trepadeira; subesp. = subespécie; zoo = zoocoria; anemo = anemocoria; (-) = desconhecido). espécie nome popular família hábito origem Cond. Disp. áreas Anthurium cordatum L. Schott. antúrio Araceae epífita Brasil nativa zoo 1 Artocarpus heterophyllus Lam. jaqueira Moraceae árvore Índia subesp. zoo 1,2 Bidens alba (L.) DC. picão Asteraceae erva México subesp. zoo 1,2 Cenchrus pirpureus (Schumach.) Morrone capim-elefante Poaceae erva África subesp. anemo 1,2 Cecropia pachystachya Trec. embaúba Urticaceae árvore Brasil nativa zoo 1,2,3 Cyperus eragrostis Lam ciperus Cyperaceae erva Neotrópicos nativa anemo? 1,3 Cissus verticillata (L.) Nicolson & C. E. Jarvis uva-do-mato Vitaceae trep; Brasil nativa zoo 1,2 Citrus limon (L.) Burm. f. limoeiro Rutaceae árvore Ásia cultiv. zoo 1 Costus spiralis (Jacq.) Roscoe cana-do-brejo Costaceae erva Trópicos nativa auto? 1 Emilia sonchifolia (L.) DC. ex DC. serralha Asteraceae erva Ásia subesp. anemo 1,3 Hedichium coronarium Koen. lírio-do-brejo Zingiberaceae erva Himalaias subesp. - 2 Impatiens holstii Engl. & Warb. Balsaminaceae erva África subesp. balístic a Melinis minutiflora P. Beauv capim-gordura Poaceae erva África subesp. anemo 1,2,3 Nephrolepis multiflora (Roxb.) F.M. Jarret samambaia Lomariopsidaceae erva Am S, Am C, Am N 1,2 nativa anemo 1,2,3 Nicotiana tabacum L. tabaco Solanaceae erva América do Sul nativa anemo 1,2,3 Pilea microphylla (L.) Liebm. brilhantina Urticaceae erva Am S, Am C nativa auto? 1 Piper sp. - Piperaceae arbusto Pityrogramma calomelanos (L.) Link maria-semvergonha samambaia-dobrejo - - zoo 1,2,3 Pteridaceae erva Brasil nativa anemo 2 Plectranthus barbatus Andrews. falso-boldo Lamiaceae arbusto Índia cultiv. - 1 Sida carpinifolia L. f. vassourinha Malvaceae erva Brasil nativa zoo 1 Tibouchina pulchra (Cham.) Cogn. quaresmeira Melastomataceae árvore Brasil nativa anemo 2 Solanum paniculatum L. jurubeba Solanaceae arbusto Neotropical nativa zoo 1,2,3 Urospatha sp. - Araceae erva Brasil nativa zoo 2 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DICKOW, K.M.C., MARQUES, R., PINCTO, C.B. & HÖFER, H. Produção de serapilheira em diferentes fases sucessionais de uma floresta secundária em Antonina, PR. Cerne, v. 18, n. 1, p. 75-86, 2012. ENGEL, V.L. & PARROTA, J.A. Definindo a Restauração Ecológica: Tendências e perspectivas Mundiais. In: KAGEYAMA, P.Y., Oliveira, R.E., Moraes, L.F.D, engel, V.L. & Gandara, F.B. (orgs.) Restauração ecológica de ecossistemas naturais. Botucatu: FEPAF, 2003. p. 01-26. UNISANTA BioScience p. 44-48; Vol. 1 nº 2, (2012) Página 47
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