MÉTODO PARA CLASSIFICAÇÃO DOS MERCADOS DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERESTADUAL SEMIURBANO DE PASSAGEIROS

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Transcrição:

MÉTODO PARA CLASSIFICAÇÃO DOS MERCADOS DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO INTERESTADUAL SEMIURBANO DE PASSAGEIROS José Expedito Brandão Filho Hugo Alves Silva Ribeiro Cleide Souza de Oliveira Superintendência de Serviços de Transporte de Passageiros Agência Nacional de Transportes Terrestres RESUMO O transporte rodoviário interestadual semiurbano de passageiros é aquele que, embora mantenha características urbanas, transpõe os limites fronteiriços das unidades federativas do Brasil. Essa conceituação, dada pelo Decreto nº 2.521 de 1998, não se apresenta de forma objetiva para definir o tema, uma vez que a definição de características urbanas não é clara. Isso faz com que seja exigida uma regulamentação mais específica a fim de orientar o Poder Público na delegação dos serviços. Para isso, o presente artigo tem por finalidade desenvolver e testar um método para classificação dos mercados semiurbanos do Brasil, considerando aspectos de identificação de aglomerações urbanas, interações geográficas e fluxos de veículos. O método proposto foi aplicado em 117 mercados semiurbanos do país, apresentando-se satisfatório e capaz de auxiliar a tomada de decisão do ente público. ABSTRACT The interstate semi-urban bus service is the one who, while maintaining urban characteristics, transposes the limits of Brazilian states. This definition is given by Decree No. 2521 of 1998 that it is not enough objective to interpret its meaning, since the definition of "urban characteristics" is not clear. It requires a more specific regulation to allow the delegation of services from the government. The present paper aims to develop and test a method for classification the semi-urban markets in Brazil, considering aspects like urban areas identifications, geographical interactions and vehicle flows. The proposed method was applied to 117 semi-urban markets in the country, presenting satisfactory and able to support the decision-making of the public entity. 1. INTRODUÇÃO Por definição legal, um mercado de transporte de passageiros é um núcleo de população, local ou regional, onde há potencial de passageiros capaz de gerar demanda para a exploração econômica de uma ligação, de maneira isolada ou combinada com outras ligações (Brasil, 1998). No Brasil, os chamados mercados de transporte interestadual de passageiros são aqueles em que uma ligação contempla origem e destino em regiões de unidades federativas diferentes. Nessas situações, os serviços são delegados, regulados e fiscalizados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), autarquia de regime especial responsável pela delegação dos serviços de transporte interestadual de passageiros no país (Brasil, 2001). Dentro deste contexto, existem mercados que, embora transponham as fronteiras dos estados, possuem características operacionais de transportes urbanos. Neles, os passageiros podem ser transportados em pé, não havendo, nos ônibus, compartimentos específicos para o transporte de bagagens e o controle de acesso do passageiro se dá por meio de catraca ou equipamento similar (Maia et al., 2014). Esses mercados são chamados de semiurbanos (Borges, 2006). Por outro lado, também existem mercados chamados de longa distância (Espósito Neto, 2014), operados regularmente com veículos de características rodoviárias. Essa nomenclatura é oriunda da antiga regulamentação dos serviços, que até 2013, para os serviços de transporte interestadual de passageiros, eram aqueles cuja extensão de viagem é maior que 75 km. No entanto, de acordo com Almeida et al. (2009), a distância não deve ser utilizada como único critério para definir se um serviço é considerado semiurbano ou longa distância. Cada mercado possui suas peculiaridades e a definição do tipo de serviço a ser oferecido é uma

atribuição da administração pública federal. A classificação errônea das linhas pode promover concorrência ruinosa, tarifas elevadas e agravamento da qualidade da prestação dos serviços. Outro fator que contribuiu para a necessidade de classificação mais rigorosa e objetiva desses mercados está relacionado à alteração do regime de delegação dos serviços de transporte interestadual de longa distância. Desde a regulamentação da Lei nº 12.996/2014, por meio da Resolução ANTT nº 4.770/2015, os serviços de transporte de passageiros de características rodoviárias devem ser delegados por meio de autorização, enquanto os serviços de transporte semiurbanos continuam sob regime permissionário (Ribeiro, 2015). Dessa forma, um enquadramento equivocado dos mercados de transporte interestadual de passageiros pode gerar graves problemas operacionais e regulatórios à prestação de serviços, devido às grandes diferenças entre os regimes de delegação. Alguns estudos vêm sendo realizados com o objetivo de criar métodos que caracterizem esses serviços de acordo com a sua natureza, seja longa distância ou semiurbano, conforme exposto pela ANTT (2014a; 2014b; 2015). Neste sentido, este trabalho apresenta o desenvolvimento e teste de um método, ainda em evolução, para classificação dos mercados de transporte semiurbano de passageiros no Brasil. 2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CLASSIFICAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TRANSPORTE DE PASSAGEIROS Até a promulgação do Decreto nº 8.083, de 2013, eram considerados serviços interestaduais semiurbanos (ou curta distância ) aqueles que detinham extensão igual ou inferior a 75 km (Brasil, 1998). Caso a extensão superasse essa distância, esses serviços eram considerados rodoviários (ou longa distância ). Como exemplos de serviços semiurbanos têm-se aqueles realizados entre o Distrito Federal e as cidades goianas de seu entorno ou entre Timon (MA) e Teresina (PI). Já quanto aos serviços rodoviários têm-se, por exemplo, aqueles realizados entre Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP), ou entre Brasília (DF) e Belo Horizonte (MG). Todavia, o estudo realizado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE, 2011) identificou exceções a essas regras, ou seja: serviços operados por ônibus urbano, mas que percorriam mais de 75 km; bem como aqueles que percorriam menos de 75 km e eram operados por veículos de características rodoviárias, de longa distância. Como exemplo, cita-se a ligação entre Poços de Caldas (MG) e Divinolândia (SP) que, embora tenha uma extensão inferior a 40 km, é operada com veículo de características rodoviárias. Com isso, foi necessário modificar o Decreto nº 2.521, de 1998, fazendo com que os serviços semiurbanos passassem a ser aqueles realizados entre municípios de diferentes unidades federativas, desde que possuíssem características de transporte urbano (Quadro 1). Serviços de Transporte de Passageiros Transporte rodoviário interestadual de passageiros Transporte rodoviário interestadual semiurbano de passageiros Quadro 1: Mudança na definição de serviços semiurbanos Definição pelo Decreto nº 2.521/1998 antes da promulgação do Decreto nº 8.083/2013 o que transpõe os limites de Estado, do Distrito Federal ou de Território. aquele que, com extensão igual ou inferior a 75 km e característica de transporte rodoviário urbano, transpõe os limites de Estado, do Distrito Federal, ou de Território. Definição pelo Decreto nº 2.521/1998 após a promulgação do Decreto nº 8.083/2013 o que atende mercados com origem e destino em Estados distintos, ou entre Estados e o Distrito Federal. serviço de transporte público coletivo entre Municípios de diferentes Unidades Federativas que possuam características de transporte urbano.

Após a modificação do Decreto nº 2.521/1998, coube à ANTT definir quais das características de transporte urbano seriam as mais adequadas para o enquadramento dos mercados de transporte interestadual de passageiros, delegados todos, à época, sob regime de permissão. No entanto, enquanto as licitações não fossem concluídas, esses serviços deveriam ser delegados sob regime de autorização especial (ANTT,2008a; 2008b). Dessa forma, foram elaborados planos de outorga que consideravam uma metodologia de classificação de serviços. Essas características foram inicialmente definidas em um sistema de classificação em 2011, na minuta de Plano de Outorga submetida à Audiência Pública nº120/2011, que visava o levantamento de subsídios para a delegação dos serviços de transporte rodoviário de passageiros operados por ônibus do tipo rodoviário (ANTT, 2011). Em 2012 e 2014, tal conceito também foi utilizada em Audiências Públicas com o objetivo de coletar subsídios para Planos de Outorga dos serviços de transporte semiurbano de passageiros (ANTT, 2012a; 2014a). Essa classificação, que se restringia às linhas de curta distância, considerava uma ligação como semiurbana aquela que atendia a pelo menos um dos seguintes critérios: a) Uso do Solo: Transporte de passageiros interestaduais em áreas conurbadas, em região metropolitana ou em região integrada de desenvolvimento; b) Motivo de viagem: linhas em que mais de 50% do total de motivos de viagem estão relacionados a deslocamento para trabalho e/ou estudo, indicando pendularidade e dependência do transporte público. c) Frequência de utilização dos serviços de transporte pelos usuários: linhas em que mais de 50% dos passageiros utilizam o serviço semanalmente; d) Linha Inoperante: Linhas cadastradas na ANTT como semiurbanas. Além desses critérios, os mercados semiurbanos antes atendidos por linhas de longa distância passavam por um processo de análise de viabilidade para fins de comparação de tarifas entre serviços semiurbanos e rodoviários, com vistas a aproveitar as economias de escalas, dada a dificuldade de formar lotes que permitissem o estabelecimento de subsídio cruzado entre diferentes linhas semiurbanas (ANTT, 2012a). Esse método de classificação fez com que diversas linhas fossem inseridas como semiurbanas e, consequentemente, fizessem parte dos Planos de Outorga dos mercados semiurbanos. No entanto, alguns municípios e operadoras questionaram esses enquadramentos, pois enquanto alguns apontaram que determinadas linhas de longa distância deveriam estar contidas no Plano de Outorgas dos serviços de características rodoviárias, outros alertaram sobre a não inserção de linhas que consideravam como semiurbanas (ANTT, 2011; ANTT, 2012a). Em paralelo, ocorreu alteração da delegação dos serviços de transportes de longa distância para autorização, dada pela Lei nº 12.996, de 2014, promovendo grandes mudanças no marco regulatório, apresentadas no Quadro 2. Com essas mudanças, a licitação dos mercados de longa distância foi cancelada, enquanto que os Planos de Outorga dos mercados semiurbanos, por sua vez, foram alterados, removendo-se a necessidade dos estudos de viabilidade, cuja realização passou a não ser mais condição necessária para a delegação de mercados sob regime de autorização (ANTT, 2014). Dessa forma, todas essas questões estimularam a busca pela melhor classificação dos mercados interestaduais de característica de transporte urbano, pois, quando considerados semiurbanos, dependerão de licitação. Caso o mercado seja considerado de longa distância, a linha será dispensada de licitação, e abertamente autorizada pelo Poder Público. Ressalta-se que, mediante análise preliminar de impacto regulatório, a peculiaridade de cada serviço

interfere nos seus custos, fazendo com que a boa classificação promova a racionalização tarifária e melhor qualidade no serviço. Quadro 2: Diferença entre os regimes de delegação dos serviços de transporte rodoviário Permissão Autorização Depende de licitação Independe de licitação Possui tarifa máxima definida, prevendo reajustes Exercida em liberdade de preços dos serviços, tarifas e e reequilíbrio econômico-financeiro fretes. Prazo de vigência definido (até 15 anos) e as prevê prazo de vigência ou termo final, extinguindo-se condições para sua prorrogação pela sua plena eficácia, por renúncia, anulação ou cassação Resistência à entrada de novos transportadores e É exercida em ambiente de livre e aberta competição à criação de novas linhas de ônibus pela necessidade de garantia de viabilidade econômica da ligação Exemplo: Serviços regulares semiurbanos Exemplo: Serviços regulares rodoviários Fonte: Brasil (1998, 2001) Considerando esse histórico, propõe-se neste trabalho um novo sistema de classificação baseado na seguinte premissa, fundamentada nos conceitos do Estatuto da Metrópole (Brasil, 2015): para que um mercado de passageiros seja classificado como semiurbano, é necessário que as duas regiões que formam o par de localidades que caracterizam uma origem e um destino guardem, entre si, relações urbanas. A partir deste axioma, o estudo buscou subsídios teóricos para substanciar uma classificação de serviços de transporte de passageiros. 3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA As linhas interestaduais de transporte rodoviário de passageiros de longa distância configuram uma rede de abrangência nacional, integrando localidades mais distantes e de diferentes regiões do país. Por outro lado, as linhas de características urbanas cumprem um papel mais marcante no dia-a-dia dos usuários (Huang, 2014) e, consequentemente, apresentam impacto urbano acentuado, pois conectam cidades próximas com interdependência econômica direta, seja pelo trabalho, pela prestação de serviços, pelo estudo e por outros fatores (Pas e Koppelman, 1986; Goetz, 2013). Os mercados de transporte de características urbanas ocorrem geralmente em regiões de grandes aglomerações. Segundo o Estatuto da Metrópole (Brasil, 2015), uma aglomeração urbana é constituída pelo agrupamento de dois ou mais municípios limítrofes, caracterizada por complementaridade funcional e integração das dinâmicas geográficas, ambientais, políticas e socioeconômicas. O mesmo instrumento legal define como metrópole um espaço urbano com continuidade territorial, com caracterização dada pelo IBGE, em razão de sua população, relevância política e socioeconômica. O citado Estatuto considera ainda que a região metropolitana é a aglomeração urbana que configura uma metrópole. De acordo com IBGE (2015), as grandes aglomerações de população têm sido tema de pesquisa institucional desde a década de 1960, quando se acelerou a urbanização no País. Em 1968, a I Conferência Nacional de Geografia e Cartografia Confege recomendou a necessidade de qualificação e definição de aglomerações metropolitanas com vistas a direcionar as pesquisas da Instituição (IBGE, 2015). Na década de 1970, foi criada a Comissão Nacional de Regiões Metropolitanas e Política Urbana (CNPU), para atuar entre 1972 e 1975. Essa comissão encomendou um trabalho

desenvolvido por Davidovich e Lima (1975, apud IBGE, 2015), no qual foram consideradas aglomerações urbanas aquelas que resultam em expansão de uma cidade central, apresentando estruturas espaciais de referência para os municípios vizinhos, possuindo diferentes níveis de hierarquia (Davidovich e Lima, 1975, apud IBGE, 2015). Para definir as aglomerações de forma mais clara, os mesmos autores destacam a aplicabilidade de atributos, tais como tamanho da cidade central, evolução do crescimento demográfico, grau de integração das aglomerações e peso da industrialização na urbanização. Para atualização desses estudos, Castello Branco (2003) apresentou um método de identificação de espaços urbanos considerando atributos demográficos (tamanho e densidade), contiguidade, atividade dominantemente urbana e integração com os municípios vizinhos por movimento pendular (deslocamento de pessoas para trabalho ou estudo). O mesmo critério foi aplicado no trabalho de Castello Branco (2006) na delimitação do Espaço Urbano do Rio de Janeiro. A metodologia proposta por Castello Branco (2003) também condiz com o trabalho de Ojima (2013) que, no âmbito de aglomerados populacionais, analisou 57 municípios concluindo que, na hipótese de um distrito apresentar densidade demográfica média igual ou superior a 215 hab./km² (conforme levantamento censitário de 2000), ele estaria contido no espaço urbano de sua cidade correspondente. Quanto à vertente de pendularidade, o trabalho de Dota e Camargo (2015) corrobora com a teoria apresentada, enfatizando a influência do movimento pendular nos processos de urbanização regional, especialmente no que tange a planejamento urbano. Com base na metodologia proposta por Castello Branco (2003), em 2006, o IBGE (2015) definiu Áreas de Concentração de População (ACPs) como sendo: grandes manchas urbanas de ocupação contínua, caracterizadas pelo tamanho e densidade da população, pelo grau de urbanização e pela coesão interna da área, dada pelos deslocamentos da população para trabalho ou estudo (IBGE, 2015). Em 2014, objetivando evoluir os conceitos aplicados a espaços regionais, o IBGE criou um novo conceito, desta vez chamado de Arranjo Populacional, definido como o agrupamento de dois ou mais municípios onde há uma forte integração populacional devido aos movimentos pendulares para trabalho ou estudo, ou devido à contiguidade entre as manchas urbanizadas principais (IBGE, 2015). Em termos quantitativos, o referido instituto considerou movimento pendular quando o volume absoluto de pessoas que se deslocam para o trabalho e estudo entre duas regiões superam 10.000 pessoas e o índice de intensidade relativa de movimentos pendulares é igual ou superior a 25%. Quanto à contiguidade, o IBGE utiliza a distância de 3 km entre as bordas das manchas urbanizadas de dois municípios. Apesar dos avanços obtidos em estudos que dissertam sobre as relações urbanas entre municípios aqui destacados, Jardim (2011) destaca que as análises sobre os movimentos pendulares limita-se às condições de desenvolvimento econômico e social, cujo desdobramento contemporâneo está relacionado aos mecanismos de reestruturação produtiva. O autor ainda ressalta que a análise dos fenômenos de pendularidade exige novas formas de abordagem sobre o movimento da população no território. Neste sentido, outra técnica apresentada na literatura como potencial para identificação das aglomerações urbanas é a Sintaxe Espacial. Por meio dela, as tendências de ocupação dos

espaços, o diagnóstico da estruturação dos tecidos urbanos e os efeitos da configuração da malha viária sobre o movimento dos indivíduos podem ser mais bem determinados (Hillier e Hanson, 1984; Varela, 1993; Ribeiro e Holanda, 2010; Ribeiro e Coelho, 2011). 4. MÉTODO PROPOSTO Conforme já destacado, a metodologia deste artigo foi desenvolvida a partir da premissa de que, para ser considerado um serviço semiurbano, é necessário ligar mercados que guardem relações urbanas. Dessa forma, para atender a essa premissa, foram criados dois conceitos, dos quais um serviço a ser considerado como semiurbano deve atender ao menos um: continuidade territorial e integração. A continuidade territorial contempla, além dos conceitos de arranjos populacionais e contiguidades territoriais citados pelo IBGE (2015), os estudos de Castello Branco (2003; 2006), e de Ojima (2013). Dessa forma, haverá continuidade territorial entre dois municípios quando ocorrer pelo menos uma das seguintes situações: a) Contiguidade territorial, quando a distância entre as bordas das manchas urbanizadas de dois municípios for de até 3 km; ou b) Densidades demográficas dos dois distritos vizinhos de municípios fronteiriços iguais ou superiores a 242 hab./km². O valor de 242hab./km 2 refere-se à densidade demográfica distrital média do Brasil de 2010. Essa média foi calculada com base no censo de 2000, que considera a densidade de 215 hab./km 2, bem como atualizada pelo crescimento populacional registrado entre os censos de 2000 e 2010 (IBGE, 2015). Ademais, a análise do critério de continuidade territorial aplica também o princípio da transitividade, também utilizado por Castello Branco (2003): se um município A é contíguo ao município B e se o município B é contíguo ao município C, então o município A é contíguo ao município C. Para determinar a integração, por sua vez, foram considerados dois parâmetros de pendularidade, que devem ocorrer simultaneamente: motivo de viagem e frequência de utilização dos serviços pelos usuários. A análise dos motivos de viagem indica o tipo de deslocamento feito pelos usuários e sua dependência em relação ao sistema de transporte rodoviário semiurbano de passageiros. Estabeleceu-se que um serviço de transporte semiurbano deve apresentar predominantemente usuários que viajam por motivo trabalho ou estudo, pois essas características indicam dependência do transporte público e pendularidade do deslocamento (Dota e Camargo, 2015). Como indicador, um serviço semiurbano deve apresentar ao menos 50% de usuários que viajam por motivo trabalho e estudo. Quanto à frequência de viagens dos usuários, de forma análoga à definida para o motivo de viagens, estabeleceu-se que um serviço semiurbano deve apresentar predominância de usuários com alta frequência de uso do serviço, ou seja, ao menos 50% de usuários. Neste caso, considera-se que o usuário viaja com alta frequência quando realiza viagens na maior parte de uma semana útil, ou seja, 3 vezes por semana. Utilizando-se os dois critérios acima definidos, é possível que ligações não se enquadrem nas características de transporte semiurbano, mas que estejam inseridas em eixos classificados como semiurbanos. Em casos deste tipo, essas ligações também serão classificadas como semiurbanas, pois é o eixo da ligação que é classificado como semiurbano.

Continuidade Territorial Integração Por último, é recomendável que se avalie os indícios de operação de transportes com características urbanas entre os municípios, mesmo que a aplicação objetiva dos parâmetros aponte para um serviço de característica rodoviária. Essa Análise Técnica pode ser feita por meio de denúncias de transportes clandestinos, manifestações de prefeituras, ou via análise em campo. A Figura 1 apresenta um fluxograma resumo do método preliminarmente desenvolvido para classificar os serviços semiurbanos. Início Predominância de Motivo Trabalho/Escola? Os municípios são contíguos? Dens. demog. dos Distritos 242 hab./km² Mudanças significativas no perfil urbano desde o último Censo? Atualização de Dados Predominância de frequência 3 vezes/semana? A Ligação está contida em um eixo classificado como semiurbano? Há indício de existir mercado de transporte semiurbano? Análise Técnica Os indícios foram confirmados? Semiurbano Rodoviário Figura 1: Fluxograma preliminar para classificação dos serviços de transporte interestadual de passageiros 5. CLASSIFICAÇÃO DOS MERCADOS Para aplicação do método proposto, foram utilizados dados de pesquisa de campo realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), no ano de 2010 (FIPE, 2011), para os mercados de transporte semiurbano de passageiros entre Estados Brasileiros; bem como aqueles apresentados pelo Centro de Formação de Recursos Humanos da Universidade de Brasília (CEFTRU, 2009), específicos para os mercados de transporte semiurbano entre o Distrito Federal e os municípios goianos do seu entorno. Esses dados foram aplicados em 117 ligações consideradas semiurbanas existentes em 2015, e constantes na Resolução ANTT nº 2.869, de 2008 (ANTT, 2008b). Estes dados foram obtido do Projeto da Rede Nacional de Transporte Rodoviário Interestadual de Passageiros (Propass, 2014). Como resultado, utilizando o método proposto, das 117 ligações, 101 obtiveram a mesma classificação baseada na metodologia proposta pela FIPE (2011) e utilizada em ANTT (2012a; 2014a), enquanto 16 ligações apresentaram classificações distintas (Quadro 3). Das classificações divergentes, destacam-se duas delas que foram submetidas para análise técnica:

Formosa (GO) Planaltina (DF) e Campos Belos (GO) Arraias (TO). Embora tais ligações tenham sido enquadradas inicialmente como serviços rodoviários, posteriormente, acabaram apresentando indícios de serviços semiurbanos, gerando necessidade de Análise Técnica. Além destas ligações, foi detectado um caso excepcional: a ligação entre Poços de Caldas (MG) e Divinolândia (SP). Embora ambas as metodologias a classificaram como serviço semiurbano, foi necessário promover uma análise técnica para avaliar a sua oferta individual em um plano de outorga específico, uma vez que, segundo a ANTT (2014a), a ligação pertencia a um lote de doze mercados, para o qual se constatou viabilidade para licitação. Quadro 3: Classificação dos mercados segundo a FIPE (2011) e o método apresentado Ligação Método FIPE (2011) Classificação Proposta Andradas (MG) São João da Boa Vista (SP) Semiurbano Rodoviário S. J. da Boa Vista (SP) Poços de Caldas (MG) Semiurbano Rodoviário Socorro (SP) Bueno Brandão (MG) Semiurbano Rodoviário Espirito Santo do Pinhal (SP) Andradas (MG) Semiurbano Rodoviário Guaçuí (ES) Natividade (RJ) Semiurbano Rodoviário Aimorés (MG) Baixo Gandu (ES) Rodoviário Semiurbano Ourinhos (SP) Marques dos Reis (PR) Rodoviário Semiurbano Andradina (SP) Três Lagoas (MS) Rodoviário Semiurbano Agudos do Sul (PR) São Bento do Sul (SP) Rodoviário Semiurbano Ribeirão Claro (PR) Chavantes (SP) Rodoviário Semiurbano Ribeirão Claro (PR) Ourinhos (SP) Rodoviário Semiurbano União da Vitória (PR) Porto União (SC) Rodoviário Semiurbano Floriano (PI) Barão de Grajaú (MA) Rodoviário Semiurbano Selvíria (MS) Ilha Solteira (SP) Rodoviário Semiurbano Formosa (GO) Planaltina (DF) Semiurbano Análise Técnica Campos Belos (GO) Arraias (TO) Semiurbano Análise Técnica Poços de Caldas (MG) Divinolândia (SP) Semiurbano Análise Técnica (*) (*) Ligação direcionada para análise técnica por excepcionalidade. 6. ANÁLISE TECNICA DE MERCADOS A utilização de critérios objetivos muitas vezes não permite uma caracterização completa do mercado em questão. A importância de ratificar o enquadramento da classificação proposta reside nos grandes impactos sociais decorridos de tal decisão, principalmente quando há mercados potenciais ainda não atendidos por um determinado serviço. Isto é refletido por reiteradas solicitações aos entes competentes, vindas de prefeituras e sociedades civis organizadas, que solicitam, principalmente, linhas semiurbanas. Esse fato é oriundo da necessidade de serviços mais frequentes, visando atender a demandas de municípios próximos detentores de correlações econômico-sociais. Dessa forma, torna-se necessário um aprofundamento de conceitos complementares que permitam uma análise dos casos concretos e consequentemente uma melhor classificação do mercado em análise. Em se tratando do método apresentado, vale ressaltar que os percentuais obtidos para a frequência dos usuários e motivo de viagens são obtidos por meio de amostragem. Assim, é fundamental avaliar o plano amostral e realizar testes estatísticos de consistência quando os parâmetros apresentem valores próximos a 50%, tendo em vista que o erro admissível poderá alterar a classificação do mercado. Outro ponto importante consiste na identificação de demanda reprimida. Destaca-se que os valores de demanda utilizados para obter os percentuais de frequência e motivo de trabalho

são valores de demanda manifestada. A demanda reprimida deve ser identificada por meio de estudos de preferência declarada (Brandão Filho et al., 2007), aliados a estudo do perfil socioeconômico e do padrão de viagens, aplicados a nichos de mercados potencias, como usuários de veículos, transporte clandestino, transporte não motorizado e não usuários de transporte. Tais resultados, combinados com dados de demanda real (preferência revelada), permitem a estimativa de modelos que permitem estimar os percentuais reais de usuários com determinado perfil, caso o serviço de transporte fosse ofertado (Hensher et al., 1998). Ademais, pode-se citar também a utilização de estudos de viabilidade econômica para complementar a avaliação de determinado serviço. Isso é possível quando houver indícios de que o serviço é semiurbano, uma vez que, nessa hipótese, é fundamental garantir a viabilidade do serviço (condição sine qua non para a licitação, conforme define a Lei 8.987/1995). Dessa forma, diante destas considerações, apresenta-se as análises técnicas dos três mercados citados, considerando informações complementares disponíveis, podendo ser complementado ou substituído por outros métodos, como os aqui destacados, em estudos futuros. 6.1 Análise Técnica entre Formosa (GO) e Planaltina (DF) Com extensão de 38 km, a ligação Formosa (GO) Planaltina (DF) está registrada na ANTT como semiurbana. No entanto, constatou-se que os critérios objetivos de continuidade territorial e integração, baseados nos dados utilizados, não enquadrariam o mercado como semiurbano. No entanto, em manifestação da Prefeitura Municipal de Formosa (GO), que solicita à ANTT a implantação de serviço semiurbano entre a cidade e a região central de Brasília, há informação de que, conforme os estudos daquele município, 30 mil pessoas se deslocam diariamente ao Distrito Federal para trabalho, estudos, passeio, dentre outros, refletindo uma tendência de deslocamento semiurbano. Essa demanda declarada exige uma oferta maior dos serviços, o que, embora não consideradas viagens tipicamente urbanas, poderiam ser contempladas no Plano Geral de Outorgas da ANTT para serem licitadas. Para confirmar a viabilidade econômica de tal inclusão, foi realizada uma simulação utilizando os dados da ANTT (2015), referentes às tarifas e às distâncias percorridas entre os municípios pertencentes a um mesmo lote de licitação em que a ligação Formosa (GO) Planaltina (DF) poderia ser inserida. Como conclusão, caso seja aproveitada a economia de escala proporcionada pelas linhas semiurbanas entre Planaltina de Goiás (GO) e as cidades de Brasília (DF), Sobradinho (DF) e Planaltina (DF), a ligação entre Formosa (GO) e Planaltina (DF) torna-se viável. O resultado desta simulação está apresentado na Tabela 1, fazendo com que a referida ligação fosse mantida, finalmente, como semiurbana. Tabela 1: ulação da viabilidade da manutenção do mercado Formosa (GO) Planaltina (DF) R$/passageiro atual R$/pass. considerando a existência da ligação Formosa (GO) Planaltina (DF) R$/pass. excluindo a ligação entre Formosa (GO) Planaltina (DF) Formosa (GO) Planaltina (DF) 3,90 4,25 - Planaltina de Goiás (GO) Brasília (DF) 5,55 6,20 6,21 Planaltina de Goiás (GO) Sobradinho (DF) 4,15 3,89 3,90 Planaltina de Goiás (GO) Planaltina (DF) 2,95 2,98 2,99 Fonte: ANTT (2015)

6.2 Análise Técnica entre Campos Belos (GO) e Arraias (TO) Com cerca de 30 km de extensão, a ligação entre Campos Belos (GO) e Arraias (TO) foi estudada pela ANTT em 2012, publicitada por meio da Nota Técnica nº 035/2012/GEROT/SUPAS (ANTT, 2012b). Como conclusão, a partir do estudo de viabilidade da ligação constatou-se que há uma diferença de 67% entre as tarifas modeladas para os serviços rodoviários e semiurbanos, o que mostra a vantagem da operação do mercado por meio do serviço semiurbano face ao rodoviário. Adiciona-se ao fato de que uma maior frequência do serviço possibilitada pela implantação do transporte semiurbano evita a proliferação do transporte clandestino. Ao considerar esses fatores, a classificação desse mercado foi mantida como semiurbana. 6.3 Análise Técnica entre Poços de Caldas (MG) e Divinolândia (SP) A ligação entre Poços de Caldas (MG) e Divinolândia (SP), utilizando do método proposto, foi classificada como semiurbana. No entanto, dentre as 9 ligações apresentadas no Plano de Outorgas submetido à Audiência Pública nº11/2014 que mantiveram a classificação como semiurbana, apenas essa linha de Poços de Caldas (MG) Divinolândia (SP) era cadastrada na ANTT como rodoviária (ANTT, 2014). Para fins de confirmação foi realizada uma visita em campo, que constatou a operação de características rodoviárias na região. Em contato com a Prefeitura Municipal de Poços de Caldas, o serviço vem operando regularmente, e atende as necessidades da população. Essa incerteza operacional é amplificada quando se considera o Plano de Outorgas apresentado pela ANTT (2014). Nele, o lote ao qual pertence a ligação em discussão, apresenta outros doze mercados que podem ser prejudicados caso sua classificação fosse rodoviário. Nesse sentido, o presente artigo considera prudente manter a classificação como análise técnica até a conclusão dos demais estudos. Como conclusão, recomenda-se a abertura de um processo de tomada de subsídio exclusiva acerca da matéria e um maior aprofundamento dos critérios de análise. 7. CONCLUSÕES Este artigo apresentou um método preliminar para classificar as linhas interestaduais como semiurbanas ou rodoviárias ( longa distância ). Essa diferenciação é essencial para determinar a necessidade, ou não, de abertura de processos licitatórios para a prestação dos serviços, uma vez que as ligações entre mercados que possuem características urbanas são delegadas por meio de permissão, precedendo de licitação. As ligações de longa distância, por sua vez, são autorizadas pela ANTT, não exigindo processo licitatório. O método proposto foi aplicado às 117 ligações interestaduais anteriormente classificadas como semiurbanas pelo critério de distância, de extensão igual ou inferior a 75 km, que não é mais utilizado como referência. Esse método foi comparado com o método apresentado pela FIPE (2011), e apresentou resultados satisfatórios. Como conclusão, 5 mercados anteriormente classificados como semiurbanos deveriam ser reclassificados como rodoviário, bem como 8 mercados anteriormente classificados como rodoviário deveriam ser considerados semiurbanos. Adicionalmente, o método possibilita a realização de análises técnicas que aprofundam o estudo e, dependendo dos resultados, pode redefinir classificações de mercados com características excepcionais. Com isso, a proposta pode fornecer maior objetividade para uma determinada empresa prestadora de serviços de transporte planejar suas operações, pois há significativa diferença

operacional entre os serviços de características urbanas ou rodoviárias. Mesmo se tratando de um estudo preliminar, que exigem adequações, detalhamentos metodológicos e inclusão de novas técnicas, conforme apontado na revisão bibliográfica deste artigo, o trabalho pode auxiliar a tomada de decisão do Poder Público quanto à necessidade de delegação dos serviços por meio de autorização (quando rodoviário) ou permissão (quando semiurbano). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Almeida, C. F.; J. G. Gularte; E. O. Ferreira; A. R. G. Oliveira e Y. Yamashita (2009) Metodologia de Caracterização do Transporte Rodoviário Interestadual Semiurbano de Passageiros: O Caso do Distrito Federal e Entorno. In: Anais do XXV ANPET Congresso de Pesquisa e Ensino em Transportes, Vitória, ES, Brasil. ANTT (2008a) Agência Nacional de Transportes Terrestres. Resolução nº2.868, de 04 de setembro de 2008, disponível em: <http://www.antt.gov.br>. Acesso em 14 de janeiro de 2016. ANTT (2008b) Agência Nacional de Transportes Terrestres. Resolução nº2.869, de 04 de setembro de 2008, disponível em: <http://www.antt.gov.br>. Acesso em 14 de janeiro de 2016. ANTT (2011) Agência Nacional de Transportes Terrestres. Audiência Pública ANTT nº 120/2011, disponível em: <http://www.antt.gov.br>. Acesso em 01 de abril de 2014. ANTT (2012a) Agência Nacional de Transportes Terrestres. Audiência Pública ANTT nº 129/2012, disponível em: <http://www.antt.gov.br>. Acesso em 01 de abril de 2014. ANTT (2012b) Agência Nacional de Transportes Terrestres Nota Técnica nº 035/2012/GEROT/SUPAS. Gerência de Regulação e Outorga de Transporte de Passageiros. Superintendência de Serviços de Transporte de Passageiros. Setembro de 2012. Brasília-DF. ANTT (2014a) Agência Nacional de Transportes Terrestres Projetos Básicos dos Lotes 3, 4 e 5. Apresentado na Audiência Pública ANTT nº 11/2014, disponível em: <http://www.antt.gov.br/index.php/content/view/35607/projetos_basicos.html>. Acesso em 14 de janeiro de 2016. ANTT (2014b) Agência Nacional de Transportes Terrestres, Edital ANTT nº2/2014, disponível em: <propass.antt.gov.br>. Acesso em 14 de janeiro de 2016. ANTT (2015) Agência Nacional de Transportes Terrestres Projetos Básicos dos Lotes 1, 2, 3 e 4. Apresentado na Audiência Pública ANTT nº 04/2015, disponível em: < http://www.antt.gov.br/index.php/content/view/40268/projetos_basicos.html>. Acesso em 14 de janeiro de 2016. Borges, R. C. N. (2006) Definição de transporte coletivo urbano. Biblioteca digital da Câmara dos Deputados, Centro de Documentação e Informação. Brasília-DF. Brandão Filho, J. E.; C. F. G. Loureiro e R. A. Cavalcante (2007) Metodologia de Planejamento de Pesquisas de Preferência Declarada aplicadas em Estudos Comportamentais de Transporte Público Intermunicipal de Passageiros. XXI ANPET. Rio de Janeiro, RJ. Brasil (1998) Decreto n. 2.521, de 20 de março de 1998. Dispõe sobre a exploração, mediante permissão e autorização, de serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros e dá outras providências. Diário oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 23 de março. Seção 1, p 1. Brasil (2001) Lei n. 10.233, de 5 de junho de 2001. Dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário e terrestre, cria o Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte, a Agência Nacional de Transportes Terrestres, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários e o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes, e dá outras providências. Diário oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 06 de junho. Seção 1, p 1. Brasil (2015) Lei n. 13.089, de 12 de janeiro de 2015. Institui o Estatuto da Metrópole, altera a Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001, e dá outras providências. Diário oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 13 de janeiro. Castello Branco, M. L. G. (2003) Espaços urbanos: uma proposta para o Brasil. 2003. 236 p. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ, Rio de Janeiro. Castello Branco, M. L. G. (2006) A Dinâmica Metropolitana, Movimento Pendular e Forma Urbana: o Espaço Urbano do Rio de Janeiro. XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais. Caxambu-MG, 18 a 22 de setembro de 2006. Disponível em <http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/abep2006_555.pdf>. Acesso em agosto de 2015.

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