Situação e perspectivas da soja no Bioma Pampa Arroz ou Soja: Eis a questão? O ARROZ E A SOJA NO URUGUAI Dr. Bruno A. Lanfranco O arroz tem uma história de mais de 8 anos de desenvolvimento sem interrupções no Uruguai. Área e produção cresceram quase exponencialmente até 1998/99, quando a cultura atingiu um pico histórico de quase 26 mil hectares. Uruguai tem a capacidade de semear uma vez por ano até um máximo de 23 mil hectares, sem recorrer a grandes investimentos em infra-estrutura. Os rendimentos têm continuado a crescer, chegando a 8. kg/ha nas últimas safras. Uma característica de destaque da indústria de arroz é a estreita colaboração de há muitos anos entre os produtores, a indústria e a pesquisa. Enquanto o sistema de preços acordados entre os produtores e a indústria tem agora mais de meio século de aplicação, a decolagem dos rendimentos de arroz conferida a partir do fim dos anos 6 e década de 197 está estreitamente relacionada com a criação da Estación Experimental del Este (hoje INIA-Treinta y Tres). A produtividade do arroz na lavoura uruguaia é, em termos da média nacional, entre as mais altas do mundo. Em paralelo, o arroz uruguaio goza de uma muito elevada reputação pela sua qualidade. 1,6 4, 1,4 3,5 Área Semeada (miles de ha) 1,2 1, 8 6 4 3, 2,5 2, 1,5 1, Produção (miles de ton) 2 5 98/99 99/ /1 1/2 2/3 3/4 4/5 5/6 6/7 7/8 8/9 9/1 1/11 11/12 12/13 13/14 14/15 Soja (produção) Arroz (produção) Soja (area) Arroz (área) Fonte: Em base a informação da Direção de Estatísticas Agropecuárias (DIEA-MGAP) e informantes privados. Gráfico 1. Área e produção de arroz e soja no Uruguai, nos últimos 15 anos A história da soja é um pouco mais recente e passou por diferentes estágios. Praticamente inexistente até meados dos 7 anos, nos primeiros anos dessa década iniciou-se um período de crescimento fortemente ligado à expectativa de demanda por parte de Taiwan. Em 1988/89, a 1
área plantada alcançou 55 mil hectares, caindo em seguida para pouco mais de nove mil durante a seguinte década. No início do novo século, a cultura voltou a emergir rapidamente, da mesma forma que outros produtos de origem agrícola, pela mão do forte crescimento nas economias dos países emergentes, como a Índia e a China. O Gráfico 1 mostra a história recente das culturas de arroz e soja no Uruguai, onde existe uma disparidade na evolução de ambas as culturas. O volume total da produção de arroz em casca atingiu 1,4 milhões de toneladas nas campanhas mais recentes, sobre a base de uma produtividade que tem continuado a crescer quase constantemente. Em contraste, tanto a área como a produção de soja tem-se multiplicado por mais de 1 vezes, com um desempenho de fazenda mostrando uma ligeira tendência de crescimento. Na última safra, a produção alcançou quase três milhões de toneladas de grãos por uma área estimada em 1,25 milhões de hectares. Até 29, o arroz continuava a ocupar o segundo lugar no ranking das exportações de mercadorias, superado apenas pela carne bovina. A soja já era o terceiro, mas passando a segunda em 21, relegando o arroz. Em 212, o valor de exportação da soja subiu finalmente ao primeiro lugar, ultrapassando também as exportações de carne bovina. A FORMAÇÃO DE PREÇOS AO PRODUCTOR Todos os anos, o Uruguai exporta mais de 9% de sua produção de arroz e soja. Isso faz com que a formação de preços é, em ambos os casos, muito dependente do mercado mundial. Os destinos principais do arroz uruguaio são o Oriente Médio (39%), Peru (14%) e o Brasil (1%). As exportações para a União Européia, África e o resto das Américas e o Caribe respondem cada um com 9%. Quanto à soja os destinos mais importantes são a China (4%), o Egito (5%) e a União Européia (3). A soja que sai pela zona franca de Nueva Palmira (44%) vai também a sua maioria para a China. O preço do produtor de soja no Uruguai "cópia" com grande fidelidade e quase instantaneamente o preço internacional. Os mercados de futuros e opções tornam-se relevantes no contexto dos mercados físicos. Eles expressam fluentemente e sem restrições as condições da oferta e da demanda. Também oferecem mecanismos de cobertura financeira em relação aos riscos de preço. Com o arroz, a situação é um pouco diferente. A partir de 1959, o preço do arroz para o produtor é fixada por acordo entre os produtores privados e moinhos, sem a intervenção do Estado. Para a fixação do preço, são considerados os custos de produção e o desempenho dos produtos vendidos no mercado internacional. Uruguai exporta seu arroz com vários níveis de processamento. O preço de uma tonelada processada surge para pesar os preços FOB de exportação de cada produto. A principal vantagem para os produtores é que eles podem se despreocupar com a venda e se concentrar nas atividades de produção. Além disso, implica a eliminação da variação do preço dentro de uma mesma safra. Por outro lado, os moinhos beneficiadores garantem um fornecimento confiável de matéria-prima a um preço que está intimamente relacionado com os custos de produção e o valor do produto exportado. O ARROZ E A SOJA NO MUNDO Os mercados para o arroz e a soja têm algumas semelhanças, mas também diferenças significativas. Em ambos os casos, seus produtos suportam múltiplos usos. O arroz é muito mais fortemente associado com alimentação humana. Ela é consumida principalmente sob a forma 2
direta, como grãos, sendo um componente essencial na dieta de mais de metade da população mundial. Este é um elemento chave para se entender como é que funciona o mercado. O arroz é a terceira cultura em termos de área colhida no planeta, somente atrás do trigo e milho, mas é o segundo na base de produção, superado apenas por este último. Em suas diferentes formas de processamento (grãos, óleo, lecitina), a soja tem um uso mais diversificado, tanto na área técnicas como comestível. Atualmente, grande parte da demanda mundial de soja está associada ao seu uso na alimentação animal. A área de colheita é significativamente menor do que a do arroz. Em 21, a área destinada à soja chegava a 5% da área ocupada pelo arroz. Uma década mais tarde, representa pouco mais de 6% do mesmo. A duas culturas aumentaram sua área e produção entre os anos de 21 e 212 (Gráfico 2). O rendimento médio de arroz aumentou 12 % no mundo, atingindo 4,4 ton/ha. Pelo seu lado, a soja teve um aumento de 9% na produtividade média, que atualmente esta na media de 2,5 ton/ha. 18 8 16 7 Área de Colheita (millões de ha) 14 12 1 8 6 4 6 5 4 3 2 Produção (millões de toneladas) 2 1 21 22 23 24 25 26 27 28 29 21 211 212 213 214 Arroz (produção) Soja (produção) Arroz (área) Soja (área) Fonte: Em base a informação de FAO. Gráfico 2. Colheita e produção mundial de arroz e soja (21-212) A produção de arroz está fortemente concentrada na Ásia, sendo o produto consumido principalmente em seu lugar de origem. Apenas entre 5% e 7% da produção mundial passa pelo mercado internacional. Trata-se de um alimento básico em muitos países de alta população e baixa renda. A escassez de arroz nos principais centros de distribuição pode ter conseqüências políticas e sociais muito graves. Além disso, há um sector produtor igualmente fraco, com um uso intenso de mão-de-obra e muito baixo de capital. Isso determina um equilíbrio difícil para os governos, que devem assegurar um preço baixo para o consumidor e, ao mesmo tempo, alto para o produtor. Isto e feito através de complexas políticas de subvenções com efeitos contrastantes. Como resultado, o mercado de arroz é altamente segmentado e protegido e a existência de variabilidade no preço é vista com grande desconfiança. O conceito de segurança alimentar tornou-se de grande importância e porem, a intervenção do Estado. O acúmulo de estoques públicos atende aos fins estratégicos, bem como o gerenciamento das informações da real 3
situação dos mercados. As previsões de curto e médio prazo, com o comportamento da oferta e da procura são difusas, bem como seus efeitos sobre os preços internacionais. Ao contrário, 85% da produção de soja é desenvolvida nas Américas, sendo que grande parte não é consumida no continente. Pelo menos do lado da oferta, o setor público não interfere ou apenas minimamente e as cotações refletem significativamente as condições e expectativas de oferta e demanda. O mercado para a soja apresenta uma elevada liquidez e volatilidade no curto prazo. Assim, as bolsas de mercadorias e futuros são uma forma muito eficaz de pesquisa e formação de preço. As exportações do arroz e da soja no mundo estão concentradas em poucos países. Nos últimos 1 anos (22-211), um pouco mais de 8% das exportações do cereal tem sido nas mãos de cinco países (Tailândia, Vietnã, Paquistão, Índia e Estados Unidos). No caso da soja, a proporção alcança 96 %, neste caso dos Estados Unidos, Brasil, Argentina, Paraguai e Canadá. SITUAÇÃO E PERSPECTIVAS DA SOJA NO BIOMA PAMPA Mais qual e realmente a perspectiva da soja na região, em termos da demanda pelo grão? O gráfico 3 mostra que o crescimento da produção mundial da soja entre 2/1 e 214/15 e explicada quase totalmente pelo crescimento na região do MERCOSUL e ainda, em boa medida, pelo crescimento da cultura no Brasil. Nesses quinze anos, a produção brasileira de soja passou de quase 4 a mais de 9 milhões de toneladas. No mundo, a produção cresceu de 175 milhões a pouco mais de 3 milhões no mesmo período. Isto é, o Brasil passou de representar 22% em 2/1 a 3% em 214/15. Milhões de toneladas 35 3 25 2 15 1 5 35 3 25 2 15 1 5 2 1 21 2 22 3 23 4 24 5 25 6 26 7 27 8 28 9 29 1 21 11 211 12 212 13 213 14 214 15 MERCOSUL Brazil Mundo Demanda chinesa Fonte: Em base a informação do USDA. Gráfico 3. Produção mundial, MERCOSUL, Brasil e demanda chinesa (2/1-214/15) Mais e interessante de ver o crescimento das importações de soja da China, que se multiplicou por mais de cinco vezes no mesmo período, de 13 a 73 milhões de toneladas. Se essa taxa de crescimento se manter, em menos de cinco anos a demanda chinesa por soja será equivalente a toda a produção brasileira. O problema e que, entrementes a demanda chinesa cresce a uma taxa 4
quase constante de 5 milhões de toneladas por ano, o suprimento da região de MERCOSUL mostra grandes oscilações entre anos, o que dificulta a estabilidade de um fluxo normal de exportações para o gigante asiático. 5 4 Milhões de toneladas 3 2 1 1 2 21 22 23 24 25 26 27 28 29 21 211 212 213 214 3 Diferencial demanda chinesa Diferencial fornecimento Mercosul Fuente: USDA Fonte: Em base a informação do USDA. Gráfico 4. Diferencial anual da produção do MERCOSUL e demanda chinesa (21-214) ALGUMAS REFLEXÕES No Uruguai, tanto a soja como o arroz tem um perfil exportador. Mais de 9% da produção de ambas as culturas e vendida nos mercados internacionais. No entanto, as duas se desenvolvem em mercados completamente diferentes. Por outro lado, os altos custos do arroz estão afetando a lucratividade do cultivo a pesar dos bons preços históricos. Isto tem incentivado a muitos produtores arrozeiros a substituir pelo menos uma parte da área arrozeira para a soja, que hoje já e o principal produto agrícola de exportação nesse país, em busca de uma lucratividade que o arroz não oferece. Mais não tudo e fácil para a soja, cuja expansão também começa a encontrar seus limites pelas altas rendas, a baixa produtividade e menores preços derivados das expectativas de boa colheita no hemisfério norte. Por outro lado, o novo Plano de Manejo de Solos aprovado pelo Ministério da Agricultura e da Pecuária do Uruguai (MGAP) exige um cuidadoso planejamento agrícola. Este planejamento inclui rotação de culturas para minimizar a degradação da estrutura dos solos, o que deixa fora a possibilidade de plantar soja (e mesmo arroz) em forma continua até nos melhores solos do país. Em geral, a soja apresenta maior risco de produção que o arroz. Aliais, tem problemas de drenagem nas zonas baixas tradicionalmente plantadas com arroz (mal chamada soja de várzea). Mais soja e arroz não têm por que ser concorrentes. A soja em rotação com arroz pode ser uma boa alternativa (controle plantas daninhas, redução custos). A demanda chinesa continua a crescer a um bom ritmo sem interrupções. Quanto à produção de soja no MERCOSUL cresce com muitas flutuações, o desafio é continuar desenvolvendo a cultura, aumentando a produção gradualmente e de uma forma sustentável. 5