Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício ISSN versão eletrônica

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INFLUÊNCIA DAS CONTRAÇÕES PERINEAIS ASSOCIADAS A EXERCÍCIOS FÍSICOS NA REABILITAÇÃO DE UMA PACIENTE COM INCONTINÊNCIA URINÁRIA DE ESFORÇO: UM ESTUDO DE CASO 240 Ana Tereza Monteiro 1 RESUMO A incontinência urinária de esforço (IUE) é definida como a perda involuntária de urina, quando a pressão vesical excede a pressão uretral, na ausência de contração do detrusor. Ocorre associada a aumentos abruptos de pressão abdominal como na tosse, espirro ou atividade física. Uma das alternativas de tratamento fisioterapêutico para IUE é o fortalecimento muscular do períneo através das contrações perineais de Kegel, que tem como finalidade ajustar a musculatura do assoalho pélvico gerando um aumento da força de fechamento e sustentação uretral, essencial para impedir a perda urinária nos momentos de esforço. Para este trabalho foi selecionada uma paciente com queixa e diagnóstico de IUE confirmado através de estudo urodinâmico, que foi submetida a um protocolo de exercícios físicos associados a contrações perineais num período de doze semanas como o objetivo de avaliar a influência das contrações perineais associadas a exercícios físicos, que simulem situações de perda urinária, na reabilitação de uma paciente com diagnóstico de IUE. Após o treinamento a paciente não apresentou mais a queixa clinica de IUE, assim como não reproduziu mais a perda urinaria no estudo urodinâmico, sugerindo que os exercícios físicos associados às contrações perineais foram eficientes num programa de treinamento da musculatura do assoalho pélvico para reabilitação de incontinência urinária de esforço leve, produzindo melhora substancial ou cura dos sintomas da IUE. Palavras-chave: incontinência urinaria de esforço, exercícios de kegel, exercícios físicos, reabilitação 1- Programa de Pós Graduação Lato-Sensu da Universidade Gama Filho- Fisiologia do Exercício: Prescrição do Exercício. ABSTRACT Influence of contractions perinea s associates the physical exercises in the whitewashing de patient with effort incontinence urinary: a case study The stress urinary incontinence (SUI) is defined as involuntary loss of urine, when the intra vesicle pressure exceeds that of urethra in the absence of contraction of detractor, that occur associated the abrupt increase of abdominal pressure as in the cough, sneeze, or physical activity. One of the alternatives of treatment for SUI is the pelvic floor muscle training through perinea s contractions of Kegel, that has as purpose to adjust the pelvic floor muscles generating an increase of the force of closing and urethral sustentation, essential to obstruction the urinary loss in the moments stress. For this work it was selected a patient with complain and diagnosis of SUI confirmed through urodynamic study that was submitted to a protocol of physical exercises associates the perinea s contractions in period of twelve weeks as the objective to evaluate the influence of the perinea s contractions associates the physical exercises who simulated situation of urinary loss, in the rehabilitation of a patient with diagnosis of SUI. After the training the patient did not present more clinical complaint of SUI, with did not show the urinary loss in the urodynamic study, suggesting that the physical exercises associated the perinea s contractions had been efficient in a program of pelvic floor muscles training for the rehabilitation of SUI light making substantial improvement or cure of the symptoms of IUE. Key words: stress urinary incontinence, Keges s exercises, physical exercises, rehabilitation Endereço para correspondência: atfisio@hotmail.com

241 INTRODUÇÃO A incontinência urinária de esforço (IUE) é definida pela Sociedade Internacional de Continência como a perda involuntária de urina, através da uretra, quando a pressão vesical excede a pressão máxima de fechamento da uretra, na ausência de atividade do detrusor (Ostegard e Bent, 1991; Moreira e colaboradores, 2002). É a forma mais freqüente de incontinência urinária, sendo responsável por 60% dos casos de incontinência urinária feminina (Moreira e colaboradores, 2002; Bernardes e colaboradores, 2002). Ocorre associada a situações de aumento abrupto da pressão abdominal como na tosse, espirro, atividades esportivas ou mudanças súbitas de posição. Dois mecanismos podem originar a IUE: o primeiro é resultado do enfraquecimento das estruturas do assoalho pélvico que sustentam a uretra, como músculos do diafragma pélvico, fáscia pubocervical e ligamentos, diminuindo sua pressão de fechamento. O outro mecanismo é a lesão intrínseca da uretra, o qual permite apenas tratamento cirúrgico e é geralmente causado por traumas uretrais, radioterapia ou cirurgias pélvicas (Bernardes e colaboradores, 2002; Rossi e Ribeiro, 2001). A nomenclatura usual para definir os graus da IUE foi proposta por McGuire e Blaivas e é graduado através de exames de bioimagem como ultra-sonografia, ou estudo urodinâmico, sendo os tipos classificados de acordo com a gravidade do sintoma apresentado: Tipo 0 - incontinência referida pela paciente, mas que não é reproduzida pelo exame clínico ou estudo urodinâmico. Tipo I incontinência urinária com pressão de perda urinária acima de 90 cmh2o e hipermobilidade do colo menor que 2 cm Tipo II incontinência urinária com pressão de perda urinária acima de 90 cmh2o e hipermobilidade do colo maior que 2 cm. Tipo III - incontinência urinária com pressão de perda urinária inferior a 60cmH20 com ou sem hipermobilidade, também chamado de insuficiência uretral intrínseca (Carrerete e Damião, 1999). O tratamento da IUE pode ser realizado através de técnicas que vão da fisioterapia e terapia comportamental, uso de drogas alfa-agonistas, terapia com reposição de estrógeno, uso de aparelhos internos como cones e pessários, obturadores e adesivos uretrais, aparelhos externos como a cadeira eletromagnética, injeções periuretrais de colágeno e até a correção cirúrgica (Carrerete, 1999; Sampaio e colaboradores 1998). Uma das alternativas fisioterápicas utilizadas no tratamento da IUE é o fortalecimento muscular do assoalho pélvico através de contrações perineais, que foram iniciadas por Arnold Kegel na década de 50 (Grosse e Sengler, 2002). No treinamento através das contrações perineais voluntárias, haverá uma hipertrofia das fibras musculares do assoalho pélvico que é composto por 70% de fibras musculares tipo I (lentas), responsáveis pela manutenção do tônus perineal e 30% de fibras musculares tipo II (rápidas), responsáveis pelo fechamento uretral em situações de aumento abrupto da pressão intra-abdominal. Esta hipertrofia garantirá um aumento da força de fechamento e sustentação uretral, essencial para impedir a perda urinária nos momentos de esforço (Bernardes e colaboradores, 2002). Muitos autores concordam com a efetividade do tratamento através das contrações perineais (Hanh e colaboradores, 1996; Bo e Maanum, 1996; Holley e colaboradores, 1995). Por isso, o objetivo deste estudo é avaliar a influência das contrações perineais associadas a exercícios físicos, que simulem situações de perda urinária, na reabilitação de uma paciente com diagnóstico de IUE. MATERIAIS E MÉTODOS Para realização do estudo de caso, foi selecionada uma paciente de forma aleatória, no ambulatório de ginecologia e obstetrícia do Centro Médico do Pólo, do município de Camaçari/BA. A mesma deveria ter queixa e diagnóstico estabelecido de IUE. Foram critérios de exclusão: patologia neurológica, uso de DIU e estado gestacional. A paciente foi informada em relação ao tratamento e a participação neste estudo. A autorização foi obtida através de termo de consentimento. Posteriormente foi submetida à avaliação através de ficha padrão utilizada neste ambulatório. A paciente apresentava-se com 56 anos, era branca, com queixa de perda urinária durantes esforços simples, como tossir, carregar pequenos pesos,

242 caminhar ou levantar-se a partir da posição sentada. Não utilizava protetores, porém eram comuns as trocas de roupas por estarem molhadas. Referia polaciúria, acentuada pelo uso de medicação para controle de hipertensão arterial sistêmica. Durante exame físico foi constatado tônus de base flácido da musculatura global, abdome globoso, musculatura acessória ao períneo com atividade preservada, e presença de cistocele grau I. A aparência externa da vulva apresentava-se com coloração e lubrificação normais, e distância anuvulvar normal. Apresentou grande perda urinária em jato durante exame de esforço tanto na simulação de tosse, quanto à manobra de Valsalva em posição ginecológica. Na palpação do períneo, foi notada tonicidade normal. Durante o teste de contratilidade baseada na escala de Contreras Ortiz e colaboradores (Moreira e colaboradores, 2002) empregando a palpação digital, que varia de grau 0 (ausência de contração) á grau 5 (contração normal ou função perineal objetiva com resistência a palpação mantida por até 5 segundos), foi classificada a contração como grau III (contração moderada ou função perineal objetiva sem resistência opositora a palpação), a qual realizava em apnéia inspiratória com uso excessivo de musculatura acessória. Além do exame clínico a paciente realizou estudo urodinâmico, que analisa os fatores fisiológicos e patológicos envolvidos no armazenamento, transporte e esvaziamento do trato urinário inferior, no qual foi evidenciado bexiga com complacência e sensibilidade normais. Apresentou perda urinária ao esforço com pressão de perda maior que 90 cmh 2 0, durante esforço em ortostase, sendo classificada como incontinência de esforço grau I. A paciente também preencheu o diário miccional, método de avaliação e acompanhamento que registra a freqüência e o volume das micções em 24 horas, levando em consideração a quantidade de líquidos ingeridos e as perdas urinárias, sendo que os primeiros diários apresentavam até oito perdas urinárias em um dia. Procedimentos Este estudo foi realizado num período de 12 semanas com início em março de 2006 a junho de 2006, sendo realizadas duas sessões semanais de 20 minutos. Após a avaliação a paciente foi submetida a protocolo elaborado especificamente para realização deste estudo. Inicialmente foi ensinada a contrair isoladamente seu períneo através de contração do assoalho pélvico com introdução bidigital. Na quinta semana as contrações foram realizadas associadas a exercícios ativos que simulavam as situações de perda urinaria referida, com o objetivo de treina-la para as situações reais, que compreendia: adução e abdução da coxa com resistência, agachamento, tosse, sustentação de carga e caminhadas leves. Os exercícios também progrediam quanto à posição da paciente, iniciando com os exercícios em decúbito, passando a sedestação e ortostase e por fim à marcha. Foram realizadas contrações máximas rápidas e sustentadas submaximas com o tempo de trabalho sendo a metade do de relaxamento, progredindo de 2 a 4 segundos. RESULTADOS E DISCUSSÃO Este estudo observou que o treinamento muscular através de contrações rápidas e sustentadas favoreceu a um ajuste da musculatura perineal as situações de esforço. O treinamento combinado de fibras musculares lentas e rápidas garantiu melhora em força e resistência ao períneo da paciente. A mesma após o tratamento além de não apresentar mais a queixa clínica de perda aos esforços, não havia mais registros de perdas urinárias no diário miccional nas últimas semanas, assim como não houve mais reprodução dos sintomas no estudo urodinâmico. Durante exame de esforço em posição ginecológica não apresentou perda em jato. Em teste de contratilidade de acordo com a classificação sugerida por Contreras Ortiz aumentou uma posição passando a grau IV (função perineal objetiva e resistência opositora não mantida a palpação por mais de cinco segundos), sustentando facilmente a contração por até três segundos, a partir do quarto segundo já perdia grande parte da força. O tratamento aplicado foi baseado nos princípios do treinamento muscular, de

243 especificidade, sobrecarga, destreinamento e reversibilidade (Lucas e colaboradores, 1999; Robergs e Roberts, 2002) onde inicialmente foi treinado especificamente e de forma isolada a musculatura perineal, em especial o músculo elevador do ânus, principal músculo do assoalho pélvico, e posteriormente foi incluído como sobrecarga os esforços de musculatura acessória. Após o término do programa de 12 semanas a paciente foi orientada que continuasse os exercícios para que não houvesse reversão dos sintomas. O uso de atividades que simularam aquelas de perda urinária foram importantes para criar o bloqueio perineal ao esforço, ou também chamado de automatismo perineal, que permitiram a paciente contrair o assoalho pélvico de forma rápida e com força adequada simultaneamente ao esforço. Este é um mecanismo dinâmico ligado a vigilância do individuo (Grosse e Sengler, 2002). É comum na literatura o trabalho isolado da musculatura do assoalho pélvico, porém através de exame da atividade eletromiográfica foi comprovada a participação dos músculos transverso do abdome e oblíquo interno durante a contração perineal e sem essa participação há uma diminuição em força de contração do períneo (Neumann e Gill, 2002). O trabalho de grupos musculares como adutores da coxa e glúteos associados as contrações perineais também é questionado quando a paciente não consegue contrair adequadamente seu assoalho pélvico. Após ultrapassada esta fase esses grupos deves ser utilizados como forma de sobrecarga ao exercício garantindo a eficiência ao tratamento. Por isso este estudo concorda que as contrações perineais associadas a exercícios físicos são eficientes num programa de treinamento da musculatura do assoalho pélvico para reabilitação de incontinência urinária de esforço leve, produzindo melhora substancial ou cura dos sintomas da IUE (Bo, 1995; Liao e colaboradores, 2006), porém não basta apenas a qualidade do treinamento, devendo também ser levado em consideração a motivação e disciplina do paciente (Devillers e Mauroy, 1997) Alguns trabalham mostram índices de até 85% de sucesso com esta técnica (Kuo 2003) e é considerado a primeira escolha como forma de tratamento para graus leves deste tipo de incontinência (Buzelin 1998). Contudo o sucesso em longo prazo não é visto até cinco anos após o treinamento, se o exercício não for continuo (Grosse e Sengler, 2002). REFERÊNCIA 1- International Continence Society. Comitee on Standadisation of Terminology. The Standadisation of Terminology of lower urinary tract fuction. In: Ostegard, R.;Bent, A E. editors. Urogynecology and Urodinamics: theory and practice. 3rd. Ed Baltimore: Williams & Wilkins.1991 p 545-62 2- Moreira, S.F.S.; e colaboradores. Mobilidade do colo vesical e avaliação funcional do assoalho pélvico em mulheres continentes e com Incontinência Urinaria de Esforço, consoante o estado hormonal. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. Vol. 24. Num. 6. 2002. p. 365-370. 3- Bernardes, N.O.; e colaboradores. Métodos de tratamento utilizados na iincontinência urinaria de esforço genuína: um estudo comparativo. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. Vol. 22. Num. 1. 2000. p. 49-54. 4- Rossi, P; Ribeiro, R.M. Avaliação do tratamento cirúrgico da incontinência urinária de esforço. Sinopse de Ginecologia e Obstetrícia. Num. 2. 2001. 5- Carrerete, F.; e colaboradores. Incontinência urinaria de esforço. Revista Brasileira de Medicina. Vol. 56. (edição especial) Rio de Janeiro. Abril 99 6- Carrerete, F.; Damião, R. Incontinência urinária na mulher na visão da urologia. Revista Brasileira de Medicina. Vol. 56. Num. 11. 1999. 7- Sampaio, F.B.; e colaboradores Tratamento não cirúrgico da iincontinência urinária de esforço na mulher, em I Consenso Brasileiro- Incontinência Urinária, Uroneurologia e Disfunções Miccionais, 1999 8- Grosse, D.; Sengler, J., Reeducação perineal Concepção, realização e transcrição

244 em prática liberal e hospitalar. 1º ed. Manole. São Paulo. 2002. 9- Hanh, I.; e colaboradores. Comparative assessment of pelvic floor function using vaginal cones, vaginal digital palpation and vaginal pressure measurements. Gynecol Obstet Invest. Num. 41. 1996. p. 269-274. 19- Buzelin, J.M. Incontinence urinaire de la femme. Quel bilan? Quel traitement?. Ann Urol (Paris). Vol. 32. Num. 2. 1998. p. 83-88. Recebido para publicação em 11/05/2009 Aceito em 25/01/2010 10- Bo, K.; Maanum, M. Does vaginal electrical stimulation cause pelvic floor muscle contraction? a pilot study. Scand J Urol Nephrol Suppl. Num. 179. 1996. p. 39-45. 11- Holley, R.L.; e colaboradores. Long-term failure of pelvic floor musculature exercises in treatment of genuine stress incontinence. South Med J. Num. 88. 1995. p. 547-549. 12- Lucas, M.; Emery, S.; Beynon, J. Incontinence 1º ed. Blackwell Science Ltd. France 1999. 13- Robergs, R.A.; Roberts, S.O. Princípios fundamentais de Fisiologia do Exercício para Aptidão, Desempenho e Saúde. São Paulo. Phorte 2002. 14- Neumann, P.; Gill, V. Pelvic floor and abdominal muscle interaction: emg activity and intra-abdominal pressure Int Urogynecol J. Australia. Num. 13. 2002. p. 125-132. 15- Bo, K. Pelvic floor muscle exercise for treatment of stress urinary incontinence: an exercise physiology perspective. Int Urogynecol J. Num. 6. 1995. p. 282-291. 16- Liao, Y.M; Dougherty, M.C.; Liou, Y.S.; Tseng, I.J. Pelvic floor muscle training effect on urinary incontinence knowledge, attitudes, and severity: an experimental study. Int J Nurs Stud. Vol. 43. Num. 1. 2006. p. 29-37. 17- Kuo, H.C. Videourodynamic results in stress urinary incontinence patients after pelvic floor muscle training. J Formos Med Assoc. Vol. 102. Num. 01. 2003. 18- Devillers, P.; Mauroy, B. Rééducation urogynécologique féminine. Techniques et indications. Prog Urol. Vol. 7. Num. 4. 1997. p. 83-93.