Notas de Aula. Geometria Diferencial

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Transcrição:

Notas de Aula Geometria Diferencial Rodney Josué Biezuner 1 Departamento de Matemática Instituto de Ciências Exatas (ICEx) Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Notas de aula do curso Geometria Diferencial do Programa de Pós-Graduação em Matemática. 13 de outubro de 016 1 E-mail: rodney@mat.ufmg.br; homepage: http://www.mat.ufmg.br/~rodney.

Sumário 1 Teoria Local das Curvas 3 1.1 Curvas Parametrizadas........................................ 3 1.1.1 Definição........................................... 3 1.1. Exemplos........................................... 3 1.1.3 Reparametrizações...................................... 6 1. Curvas Regulares e Comprimento de Arco............................. 6 1..1 Curvas Regulares....................................... 6 1.. Comprimento de uma Curva................................ 7 1..3 O Parâmetro Comprimento de Arco............................ 10 1.3 Curvatura............................................... 1 1.3.1 Definição........................................... 1 1.3. Exemplos........................................... 16 1.3.3 Fórmulas de Frenet para Curvas Planas.......................... 18 1.4 Derivada em R n........................................... 19 1.4.1 Definição........................................... 19 1.4. Propriedades......................................... 1.5 Isometrias de R n........................................... 3 1.6 Teorema Fundamental das Curvas no Plano............................ 7 1.7 Torção e Triedro de Frenet...................................... 9 1.7.1 Definição........................................... 9 1.7. Fórmulas de Frenet para Curvas Espaciais......................... 3 1.7.3 Cálculo da Curvatura e Torção para Parametrizações Arbitrárias............ 33 1.8 Teorema Fundamental das Curvas no Espaço........................... 36 Teoria Global das Curvas 41.1 Número de Rotação de uma Curva Fechada............................ 41.1.1 Número de Rotação e Curvatura Total........................... 41.1. Número de Rotação de Curvas Fechadas Simples..................... 45. Curvas Fechadas Simples Convexas................................. 49.3 Teorema dos Quatro Vértices para Curvas Convexas....................... 51.4 Teorema dos Quatro Vértices: Caso Geral............................. 53 3 Superfícies Regulares 55 3.1 Superfícies Parametrizadas Regulares e Superfícies Regulares.................. 55 3.1.1 Definição e Exemplos.................................... 55 3.1. Superfícies como Imagens Inversas de Valores Regulares................. 61 3. Mudança de Coordenadas e Funções Diferenciáveis em Superfícies............... 63 3.3 Plano Tangente, Vetor Normal e Diferencial............................ 65 3.3.1 Plano Tangente e Vetor Normal............................... 65 1

Rodney Josué Biezuner 3.3. Diferencial de uma Aplicação Diferenciável entre Superfícies Regulares......... 66 3.4 Superfícies Orientáveis........................................ 68 4 As Formas Fundamentais e Curvaturas 73 4.1 A Primeira Forma Fundamental................................... 73 4.1.1 Comprimento de Curvas em Superfícies.......................... 76 4.1. Área de Regiões de Superfícies............................... 77 4. Segunda Forma Fundamental.................................... 78 4..1 A Aplicação de Gauss.................................... 78 4.. A Segunda Forma Fundamental............................... 80 4..3 Segunda Forma Fundamental e Operador Forma em Coordenadas........... 8 4.3 Curvaturas.............................................. 85 4.3.1 Curvatura Normal...................................... 85 4.3. Curvaturas Principais.................................... 86 4.3.3 Curvatura Gaussiana..................................... 87 4.3.4 Curvatura Média....................................... 88 4.3.5 Classificação dos Pontos de uma Superfície........................ 88 4.3.6 Exemplos........................................... 93 4.4 Superfícies de Curvatura Constante................................. 98 4.4.1 Superfícies de Revolução com Curvatura Constante.................... 99 4.5 Superfícies Mínimas......................................... 103 5 Geometria Intrínseca das Superfícies 109 5.1 Isometrias............................................... 109 5. Símbolos de Christoffel........................................ 11 5.3 Equações de Compatibilidade e Teorema Egrégio de Gauss.................... 117 5.4 Teorema Fundamental Local das Superfícies............................ 119 5.5 O Teorema de Rigidez da Esfera.................................. 14 5.5.1 Parametrizações Ortogonais................................. 14 5.5. Curvas Principais....................................... 16 5.5.3 Existência de Parametrizações Ortogonais......................... 19 5.5.4 O Teorema de Rigidez da Esfera.............................. 131 6 Geodésicas 134 6.1 Definição............................................... 134 6. Exemplos............................................... 136 6.3 Aplicação Exponencial........................................ 139 6.3.1 Definição........................................... 139 6.3. Coordenadas Normais.................................... 141 6.3.3 Coordenadas Geodésicas Polares.............................. 141 6.4 Propriedades Minimizantes das Geodésicas............................. 147 6.5 Vizinhanças Totalmente Normais e Vizinhanças Convexas.................... 148 6.6 Função Distância........................................... 151 6.7 Superfícies Completas e Teorema de Hopf-Rinow......................... 15

Capítulo 1 Teoria Local das Curvas 1.1 Curvas Parametrizadas 1.1.1 Definição Denotaremos por I qualquer subconjunto conexo de R, isto é, qualquer intervalo aberto, fechado, semiaberto, raio de R ou o próprio R; chamaremos I simplesmente de intervalo. Diremos que uma função vetorial f : I R n satisfaz localmente uma certa propriedade, se para todo t I existe um intervalo aberto J t t tal que f Jt satisfaz a propriedade. 1.1 Definição. Uma curva parametrizada diferenciável é uma função vetorial localmente injetiva, continuamente diferenciável, α : I R n. Dizemos que α é uma curva parametrizada de classe C k se α é k vezes continuamente diferenciável. Se α é de classe C também dizemos que α é uma curva parametrizada suave. O traço de uma curva parametrizada α : I R n é sua imagem α (I). Muitas vezes identificamos o traço de uma curva com a própria curva, abusando a linguagem, e nos referimos à parametrização da curva (ao invés de a parametrização do traço da curva ). A exigência de diferenciabilidade elimina exemplos patológicos, tais como o de curvas contínuas que preenchem um quadrado ou um cubo (curvas de Hilbert). Mas não evita o aparecimento de quinas (veja os Exemplos 1.8 e 1.9 a seguir). O requerimento de injetividade apenas local permite autointerseções: α : I R n ser localmente injetiva significa que para todo t I existe um intervalo J t t tal que α Jt é injetiva, mas α não precisa ser globalmente injetiva, isto é, não precisa ser injetiva em todo o intervalo I. O requerimento de injetividade local proíbe no entanto que uma curva volte sobre si mesma (veja o Exemplo 1.7 a seguir). 1.1. Exemplos 1. Exemplo (Retas). α : R R definida por α (t) = (x 0 + v 1 t, y 0 + v t) = (x 0, y 0 ) + t (v 1, v ) = p 0 + tv é uma parametrização de uma reta no plano, enquanto que β : R R 3 definida por β (t) = (x 0 + v 1 t, y 0 + v t, z 0 + v 3 t) = (x 0, y 0, z 0 ) + t (v 1, v, v 3 ) = p 0 + tv é uma parametrização de uma reta no espaço. Em geral, γ : R R n definida por γ (t) = (x 1 + v 1 t,..., x n + v n t) = (x 1,..., x n ) + t (v 1,..., v n ) = p 0 + tv é uma parametrização de uma reta em R n. Note que α é uma curva suave, globalmente injetiva. 3

Rodney Josué Biezuner 4 1.3 Exemplo (Círculos). α : R R definida por α (t) = (x 0 + R cos t, y 0 + R sen t) = (x 0, y 0 ) + R (cos t, sen t) é uma parametrização do círculo de raio R e centro no ponto (x 0, y 0 ). De fato, α (t) (x 0, y 0 ) = R para todo t. Note que α é uma curva suave, localmente injetiva. 1.4 Exemplo (Elipses). α : R R definida por α (t) = (x 0 + a cos t, y 0 + b sen t) = (x 0, y 0 ) + (a cos t, b sen t) é uma parametrização da elipse de semieixos a, b e centro no ponto (x 0, y 0 ). De fato, se x (t) = a cos t, y (t) = b sen t, então [x (t) x 0 ] a + [y (t) y 0] b = 1 para todo t. Note que α é uma curva suave, localmente injetiva. 1.5 Exemplo (Hipérboles). α : R R definida por α (t) = (x 0 + a cosh t, y 0 + b senh t) = (x 0, y 0 ) + (a cosh t, b senh t) é uma parametrização de um ramo de uma hipérbole centrada no ponto (x 0, y 0 ). De fato, se x (t) = a cosh t, y (t) = b senh t, então [x (t) x 0 ] a [y (t) y 0] b = 1 para todo t; como o cosseno hiperbólico é uma função positiva, a imagem de α corresponde apenas a um único ramo desta hipérbole. Note que α é uma curva suave, globalmente injetiva. 1.6 Exemplo (Gráficos de Funções). Se f : I R é uma função de classe C k, então α : I R definida por α (t) = (t, f (t)) é uma curva parametrizada de classe C k. 1.7 Exemplo. α, β : R R definidas por α (t) = (t, t), β (t) = ( t 3, t 3), são curvas parametrizadas suaves, parametrizações da diagonal principal do plano cartesiano. A função suave γ : R R definida por γ (t) = ( t, t ) tem como imagem a semidiagonal principal positiva do plano cartesiano, mas não é uma curva parametrizada porque não é localmente injetiva em t = 0. Se restringirmos o domínio de qualquer uma destas três funções ao intervalo [0, + ), obtemos uma parametrização suave da semidiagonal principal positiva.

Rodney Josué Biezuner 5 1.8 Exemplo (Parametrização Suave de uma Quina). α : ( 1, 1) R definida por α (t) = (t, t ) é globalmente injetiva, mas não é uma curva porque não é diferenciável na origem. Note que sua imagem é uma quina. Por outro lado, β : ( 1, 1) R definida por { ( t β (t) = (, t ) se t 0, t, t ) se t 0, tem esta quina como imagem, mas é uma curva parametrizada de classe C 1, globalmente injetiva. Observe que β (0) = 0. γ : ( 1, 1) R definida por γ (t) = (t 3, t 3) também é uma parametrização desta quina, mas de classe C, globalmente injetiva, com γ (0) = γ (0) = 0. Em geral, { ( t α k (t) = ( k, t k) se t ( 1, 0], t k, t k) se t [0, 1), se k é par, e α k (t) = ( t k, t k), t ( 1, 1) se k é ímpar, é uma parametrização da quina de classe C k 1, globalmente injetiva, com α k (0) =... = α (k 1) k (0) = 0. Podemos obter uma parametrização suave globalmente injetiva da quina definindo α (t) = Note que α (k) (0) = 0 para todo k. ( e 1/t, e 1/t) se t < 0, 0, se t = 0, ( e 1/t, e 1/t) se t > 0. 1.9 Exemplo (Parametrização Suave de um Quadrado). Podemos parametrizar o quadrado unitário de cantos (0, 0), (1, 0), (1, 1) e (0, 1) pela parametrização continuamente diferenciável α : [0, 4] R definida por α (t) = ( ( ) ) t 6 t3, 0 ( ( 3 1, 6 t 3 ) ) t + t3 + 5 ( ( 3 6 6t 5 ) ) t + t3 7, 1 ( ( 3 0, 6 1t 7 ) ) t + t3 80 3 se 0 t 1, se 1 t, se t 3, se 3 t 4. Note que de modo que ( 6t (t 1), 0) se 0 t 1, α (0, 6 (t 1) (t )) se 1 t, (t) = (6 (t ) (t 3), 0) se t 3, (0, 6 (t 3) (t 4)) se 3 t 4, α (0) = α (1) = α () = α (3) = α (4) = 0

Rodney Josué Biezuner 6 e lim t 1 α (t) = lim t 1 α (t) = 0, + lim α (t) = lim α (t) = 0, t t + lim α (t) = lim α (t) = 0. t 3 t 3 + De fato, é fácil ver que podemos definir uma parametrização de classe C k para qualquer k ou até mesmo suave para o quadrado. 1.1.3 Reparametrizações 1.10 Definição. Seja α : I R n uma curva parametrizada de classe C k. Se J é um intervalo e f : J I é um difeomorfismo de classe C k, então β : J R n definida por β = α f é uma curva parametrizada de classe C k que tem o mesmo traço de α. Dizemos que β é uma reparametrização de α e a função f é chamada uma mudança de parâmetro. Abusando a linguagem, dizemos que α e β são parametrizações da mesma curva (ao invés de parametrizações do mesmo traço). 1.11 Exemplo. α : [0, π] R n e β : [0, 1] R n definidas por α (s) = (cos s, sen s), β (t) = (cos πt, sen πt), são duas parametrizações do círculo unitário centrado na origem. Cada uma é uma reparametrização da outra. Por exemplo, a mudança de parâmetro de t para s é a função f : [0, 1] [0, π] definida por f (t) = πt. A mudança de parâmetro de s para t é a inversa de f. 1. Curvas Regulares e Comprimento de Arco 1..1 Curvas Regulares Queremos estudar curvas onde a tangente está definida em todo ponto, pois elas possuem uma riqueza de propriedades geométricas. Certamente não é possível definir a reta tangente em quinas, pois há dois vetores tangentes com direções diferentes. Observe que nos Exemplos 1.8 e 1.9 a derivada se anulava nas quinas. Para evitar o aparecimento de quinas e consequentemente podermos definir o conceito de reta tangente, basta então considerar curvas parametrizadas em que a derivada nunca se anula. 1.1 Definição. Uma curva regular é uma curva parametrizada suave α : I R n tal que para todo t I. α (t) 0 Curvas regulares não podem ter cantos ou quinas, pois a tangente à curva está definida em todo ponto: a reta tangente à curva α no ponto α (t) é simplesmente a reta passando por α (t) com direção α (t).

Rodney Josué Biezuner 7 1.13 Proposição. Se α : I R n é uma função de classe C 1 tal que α (t) 0 para todo t, então α é localmente injetiva. Em particular, α é uma curva regular de classe C 1. Prova: Escreva α (t) = (x 1 (t),..., x n (t)). Seja t 0 I. Como α (t 0 ) 0, temos x i (t 0) 0 para algum i. Se x i (t 0) > 0, como por hipótese a derivada x i é continua, existe um intervalo aberto J t 0 I contendo t 0 tal que x i (t) > 0 para todo t J t 0 ; segue que x i é crescente neste intervalo, em particular injetiva, logo α também é. Se x i (t 0) < 0, o mesmo argumento implica a existência de um intervalo aberto J t0 I contendo t 0 onde x i é decrescente, em particular injetiva, logo α também é. 1.. Comprimento de uma Curva A primeira noção geométrica que definiremos é a de comprimento de uma curva. 1.14 Definição. Seja α : I R n uma curva parametrizada e t 0 I. A função comprimento de arco de α a partir de t 0 é a função s : I R definida por s (t) = t t 0 α (r) dr Dados t 0, t 1 I, t 0 t 1, o comprimento do arco da curva de t 0 a t 1 é o número não negativo (positivo se t 0 < t 1 ) l (α ([t 0, t 1 ])) = t1 t 0 α (t) dt. O comprimento da curva é simplesmente l (α (I)) e será denotado simplesmente por l (α). 1.15 Proposição. O comprimento de uma curva não depende da parametrização. Prova: Sejam α : I R n, I = [a, b] e β : J R n, J = [c, d] parametrizações da mesma curva, com f : J I a mudança de parâmetro, de modo que β = α f. Pela regra da cadeia, β (t) = α (f (t)) f (t), com f 0, pois f é um difeomorfismo. Consideraremos o caso f > 0, já que o outro caso tem demonstração análoga. Segue da fórmula da mudança de coordenadas para integrais (i.e., integração por substituição) que l (β) = l (β ([c, d])) = = = d c b a d α (f (t)) f (t) dt c β (t) dt α (s) ds = l (α ([a, b])) = l (α). 1.16 Exemplo (Comprimento do Círculo). Utilizando a parametrização α : [0, π] R n para o círculo de raio R α (t) = (x 0, y 0 ) + R (cos t, sen t), de modo que obtemos l (α) = π 0 α (t) = R (cos t, sen t), α (t) dt = π 0 R dt = πr.

Rodney Josué Biezuner 8 1.17 Exemplo (Comprimento da Espiral de Arquimedes). A espiral de Arquimedes é a trajetória de um ponto que se move com velocidade constante em uma reta enquanto esta reta gira em torno de um de seus pontos fixado com velocidade angular constante. Uma parametrização para a espiral de Arquimedes, considerando o ponto em torno do qual a reta gira como sendo a origem, é t 0, para alguma constante c 0. Temos de modo que Logo, α (t) = c (t cos t, t sen t), α (t) = c (cos t t sen t, sen t + t cos t), α (t) = c ( cos t t sen t cos t + t sen t + sen t + t sen t cos t + t cos t ) 1/ = c 1 + t. l (α ([0, t])) = c t 0 1 + s ds = c [ s ( 1 + s + ln s + )] t 1 + s 0 = c [ t 1 + t + ln (t + )] 1 + t. Evidentemente, a espiral toda tem comprimento infinito. 1.18 Exemplo (Comprimento da Espiral Logarítmica). A espiral logarítmica é a trajetória de um ponto que se move em uma reta com velocidade proporcional à distância já percorrida nesta reta enquanto esta reta gira em torno de um de seus pontos fixado com velocidade angular constante. Em coordenadas polares (r, θ) temos dr dθ = kr, de forma que r (θ) = ce kθ. Assim, uma parametrização para a espiral logarítmica é α (t) = c ( e kt cos t, e kt sen t ), t R, para algumas constantes c, k 0. Temos α (t) = c ( ke kt cos t e kt sen t, ke kt sen t + e kt cos t ) de modo que Logo, = ce kt (k cos t sen t, k sen t + cos t), α (t) = ce kt ( k cos t k sen t cos t + sen t + k sen t + k sen t cos t + cos t ) 1/ = ce kt k + 1. l (α ([t 1, t ])) = c t k + 1 t 1 e kt dt ] t = c [ e kt k + 1 k t 1 k + 1 ( = c e kt k e kt1).

Rodney Josué Biezuner 9 Em particular, k + 1 l (α ([, t])) = c k e kt. Historicamente, a espiral logarítmica foi a primeira curva a ser retificada, isto é, uma construção geométrica precisa foi dada para produzir um segmento de reta cujo comprimento é igual ao comprimento de um arco da curva. Isto foi obtido por Torricelli (1608-1647). Veja [Borceux], p. 8, Proposition 1.7.3 para uma demonstração simples. 1.19 Exemplo (Comprimento da Ciclóide). A ciclóide é a trajetória de um ponto fixado em um círculo quando este círculo roda sem deslizar em cima de uma reta. Uma parametrização para a ciclóide escolhendo o ponto fixado de um círculo de raio R rodando sobre o eixo x como sendo o ponto inferior do círculo quando este concide com a origem é α (t) = R (t sen t, 1 cos t). Daí de modo que α (t) = R (1 cos t, sen t), α (t) = R ( 1 cos t + cos t + sen t ) 1/ = R (1 cos t) 1/ = ( R sen t ) 1/ = R sen t Consequentemente, o comprimento de um arco completo da ciclóide (quando o ponto que era o ponto inferior do círculo volta a ser o ponto inferior do círculo; em outras palavras, quando o círculo fez uma volta completa) é π l (α ([0, π])) = R sen t [ 0 dt = R cos t ] π = 4R ( cos π + cos 0) 0 = 8R. Este também é um resultado de retificação (veja o exemplo anterior para o significado deste conceito) obtido pela primeira vez por Torricelli usando outros argumentos. 1.0 Exemplo (Comprimento da Hélice Circular). Uma hélice circular é a trajetória de um ponto girando em um círculo com velocidade angular constante enquanto o centro deste círculo sobe (ou desce) com velocidade constante ao longo de uma reta perpendicular ao seu plano. Diferente de todas as curvas que consideramos até agora, que eram curvas planas, a hélice é uma curva espacial. Uma parametrização para a hélice é α (t) = (R cos t, R sen t, kt) onde R > 0 é o raio do círculo e k 0 é a velocidade do centro do círculo (que também é a componente vertical da velocidade da partícula, obviamente). Temos α (t) = ( R sen t, R cos t, k), de modo que α (t) = R + k.

Rodney Josué Biezuner 10 Logo, o comprimento de um arco de hélice (quando o ponto chega em uma posição exatamente acima da sua posição inicial) é l (α ([0, π])) = π R + k dt = π R + k. Observe que este comprimento é maior que o do círculo de raio R. 1..3 O Parâmetro Comprimento de Arco Muitas vezes é útil interpretar o parâmetro t da parametrização de uma curva como se referindo ao tempo decorrido. Em certas ocasiões especiais, o parâmetro t se refere à distância percorrida: 1.1 Definição. Dizemos que uma curva α : I R n está parametrizada pelo comprimento de arco se l (α [t 0, t 1 ]) = t 1 t 0 para todos t 0 t 1 I. Dizemos que uma curva α : I R n é unitária ou normalizada se para todo t I. 0 α (t) = 1 1. Proposição. Uma curva está parametrizada pelo comprimento de arco se e somente se ela é unitária. Prova: Se α : I R n é unitária, então Reciprocamente, se para todos t 0, t I, então l (α [t 0, t 1 ]) = mas pelo teorema fundamental do Cálculo t1 t t 0 α (t) dt = t1 t 0 α (r) dr = t t 0 d t α (r) dr = 1, dt t 0 d t α (r) dr = α (t). dt t 0 t 0 1 dt = t 1 t 0. 1.3 Lema (Regra do Produto para o Produto Escalar). Sejam V, W : I R n funções vetoriais diferenciáveis e considere a função escalar f : I R definida por f (t) = V (t), W (t). Então f (t) = V (t), W (t) + V (t), W (t).

Rodney Josué Biezuner 11 Prova: Denotando por {e 1,..., e n } a base canônica de R n e escrevendo as funções V e W em coordenadas como n V (t) = V i (t) e i, segue que Logo, pela regra do produto temos f = n i=1 W (t) = f (t) = V i W i + i=1 n W i (t) e i, i=1 n V i (t) W i (t). i=1 n V i W i = V, W + V, W. 1.4 Proposição. Toda curva regular pode ser reparametrizada pelo comprimento de arco. i=1 Prova: Se α : I R n é uma curva regular de classe C k, considere a função comprimento de arco s : I J de α a partir de t 0 com J = s (I). Afirmamos que a sua inversa s 1 : J I está bem definida e é uma função de classe C k. De fato, como s (t) = α (t) > 0, a função s é estritamente crescente, logo a sua inversa está bem definida. Além disso, s é uma função de classe C k, pois s (t) = α (t) = α (t), α (t) 1/, s (t) = α (t), α (t) α, (t) s (t) = α (t), α (t) + α (t), α (t) α (t). s (k) (t) = F ( α (t), α (t),..., α (k) (t) ) α (t) p, α (t), α (t) α (t) 3, para algum inteiro p e para uma função de classe C F : (R n ) k R, combinação de produtos internos; segue também do teorema da função inversa que sua inversa s 1 também é uma função de classe C k. Portanto podemos definir uma reparametrização de classe C k de α por Segue da regra da cadeia que β : J R n β = α s 1. β (r) = α ( s 1 (r) ) ( s 1) (r) = α ( s 1 (r) ) 1 s (s 1 (r)) = α ( s 1 (r) ) α (s 1 (r)),

Rodney Josué Biezuner 1 donde β (r) = 1. Em particular, as parametrizações de uma curva regular são reparametrizações uma da outra, já que qualquer parametrização pode ser reparametrizada por comprimento de arco. Note que, embora em tese é sempre possível reparametrizar uma curva por comprimento de arco, na prática isso nem sempre é factível porque a inversa de uma função complicada pode não ser obtível através de métodos analíticos. 1.3 Curvatura 1.3.1 Definição A curvatura de uma curva em um ponto mede a taxa de variação da direção da tangente à curva no ponto; é uma medida de quanto a curva se curva, isto é, o quanto ela difere de uma reta. Para medir a taxa de variação da direção da tangente através do vetor tangente à curva, é necessário que o comprimento do vetor tangente seja sempre o mesmo (caso contrário, estaríamos medindo também a variação do comprimento do vetor; por exemplo, α (t) = p 0 + t 3 V é uma parametrização de uma reta com velocidade variável, logo α 0, apesar do vetor tangente da reta nunca mudar de direção). Por este motivo, para definir a curvatura precisamos que a curva esteja parametrizada por comprimento de arco, de modo que o vetor tangente tenha sempre comprimento igual a 1. 1.5 Definição. Seja α : I R n, n 3, uma curva parametrizada por comprimento de arco. Denotando o vetor tangente unitário à curva no ponto α (s) por definimos a curvatura de α no ponto α (s) por Em outras palavras, T (s) = α (s), (1.1) κ (s) = T (s). (1.) κ (s) = α (s), isto é, a curvatura mede a aceleração de uma partícula que percorre a trajetória da curva com velocidade unitária. No caso especial n = podemos definir o conceito de curvatura com sinal, como veremos daqui a pouco. 1.6 Proposição. Seja α : I R n uma curva parametrizada por comprimento de arco. Então o vetor T (s) é ortogonal ao vetor tangente T (s), isto é, para todo s. Prova: Derivando obtemos T (s), T (s) = 0 (1.3) T (s), T (s) = T (s) = 1, T (s), T (s) = 0. Observe que o vetor T em um ponto aponta para a direção em que a curva está se curvando naquele ponto.

Rodney Josué Biezuner 13 Dentre as infinitas direções possíveis para vetores ortogonais ao vetor tangente em R n, n 3, escolhemos privilegiar a direção do vetor T (s). Em R, onde existem apenas duas possibilidades distintas, escolhemos a direção compatível com a orientação da base canônica. 1.7 Definição. Seja α : I R n uma curva parametrizada por comprimento de arco. Se κ (s) 0, definimos o vetor normal principal N (s) à curva α no ponto α (s) da seguinte forma: (i) Se n 3 N (s) = T (s) T (s). (1.4) (ii) Se n =, escrevendo em coordenadas α (s) = (x (s), y (s)), de modo que definimos T (s) = (x (s), y (s)), N (s) = ( y (s), x (s)). (1.5) O vetor normal principal é o vetor unitário na direção de T (s) no caso n 3, ou seja, N (s) = α (s) α (s). No caso n = escolhemos N (s) de tal forma que {T (s), N (s)} é uma base ortonormal que tem a mesma orientação da base canônica do plano R, isto é, [ ] x det (s) y (s) y (s) x = [x (s)] + [y (s)] = T (s) = +1. (s)

Rodney Josué Biezuner 14 A outra única escolha possível para N (s), o vetor (y (s), x (s)), implicaria em uma base ortonormal com a orientação oposta à orientação da base canônica do plano. Em R n, n 3, existem infinitas escolhas possíveis para N (s) e nenhuma delas fixa uma orientação. Portanto em R podemos definir o conceito de curvatura com sinal: como T (s) é ortogonal ao vetor tangente T (s), segue que ele é um múltiplo escalar do vetor normal principal N (s); definimos este múltiplo escalar como sendo a curvatura da curva no ponto α (s). 1.8 Definição. Seja α : I R uma curva parametrizada por comprimento de arco. Definimos a curvatura com sinal de α no ponto α (s) por Em outras palavras, Note que T (s) = κ (s) N (s). (1.6) κ (s) = T (s), N (s). (1.7) κ (s) = T (s). (1.8) A curvatura com sinal dá mais informação geométrica para curvas planas em R do que obteríamos se usássemos simplesmente a Definição 1.5: quando a curvatura é positiva, a curva está se curvando para a esquerda (vetor T no mesmo sentido que N), enquanto que quando a curvatura é negativa, a curva está se curvando para a direita (vetor T no sentido oposto a N; veja o Exemplo 1.3 a seguir para uma ilustração concreta no caso do círculo). 1.9 Proposição. Seja α : I R uma curva parametrizada por comprimento de arco. Se α (s) = (x (s), y (s)), então e κ (s) = [x (s)] + [y (s)] (1.9) κ (s) = x (s) y (s) y (s) x (s). (1.10)

Rodney Josué Biezuner 15 Prova: A primeira fórmula segue de e a segunda fórmula de κ = T = (x, y ) κ = T, N = (x, y ), ( y, x ) = x y + y x. É extremamente útil ter fórmulas para o vetor tangente, o vetor normal e a curvatura, para curvas parametrizadas por um parâmetro arbitrário que não o comprimento de arco, já que, como observado anteriormente, nem sempre é fácil ou analiticamente possível reparametrizar uma curva por comprimento de arco, pois para isso é necessário encontrar a inversa de uma função (a inversa da função comprimento de arco). Abaixo fazemos isso para curvas em R ; o resultado correspondente para curvas em R 3 é dado na Proposição 1.7. 1.30 Proposição. Seja α : I R uma curva parametrizada por um parâmetro qualquer. Se então e α (t) = (x (t), y (t)), T (t) = ( (x (t), y (t)) ) 1/ (1.11) [x (t)] + [y (t)] N (t) = ( ( y (t), x (t)) ) 1/ (1.1) [x (t)] + [y (t)] κ (t) = x (t) y (t) y (t) x (t) ( ) 3/. (1.13) [x (t)] + [y (t)] Prova: As primeiras duas fórmulas seguem imediatamente das definições de vetor tangente unitário e vetor normal unitário. Para obter a fórmula para a curvatura, seja β (s (t)) = α (t) uma reparametrização de α por comprimento de arco (ou seja, β = α s 1 ). Pela definição da curvatura, temos Pela regra da cadeia temos de modo que Portanto, κ (t) = κ (s (t)) = T (s (t)), N (s (t)) = β (s (t)), N (s (t)). α (t) = β (s (t)) s (t) = β (s (t)) α (t), α (t) = β (s (t)) α (t) + β (s (t)) α (t), α (t) α (t) = β (s (t)) α (t) + α (t), α (t) α (t) α (t). β (s (t)) = α (t) α (t) α (t), α (t) α (t) 4 α (t). α (t) κ (t) = α (t), N (t) 1 = α (t) (x (t), y (t)), ( y (t), x (t)) α (t) = x (t) y (t) y (t) x (t) α (t) 3.

Rodney Josué Biezuner 16 1.3. Exemplos 1.31 Exemplo (Curvatura da Reta). Se α (t) = (x 0 + v 1 t, y 0 + v t) é uma reta em R, segue de (1.13) que κ 0. O resultado também vale para retas em R n e de fato caracteriza as retas, no sentido de que as curvas com curvatura nula são retas (Proposição 1.38). 1.3 Exemplo (Curvatura do Círculo). Se é um círculo de raio R, de modo que α (t) = (x 0 + R cos t, y 0 + R sen t) α (t) = R ( sen t, cos t), α (t) = R ( cos t, sen t), α (t) = R, segue de (1.13) que [ R ( sen t) + ( cos t) ] κ (t) = R 3 = 1 R. Portanto, o círculo tem curvatura constante e de fato isso caracteriza os círculos, como veremos mais adiante (Proposição 1.38). Vemos também que quanto maior é o seu raio, menor é a sua curvatura. De fato, quando R, a curvatura tende a zero, de modo que neste sentido o círculo aproxima-se de uma reta. Observe agora que se usarmos a parametrização com orientação reversa para o círculo β (t) = (x 0 + R cos t, y 0 R sen t), (isto é, na parametrização anterior um ponto percorre o círculo no sentido antihorário, enquanto que nesta parametrização um ponto percorre o círculo no sentido horário), de modo que segue de (1.13) que β (t) = R ( sen t, cos t), β (t) = R ( cos t, sen t), β (t) = R, [ κ (t) = R sen t cos t ] R 3 = 1 R. Este exemplo mostra que o sinal da curvatura não é uma característica intrínseca da curva, pois depende da parametrização. Além disso, o sinal da curvatura não é um invariante geométrico, como veremos (Lema 1.63). 1.33 Exemplo (Curvatura da Parábola). Se é a parábola y = x, de modo que α (t) = ( t, t ), α (t) = (1, t), α (t) = (0, ), α (t) = 1 + 4t,

Rodney Josué Biezuner 17 segue de (1.13) que κ (t) = (1 + 4t ) 3/. Quando t ±, temos κ (t) 0 e a parábola aproxima-se de uma reta. 1.34 Exemplo (Curvatura da Elipse). Se é uma elipse, de modo que segue de (1.13) que α (t) = (x 0 + a cos t, y 0 + b sen t), α (t) = ( a sen t, b cos t), α (t) = ( a cos t, b sen t), α (t) = a sen t + b cos t, κ (t) = ab ( sen t + cos t ) (a sen t + b cos t) 3/ = ab (a sen t + b cos t) 3/. Quando ab ± (o que ocorre quando a, b ou mesmo quando um destes dois coeficientes é fixado e o outro tende a ) a curvatura tende a zero, aproximando-se de uma reta. 1.35 Exemplo (Curvatura da Hipérbole). Se é um ramo de hipérbole, de modo que segue de (1.13) que κ (t) = α (t) = (x 0 + a cosh t, y 0 + b senh t), α (t) = (a senh t, b cosh t), α (t) = (a cosh t, b senh t), α (t) = a senh t + b cosh t, ab ( senh t cosh t ) ( a senh t + b cosh t ) 3/ = ab ( a senh t + b cosh t ) 3/. Quando t ±, temos κ (t) 0 e a curva se aproxima de uma reta. 1.36 Exemplo (Curvatura da Hélice Circular). Se ( α (t) = R cos s R + k, R sen s R + k, é uma parametrização por comprimento de arco da hélice circular, temos T (s) = 1 R + k ( R sen T (s) = R R + k ( cos s R + k, R cos s R + k, sen ) k R + k s, ) s R + k, k, ) s R + k, 0, de modo que κ (s) = T R (s) = R + k. Portanto, a hélice circular também tem curvatura constante. Note que a curvatura da hélice circular é menor que a curvatura do círculo de raio R.

Rodney Josué Biezuner 18 1.3.3 Fórmulas de Frenet para Curvas Planas 1.37 Proposição (Fórmulas de Frenet para Curvas Planas). Seja α : I R n uma curva parametrizada por comprimento de arco com κ 0. Então T (s) = κ (s) N (s), (1.14) Se n = temos N (s) = κ (s) T (s). (1.15) Prova: A primeira fórmula é a definição de curvatura no caso n = e no caso n 3 segue da definição de curvatura e vetor normal: T (s) = T (s) T (s) T = κ (s) N (s). (s) A segunda fórmula também vale para curvas planas em R 3 (veja as Proposições 1.71 e 1.7), mas no momento daremos uma demonstração válida apenas para curvas em R. Como segue que N, N = N = 1, N, N = 0, ou seja, N é ortogonal a N e portanto (em R ) está na direção de T, ou seja, Da definição de N temos que de modo que N = N, T T. N (s) = ( y (s), x (s)) (1.16) N, T = x y + y x = κ. O próximo resultado mostra que a curvatura de fato mede o quanto uma curva deixa de ser uma reta. 1.38 Proposição. Uma curva é uma reta se e somente se κ = 0. Uma curva em R está contida em um círculo de raio R se e somente se κ = 1 R. Prova: Se α : I R n é uma reta parametrizada por comprimento de arco, então com v = 1. Logo, donde α (s) = p 0 + sv α = 0, κ = 0. Reciprocamente, κ = 0 implica α = 0; integrando, obtemos α (s) = p 0 + sv. Se α : I R n é uma curva parametrizada por comprimento de arco tal que α (I) está contida em um círculo de centro p 0 e raio R, então α (s) p 0, α (s) p 0 = α (s) p 0 = R. Derivando esta expressão obtemos α (s), α (s) p 0 = 0;

Rodney Josué Biezuner 19 em particular, α (s) p 0 está na direção de N (s), que é a direção de α (s). Derivando mais uma vez obtemos α (s), α (s) p 0 = α (s), α (s) = α (s) = 1. Concluímos que donde α (s) α (s) p 0 = 1, κ = α (s) = 1 α (s) p 0 = 1 R. Reciprocamente, suponha que κ = 1 (a demonstração para κ = 1/R é análoga). R vetorial f : I R definida por f (s) = α (s) + RN (s). Pelas fórmulas de Frenet temos f (s) = T (s) Rκ (s) T (s) = 0, logo f é uma função constante, digamos f (s) = p 0 para algum ponto fixado p 0 R. Segue então da definição de f que Considere a função α (s) p 0 = R. 1.4 Derivada em R n 1.4.1 Definição 1.39 Definição. Dizemos que uma aplicação F : U R m R n, U aberto, é uma aplicação diferenciável em x U se existe uma transformação linear L : R m R n tal que com F (x + h) = F (x) + Lh + r (h) r (h) lim h 0 h = 0, para todo h R m tal que x + h U. Se F é diferenciável em todo ponto x U, dizemos simplesmente que F é uma aplicação diferenciável. Observe que como todas as normas de R n são equivalentes, não importa a norma usada na definição acima. 1.40 Proposição. Se F é diferenciável em x, então existe uma única transformação linear L tal que F (x + h) = F (x) + Lh + r (h) com r (h) lim h 0 h = 0.

Rodney Josué Biezuner 0 Prova: Para todo t tal que t é suficientemente pequeno, podemos escrever Segue que F (x + te i ) = F (x) + L (te i ) + r (te i ) = F (x) + tle i + r (te i ). Le i = F (x + te i) F (x) t = F (x + te i) F (x) t r (te i) t r (te i) te i. Portanto, tomando o limite de ambos os lados da equação quando t 0, concluímos que F (x + te i ) F (x) Le i = lim. t 0 t O limite no lado direito depende apenas de F e como uma transformação linear é unicamente determinada pelos valores que ela toma nos vetores da base, segue que L é única. 1.41 Definição. Se F : U R m R n, U aberto, é diferenciável no ponto x U, a única transformação linear L : R m R n tal que F (x + h) = F (x) + Lh + r (h) com r (h) lim h 0 h = 0 é chamada a derivada (ou diferencial) de F em x, denotada por df x. 1.4 Definição. Seja F : U R m R n, U aberto, uma aplicação. A derivada parcial de F em x com relação à variável x i é o limite F F (x + te i ) F (x) (x) = lim. x i t 0 t quando ele existir. Mais geralmente, dado um vetor v R m, a derivada direcional de F em x na direção v é o limite quando ele existir. F (x) = lim t 0 F (x + tv) F (x). t 1.43 Proposição. Se F é diferenciável em x, então e df x (e i ) = F x i (x) df x (v) = F (x).

Rodney Josué Biezuner 1 Prova: O primeiro fato segue da demonstração da Proposição 1.40 e o segundo pelo mesmo argumento. Segue que a matriz da diferencial df x em relação à base canônica de R m é [ ] F F df x = (x)... (x) x 1 x m e em relação às bases canônicas de R m e R n é F 1 (x)... x 1 df x =. F n (x)... x 1 ou seja df x = ( ) Fi (x). x j F 1 (x) x m. F, n (x) x m Esta última é chamada a matriz jacobiana de F no ponto x. Se denotarmos as funções coordenadas F por a matriz jacobiana de F é F (x 1,..., x m ) = (y 1 (x 1,..., x m ),..., y n (x 1,..., x m )), df x = y 1 x 1 (x).... y n (x)... x 1 y 1 (x) x m. y. n (x) x m 1.44 Teorema. Seja F : U R m R n, U aberto, uma aplicação. Se F é diferenciável em x, então F é contínua em x. Se as derivadas parciais das funções coordenadas F i existem e são contínuas em x, então F é diferenciável em x j x. Prova: Veja [Lima]. 1.45 Exemplo (Curvas Diferenciáveis e Vetor Tangente). Uma aplicação diferenciável α : I R n é simplesmente uma curva diferenciável. Sua derivada dα t0 : R R n em um ponto t 0 I tem como matriz jacobiana a matriz coluna α 1 t (t 0) α 1 (t 0 ) dα t0 =.. α =., n t (t α n 0) (t 0 ) que age em vetores t de R através de multiplicação por escalar é identificada com o vetor α (t 0 ) = ( (α 1 ) (t 0 ),..., (α n ) (t 0 ) ). Observe que a derivada direcional F (x) de uma aplicação F : U Rm R n é simplesmente o vetor tangente à curva α : I R n definida por em t = 0. α (t) = F (x + tv)

Rodney Josué Biezuner 1.46 Exemplo (Vetor Gradiente). Uma aplicação diferenciável F : U R m R tem como derivada em cada ponto x um funcional linear df x : R m R cuja matriz jacobiana é a matriz linha [ ] F F df x = (x)... (x). x 1 x m Se definirmos o vetor gradiente de F em x como sendo o vetor ( ) F F F (x) = (x),..., (x), x 1 x m a ação do funcional linear df x em vetores v de R m é idêntica ao produto escalar do gradiente F (x) com v, isto é, df x (v) = F (x), v. Ou seja, usamos o produto interno canônico de R m para obter um isomorfismo entre o espaço dual (R m ) e R m e através dele identificar a derivada funcional linear df x com o vetor gradiente F (x). 1.4. Propriedades Derivadas parciais de ordem superior de uma aplicação F : U R m R n, U aberto, α F x i1... x ik (x), onde α = i 1 +... + i k é a ordem da derivada parcial, são definidas indutivamente da maneira óbvia. 1.47 Definição. Seja F : U R m R n, U aberto, uma aplicação diferenciável. Dizemos que ela é uma aplicação de classe C k se ela possui derivadas parciais contínuas até ordem k. Dizemos que ela é uma aplicação de classe C ou suave se ela possui derivadas parciais de todas as ordens. 1.48 Teorema (Regra da Cadeia). Sejam U R m, V R n conjuntos abertos. Se F : U R m R n é diferenciável em x, F (U) V e G : V R n R p é diferenciável em F (x), então a composta G F : U R p é diferenciável em x e d (G F ) x = dg F (x) df x. Prova: Veja [Lima]. Em particular, a matriz jacobiana da composta é o produto das matrizes jacobianas das funções G e F nos pontos apropriados: (G F ) 1 (x)... x 1. (G F ) p (x)... x 1 Portanto, de modo que, denotando (G F ) 1 G (x) 1 x m (F (x))... x 1. =.. (G F ) p G p (x) (F (x))... x m x 1 (G F ) i x j (x) = n k=1 G 1 (F (x)) x n.. G p (F (x)) x n G i x k (F (x)) F k x j (x), F (x 1,..., x m ) = (y 1 (x 1,..., x m ),..., y n (x 1,..., x m )), G (y 1,..., y n ) = (z 1 (y 1,..., y n ),..., z p (y 1,..., y n )), F 1 (x)... x 1.. F n (x)... x 1 F 1 (x) x m.. F. n (x) x m

Rodney Josué Biezuner 3 obtemos a familiar regra da cadeia z i x j = n k=1 z i y k y k x j. 1.49 Corolário. Sejam U, V R n conjuntos abertos. Se F : U V é diferenciável em x e F 1 : V U é diferenciável em F (x), então d ( F 1) F (x) = (df x) 1. Prova: Segue da regra da cadeia aplicada a F F 1 = id e do fato da derivada de aplicação identidade ser a transformação linear identidade. 1.50 Definição. Sejam U, V R n conjuntos abertos. Uma aplicação F : U V é um difeomorfismo de classe C k se F é um homeomorfismo (isto é, uma aplicação bijetiva contínua com inversa contínua) que é uma aplicação diferenciável de classe C k e sua inversa também é uma aplicação diferenciável de classe C k. Se F : U V é um difeomorfismo, segue do corolário anterior que df x é um isomorfismo. Localmente vale a recíproca (Lema 3.16), que efetivamente é a maneira de determinar quando uma aplicação diferenciável é um difeomorfismo. 1.5 Isometrias de R n 1.51 Definição. Uma isometria de R n é uma aplicação F : R n R n que preserva distâncias, isto é, para todos p, q R n. F (p) F (q) = p q O exemplo mais simples de isometria de R n é uma translação, isto é, uma aplicação T : R n R n definida por T (p) = p + c para algum vetor fixo c R n. 1.5 Proposição. Se F, G são isometrias de R n, então a sua composta F G também é uma isometria de R n. Prova: Pois (F G) (p) (F G) (q) = F (G (p)) F (G (q)) = G (p) G (q) = p q. 1.53 Definição. Uma transformação ortogonal é uma aplicação linear F : R n R n que preserva o produto interno, isto é, F (p), F (q) = p, q para todos p, q R n. 1.54 Proposição. Transformações ortogonais são isometrias.

Rodney Josué Biezuner 4 Prova: Se F : R n R n é uma transformação ortogonal, então F (p) F (q) = F (p) F (q), F (p) F (q) = F (p), F (p) F (p), F (q) + F (q), F (q) = p, p p, q + q, q = p q, p q = p q. 1.55 Lema. O produto interno pode ser obtido da norma através das fórmulas v, w = 1 ( v + w v w ) e v, w = 1 ( v + w v w ). 4 Prova: Pois e v + w v w = v + w, v + w v, v w, w = v, v + v, w + w, w v, v w, w = v, w. v + w v w = v + w, v + w v w, v w = v, v + v, w + w, w [ v, v v, w + w, w ] = 4 v, w 1.56 Proposição. Isometrias F : R n R n tais que F (0) = 0 são transformações ortogonais. Prova: Passo 1. F (p) = p para todo p R n. Pois F (p) = F (p) F (0) = p 0 = p. Passo. F preserva o produto interno. Pois F (p), F (q) = 1 ( F (p) F (q) F (p) F (q) ) = 1 ( p q p q ) = p, q. Passo 3. F é linear. Para todos p, q R n e para todos α, β R temos F (αp + βq) αf (p) βf (q) = F (αp + βq) αf (p) βf (q), F (αp + βq) αf (p) βf (q) = F (αp + βq), F (αp + βq) α F (αp + βq), F (p) β F (αp + βq), F (q) + α F (p), F (p) + αβ F (q), F (q) + β F (q), F (q) = αp + βq, αp + βq α αp + βq, p β αp + βq, q + α p, p + αβ q, q + β q, q = αp + βq αp βq = 0,

Rodney Josué Biezuner 5 logo F (αp + βq) = αf (p) + βf (q). 1.57 Teorema. Se F : R n R n é uma isometria, então existe uma única transformação ortogonal L e uma única translação T tais que F = T L. Prova: (Existência) Seja T : R n R n a translação T (p) = p + F (0). Então T 1 F : R n R n é uma isometria tal que ( T 1 F ) (0) = T 1 (F (0)) = F (0) F (0) = 0, de modo que pelo resultado anterior L := T 1 F é uma transformação ortogonal. (Unicidade) Se L 1, L são transformações ortogonais e T 1, T são translações tais que F = T 1 L 1 = T L, então L 1 L 1 = T1 1 T. Em particular, T1 1 T é uma aplicação linear e como aplicações lineares deixam o vetor nulo fixo, segue que T1 1 T é a translação nula, isto é, a identidade. Logo, T 1 1 T = id = T 1 = T, L 1 L 1 = id = L 1 = L. 1.58 Corolário. Se F : R n R n é uma isometria com F = T L, onde L é uma transformação ortogonal e T é uma translação, então df p = L. Em particular, F é diferenciável de classe C, sua derivada é uma transformação ortogonal e para todos v, w R n. df p (v), df p (w) = v, w Prova: Note que a derivada de uma transformação linear é ela própria e a derivada de uma translação é a identidade. Daí, pela regra da cadeia, 1.59 Teorema. Sejam p 0, q 0 R n e df p = d (T L) p = dt L(p) dl p = id L = L. B 1 = {e 1,..., e n }, B = {f 1,..., f n } bases ortonormais de R n. Então existe uma única isometria F : R n R n tal que e F (p 0 ) = q 0 df p (e i ) = f i para todo i.

Rodney Josué Biezuner 6 Prova: Sejam L : R n R n a única aplicação linear tal que L (e i ) = f i para todo i e T : R n R n a translação tal que T (L (p 0 )) = q 0, ou seja, T (p) = p + (q 0 L (p 0 )). Pelo Teorema 1.57 e pelo corolário anterior F = T L é a única isometria que satisfaz as condições do enunciado. 1.60 Definição. Dizemos que duas bases de R n tem a mesma orientação se B 1 = {e 1,..., e n } e B = {f 1,..., f n } sign (det [e 1... e n ]) = sign (det [f 1... f n ]). Dizemos que uma isometria F : R n R n preserva orientação se e {e 1,..., e n } {df p (e 1 ),..., df p (e n )} tem a mesma orientação para toda base {e 1,..., e n } de R n. Caso contrário, dizemos que F reverte orientação. Como isometrias levam bases ortonormais em bases ortonormais, uma isometria preservar orientação é equivalente a exigir que det [df p (e 1 )... df p (e n )] = det [e 1... e n ] para toda base ortonormal {e 1,..., e n } de R n. Note que uma isometria em R 3 preserva orientação se e somente se df p (e 1 ) df p (e ), df p (e 3 ) = e 1 e, e 3 para toda base ortonormal {e 1, e.e 3 } de R n. 1.61 Proposição. Se L é uma transformação ortogonal, então Em particular, Portanto, L preserva orientação se e somente se Prova: Seja L 1 = L T. det L = ±1. det L = 1. B = {e 1,..., e n } a base canônica de R n. Escreva a matriz de L em relação à B no formato em colunas L = [L 1... L n ], o que é equivalente a L i = Le i.

Rodney Josué Biezuner 7 Então a matriz de L T em relação à B no formato em linhas é L T = Por definição do produto matricial e pelo fato que L preserva o produto interno, temos ( L T L ) ij = L i, L j = Le i, Le j = e i, e j = δ ij, L 1. L n. isto é, Daí, donde det L = ±1. LL T = id. 1 = det (id) = det ( LL T ) = det L det ( L T ) = (det L) (det L) = (det L), 1.6 Teorema Fundamental das Curvas no Plano 1.6 Definição. Dizemos que duas curvas α, β : I R n são congruentes se existe uma isometria F de R n tal que α = F (β). 1.63 Lema. Curvas congruentes em R n, n 3, possuem a mesma curvatura. Em R, curvas congruentes por uma isometria que preserva orientação possuem a mesma curvatura; curvas congruentes por uma isometria que reverte orientação possuem curvatura iguais, mas de sinais opostos. Prova: Sejam α, β : I R n curvas congruentes e F uma isometria de R n tal que α = F (β). Pela regra da cadeia e pela caracterização das isometrias de R n, onde L é uma transformação ortogonal, donde α (t) = df β(t) β (t) = Lβ (t), α (t) = β (t). Portanto, uma reparametrização de β por comprimento de arco também implicará em uma reparametrização de α por comprimento de arco. Assim, sem perda de generalidade, podemos assumir que as duas curvas estão parametrizadas por comprimento de arco, de modo que para todo s. Além disso, derivando T α (s) = α (s) = β (s) = T β (s) = 1 T α (s) = α (s) = Lβ (s) = LT β (s), obtemos donde o que implica, se n 3, T α (s) = LT β (s), T α (s) = T β (s) κ α (s) = κ β (s).

Rodney Josué Biezuner 8 No caso n =, se F preserva orientação, então Se F reverte orientação, então κ α = T α, N α = LT β, LN β = T β, N β = κβ. κ α = T α, N α = LT β, LN β = T β, N β = κβ. No caso de curvas em R vale a recíproca: duas curvas que possuem a mesma curvatura são congruentes. Mais que isso, curvas parametrizadas por comprimento de arco que possuem os mesmos ponto inicial, vetor tangente inicial e curvatura são idênticas. 1.64 Teorema. Dados uma função contínua κ : I R, um ponto p R e um vetor unitário v R, e fixado s 0 I, existe uma única curva continuamente diferenciável parametrizada por comprimento de arco α : I R tal que a curvatura de α é κ, α (s 0 ) = p e α (s 0 ) = v. Duas curvas α, β : I R que possuem a mesma curvatura são congruentes. Prova: Observe que qualquer curva parametrizada por comprimento de arco α : I R, α (s) = (x (s), y (s)), satisfaz pela primeira equação de Frenet T = κn (x, y ) = κ ( y, x ), isto é, as funções x, y satisfazem o sistema de equações diferenciais ordinárias lineares de segunda ordem { x = κy, y = κx. Pelo Teorema de Existência e Unicidade para Equações Diferenciais Ordinárias Lineares, dados uma função contínua κ : I R, um ponto p = (x 0, y 0 ) R e um vetor v = (v 1, v ) R, existe uma única solução continuamente diferenciável α : I R para o sistema acima satisfazendo (x (s 0 ), y (s 0 )) = (x 0, y 0 ), (x (s 0 ), y (s 0 )) = (v 1, v ). No caso de curvas no plano, a solução para este sistema pode ser obtida de maneira explícita por integração simples, mostrando além disso de um modo mais simples que esta solução é parametrizada por comprimento de arco (compare a demonstração dada aqui com a demonstração do Teorema Fundamental das Curvas no Espaço (Teorema 1.76)). De fato, seja p 0 = (x 0, y 0 ). Defina uma função θ : I R por θ (s) = θ 0 + s s 0 κ (s) ds onde v = (cos θ 0, sen θ 0 ), e uma curva α : I R, α (s) = (x (s), y (s)), por Como segue que x (s) = x 0 + y (s) = y 0 + s s 0 cos θ (t) dt, s s 0 sen θ (t) dt. α (s) = (x (s), y (s)) = (cos θ (s), sen θ (s)), α (s 0 ) = (cos θ (s 0 ), sen θ (s 0 )) = (cos θ 0, sen θ 0 ) = v

Rodney Josué Biezuner 9 e α (s) = 1, para todo s, ou seja, α é uma curva parametrizada por comprimento de arco; em particular, T (s) = α (s). Logo, N (s) = ( sen θ (s), cos θ (s)), de modo que N (s) = ( cos θ (s) θ (s), sen θ (s) θ (s)) = κ (s) (cos θ (s), sen θ (s)) = κ (s) T (s) e portanto α tem curvatura κ. A unicidade desta solução está garantida pelo teorema de unicidade de soluções para equações diferenciais ordinárias lineares considerado acima. Para terminar a demonstração do teorema, sejam α, β : I R duas curvas que possuem a mesma curvatura. Seja F uma isometria do plano tal que (F β) (s 0 ) = F (β (s 0 )) = α (s 0 ), (F β) (s 0 ) = df β(s0)β (s 0 ) = α (s 0 ), Como a curvatura é invariante por isometria, a curva β (s) = (F β) (s) é uma curva parametrizada por comprimento de arco com a mesma curvatura que β, e portanto com a mesma curvatura que α, que possui os mesmos pontos inicial e vetor tangente, logo pelo resultado anterior é α. 1.7 Torção e Triedro de Frenet 1.7.1 Definição Curvas espaciais não podem ser caracterizadas apenas pela curvatura. Além da mudança de direção do vetor tangente, o plano formado pelos vetores tangente e normal também muda de direção. Para medir a mudança na direção deste plano consideramos o vetor normal a este plano: 1.65 Definição. Seja α : I R 3 uma curva parametrizada por comprimento de arco. Definimos o vetor binormal à curva no ponto α (s) por B (s) = T (s) N (s). (1.17) Desta forma, os vetores T, N, B formam um referencial ortonormal em R 3, chamado o triedro de Frenet. Segue imediatamente que T (s) = N (s) B (s), (1.18) N (s) = B (s) T (s). (1.19) 1.66 Lema (Regra do Produto para o Produto Vetorial). Sejam V, W : I R 3 funções vetoriais diferenciáveis e considere a função vetorial F : I R 3 definida por F (t) = V (t) W (t). Então F (t) = V (t) W (t) + V (t) W (t).

Rodney Josué Biezuner 30 Prova: Escrevendo as funções V e W em coordenadas como temos V (t) W (t) = i j k V 1 (t) V (t) V 3 (t) W 1 (t) W (t) W 3 (t) V (t) = (V 1 (t), V (t), V 3 (t)), W (t) = (W 1 (t), W (t), W 3 (t)), = (V (t) W 3 (t) V 3 (t) W (t), V 3 (t) W 1 (t) V 1 (t) W 3 (t), V 1 (t) W (t) V (t) W 1 (t)). Logo, pela regra do produto temos F = (V W 3 + V W 3 V 3W V 3 W, V 3W 1 + V 3 W 1 V 1W 3 V 1 W 3, V 1W + V 1 W V W 1 V W 1) = (V W 3 V 3W, V 3W 1 V 1W 3, V 1W V W 1 ) + (V W 3 V 3 W, V 3 W 1 V 1 W 3, V 1 W V W 1) = V W + V W. 1.67 Proposição. Seja α : I R 3 uma curva parametrizada por comprimento de arco. O vetor B (s) é ortogonal ao vetor tangente T (s) e ao vetor binormal B (s), isto é, para todo s. Em particular, o vetor B (s) é paralelo ao vetor normal N (s). Prova: Pela regra do produto para o produto vetorial, temos de modo que B (s) T (s). Além disso, como T (s), B (s) = 0, (1.0) B (s), B (s) = 0, (1.1) B (s) = T (s) N (s) + T (s) N (s) = κ (s) N (s) N (s) + T (s) N (s) = T (s) N (s), B (s), B (s) = B (s) = 1, segue da regra do produto para o produto escalar que B (s), B (s) = 0. Em vista do resultado anterior, definimos o conceito de torção, que mede o quanto uma curva deixa de ser plana: 1.68 Definição. Seja α : I R 3 uma curva parametrizada por comprimento de arco. Definimos a torção de α no ponto α (s) por B (s) = τ (s) N (s). (1.) Em outras palavras, Observe que mas a torção pode ser positiva, negativa ou nula. τ (s) = B (s), N (s). (1.3) τ (s) = B (s), (1.4)