Aula 02 Produção de Texto Professora Carolina Ferreira Leite
Todos conhecem as aventuras do Super-homem. Ele não é um terráqueo, mas chegou à Terra, ainda criança, numa nave espacial, vindo de Crípton, planeta que estava para ser destruído por uma grande catástrofe. É dotado de poderes sobre-humanos; seus olhos de raio X permitem ver através de quaisquer corpos, a uma distância infinita; sua força é ilimitada, possibilitando-lhe escorar pontos prestes a desabar e levantar transatlânticos; a pressão de suas mãos submete o carbono a temperaturas tão altas que o transforma em diamante; sua apurada audição permite-lhe escutar o que se fala em qualquer ponto. Pode voar a uma velocidade igual à da luz e, quando ultrapassa essa velocidade, atravessa a barreira do tempo e transfere-se para outras épocas; pode perfurar montanhas com o próprio corpo; pode fundir metais com um olhar. Além disso, tem uma série de qualidades: beleza, bondade, humildade. Sua vida é dedicada à causa do bem.
O Super-homem vive entre os homens sob a aparência do jornalista Clark Kent, que é um tipo medroso, tímido, pouco inteligente, míope. Você já viu na Aula 01 que todo texto é um pronunciamento sobre uma dada realidade. Ao fazer esse pronunciamento, o produtor do texto trabalha com as ideias de seu tempo e da sociedade em que vive. Com efeito, as concepções, as ideias, as crenças, os valores não são tirados do nada, mas surgem das condições de existência. As concepções racistas, por exemplo, aparecem numa época em que certos países, necessitando de mão-de-obra, iniciam a escravização de negros. A ideia de que certas raças são inferiores a outras não é uma maldade dos brancos, mas uma justificativa apaziguadora da consciência dos senhores de escravos. Essas concepções ganham um impulso maior quando os países europeus, precisando de matériasprimas, iniciam o processo de colonização da África e da Ásia. A colonização é, assim, justificada por um belo ideal: expandir a civilização.
Todo texto assimila as ideias da sociedade e da época em que foi produzido. Neste momento, você poderia estar dizendo que o texto do Superhomem prova exatamente o contrário, pois nada tem ele a ver com a realidade histórica, onde não existem super-homens. Quando se afirma que os textos se relacionam com a história, não se quer dizer que eles narram fatos históricos de um país, mas que revelam os ideais, os anseios e os temores de um povo numa determinada época. Nesse sentido, a narrativa do Super-homem mostra os anseios dos homens das camadas médias das sociedades industrializadas do século XX, massacrados por um trabalho monótono e por uma vida sem qualquer heroísmo. Esse homem, mediocrizado e inferiorizado, nutre a esperança de tornar-se um ser todo-poderoso assim como Clark Kent, que se transforma em Super-homem. As condições de importância do homem diante das pressões sociais geram um ideal de onipotência refletido na narrativa do Super-homem.
Além disso, as concepções de sociedade em que esse texto foi produzido estão presentes na ideia de BEM. Como nota Umberto Eco, famoso autor italiano, um indivíduo dotado dos poderes do Super-homem poderia acabar com a fome, a miséria e as injustiças do mundo. No entanto ele não faz nada disso. Ao contrário, o bem que pratica é a caridade, e o mal que combate é o atentado à propriedade privada. Lutar contra o mal é assim como combater ladrões. Dedica sua vida a isso.
Como se vê, as ideias produzidas num determinado tempo, numa dada época estão presentes no texto. Cabe lembrar, no entanto, que uma sociedade não produz uma única forma de ver a realidade. Como ela é dividida pelos interesses antagônicos dos diferentes grupos sociais, produz ideias contrárias entre si. A mesma sociedade que gera as ideias racistas produz ideias antirracistas. Por isso constroem-se nessa sociedade textos que fazem pronunciamentos antagônicos com relação aos mesmos dados da realidade. Há algumas ideias que predominam sobre suas contrárias numa dada época. Elas refletem os interesses dos grupos sociais dominantes. Fazer uma reflexão pessoal é analisar essas ideias de maneira crítica, verificando até que ponto elas têm apoio na realidade.
Para entender com mais eficácia o sentido de um texto, é preciso verificar as concepções correntes na época e na sociedade em que foi produzido. Assim, não se corre o risco de considerar, por exemplo, como pronunciamentos idênticos um texto sobre a democracia ateniense e um sobre a democracia nas sociedades capitalistas modernas, que, na verdade, tratam de concepções distintas. As ideias de uma época estão presentes nos significado dos textos. Cabe lembrar ainda que as ideias de uma época são veiculadas por textos, uma vez que não existem ideias puras, ou seja, não transmitidas linguisticamente. Assim, analisar as ideias presentes num texto é estudar o diálogo entre textos, em que um assimila ou registra as ideias presentes nos outros.
Proposta de redação Vimos que todo texto assimila ideias presentes numa dada sociedade. Os preconceitos, que ocorrem em vários textos, são ideias que passam por verdades, mas não resistem a uma argumentação bem fundamentada. Revelam, no entanto, a visão de uma certa sociedade e de determinado grupo social a respeito de algum aspecto da vida humana. Esses preconceitos têm origem numa observação parcial e apressada da realidade. Tento isso em vista, leia as seguintes afirmações: a) A raça branca é superior à negra. b) O brasileiro tem duas características básicas: a capacidade de dar um jeitinho em tudo e de empurrar as coisas com a barriga, não lhes dando solução. c) Só é pobre quem não trabalha.
Proposta de redação Escolha uma delas e arrole argumentos para rebatê-las. Escreva um texto mostrando que a afirmação escolhida por você não corresponde à realidade. Nele, você vai refutar ideias cristalizadas, expressas pelas afirmações anteriores, e mostrar que sobre um mesmo fato há mais de um ponto de vista.
Bibliografia FIORIN, José Luiz e SABIOLI, Francisco Platão. São Paulo. Ática. 2007. p. 27-33 - adaptado