Avaliação das Políticas de. Incentivo à P&D e. Inovação Tecnológica no Brasil. João Alberto De Negri * Mauro Borges Lemos **



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Transcrição:

Avaliação das Políticas de Incentivo à P&D e Inovação Tecnológica no Brasil João Alberto De Negri * Mauro Borges Lemos **

NOTA TÉCNICA IPEA Avaliação das Políticas de Incentivo à P&D e Inovação Tecnológica no Brasil João Alberto De Negri Mauro Borges Lemos Técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos Setoriais Diset/Ipea. Pesquisador do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional Cedeplar/UFM G.

3 Nos últimos 30 anos, a matriz de Ciência e Tecnologia (C&T) mundial se tornou mais densa e complexa. Há uma interconexão entre áreas de C&T, mudança de escala e intensificação da produção científica em todos os domínios tecnológicos. A singularidade do paradigma tecnológico desta matriz mundial, relativamente a paradigmas anteriores, é a estreita relação entre a base de conhecimento científico e a produção tecnológica. Esta estreita relação entre ciência e tecnologia explica por que o avanço do conhecimento científico de uma nação determina em grande medida sua capacidade de inovação tecnológica. Daí a relação direta hoje existente entre capacidade de produção de riqueza e liderança em C&T. Países considerados líderes em C&T são também potências econômicas e países com forte crescimento econômico apresentam matrizes cada vez mais complexas; O Brasil manteve sua posição relativa nessa corrida tecnológica (não avançou e não retrocedeu), enquanto outras economias emergentes de grande e médio porte mudaram sua estrutura de C&T e ultrapassaram o Brasil, como a China e a Coréia. O Brasil apresenta pouca sintonia com a matriz mundial, pois concentra esforços em áreas mais distantes da fronteira onde não há um maior esforço das nações líderes. No período recente, segunda metade da década de 2000, há um padrão de C&T mundial concentrado nas áreas tecnológicas como Tecnologia da Informação (TI), Biotecnologia e Eletrônica. Nesse contexto, as atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) nacional têm uma agenda defasada de pesquisa, ainda pouco estruturada e já fora do foco da disputa tecnológica. Nesse caso há amplas diferenças entre a matriz de C&T brasileira, a mundial e a dos países tecnologicamente emergentes, como Coréia e China; No que tange ao impacto do C&T no crescimento das nações e das firmas, a inovação tecnológica gera postos de trabalho mais bem remunerados e mais estáveis. Aproximadamente 1/3 das empresas industriais brasileiras faz inovação tecnológica de produto ou processo a cada dois anos. Segundo informações da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), as empresas industriais que inovam e diferenciam produtos pagam 80,5% a mais para os seus trabalhadores do que a média dos trabalhadores empregados na indústria. Os postos de trabalho gerados nas empresas que inovam e diferenciam produtos exigem 20,9% a mais de escolaridade do trabalhador. A permanência média do trabalhador nestas empresas é 30,4% maior

4 do que média. Houve avanços especialmente relevantes na política de inovação tecnológica no Brasil a partir de 2003. Nos últimos 25 anos foi construído um sistema relativamente robusto de inovação no Brasil quando comparado aos outros países latino-americanos mais desenvolvidos: pós-graduação, fundos especiais para o financiamento da pesquisa entre outras ações. Na segunda metade dos anos 1990 houve avanços com a criação dos Fundos Setoriais e com os programas de desenvolvimento tecnológico Industrial e agropecuário (PDTI/PDTA). Com a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (Pitce) de 2003 o Brasil passou a contar com um sistema mais integrado e coerente para a indução da inovação nas empresas nacionais: Lei do Bem (Lei nº 11.196/2005) e Lei da Inovação (Lei nº 10.973/2004). As Empresas dispõem de: a. incentivo fiscal à P&D semelhante à dos principais países do mundo (automática, sem exigências burocráticas); b. possibilidade de subvenção a projetos considerados importantes para o desenvolvimento tecnológico; c. subsídio para a fixação de pesquisadores nas empresas; d. programas de financiamento à inovação de capital empreendedor; e. arcabouço legal mais propício para a interação universidade/empresa. Os incentivos fiscais induzem investimentos em P&D das empresas brasileiras. Programas de incentivos fiscais à P&D no Brasil induzem aumento dos gastos de P&D das empresas participantes em 90% dos casos. Os incentivos fiscais são amplamente utilizados pelos países desenvolvidos para impulsionar os gastos em P&D. Isoladamente, este instrumento tem se mostrado pouco eficaz. No Canadá tem incentivos fiscais para P&D desde 1944; Estados Unidos desde 1954, e Austrália desde 1986. No Brasil esses incentivos foram inicialmente implementados pelo PDTI (Lei nº 8.661/93). A burocracia envolvida limitou o alcance do PDTI. Entre 1996 e 2005, período de vigência do PDTI, houve 196 projetos aprovados. A Lei do Bem (Lei nº 11.196/2005) amplia os incentivos fiscais e melhora os mecanismos de acesso aos benefícios. Nos dez anos de vigência do PDTI foram aprovados 196 projetos. Nos dois primeiros anos de vigência da Lei do Bem foram beneficiadas 320 empresas. Os incentivos fiscais à P&D estão relativamente distribuídos por toda a base produtiva, porém regionalmente concentrados. Cerca de 600 mil trabalhadores estão ocupados nas 276 empresas do setor de serviços e indústria que

5 acessaram os benefícios fiscais da Lei do Bem. A maior parte das empresas está localizada no Sul e no Sudeste brasileiro. A baixa participação das regiões Nordeste, Centro-Oeste e Norte é um indicador das diferenças tecnológicas regionais da base produtiva brasileira (Quadro 1 Anexo). O financiamento à P&D nas empresas é um dos instrumentos universalmente mais utilizados para a indução do desenvolvimento tecnológico. Vários países mesclam financiamento em condições favorecidas com subvenção, como é o caso da Coréia do Sul, da Finlândia, da França e do Japão. Muitos países utilizam fortemente as compras governamentais. É o instrumento, por excelência, praticado pelos Estados Unidos (Nasa e Departamento de Defesa). Os mais comuns: a) financiamento não reembolsável para pesquisa acadêmica, mas há também financiamento não reembolsável para pesquisa privada pré-competitiva (algo pouco desenvolvido no Brasil); b) subvenção; c) financiamento reembolsável em condições favorecidas (taxas menores, prazos maiores etc.); d) participação no capital do empreendimento; e) capital empreendedor para desenvolvimento de pequenas empresas de base tecnológica; O financiamento à P&D nas empresas brasileiras tem impacto positivo sobre a produtividade e crescimento das firmas. No período 1996 a 2005 os financiamentos à P&D nas empresas realizados pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) por meio dos programas de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Empresa Nacional (Adten) e do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT-Cooperativo) tiveram um impacto positivo sobre o desempenho das empresas. Foi observado um efeito de adicionalidade nos investimentos em P&D, ou seja, as empresas apoiadas pelo Adten investiram 54% a mais em P&D com recursos próprios. Aquelas apoiadas pelo FNDCT-Cooperativo investiram 104% a mais de recursos próprios em P&D. No entanto, o alcance dos programas de apoio às empresas da Finep no período 1996-2005 foi muito restrito, limitando-se a 813 empresas em dez anos. Os novos instrumentos legais ampliaram o alcance dos programas de financiamento à P&D. Com os novos instrumentos legais (especialmente Lei de Inovação e Lei do Bem) e com o aumento na execução dos Fundos Setoriais, a Finep apoiou 923 empresas em quatro anos (2005/out.2008). Considerando o edital de subvenção de novembro de 2008 a Finep financiou em quatro anos 1.132 empresas. Os salários pagos nas empresas apoiadas pela Finep são maiores do que a média. O salário pago nas empresas apoiadas pela Finep é 2,6 vezes maior do que

6 a média salarial das empresas industriais e 2,3 vezes maior do que a média de salários no setor de serviços. Vinte e cinco por cento do total de pesquisadores e 25% do total de carreiras científicas encontram-se empregados nas firmas financiadas pela Finep (Quadro 2 Anexo). No Brasil, a participação do fomento público à P&D das empresas é relativamente pequena. Em 2005 apenas 7,4% dos gastos privados em inovação eram provenientes de financiamento público em contraste com 88,6% de recursos próprios das empresas. Problemas e obstáculos à inovação no Brasil. As empresas que enfrentaram problemas para realizar inovação tecnológica, tanto para as financiadas pela Finep quando para as não financiadas, declararam que os principais obstáculos à inovação estão associados ao crédito: a) riscos econômicos excessivos; b) elevados custos da inovação; c) escassez de fontes apropriadas de financiamento; Articulação universidade- empresa é um grande desafio no Brasil. Muitos países têm política explícita de brain circulation como a China, a Índia e os países europeus. O Brasil ainda não conseguiu articular uma rede com pesquisadores e pósgraduandos no exterior, como o fazem os indianos e os chineses. O orçamento das universidades de pesquisa tem crescido menos do que o necessário. O orçamento para a formação superior tem crescido mais aceleradamente. Ampliar a dotação orçamentária para as universidades de pesquisa é importante, pois afeta tanto a efetividade da produção de pesquisa como os incrementos na formação de recursos humanos (RH) de alta qualificação para inovação. Foram destinados a pesquisadores que têm articulação com empresas dos setores industriais e de serviços 20% dos desembolsos dos Fundos Setoriais. Existem 24.645 grupos de pesquisa cadastrados no Diretório do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Dentre esses grupos, 2.922 declaram interações com 4.483 empresas sendo 1.137 delas do setor de serviços (exceto educação) e indústria. Nos Fundos Setoriais existem 13.435 projetos apoiados no período 2002-2008 que tiveram no mínimo 20% dos seus recursos previstos já desembolsados. Nestes projetos foram contratados R$ 4,49 bilhões e desembolsados aproximadamente R$ 3 bilhões; 20,1% dos recursos provenientes dos Fundos Setoriais, ou seja, aproximadamente R$ 600 milhões, foram destinados a doutores vinculados a grupos de pesquisa no CNPq que têm relação com empresas do setor de serviços e indústria. Este é um indicador relevante de articulação universidade/empresa e também para avaliação dos mecanismos de financiamento ao

7 sistema de C,T&I no Brasil. Os gastos dos Fundos Setoriais são hoje parte importante dos dispêndios em P&D no Brasil. Contudo, esses gastos ainda são pequenos, em comparação ao volume de gastos públicos do país e à escala dos esforços dos países líderes e das grandes corporações mundiais. Em termos de participação no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro de 2005 os gastos totais em P&D seriam de aproximadamente 1,3% em comparação com a média dos países da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de 2,3% e da União Europeia (UE) (15 iniciais) de 2%. Para atingir estes 2% da UE os dispêndios adicionais em P&D do Brasil deveriam ser de R$ 12,78 bilhões. Tendo como referência o dispêndio anual de 2007 no valor de R$ 1,3 bilhão e a constância dos dispêndios totais entre 2005 e 2007, os Fundos Setoriais representam em torno de 5% do total do dispêndio e 8,34% dos dispêndios públicos. Para atingir os 2% da UE, os dispêndios adicionais em P&D do Brasil deveriam ser de R$ 12,78 bilhões. Uma vez mantida a mesma participação pública-privada, ainda que parte do dispêndio público resulte em benefício direto de capacitação tecnológica privada, o esforço adicional do setor público seria de R$ 7,67 bilhões anuais. Tendo em vista que pela sua natureza os Fundos Setoriais são o instrumento hoje disponível mais eficaz de fomento público ao financiamento privado em P&D, é mister considerar que a sua participação neste esforço adicional público deveria ser destacada. Se sua participação passar a representar 50% do esforço adicional, seu valor incremental deveria ser de R$ 3,83 bilhões, que corresponde a três vezes o valor de 2007. Assim, a primeira proposta relativa aos gastos dos Fundos Setoriais é a necessidade de seu aumento substantivo se o objetivo estratégico do país for sua progressão para o regime tecnológico dos países desenvolvidos e tecnologicamente emergentes. A segunda relaciona-se à focalização desses gastos. Os gastos deveriam ser focalizados nos segmentos onde a iniciativa privada ainda não investe e que são considerados centrais no padrão de C&T identificado na matriz mundial. O risco dessa alocação de recursos em setores novos é a baixa interação com o setor privado, dado o baixo interesse do mesmo nessas áreas com elevada

8 incerteza tecnológica. O objetivo de alocar recursos em setores de alta tecnologia pouco explorados pelo setor privado é criar condições para que essas atividades passem a ser consideradas rentáveis a partir do controle da tecnologia por parte de centros de pesquisa nacionais. Nesse caso os Fundos Setoriais funcionariam como ponta de lança no desenvolvimento tecnológico nacional. Os setores selecionados seriam alguns daqueles que constituem a matriz de C&T mundial. Os setores preferenciais para os Fundos Setoriais seriam aqueles onde ainda existem janelas de oportunidades : setores novos, empresas ainda emergentes, suporte público e concorrência ainda modesta, em termos de capacitação tecnológica. Esta é a orientação principal dos institutos nacionais de C&T recentemente selecionados pelo MCT. É suficiente a políticas de apoio à P&D nas empresas? Esta nota técnica argumenta que há avanços significativos na política brasileira de inovação tecnológica nas empresas a partir de 2003, com o aumento especialmente relevante dos recursos destinados ao sistema de C&T e à Inovação bem como a efetivação dos novos instrumentos legais, particularmente a Lei de Inovação e a Lei do Bem. O número de empresas apoiadas cresceu significativamente e foi possível fazer em três ou quatro anos muito mais do que foi feito nos dez anos anteriores a 2005, quando os novos instrumentos legais passaram a ser efetivos. No entanto, ainda é preciso fazer muito mais. Para exemplificar, considerando somente a indústria, no Brasil existem 95 mil empresas industriais com mais de dez pessoas ocupadas. Destas firmas, 35 mil realizaram algum tipo de inovação no período 2003-2005. Existem aproximadamente 6 mil empresas industriais que realizaram gastos com P&D. A Finep financiou pouco mais de mil delas no período 2005-2008. No Brasil mais de 95% dos gastos em P&D das empresas são realizados com recursos próprios ou privados, ou seja, os fundos públicos participam com menos de 5% dos gastos em P&D das empresas. Nos países desenvolvidos o financiamento público é especialmente mais relevante e os fundos públicos participam com percentuais que chegam a 50%. Desafios da avaliação dos Fundos Setoriais. Nos próximos anos a avaliação dos Fundos Setoriais será especialmente relevante para melhorar a atuação do Estado no fomento à C,T&I. Neste contexto são questões centrais na avaliação: Os Fundos Setoriais têm sido eficientes no financiamento à C,T & I no Brasil? As

9 empresas têm participado de forma expressiva nos Fundos Setoriais? Qual o impacto dos Fundos Setoriais na gestão do Sistema Nacional de Inovação? Integração dos instrumentos de política de investimento e inovação no Brasil. Hoje o Brasil conta com importante conjunto de instrumentos de apoio à inovação, no entanto, eles estão ainda desarticulados com a política de desenvolvimento da produção. A rigidez institucional das várias agências de fomento como BNDES e Finep e o pouco uso do poder de compra do Estado (particularmente Petrobras) para impulsionar a produção ainda é uma barreira especialmente relevante. A experiência internacional mostra que esta articulação é fortemente dependente do poder central de cada país e não é viável ser feita pela simples vontade individual das agências, ministérios ou empresas estatais. O Estado precisa inovar-se. Instituições criadas para o tipo de desenvolvimento dos anos 1950 têm dificuldade para impulsionar o desenvolvimento do século XXI, que é muito calcado em ativos intangíveis. Coordenação mais forte e um pouco de ousadia ajudam principalmente quando políticas de inovação tendem a ganhar relevância diante das perspectivas de mudança da base produtiva brasileira com as descobertas do Pré-Sal. A crise atual pode abrir oportunidades para o Brasil, caso bem administrada internamente, ao permitir um avanço na acumulação de C&T nacional, em um contexto no qual pode haver uma certa estagnação ou mesmo redução nos investimentos dos países centrais.

10 ANEXO Quadro 1 Setores Número de Número de empresas trabalhadores Indústria extrativa (10 a 14) 2 346 Indústria de alimentação, bebidas e fumo (15 e 16) 20 88.384 Indústria têxtil, vestuário, calçados e couro (17 18 19) 13 61.091 Celulose, papel, impressão, edição (20 e 21) 8 19.527 Refino de petróleo e combustíveis nucleares (22 e 23) 2 43.041 Produtos químicos e plástico (24 e 25) 69 56.972 Metalurgia básica e produtos de metal (26 e 27) 31 65.329 Máquinas e equipamentos (29) 40 52.669 Máq. para escritório e informática (30) 2 760 Material elétrico e de telecomunicações. (31 e 32) 19 32.799 Automóveis e transporte (33, 34, 35) 38 103.056 Móveis, reciclagem e indústrias diversas (36 e 37) 7 6.764 Serviços 25 60.881 Regiões Número de Número de empresas trabalhadores Sul 125 181.071 São Paulo 101 185.114 Sudeste (exceto SP) 36 165.196 NE 10 57.123 CO 1 1.258 NO 3 1.857 Total 276 591.619 Quadro 2 Características dos profissionais com carteira assinada nas empresas Empresas apoiadas pela Finep Empresas industriais Empresas de serviços* Salário médio mensal 2.547 979 1.112 Número de pesquisadores ocupados nas empresas 1.381 (25,2%) 2.528 (46,1%) 1.579 (28,8%) Número de físicos, químicos, engenheiros e outros profissionais de carreiras científicas 26.806 (24,7%) 63.416 (58,4%) 18.410 (16,9%) * Empresas que prestam serviços a outras empresas.

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