MURCHO, Desidério A natureza da filosofia e o seu ensino. Lisboa: Plátano, 2002, (Coleção Aula Prática), 102 p.

Documentos relacionados
MURCHO, Desidério - Essencialismo naturalizado. Coimbra: Angelus Novus, Ltd., 2002, 100 p.

ALMEIDA, Aires (org.) Dicionário escolar de filosofia. Lisboa: Plátano Editora, 2003, 148 p.

Versão A. GRUPO I (10 X 3 = 30 pontos)

Filosofia - 11.ºAno. UNID- RACIONALIDADE ARGUMENTATIVA E FILOSOFIA Nº Aulas:14 aulas de 90 minutos

Metodologia Científica. Aula 2

OBJETIVOS CONTEÚDOS ESTRATÉGIAS Nº AULAS / AVAL. 1. Argumentação e Lógica Formal Motivar para o estudo da lógica Definir lógica.

Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes PROVA GLOBAL DE INTRODUÇÃO À FILOSOFIA 10º ANO ANO LECTIVO 2001/2002

RACIONALIDADE ARGUMENTATIVA DA FILOSOFIA E A DIMENSÃO DISCURSIVA DO TRABALHO FILOSÓFICO

Versão A. Grupo I (10 x 3 = 30 pontos) Assinala a alternativa correta

OBJETIVOS CONTEÚDOS ESTRATÉGIAS Nº AULAS / AVAL. 1. Argumentação e Lógica Formal Motivar para o estudo da lógica Definir lógica.

Versão B. GRUPO I (10 X 3 = 30 pontos) Assinala a única alternativa correta

Exemplos de frases e expressões que não são proposições:

Grau acadêmico: Graduação Turno: Noturno Currículo: Natureza: Obrigatória Unidade acadêmica: DFIME Período: 1º/2018

Revisão da literatura / Fundamentação teórica

Grupo I Para cada uma das questões que se seguem assinala a opção correta

Plano de Ensino. EMENTA (parte permanente) PROGRAMA (parte variável)

Guião de Visionamento do vídeo: Sisyphus - the real struggle

Revisão da literatura / Fundamentação teórica

Racionalidade argumentativa e Filosofia

ESCOLA SECUNDÁRIA DA AMADORA CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DA DISCIPLINA DE FILOSOFIAS 10º ANO CURSOS CIENTÍFICO-HUMANÍSTICOS

Plano de Ensino. EMENTA (parte permanente) PROGRAMA (parte variável)

UNIVERSIDADE LUSÍADA DE LISBOA. Programa da Unidade Curricular ÉTICA Ano Lectivo 2013/2014

Acção de formação. Lógica e Filosofia nos Programas de 10.º e 11.º Anos. Formador. Desidério Murcho ALGUMAS NOÇÕES DE LÓGICA

Ética e Conduta Humana. Aula 5

PERSPECTIVAS DO ENSINO DE FILOSOFIA NO ENSINO MÉDIO.

Versão B. Grupo I (10 x 3 = 30 pontos) Assinala a alternativa correta

POR QUE ENSINAR GRAMÁTICA

Escola Secundária de Amora Ano Lectivo de 2014/2015 Disciplina: Filosofia 11º Ano Ensino Regular (Diurno) Planificação de Médio e Longo Prazo

Volume 2 Fascículo 2 Filosofia Unidade 3

Lógica. Abílio Rodrigues. FILOSOFIAS: O PRAZER DO PENSAR Coleção dirigida por Marilena Chaui e Juvenal Savian Filho.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO SECRETARIA DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA CURSO TÉCNICO EM INSTRUMENTO MUSICAL

Nota sobre a Filosofia e o Espírito Critico

INTRODUÇÃO A LÓGICA. Prof. André Aparecido da Silva Disponível em:

EMENTA OBJETIVOS CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

Racionalismo. René Descartes Prof. Deivid

INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DA FILOSOFIA 2º /

Cenários em Matus. Elizabeth Artmann-ENSP/FIOCRUZ 1

UNIVERSIDADE LUSÍADA DE LISBOA. Programa da Unidade Curricular ÉTICA Ano Lectivo 2014/2015

AGRUPAMENTDE ESCOLAS DE CARVALHOS. Planificação Filo sofia 10º ano. Iniciação à atividade filosófica O que é a filosofia?

Lógica Computacional. Métodos de Inferência. Passos de Inferência. Raciocínio por Casos. Raciocínio por Absurdo. 1 Outubro 2015 Lógica Computacional 1

O que é o conhecimento?

UNIVERSIDADE LUSÍADA DE LISBOA. Programa da Unidade Curricular ÉTICA Ano Lectivo 2016/2017

A ciência deveria valorizar a pesquisa experimental, visando proporcionar resultados objetivos para o homem.

Filosofia. IV Conhecimento e Racionalidade Científica e Tecnológica 1. DESCRIÇÃO E INTERPRETAÇÃO DA ACTIVIDADE COGNOSCITIVA JOÃO GABRIEL DA FONSECA

UNIVERSIDADE LUSÍADA DE LISBOA. Programa da Unidade Curricular ÉTICA Ano Lectivo 2017/2018

ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO

A ciência deveria valorizar a pesquisa experimental, visando proporcionar resultados objetivos para o homem.

OBJETIVOS CONTEÚDOS ESTRATÉGIAS Nº AULAS / AVAL. Motivar para o estudo da lógica

PLANO DE ENSINO CURSO: FILOSOFIA. INFORMAÇÕES BÁSICAS Unidade curricular METODOLOGIA CIENTÍFICA (FL155) Carga Horária Teórica Prática

A RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS E O ENSINO DA FÍSICAF

CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DE UM ARTIGO CIENTÍFICO

LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. de A. Fundamentos de metodológica científica. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, p

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Parecer da Divisão de Educação da Sociedade Portuguesa de Física (SPF) Revisão da Estrutura Curricular dos Ensino Básico e Secundário

COLÉGIO MAGNUM BURITIS

ANÁLISE E DESENVOLVIMENTO DE SISTEMAS Curso de Graduação

Questões de Concursos Aula 04 CEF RACIOCÍNIO LÓGICO. Prof. Fabrício Biazotto

PRÁTICAS DE ENSINO III - Metodologias

UNIVERSIDADE PEDAGÓGICA ESCOLA SUPERIOR TÉCNICA - ESTEC

Método e Metodologia Conceitos de método e seus princípios

Plano da Unidade Curricular (PUC) (corrigido!)

BuscaLegis.ccj.ufsc.br

11/01/2016 LÓGICA MATEMÁTICA. O homem pensa, possui o dom da palavra, é um animal racional, e é isto que o distingue dos outros animais.

MÉTODO CIENTÍFICO. Profº M.Sc. Alexandre Nojoza Amorim

Sócrates: após destruir o saber meramente opinativo, em diálogo com seu interlocutor, dava início ã procura da definição do conceito, de modo que, o

CURSO DE ADMINISTRAÇÃO Autorizado plea Portaria nº de 04/07/01 DOU de 09/07/01 PLANO DE CURSO

Coerência e Coesão Textuais

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

Universidade de São Paulo Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas

COLÉGIO MAGNUM BURITIS

III. RACIONALIDADE ARGUMEN NTATIVA E FILOSOFIA

METODOLOGIA DO TRABALHO ACADÊMICO 1

A Modernidade e o Direito

IV Análise comparativa de duas teorias explicativas do conhecimento - Trabalho de investigação e debate Descartes versus Hume

Curso TURMA: 2101 e 2102 DATA: Teste: Prova: Trabalho: Formativo: Média:

Objetividade e diálogo de culturas. A professora M. Clara Gomes

O PAPEL E A IMPORTÂNCIA DO LIVRO DIDÁTICO NO PROCESSO DE ENSINO APRENDIZAGEM

Formulário de preenchimento obrigatório, a anexar à ficha modelo ACC 2

I. Iniciação à atividade filosófica Abordagem introdutória à Filosofia e ao filosofar... 13

PERÍODO TEMA / UNIDADE SUB-TEMA / CONTEÚDO AULAS AVALIAÇÃO (meios e instrumentos)

3ª ETAPA. Componente Curricular: exclusivo de curso ( ) Eixo Comum ( X ) Eixo Universal ( ) Curso: Licenciatura em Filosofia.

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Bachelard. A Ciência é contínua?

Introdução ao Curso. Área de Teoria DCC/UFMG 2019/01. Introdução à Lógica Computacional Introdução ao Curso Área de Teoria DCC/UFMG /01 1 / 22

Aula 02 Introdução à Lógica. Disciplina: Fundamentos de Lógica e Algoritmos Prof. Bruno Gomes

8 Conclusões. Conclusões. José Mário Branco, A noite, Funções e Calculadoras Gráficas: análise de algumas inferências erróneas

I ENCONTRO DE PESQUISADORES FAZENDÁRIOS METODOLOGIA PARA O DESENVOLVIMENTO DE PESQUISA CIENTÍFICA: ORIENTAÇÕES INICIAIS UNIDADE II O MÉTODO CIENTÍFICO

Filosofia no Brasil e na América Latina Suze Piza e Daniel Pansarelli Cronograma das aulas, leituras e critérios e formas de avaliação Ementa:

Departamento de Geografia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Universidade de São Paulo. Iniciação à Pesquisa em Geografia I

COLÉGIO NOSSA SENHORA DA PIEDADE. Programa de Recuperação Paralela. 2ª Etapa 2014

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO Ensino Secundário - Cursos Científico / Humanísticos

COLÉGIO SHALOM ENSINO MEDIO 1 ANO - filosofia. Profº: TONHÃO Disciplina: FILOSOFIA Aluno (a):. No.

Classificação das Ciências. Tipos de conhecimento. Conhecimento Popular. Conhecimento Religioso. Conhecimento Filosófico. Metodologia Científica

PLANO DE TRABALHO DA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO. MCC01 Temas de Dissertação em Engenharia Mecânica

SOBRE OS CONCEITOS DE REGRA E CRENÇA PRESENTES NOS ESCRITOS TARDIOS DE WITTGENSTEIN 1. INTRODUÇÃO

Utilize apenas caneta ou esferográfica de tinta indelével, azul ou preta.

2012 COTAÇÕES. Prova Escrita de Filosofia. 11.º Ano de Escolaridade. Prova 714/1.ª Fase. Critérios de Classificação GRUPO I GRUPO II GRUPO III

Virtudes: conceito e classificação

UNIP Ciência da Computação Prof. Gerson Pastre de Oliveira

Transcrição:

MURCHO, Desidério A natureza da filosofia e o seu ensino. Lisboa: Plátano, 2002, (Coleção Aula Prática), 102 p. O autor. Licenciou-se em filosofia pela Universidade de Lisboa. É um dos diretores da Sociedade Portuguesa de Filosofia (SPF), fundador do Centro para o ensino da filosofia dessa entidade. Ao lado de Guilherme Valente, dirige a coleção Filosofia aberta, da editora Gradiva (Lisboa), responsável pela divulgação de muitas obras de filosofia. Traduziu vários livros. Uma de suas importantes atividades é a manutenção, na internet, do portal Crítica, o maior portal de filosofia em língua portuguesa, riquíssimo de informações. O livro. Como o título deixa explícito, Desiderio trata de caracterizar a filosofia e de indicar diretrizes para o ensino dessa disciplina. Ao lado de curto prefácio e de uma página com leituras recomendadas, reúne oito ensaios, quase todos resultantes de suas atividades na SPF. Os ensaios mais breves são Filosofia e subjectividade (duas páginas) e O problema didáctico da definição de filosofia (quatro); os mais longos são O que é filosofia? (21); Definição de definição (18); e A tradição socrática (17). O ensaio inicial, Filosofia e desencanto no ensino secundário (11 páginas) encerra contundentes críticas dirigidas contra o sistema escolar de Portugal críticas aplicáveis a sistemas de muitos outros países. Nota, explicitamente, que a formação universitária deficiente, os professores e estudantes desmotivados e os maus programas estariam entre os fatores que explicariam a baixa produção filosófica de

6 HEGENBERG, Leonidas: Resenhas Portugal. Em síntese, as faculdades ensinam a comentar, não ensinam a pensar. Desidério aponta falhas de programas escolares e de sistemas didáticos, assim como condena a repetição enfadonha e inútil de textos clássicos sem a desejável e imprescindível criação de um espírito crítico. Entende que aos professores de filosofia não cabe dar aos alunos a capacidade de repetir (bem ou mal) as idéias dos filósofos, mas a capacidade para defender e criticar idéias, a capacidade criativa para reagir a problemas com propostas bem pensadas, o talento para compreender o objectivo de um argumento, as suas premissas e o seu alcance (p. 79). Assevera que os licenciados em filosofia pouco mais sabem do que citar e parafrasear textos (p. 66). Para evitar a transmissão de preconceitos, os comentários vagos, a exegese estéril, defende modo socrático de fazer filosofia, insistindo no exercício crítico da razão. Em especial, o ensino da filosofia não faz sentido se for transformado em propaganda ou em catequese (p. 22). Mais: A filosofia não cultiva dogmas (...); faz o contrário: procura destruir dogmas (p. 57). Os filósofos introduzem muitos conceitos com os quais não estamos habituados a lidar no dia-a-dia (p. 86); fazem-no para que se possa compreender melhor outros conceitos que nos habituamos a encontrar na arte, na religião, na ciência. Filosofia é estudo disciplinado e rigoroso (p. 12) de conceitos

HEGENBERG, Leonidas: Resenhas 7 como os de verdade, validade, conhecimento, realidade, bem, arte, Deus, existência, propriedade, justiça... Daí resultam teorias que visam resolver problemas relativos a tais conceitos (p. 21). E as possíveis soluções, como é desejável, devem apresentar-se apoiadas em argumentos corretos. As opiniões em torno dos problemas nunca parecem chegar a um consenso mínimo (p. 25). Por isso, é oportuno, às vezes, conhecer o que certos pensadores disseram a respeito dessas questões (p. 27). Em outras palavras, convém conhecer um pouco da história da filosofia (p. 67), boa maneira para entender o que determinado filósofo pretendia asseverar. Contudo, filosofia não é história da filosofia, lembra Desidério, com razão. A história é meio; o fim é perguntar-se se o filósofo tem razão, o que requer a atitude crítica. Na p. 12, Desidério fala da opacidade referencial (noção desenvolvida por W. Quine, em 1960, no livro Word and object), atribuindo ao termo um alcance mais amplo. Existe opacidade quando nos limitamos a dizer P afirmou x; Q contestou, asseverando y; R retrucou defendendo z, sem, no entanto, conhecer o que significam x, y, z... [Lamentavelmente, isso é muito comum.] O comentário em torno da incomensurabilidade de teorias, (p. 75s.) é curioso.

8 HEGENBERG, Leonidas: Resenhas No livro de Desidério há cinco itens que merecem comentário, mesmo que breve. Primeiro. Desidério diz (p. 25) que em filosofia não se sabe praticamente nada. Evidentemente, mera façon de parler. Esqueçamos o exagero. Adiante (p. 49), segundo item, assevera que As definições explícitas são, na verdade, raras. Cabe notar que numerosíssimas definições da matemática são explícitas (algumas poucas são recursivas e contextuais). A par disso, os dicionários oferecem ou procuram oferecer definições explícitas da maioria dos termos arrolados (mesmo que muitas sejam horríveis ). O terceiro item (p.64), refere-se à dupla negação. Para a lógica, a dupla negação equipara-se a uma afirmação. Em diálogos corriqueiros, porém, portugueses e brasileiros costumam empregá-la com força de negação. Creio que não vale a pena acolher o erro. Parece preferível insistir, desde cedo, no uso correto. Quarto item: exigir argumentos que sustentam nossas posições (p. 60), isto é, a fundamentação racional do que asseveramos, não é exigência que possa ficar circunscrita à arena filosófica. Argumentos dedutivamente legítimos ou, no mínimo, indutivamente corretos são exigíveis em quaisquer disciplinas. Melhor, em qualquer discussão civilizada. O quinto item diz respeito às definições. Deixei registrado (cap. 2.5 do livro Saber de e saber que: alicerces da racionalidade, Petrópolis: Vozes, 2002),

HEGENBERG, Leonidas: Resenhas 9 meu modo de entender as definições. Desidério examina o assunto por um prisma excessivamente tradicionalista. Preso a tais esquemas, define coisas enquanto, no meu entender, definimos palavras, isto é, termos de uma língua. Para mim, a ostensão não é modo de definir, mas forma de incutir certos hábitos lingüísticos. Essa diferença de enfoques não impede, porém, que aceite vários de seus pontos de vista. Lh res nov 02