ESTUDO DE CASO DA APLICAÇÃO DE MÉTODO MULTICRITÉRIO PARA PRIORIZAÇÃO DE PROJETOS

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Transcrição:

ESTUDO DE CASO DA APLICAÇÃO DE MÉTODO MULTICRITÉRIO PARA PRIORIZAÇÃO DE PROJETOS Sandra Naomi Morioka (EPUSP ) sanmorioka@gmail.com Marly Monteiro de Carvalho (EPUSP ) marlymc@usp.br Tendo em vista a limitação de recursos humanos e financeiros, as empresas devem ser capazes de selecionar os projetos a serem conduzidos de forma a maximizar seus benefícios. Porém esse processo nem sempre é trivial, pois diversos critérios de escolha devem ser levados em consideração e o impacto de cada um sobre o benefício do projeto é muitas vezes pouco linear. Isso pode ser identificado, por exemplo, na seleção de pontos de venda de varejistas de grande porte a serem reformadas, já que as lojas impactam no desempenho da empresa e o estado físico delas fica deteriorado com o passar do tempo. Nesse contexto, o presente estudo tem como objetivo discutir os principais aspectos relacionados com a aplicação de um método estruturado multicritério para seleção de projetos de reforma de loja. Para isso, foi conduzido um estudo de caso em uma empresa de varejo de grande porte. O método se mostrou útil para escolha das lojas a serem reformadas, apoiando a tomada de decisão da empresa. Palavras-chaves: seleção de projetos, método multicritério, varejo.

1. Introdução Dada a natureza dos serviços, os gestores tendem a focar seus esforços nos aspectos intangíveis de sua operação, tais como confiabilidade, empatia e agilidade de resposta (WALKEFIELD e BLODGETT; 1999). Com isso, muitas vezes podem acabar dedicando menos recursos a elementos tangíveis dos serviços, como relocação e renovação da infraestrutura física do local (WALKEFIELD e BLODGETT; 1999). Porém, é válido ressaltar que os aspectos tangíveis da prestação de serviços possuem potencial significativo para influenciar a experiência afetiva do cliente, impactando, portanto, a qualidade percebida do serviço (WALKEFIELD e BLODGETT; 1999). Assim, a decisão sobre alocação de recursos destinados a reforma de lojas do setor do varejo possui impacto relevante sobre o desempenho da empresa. Considerando que a problemática da escolha de lojas a serem reformadas é um problema do tipo de priorização de alternativas na gestão de portfólio, é possível verificar que há grande complexidade envolvida no processo de tomada de decisões dessa natureza. Kleinmuntz (2007) evidencia a dificuldade de um indivíduo conhecer suficientemente os diversos candidatos a projeto para garantir escolhas racionais e razoáveis. Uma das formas de abordar problemas de seleção de projetos é por meio da análise de decisão multicritério, ou seja, que considera não somente uma variável na tomada de decisão, mas um conjunto de critérios. Isso aumenta as chances de se tomar decisões mais adequadas ao negócio devido à sua capacidade de elevar a racionalidade do processo, buscando amenizar eventual viés causado por decisões intuitivas e/ou influências políticas (MONTIBELLER e FRANCO, 2007). Nesse contexto, o estudo tem como objetivo discutir os principais aspectos relacionados com a aplicação de um método estruturado multicritério para seleção de projetos de reforma de loja. Para isso, o artigo segue com um levantamento teórico sobre a gestão de portfólio, bem como sobre os principais conceitos da análise de decisão focada em seleção de projetos. Em seguida, é apresentado o estudo de caso em uma empresa de grande porte do setor do varejo, com o objetivo de selecionar lojas para serem reformadas, tendo em vista restrição orçamentária. Por fim, é discutida a forma como o problema foi conduzido, bem como os principais resultados da análise. 2. Referencial teórico 2.1. Gestão de portfólio Conforme bastante disseminado na prática, bem como utilizado na literatura de projetos (como PMI, 2004), verifica-se que um projeto é um esforço temporário para empreender um resultado único. Nesse sentido, um conjunto de projetos com objetivo comum é então agrupado em programas, sendo que programas e projetos isolados de uma determinada organização formam o seu portfólio de projetos (PMI, 2004). Cooper et al. (1997) argumentam que os objetivos da gestão de portfólio são maximizar o valor do portfólio, alcançar o balanceamento e o mix adequado de projetos e garantir o alinhamento dos projetos individualmente à estratégia de negócio. Existem diversas formas de se avaliar projetos para se obter critérios de seleção e balanceamento de portfólio adequados, como mostra o resultado da busca literária de Iamratanakul et al. (2008) da Figura 1. Nesse estudo, 2

seis categorias de métodos de seleção de projetos foram identificadas, indicando uma grande variedade de alternativas para apoiar a tomada de decisão de projetos de um determinado portfólio. É de grande importância que o gerente do projeto seja capaz de aplicar o modelo mais adequado para a sua realidade, já que cada um deles apresenta vantagens e desvantagens, bem como diferentes graus de complexidade de implantação (IAMRATANAKUL et al,. 2008). Figura 1 Tipos de métodos de avaliação de projeto para seleção. Fonte: Iamratanakul et al. (2008) Métodos de seleção Medida de desempenho Programaçao matemática Emulaçao cognitiva Simulaçao e heurística Opçoes reais Ad hoc Comparativo Scoring Tradicionais Programaçao linear Árvore de decisao Monte Carlo Equacao diferencial parcial Q-Sort appoach Checklist Indices econômicos Programacao nao-linear Teoria de jogos Dinâmica de sistemas Programacao dinâmica Outros Multicritério Fluxo de caixa descontado Programacao inteira Técnicas de decisao de grupos Heurística Simulaçoes Utilidade multiatributo Opções Programaçao dinamica Estatística AHP Programaçao estocástica Sistema de experiências Fuzzy Análise do processo de decisao Transportando a abordagem de Cooper et al. (2007) de projetos de desenvolvimento de novos produtos para quaisquer tipos de projetos, pode-se afirmar que decisões associadas à alocação de recursos de uma empresa em seu portfólio são fundamentais para atingir seus objetivos estratégicos. Isso porque, a aprovação de determinados projetos para execução tem como implícito que outros projetos não serão conduzidos, já que há limitação de recursos, sejam eles humanos, financeiros, de infraestrutura e etc. Assim, ao tomar a decisão quanto à carteira de projetos deve-se considerar de forma racional os trade-offs intrínsecos, pois más decisões implicam de altos custos de oportunidade (KLEINMUNTZ, 2007). O processo de escolha dos projetos a serem aprovados, reprovados ou adiados varia de acordo com as características da organização. Porém, segundo Kleinmuntz (2007) existem alguns aspectos em comum entre elas: (i) o número de solicitações de projetos é grande, aumentando a complexidade na tomada de decisão; (ii) não é possível que uma única pessoa seja capaz de compreender a fundo todos esses potenciais projetos, já que as informações relevantes estão espalhadas em diversos indivíduos pela organização; (iii) há influência política de gerentes e executivos, com o objetivo de auto-crescimento ou até mesmo devido à dificuldade dos decisores em conseguir discernir os projetos mais adequados à estratégia da empresa. Portanto, ferramentas de análise de 3

decisão baseadas em multicritérios podem ser de grande utilidade para a organização, aumentando o grau de racionalidade no processo de tomada de decisão. 2.2. Análise de decisão para seleção de projetos Keeney (1982) indica que existem diversos fatores que aumentam a complexidade em processo de tomada de decisão: objetivos múltiplos, dificuldade de identificar boas soluções, intangibilidade de critérios, impactos de longo prazo, múltiplos grupos impactados, risco e incerteza, riscos de sobrevivência, multidisciplinaridade dos assuntos, multiplicidade de decisores, trade offs de valores, atitude perante o risco e, finalmente, o encadeamento das decisões. Isso porque a natureza das decisões a serem tomadas, em geral, está relacionada ao fato de que há muito em jogo (ex. alto investimento ou impacto de longo prazo para a imagem da empresa), sendo que a estrutura dos problemas é complicada, dificultando a existência de especialistas do assunto. Além disso, uma vez tomada uma determinada decisão é necessário que haja uma justificativa racional para embasá-la (KENNEY, 1982). Nesse contexto, o próprio Keeney (1982, p.806) define a análise de decisão como sendo a formalização do senso comum para problemas de decisão que sejam complexos demais para serem solucionados pelo senso comum. Existem diversos artigos sobre a aplicação prática de análise de multicritério para seleção de projetos, sendo que alguns deles serão discutidos a seguir. Para analisar a carteira de projetos do Ministério de Ciência e Tecnologia da Eslovênia, Bohanec et al. (1995) desenvolveram um software customizado chamado DEX. Nesse cenário, os projetos são avaliados segundo os critérios de viabilidade e conteúdo discutidos com os decisores, formando a figura de uma matriz, onde são mostrados os resultados do software, conforme mostrado na Figura 2. Os eixos da matriz foram discutidos com os decisores e decompostos em critérios analíticos: viabilidade (interna e externa) e conteúdo (avaliação de metas e avaliação de objetivos) Figura 2. Matriz de classificação dos projetos. Fonte: Bohanec et al. (1995). Um dos artigos mais citados de otimização de carteira de projetos com uso de análise de multicritério é o de Ehrgott et al (2004). Com a parceria da empresa de Standard and Poor s, o estudo decompôs os objetivos clássicos de risco e retorno em cinco objetivos: desempenho 12 meses, desempenho de 3 anos, receita anual, S&P starrating e volatilidade. Dessa forma, baseados na teoria da utilidade de multicritérios e no modelo clássico 4

de Markowitz de média-variância, os autores puderam gerar funções de utilidade associados aos cinco objetivos definidos por meio de métodos de interpolação, variando conforme o perfil do investidor. Já Liesiö et al (2007) trataram do problema de seleção de projetos por meio do conceito de modelagem de portfólio robusto. A ideia principal dessa abordagem é associar um intervalo possível de níveis para situações em que o valor exato do peso dos critérios de decisão é difícil de ser determinado. Assim, o grupo de projetos que é selecionado, independente dos parâmetros desconhecidos é diretamente aprovado. Analogamente, aqueles projetos rejeitados para quaisquer limites do intervalo aceitável são descartados. Dessa forma, o problema de decisão de portfólio é simplificado, restringindo-se àqueles projetos que tem resultado variável de acordo com o peso dos atributos. Essa abordagem é então razoável para problemas de portfólio de projetos em que trata-se de com muitas alternativas, bem como de pesos de critérios que não são facilmente identificáveis ou acordáveis entre os decisores. Esses são alguns exemplos de aplicação de métodos de multicritério para apoio à tomada de decisão de gestão de portfólio. É possível verificar, portanto, que não há solução única ao realizar a priorização de projetos, já que a aplicação prática depende do caso real que está sendo tratado. De qualquer forma, para os exemplos apresentado, há em comum o caráter multicritério necessário para apoiar a tomada de decisão. 2.3. Value focused thinking e seu método de aplicação Como base da metodologia utilizada, foi utilizado o value focused thinking (VFT), em detrimento do alternative focused thinking (AFT). Tratado por Keeney (1996), o VFT é capaz de aumentar a qualidade do processo de tomada de decisão. Isso porque o autor argumenta que o paradigma mais disseminado, o AFT, é limitante, bem como tem caráter reativo, ao invés de pró-ativo. Por outro lado, o autor argumenta também que, ao evidenciar os valores considerados relevantes aos decisores, o VFT é capaz de identificar oportunidades de decisão e criar alternativas, enriquecendo o processo de tomada de decisão. Fundamentada nessa lógica, a metodologia conduzida para apoiar a tomada de decisão referente à priorização de projetos está composta por 5 etapas principais (ver Figura 3). O primeiro passo é justamente identificar os objetivos fundamentais da organização (KEENEY, 1982; MONTIBELLER e FRANCO, 2007). Para tanto, diversos métodos de geração de ideias podem ser utilizados, como o brainstorming e o brainwriting. Estruturando esses objetivos de forma hierárquica, obtém-se a chamada árvore de valores, que deve respeitar as propriedades a seguir (COSTA et al., 1999; BELTON e STEWART; 2002): a) Inteligível (significado claro aos decisores); b) Mensurável; c) Não redundante; d) Preferencialmente independente (desempenho de um determinado objetivo independe do desempenho dos demais objetivos); e e) Equilíbrio entre exaustivo e conciso. 5

O segundo passo é identificar os atributos que representem os objetivos fundamentais da organização. Nesse sentido, verifica-se que esses atributos podem ser classificados como direto, indireto ou construído a partir de outros indicadores; quantitativos ou qualitativos, bem como contínuos ou discretos (por exemplo em KEENEY, 1992 e COSTA et al., 1999). Um vez definidos os atributos a serem considerados, é necessário identificar limites factíveis e razoáveis tanto superiores e inferiores (MONTIBELLER e FRANCO, 2007), além dos níveis intermediários possíveis de atributos discretos. A etapa seguinte, uma das mais importantes no processo decisório, está focada no levantamento de alternativas, sejam elas pré-existentes ou potencialmente factíveis no futuro (MONTIBELLER e FRANCO, 2007). Para tanto, Keeney (1992) indica a possibilidade de se estimular os decisores por meio dos objetivos fundamentais, dos meios para atingí-los, de alternativas criadas e da combinação de diversas opiniões. A quarta etapa trata principalmente de explicitar os trade offs aceitos pelos decisores, evidenciando suas preferências. Montibeller e Franco (2007) buscam quantificar essas preferências por meio de alternativas fictícias, variando os níveis dos atributos. Assim, comparando alternativas com níveis mais baixos possíveis em todos os atributos exceto um e atribuindo preferências de forma quantitativa (valor de 0 a 100, por exemplo), é possível obter o valor dados ao decisor para cada atributo. Figura 3. Processo metodológico da análise de decisão. Fonte: Baseado em Keeney (1982) Levantar e hierarquizar objetivos Estruturação dos objetivos fundamentais Identificação dos atributos Levantar atributos Definir níveis de cada atributo Levantar alternativas Avaliar das alternativas com base nos atributos Estruturação das alternativas Levantamento das preferências dos decisores Estruturar e quantificar os valores dos decisores Avaliar alternativas Conduzir análise de sensibilidade Análise dos resultados A quinta e última etapa trata, então, de consolidar o valor de cada alternativa por meio da somatória ponderada pelas preferências dos decisores em relação aos atributos dos objetivos fundamentais (BELTON e STEWART; 2002). Assim, no caso da seleção de projetos, serão aprovadas para execução as alternativas que tiverem maior valor até que a alguma restrição humana ou financeira seja saturada. 3. Método de pesquisa Tendo em vista o objetivo de pesquisa, o método mais indicado é o estudo de caso devido ao seu caráter exploratório. A empresa escolhida para o estudo é uma varejista de grande porte, pois possui várias lojas 6

espalhadas em diversos estados brasileiros e inauguradas em anos diferentes, o que resulta em características específicas de cada loja e no consequente aumento de complexidade da escolha daquelas que devem ser reformadas. Nesse caso, o método de apoio à decisão será aplicado para priorização de lojas a serem reformadas no ano seguinte, dada as restrições de recursos da empresa. Tendo em vista o contexto da empresa e seus direcionadores de decisão, os critérios de decisão puderam ser identificados e o software V.I.S.A pôde ser aplicado para apoiar o processo estruturado da análise de decisão focada na presente pesquisa. Esse processo foi baseado nas atividades apresentadas na Figura 3: estruturação dos objetivos fundamentais, identificação dos atributos, estruturação das alternativas, levantamento das preferências dos decisores e análise dos resultados. 4. Apresentação dos Resultados Tendo em vista o estudo de caso, é possível verificar contribuições interessantes da metodologia baseada na lógica do value focused thinking na gestão de portfólio no contexto corporativo varejista. 4.1. Estruturação do problema Utilizando o software V.I.S.A (versão para universidade), foi possível conduzir as quatro primeiras etapas da metodologia apresentada na seção 2.3: estruturação dos objetivos fundamentais, identificação dos atributos, estruturação das alternativas e levantamento das preferências dos decisores. O primeiro passo foi identificar os objetivos fundamentais ao se escolher lojas para reforma. Assim, chegou-se à conclusão de que a infra-estrutura adequada das lojas é fundamental para estimular a venda a fim de compensar os custos de investimento, bem como satisfazer necessidades dos clientes e combater a concorrência local. Os atributos para avaliar esses objetivos são mostrados na Figura 4. Após a definição da árvore de valores, os intervalos dos atributos foram definidos com base em dados correspondentes a todas as lojas da empresa, de forma a garantir a abrangência dos atributos. Os atributos levantados foram: - Venda da loja (R$), indicando a importância da loja para a empresa, sendo que a margem de lucro dessa receita deverá compensar os custos de reforma; - Custo de investimento na reforma (R$), já que as demandas de cada loja podem variar conforme a sua necessidade física de reforma; - Fluxo de pessoas, representando a visibilidade da loja perante os consumidores em geral; - Opinião do cliente, consolidando outros indicadores disponíveis na empresa que representam o grau de satisfação do cliente perante a infraestrutura da loja (variação: 0% a 100%, sendo que 100% corresponde a um altíssimo grau de satisfação); - Quantidade de concorrentes, servindo como indicador do nível de concorrência na praça; e 7

- Estratégia de marketing, indicando o grau de investimento em ações de publicidade e propaganda para enfrentar a concorrência direta. Locais com pretensão futura de altos investimentos de marketing (MKT 4) tendem a ser prioritários para que a infraestrutura da loja esteja de acordo com a comunicação pretendida. A função de valor de cada atributo foi então definida com apoio da ferramenta, podendo ser visualizado na Figura 4. É fácil verificar que algumas variáveis, como a venda da loja, o fluxo de pessoas e a quantidade de concorrentes possuem inclinação positiva, indicando que lojas com venda alta e alto fluxo de pessoas e inserida em um mercado de alto nível de concorrência devem ser prioritárias. Análise análoga pode ser realizada para variáveis com inclinação negativa, ou seja, são consideradas boas alternativas lojas com baixo custo de reforma e com baixa avaliação do cliente (mais afastado de 100%). Já a variável de estratégia de marketing é a única variável discreta contemplada no modelo. Vale ressaltar que, para preservar o sigilo dos dados da empresa, os limites dos atributos, bem como os valores das alternativas foram de alguma forma manipulados. As dez alternativas a serem avaliadas correspondem a lojas que já estavam na lista de espera para priorização para o ano seguinte. Assim, o ranking resultante do modelo é capaz de indicar as lojas prioritárias para reforma, escolhendo o máximo de lojas possível tendo em vista restrições de investimento para esse tipo de intervenção de loja. Avaliando o desempenho dos atributos das alternativas, temos o resultado apresentado na Figura 5. Figura 4. Objetivos fundamentais para reforma de loja e funções de valor dos atributos. Software V.I.S.A. Figura 5. Avaliação das alternativas. Software V.I.S.A. 8

Dado que os valores extremos das variáveis correspondem aos possível dentro do universo total de lojas, as alternativas não ocuparam homogeneamente os valores factíveis, já que estas representam apenas uma amostra de lojas. 4.2. Interpretação dos resultados Avaliando as preferências do decisor em partes, ou seja, o valor de venda foi comparado com o custo da reforma, o fluxo de pessoas com a opinião do cliente e, finalmente, a quantidade de concorrentes com a estratégia do marketing, foram obtidos os valores parciais apresentado na Figura 4. Essa valoração é então hierarquizada de forma que foi também feita a comparação de preferências entre desempenho da loja, clientes e concorrência. Assim, o software tratou do problema, apresentado o seguinte resultado: Figura 6. Avaliação das alternativas. 9

Dado o orçamento estimado de cada loja, temos como resultado que devem ser priorizadas para reforma no ano seguinte as lojas: 1, 2, 10, 4, 3, 7 e 6, nessa ordem de prioridade. 6. Considerações Finais Diversos aspectos tangíveis e intangíveis devem ser levados em consideração na gestão de serviços (WALKEFIELD e BLODGETT; 1999). No varejo, a estrutura física da loja possui um papel importante no bem estar do cliente no ponto de venda, podendo impactar no processo decisório de compra. Considerando isso, o caso da empresa varejista descrito neste capítulo teve como foco a aplicação de uma método multicritério para apoio à tomada de decisão relativa às lojas a serem priorizadas para reforma de infraestrutura. Além do método multicritério utilizado ser bastante pragmático, ele possui a vantagem também de servir como base para explicitar preferências dos decisores. A facilidade de uso e de entendimento da metodologia aumentam as chances de aceitação por parte dos decisores. A discussão das curvas de valor e preferências entre critérios comparáveis de forma estruturada é uma das etapas de maior valor do método apresentado, já que garante a consistência do resultado final. Isso porque há a possibilidade de ilustrar a não linearidade entre desempenho do critério e impacto na prioridade da alternativa, complementando a discussão sobre os parâmetros de decisão. Assim, o cálculo final do ranking de prioridade das empresas deixa de ser o foco e passa a ser apenas uma consequência da objetivação das preferências dos tomadores de decisão. Uma limitação do estudo é o do número de candidatos, já que a rigor seria necessário considerar todas as lojas como alternativas de escolha e não apenas 10 candidatos. Porém, uma vez que o número de lojas está na casa de algumas centenas, isso dificultaria a visão e aumentaria a complexidade da situação. Uma vez que o modelo com o reduzido número de projetos a serem priorizados está entendido e validado pelos decisores, é possível, em um segundo momento, realizar uma aplicação mais complexa, incluindo as demais lojas como candidatas para reforma. 10

Referências BELTON, V. e STEWART, T. (2002) Multiple Criteria Decision Analysis. Kluwer: Nordwell, MA. BOHANEC, M. et al. (1995) Knowledge-based Portfolio Analysis for Project Evaluation. Information and Management, v. 28, p. 293-302. COSTA, C. et al. (1999) Decision Support System ind Action: Integrated Application in a Multicrieria Decision Aid Process. European Journal of Operation Research, v. 113, p. 315-335. EHRGOTT, M (2004) An MCDM Approach to Portfolio Optimization. European Journal of Operation Research, v. 155, p. 752-770. IAMRATANAKUL et al.(2008) Project Portfolio Selection: From Past to Present. IEEE. LIESIÖ, J. et al (2007) Preference Programming Using Robust Portfolio Modeling and Project Selection. European Journal of Operation Research, v. 181, p. 1488-1505. KENNEY, R.L. (1996) Value-focused thinking: Identifying decision opportunities and creating alternatives. European Journal of Operational Research, v. 92, p. 537-549. KENNEY, R.(1992) Value focused thinking. Cambridge, MA: Harvard University Press. KENNEY, R.L. (1982) Decision Analysis: An Overview. Operations Research, Vol. 30, No. 5, 803-838. KLEINMUNTZ, D. (2007) Ressource Allocation Analysis. In: EDWARDS, W et al. Advances in Decision Analysis: From Fundantions to Applications. Cambridge Press. MONTIBELLER, G.; FRANCO, A. (2007) Chapter 10: Decision and Risk Analysis for the evaluation of Strategic Options. In: O BRIEN, F.; DYSON, R. Supporting strategy: frameworks, methods and models pp.1-2, Chichester: John Wiley & Sons Ltd. PMI, Project Management Institute (2004) A guide to the project management body of knowledge (PMBoK). 4a. Edição. Project Management Institute. WALKEFIELD, K. L.; BLODGETT, J. G. (1999). Customer response to tangible and intangible service factors. Psychology and Marketing, v. 16, n. 1, p. 51-68. 11