JOGOS DE ANÁLISE FONOLÓGICA EM DUPLAS DE CRIANÇAS REFLETINDO, BRINCANDO E APRENDENDO SOBRE O SEA.

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Transcrição:

JOGOS DE ANÁLISE FONOLÓGICA EM DUPLAS DE CRIANÇAS REFLETINDO, BRINCANDO E APRENDENDO SOBRE O SEA. Valéria Suely S. Barza BEZERRA UFPE RESUMO Esta pesquisa pretende discutir a relação entre as habilidades de consciência fonológica e a apropriação da linguagem escrita em crianças, utilizando o jogo como recurso pedagógico, mobilizador da interação e facilitador da aprendizagem. Serão observadas nas sessões de jogos de analise fonológica as interações entre as duplas de crianças, os conhecimentos mobilizados por elas e, os prováveis avanços sobre o SEA -Sistema de escrita alfabética. As duplas serão formadas a partir da avaliação dos níveis de conhecimento sobre a escrita de acordo com os estudos de Ferreiro e Teberosky, (1995) e serão classificadas em duplas homogêneas (mesmos níveis de conhecimento sobre a escrita) e duplas heterogêneas(níveis diferentes de conhecimentos sobre a escrita) com o objetivo de observar a interação que acontece entre uma criança menos experiente e a criança mais experiente e, o adulto presente nas sessões. A pesquisa se propõe a contribuir na análise dos prováveis ganhos que as interações entre as crianças em diferentes níveis de escrita e entre os mesmos níveis sobre a língua escrita, em situações de jogos, de modo a auxiliar o trabalho do professor na tarefa de auxiliar o aprendiz no aprendizado do SEA. I- INTRODUÇÃO: A necessidade de mudança nas práticas pedagógicas que envolvem a leituraescrita, apontada pelos pela literatura cientifica através dos estudos de Brandão & Guimarães (1997), Rego (1988) e Terzi (2006) tem sido enfatizada como uma tentativa de tornar a aprendizagem das crianças mais significativa e prazerosa. No entanto, ainda é possível observar a permanência de práticas alfabetizadoras diferentes que, ora concebem a leitura e a escrita como uma atividade mecânica de memorização de um código de conversão de unidades sonoras em unidades gráficas, ora tratam a aprendizagem da língua escrita como algo espontâneo, encarando a alfabetização como resultante de capacidades exclusivamente individuais. Parece que nos dois casos citados acima há uma desconsideração sobre a tarefa do aprendiz em aprender a ler e a escrever. O processo de aquisição da leitura e escrita exige da criança um considerável investimento cognitivo, uma vez que o aprendiz deve ter um papel ativo na elaboração de um sistema de representação, que implica a elaboração de relações entre letras e sons e não simplesmente, a aquisição passiva de relações já estabelecidas. Assim, para compreender e ativamente se apropriar do

Sistema de Escrita Alfabética (SEA) é importante que a criança pense a língua como um objeto a ser descoberto, cujas complexidades serão desvendadas na interação com o próprio objeto de conhecimento (palavras e textos), assim como com parceiros mais experientes (adultos ou não). A compreensão sobre o funcionamento desse sistema implica, por sua vez, uma complexidade de princípios que devem ser descobertos e assimilados pela criança no seu processo de interação com a leitura e escrita. Vale a pena destacar a importância levantada por Vygotsky (1998) sobre a interação. Para este autor, a interação social é a base para a aquisição de conhecimentos pelo indivíduo, ou seja, o desenvolvimento das habilidades cognitivas se dá por meio da interação entre sujeitos, inseridos num contexto sócio-cultural. Deste modo, os jogos que estimulam a análise fonológica das palavras, ou seja, jogos que levam a criança a refletir sobre os sons das palavras (jogos de produção oral de rimas com nomes das crianças, por exemplo) podem contribuir nessa direção, de maneira lúdica e, favorecendo o estabelecimento da ZDP - Zona de desenvolvimento Proximal, ao mesmo tempo em que pode contribuir para a reflexão sobre o SEA. A ZDP é definida como a distância entre o nível de desenvolvimento real, determinado pela solução independente de problemas por parte do aprendiz, e o nível de desenvolvimento potencial, equivalente à solução de problemas, sob a orientação de um adulto ou outra criança mais competente. A seguir, abordaremos, de modo breve, algumas definições sobre CF e os estudos relacionados entre CF e alfabetização, bem como, apresentaremos algumas sugestões de atividades de reflexão fonológica, como por exemplo, os jogos de analise fonológica. 2. CONSCIENCIA FONOLÓGICA E ALFABETIZAÇÃO: A CF faz parte dos conhecimentos metalingüísticos, ou seja, resulta da possibilidade do sujeito de pensar sobre a própria língua, e não, simplesmente, de usá-la para se comunicar e atingir os seus objetivos. Como afirma Morais (2006), a CF se constitui, portanto, em um dos tipos de reflexão metalingüística, aquela que opera sobre segmentos sonoros (sílabas, rimas, fonemas) que estão no interior das palavras (p. 60). Assim, o autor destaca outros níveis possíveis de reflexão metalingüística, tais como: o nível sintático ou o nível morfológico. Cardoso-Martins (1995) define a CF como a consciência dos sons que compõem a fala (p.7). Um conceito semelhante é proposto por Freitas (2004), em que a CF é

entendida como a capacidade do ser humano de refletir conscientemente sobre os sons da fala (p.179), implicando, assim, não apenas a possibilidade de refletir, mas também a de operar, de forma consciente, sobre as unidades constituintes da fala, tais como: os fonemas, sílabas, rimas e aliterações. A capacidade de a criança refletir sobre as palavras inicia-se muito antes dela ingressar na escola, pois desde cedo já entra em contato com atividades culturais como, por exemplo: cantigas de roda, jogo da forca, parlendas e brincadeiras de adedonha, entre outras. Essas experiências constituem jogos e brincadeiras populares que auxiliam os aprendizes a refletirem e aprenderem sobre sua a língua de forma lúdica e prazerosa. Como já foi dito, a proposta de atividades que estimulem a reflexão fonológica das palavras, através de jogos de análise fonológica, tem sido recomendada por diversos autores por ser um recurso auxiliar importante para o trabalho do professor durante o processo de alfabetização. Segundo Leal (2004), tais propostas podem contribuir para levar os aprendizes a perceberem a natureza da relação entre a escrita e a pauta sonora (que no nosso sistema de escrita é alfabética e não silábica), assim como, estabelecerem as relações grafofônicas com mais eficiência. Nesta mesma direção, Freitas (2004) sugere a realização de atividades que estimulem a consciência fonológica das crianças desde a Educação Infantil, oportunizando a manipulação e reflexão sobre os sons das palavras, como auxílio na aquisição da língua escrita. Porém, como já afirmamos anteriormente, no campo da pesquisa, a natureza das relações existentes entre habilidades metalingüísticas e o aprendizado da leitura e escrita continua sendo alvo de discussões entre diferentes pesquisadores (MORAIS, 2005). No entanto, é inegável a estreita conexão entre consciência fonológica e a aprendizagem da leitura e escrita. Diversos estudos longitudinais têm defendido que as habilidades fonológicas, especialmente, as habilidades das crianças de refletir e manipular os fonemas das palavras, ao final da educação infantil, têm uma relação preditora no que concerne ao desempenho dessas crianças em leitura e escrita em séries seguintes (ver, por exemplo, Cardozo-Martins e Pennington, 2004). Outros estudos também têm revelado que a sensibilidade a aliterações e rimas das palavras apresenta uma conexão causal com o sucesso na alfabetização (Goswami e Bryant, 1991). Há ainda pesquisas que apontam para uma influência recíproca entre esses dois pólos: alfabetização e consciência fonológica (Gough, Larson, 1995; Morais, 1989).

No entanto, não há ainda um consenso sobre o papel da CF no processo de aquisição da língua escrita entre os diversos grupos que pesquisam a CF nem entre aqueles estudiosos que levam em consideração o processo evolutivo da língua escrita. Assim, buscando a superação da polêmica relação entre o papel dessas habilidades metafonológicas na alfabetização, alguns estudos tentam buscar um ponto de convergência entre as duas vertentes teóricas envolvidas: a CF e a perspectiva evolutiva da aquisição da escrita. É neste sentido que Morais (2005) e Leite (2006) sugerem que a reflexão fonológica é uma condição necessária para ajudar os aprendizes na compreensão da natureza e funcionamento do SEA, não sendo, porém, uma condição suficiente para o domínio desse sistema, uma vez que as habilidades de reflexão fonológica constituem apenas parte do processo de apropriação do SEA. Pretendemos, neste artigo, apresentar um estudo sobre jogos de análise fonológica com o intuito de subsidiar o trabalho do professor em sala de aula, uma vez que, o jogo é uma ferramenta didática interessante para proporcionar aprendizagens dinâmicas e significativas em crianças, além de fornecer dados importantes sobre a interação entre crianças pré-escolares e os jogos que estimulam a reflexão e a manipulação dos sons das palavras. O estudo citado acima tem como foco de análise as interações de cada dupla com um mesmo jogo ao longo de certo período de tempo, bem como as trocas de conhecimento sobre o SEA, registradas entre os parceiros de cada dupla e entre estes e o adulto, também participante da situação. Vale destacar que a proposta descrita acima se baseia numa concepção sóciointeracionista de ensino e de aprendizagem, extraída da teoria de Vygotsky. Considerase, portanto, que a aprendizagem significativa se dá com base na interação dos aprendizes com os objetos de conhecimento, mediados por outros sujeitos mais experientes. No caso da presente pesquisa, parte-se do pressuposto de que a situação de jogo proposta pode funcionar como o mobilizadora da Zona de Desenvolvimento Proximal (distância entre o nível de desenvolvimento real, o que a criança é capaz de realizar sozinha, e o nível de desenvolvimento potencial, ou seja, o que a criança pode realizar mediante a ajuda de um outro mais capaz). No próximo item apresentaremos, em mais detalhes, os objetivos que pretendemos perseguir neste estudo.

3 JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS DO ESTUDO: Diversos autores têm recomendado o uso de jogos como uma importante ferramenta didática para o professor. Na educação matemática, por exemplo, Kami (1995) indica o uso de jogos de bola de gude, boliche, corrida e baralhos como oportunidades excelentes para as crianças pequenas contarem, compararem quantidades, realizarem cálculos, possibilitando aos aprendizes pensarem sobre os números de forma prazerosa e com sentido. Cória-Sabini e Lucena (2004), por sua vez, realizaram estudos sobre a aprendizagem e o desenvolvimento das noções de maior/menor; perto/longe; alto/ baixo, ordenação e formas geométricas envolvendo movimentos e jogos corporais. O uso de jogos também tem sido indicado como importante aliado para o desenvolvimento da linguagem e da interação social (Kishimoto, 1994). Como já dissemos anteriormente, na área de ensino da leitura e escrita, o uso de jogos e brincadeiras em sala de aula têm sido recomendado para a aprendizagem dos princípios que regem o SEA, de uma forma mais significativa e lúdica (Leal, Albuquerque e Leite, 2005). Não há, porém, indicações detalhadas sobre os possíveis avanços que a criança realiza em relação ao processo de conquista do SEA, especificamente a evolução de suas habilidades fonológicas, em situações de jogos. É neste sentido que pretendemos apresentar os jogos de analise fonológica, como uma atividade a ser desenvolvida em duplas de crianças no processo inicial de alfabetização com os mesmo níveis de compreensão da escrita e com níveis distintos, buscando conhecer de modo aprofundado os conhecimentos partilhados em tais situações, registrando e refletindo sobre as possíveis mudanças qualitativas observadas, avaliando a construção de conhecimentos relativos ao SEA na sua interação com jogos de análise fonológica e com os participantes da situação de jogo (outra criança e um adulto). Neste trabalho, descreveremos os jogos com suas regras e o material utilizado nos mesmos, como também as habilidades metafonológicas mobilizadas em cada um dos jogos. Vale destacar que os jogos descritos fazem parte de um estudo em andamento com duplas crianças de cinco e seis anos, da Educação Infantil e do Ensino Fundamental, respectivamente. A partir das situações com os jogos pretendemos: Identificar os conhecimentos metafonológicos mobilizados, compartilhados e confrontados entre as crianças, durante as sessões de jogos de AF; Identificar e avaliar o desempenho de cada dupla ao longo das sessões de jogos, enfocando, particularmente, as diferentes habilidades fonológicas

mobilizadas por cada jogo; Registrar e analisar as mudanças qualitativas observadas em relação a tais habilidades traçando o perfil de cada dupla ao longo das quatro sessões em que irá interagir com um mesmo jogo; Identificar aspectos semelhantes e diferentes nas interações entre as duplas de crianças e os jogos, considerando os níveis distintos de compreensão que demonstram acerca do SEA. A seguir descreveremos os três jogos de análise fonológica e as habilidades mobilizadas pelos mesmos, nas situações com duplas de crianças. 4- JOGOS DE ANÁLISE FONOLÓGICA Jogo 1 - Batalha: Composto de vinte e oito cartões de cartolina com figuras correspondentes à palavras compostas por uma, duas, três e quatro sílabas. O jogo estimula as habilidades metafonológicas de segmentação e contagem das sílabas, e comparação do tamanho das palavras. Seguindo a regra do jogo de baralho original, aquele jogador que colocar o cartão com a palavra maior (ou seja, com o maior número de pedacinhos ), fica com o montinho descartado. Ganhará o jogador que conseguir reunir o maior número de cartões ao final do jogo. Jogo 2 - Jogo de sons iniciais: É composto por vinte e quatro cartões com pares de figuras diferentes cujas palavras correspondentes iniciam com a mesma sílaba, e um saquinho contendo diversas palavras escritas que possuem som inicial correspondentes às palavras dos cartões. O adulto retira uma palavra do saquinho ao acaso e lê em voz alta. A criança da vez irá procurar pares de cartões com figuras contendo a palavra iniciando com o mesmo som da palavra lida pelo adulto. O jogador que conseguir encontrar um cartão ou o par de cartões cuja figura comece pelo mesmo som da palavra lida ganha uma fichinha. Vencerá o jogo aquele que conseguir encontrar o maior número de pares, isto é, obter o maior número de fichas. As habilidades metafonológicas mobilizadas pelo jogo são as seguintes: reconhecimento de som inicial de palavras e identificação de palavras com o mesmo som. Jogo 3 Trilha: o jogo consiste em um tabuleiro com uma trilha (percurso), um dado e pinos para cada jogador. Em várias casas da trilha estão apresentadas perguntas sobre rimas, sons iniciais, quantidades de sons de palavras, palavras que começam com determinado som, figuras cujos nomes começam com a

mesma sílaba, etc. Cada jogador deve percorrer a trilha com base na quantidade de casas indicadas pelo dado, respondendo às perguntas formuladas quando este for o caso. À medida que o jogador responde corretamente a uma pergunta, ele receberá fichinhas. Vence o jogo quem chegar primeiro ao final da trilha com maior número de fichas. As habilidades metafonológicas envolvidas neste jogo são as seguintes: contagem de sílabas, reconhecimento e produção oral de palavras rimadas, comparação de tamanho de palavras e produção de palavras que iniciem com determinada sílaba. 5- CONSIDERAÇÕES FINAIS: A proposta de inserir jogos como estratégias didáticas no trabalho sistemático do ensino da língua, nos remete a um resgate do lúdico no espaço escolar (KISHIMOTO, 1994), além de favorecer a compreensão de que a aprendizagem é processual e dinâmica. Na escola, a aprendizagem não ocorre de forma isolada, ou de modo solitário, mas, sobretudo ela é coletiva. O espaço escolar é um lugar de coletividade no qual professor-aluno e aluno-aluno estão em constantes interações e possuem diferentes formas de compreensão do mundo. Deste modo, tomamos emprestado as palavras de Curto (2000) ao abordar o trabalho cooperativo de crianças pequenas: A educação escolar é grupal. Trabalha-se com grupos, não com somas de indivíduos. Acontece que toda aprendizagem é uma construção social, isto é, aprendese entre todos, em contato com algo ou com alguém (p: 87). Neste sentido, acreditamos que os jogos de análise fonológica podem ser grandes aliados no trabalho do professor de educação infantil e ensino fundamental, fornecendo-lhe pistas sobre como intervir em direção a um melhor desenvolvimento dessas habilidades com seu grupo de crianças e, principalmente, pode contribuir para o desenvolvimento de aprendizagens prazerosas para as mesmas. 6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRANDÃO, A. C. P. & GUIMARÃES, G. L. Concepções distintas de alfabetização: onde está a diferença? Tópicos Educacionais. vol. 15 (1/ 2), 1997, p.19-38. CARDOZO-MARTINS, C. & PENNINGTON, B.F. The relationship between phoneme awareness and rapid serial naming skills and literacy acquisition: The role of

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