AULA 2: CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE 3

Documentos relacionados
ARTIGO: O controle incidental e o controle abstrato de normas

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

CARLOS MENDONÇA DIREITO CONSTITUCIONAL

CAPÍTULO 1: NOTAS INTRODUTÓRIAS...1

DIREITOS COLETIVOS E CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE II. Professor Juliano Napoleão

Controle da Constitucionalidade

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

PROCESSO CONSTITUCIONAL PROF. RENATO BERNARDI

PROF. JEFERSON PEDRO DA COSTA CURSO: CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Sumário. Proposta da Coleção Leis Especiais para Concursos Capítulo I

CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE. O controle de constitucionalidade difuso está presente no ordenamento jurídico

DIREITO CONSTITUCIONAL

Aula 10. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE: TEORIA GERAL (continuação)

CONTROLE ABSTRATO. Jurisdição Constitucional Profª Marianne Rios Martins

PROF. RAUL DE MELLO FRANCO JR. UNIARA

SUMÁRIO. Capítulo 2 História Constitucional Brasileira O império... 83

Direito Constitucional Procurador Legislativo 1ª fase

Aula 04 CONTROLE DIFUSO ANÁLISE TEÓRICA

DIREITO CONSTITUCIONAL CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

2. O Supremo Tribunal Federal: cúpula do Poder Judiciário e Corte Constitucional PARTE I EFICÁCIA DAS DECISÕES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Sumário 1. CONSTITUCIONALISMO,CONSTITUIÇÃO E CLASSIFICAÇÕES

LISTA DE ABREVIATURAS UTILIZADAS INTRODUÇÃO Capítulo 1 FUNDAMENTOS TEÓRICOS DO PROCESSO LEGISLATIVO... 25

Como pensa o examinador em provas para a Magistratura do TJ-RS? MAPEAMENTO DAS PROVAS - DEMONSTRAÇÃO -

decisões definitivas de mérito Supremo Tribunal Federal

Instituições de direito FEA

) Conforme entendimento doutrinário, jurisprudencial e legislativ o cabe ação direta de inconstitucionalidade de: Exceto.

Exercícios de Fixação Controle de Constitucionalidade

Sumário PROPOSTA DA COLEÇÃO LEIS ESPECIAIS PARA CONCURSOS... 15

Processo Legislativo II. Prof. ª Bruna Vieira

Controle da Constitucionalidade

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade

BuscaLegis.ccj.ufsc.br

Aula 07 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. De forma geral, as características da ação direta de inconstitucionalidade são:

Sumário. A importância da Lei na sociedade contemporânea... 21

Direito Constitucional Marcelo Leonardo Tavares

Bem Vindo a mais um CURSO da

Direito Constitucional III

Questão 1. Em relação ao controle repressivo de constitucionalidade das leis é correto afirmar:

LISTA DE ABREVIATURAS UTILIZADAS INTRODUÇÃO Capítulo 1 FUNDAMENTOS TEÓRICOS DO PROCESSO LEGISLATIVO... 25

A CASA DO SIMULADO DESAFIO QUESTÕES MINISSIMULADO 11/360

a) V, F, V, V. b) F, V, V, V. c) V, V, F, F. d) V, V, F, V. Dica: Aula 01 e Apostila 01 FIXAÇÃO

CONTROLE ASPECTOS DE UMA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: UMA DISPUTA DE PARADIGMAS TEORIA GERAL DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE...

Professor Otávio Piva

DIREITO CONSTITUCIONAL

CONSTITUIÇÃO E SUPREMACIA CONSTITUCIONAL...

Sumário. Parte 1 Teorias e doutrinas relacionadas ao estudo da Constituição

DIREITO CONSTITUCIONAL O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DOS ATOS NORMATIVOS

0 % das questões (0 de 20)

Bloco 1. CURSO DE PROCESSO LEGISLATIVO CONSTITUCIONAL E REGIMENTAL Prof. Gabriel Dezen Junior. Responda às questões:

PROVA DAS DISCIPLINAS CORRELATAS DIREITO CONSTITUCIONAL

1 Direito processual constitucional, 7

Capítulo I CONSTITUIÇÃO E SUPREMACIA CONSTITUCIONAL Capítulo II CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE: A GARANTIA DA SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO...

(TRT-RJ / TÉCNICO JUDICIÁRIO ÁREA ADMINISTRATIVA / CESPE / 2008) DIREITO CONSTITUCIONAL

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ÓRGÃO ESPECIAL

ADIn genérica Material para acompanhamento de aulas, Professor Luiz Marcello de Almeida Pereira

ASPECTOS DE UMA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: UMA DISPUTA DE PARADIGMAS...

A CASA DO SIMULADO DESAFIO QUESTÕES MINISSIMULADO 113/360

PROF. JOSEVAL MARTINS VIANA

TEMA 14: CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

CENTRO UNIVERSITÁRIO AUGUSTO MOTTA VICE-REITORIA ACADÊMICA. DISCIPLINA Teoria da Constituição e Organização do Estado

INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE ALCANCE DA NORMA CONTIDA NO ART. 481, PARÁGRAFO ÚNICO DO CPC, ACRESCENTADO PELA LEI Nº 9.756/98

A proteção dos direitos fundamentais. Professora Adeneele Garcia Carneiro

Cronograma de Trabalho

4 PODER LEGISLATIVO 4.1 PERDA DOS MANDATOS DOS PARLAMENTARES CONDENADOS CRIMINALMENTE 14, 3º, II,

PONTO 1: Poder Constituinte PONTO 2: Poder Reformador PONTO 3: Poder Constituinte Decorrente 1. PODER CONSTITUINTE NATUREZA DO PODER CONSTITUINTE:...

3. OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Controle da Constitucionalidade

Ano: 2015 Banca: FGV Órgão: TJ-PI Prova: Analista Judiciário - Analista Administrativo

DIREITO CONSTITUCIONAL

Controle da Constitucionalidade. Teoria e Evolução. Curitiba. Juruá Editora (81) H474c

Aula 27 PROCESSO LEGISLATIVO. Tais atos normativos formalmente primários, que derivam diretamente da Constituição, estão previstos no art. 59.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

CEM CADERNO DE EXERCÍCIOS MASTER. Controle de Constitucionalidade CESGRANRIO

HERMENÊUTICA. Elementos de interpretação tradicionais. Princípios de interpretação constitucional

O CONTROLE EXTERNO DO EXECUTIVO.

Aula 01 TEORIA GERAL DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE 1

Sumário. Sobre o autor... 5 Agradecimentos Nota à sétima edição Prefácio... 21

Decisões do STF: efeitos vinculantes, efeitos expansivos e o CPC/2015

Controle de Constitucionalidade. - Busca retirar do ordenamento jurídico lei ou ato normativo viciado (formal ou materialmente)

QUESTÕES OAB SEGUNDA FASE CONSTITUCIONAL BLOCO I CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

PONTO 1: Controle de Constitucionalidade 1. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Parte geral e controle difuso Material para acompanhamento de aulas, Professor Luiz Marcello de Almeida Pereira

ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL XX EXAME DE ORDEM UNIFICADO

DIREITO ADMINISTRATIVO Controle da Administração Pública. Prof. Luís Gustavo. Fanpage: Luís Gustavo Bezerra de Menezes

DIREITOS HUMANOS E A CONSTITUIÇÃO

Prefácio Nota do autor Parte I Introdução ao controle

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE AULA 6. Prof. Eduardo Casassanta

Sumário. Questões Capítulo Questões Múltipla Escolha Certo ou Errado Gabarito...61

LIMITES DE ATUAÇÃO DO CARF

Sumário. Questões Capítulo Questões Múltipla Escolha Certo ou Errado Gabarito...60

CONTROLE DIFUSO. Jurisdição Constitucional Profª Marianne Rios Martins

Sumário CAPÍTULO I TEORIA DA CONSTITUIÇÃO E DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS... 13

DIREITO ADMINISTRATIVO Controle da Administração Pública. Prof. Luís Gustavo. Fanpage: Luís Gustavo Bezerra de Menezes

AÇÃO DECLATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. Jurisdição Constitucional Profª Marianne Rios Martins

Súmario CAPÍTULO I TEORIA DA CONSTITUIÇÃO E DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS... 13

DIREITO CONSTITUCIONAL

TEMA 16: CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

9. HABEAS DATA Breve introdução Cabimento

Transcrição:

1

AULA 2: CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE 3 INTRODUÇÃO 3 CONTEÚDO 4 SISTEMAS DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE EM PERSPECTIVA COMPARADA 5 JUDICIAL REVIEW: O SISTEMA DIFUSO NORTE-AMERICANO 5 O SISTEMA AUSTRÍACO OU EUROPEU DE CONSTITUCIONALIDADE (CONTROLE ABSTRATO) O MODELO FRANCÊS DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE (CONTROLE POLÍTICO)10 OS SISTEMAS DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA ALEMANHA E DA ITÁLIA (CONTROLE CONCENTRADO E INCIDENTAL) 12 VISÃO PANORÂMICA DO SISTEMA BRASILEIRO DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE CONTROLE PREVENTIVO DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS NO DIREITO BRASILEIRO CONTROLE PREVENTIVO POLÍTICO 17 CONTROLE PREVENTIVO JUDICIAL 19 CONTROLE REPRESSIVO POLÍTICO 22 ATIVIDADE PROPOSTA 24 REFERÊNCIAS 24 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 25 8 13 17 CHAVES DE RESPOSTA 28 ATIVIDADE PROPOSTA 28 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 28 2

Introdução Nos últimos anos, notadamente a partir da redemocratização do país com a promulgação da Constituição de 1988, tem-se observado a expansão da jurisdição constitucional, cabendo ao Supremo Tribunal Federal papel ativo na proteção dos direitos fundamentais e na garantia da força normativa da Constituição. Nesse sentido, temos um dos sistemas de controle de constitucionalidade mais completos e complexos do mundo. Assim sendo, na presente aula, vamos estudar as diferentes modalidades de controle de constitucionalidade deste complexo sistema brasileiro, desde o controle prévio ou preventivo (feito antes mesmo de a norma entrar no mundo jurídico) até o controle repressivo, seja na esfera política, seja na esfera judicial. Com efeito, o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade merece tal designação, na medida em que mescla o controle difuso norte-americano (judicial review), o controle abstrato (sistema austríaco - kelseniano) e o modelo político francês. Sendo assim, é objetivo desta aula: 1. Analisar as modalidades de controle de constitucionalidade que levam em consideração diferentes critérios atinentes ao momento de realização do controle, à natureza do órgão controlador, ao órgão judicial que exerce o controle e à forma de controle judicial. 3

Conteúdo O sistema brasileiro de controle de constitucionalidade é um dos mais complexos e completos do mundo, na medida em que optamos por combinar diferentes modelos ou paradigmas de controle de outros países, bem como criamos figuras jurídicas que nos são peculiares, como, por exemplo, a ação 4

declaratória de constitucionalidade (ADC) e a arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). Com efeito, diversos fatores permitem afirmar que o Brasil ostenta o mais perfeito sistema de controle de constitucionalidade do mundo, entre eles o aspecto indelével da completude. Sem nenhuma dúvida, existem diversos mecanismos, situações, oportunidades e instrumentos de controle de constitucionalidade que só se encontram no Brasil, não se tendo notícia de similares no resto do mundo. Vale, pois, adentrar ao estudo do direito comparado. Sistemas de Controle de Constitucionalidade em Perspectiva Comparada O sistema brasileiro de controle de constitucionalidade é fruto da imbricação de diferentes sistemas de controle existentes no mundo atual, daí a importância de investigar as principais características dos modelos adotados nos Estados Unidos, na França e na Áustria (sistema kelsiano-europeu). Judicial Review: o Sistema Difuso Norte-Americano Nesta segmentação temática, vamos examinar a primeira influência que vem do sistema norte-americano, que se caracteriza pelo controle de constitucionalidade feito por todos os graus de jurisdição do poder judiciário e dentro de um determinado caso concreto. Trata-se do controle difuso de constitucionalidade, também denominado de arguição incidenter tantum ou arguição incidental de inconstitucionalidade. Assim, a primeira nota relevante do sistema dos Estados Unidos é que todo e qualquer órgão jurisdicional tem competência para efetuar o controle de constitucionalidade das leis e demais atos do Poder Público a partir de um caso concreto. 5

É o chamado judicial review que surge em 1803, no célebre caso Marbury v. Madison, no qual o Justice John Marshall deixou de aplicar uma lei infraconstitucional por julgá-la violadora da Constituição. E assim é que, a partir deste caso, consagra-se a supremacia da Constituição em face do ordenamento jurídico como um todo. Compete ao magistrado e, portanto, a qualquer órgão do poder judiciário, deixar de aplicar normas infraconstitucionais incompatíveis com a norma jurídica superior. No dizer de Luis Roberto Barroso: Marburyv. Madison, portanto, foi a decisão que inaugurou o controle de constitucionalidade no constitucionalismo moderno, deixando assentado o princípio da supremacia da Constituição, da subordinação a ela de todos os Poderes estatais e da competência do Judiciário como seu intérprete final, podendo invalidar os atos que lhe contravenham. Na medida em que se distanciou no tempo da conjuntura turbulenta em que foi proferida e das circunstâncias específicas do caso concreto, ganhou maior dimensão, passando a ser celebrada universalmente como o precedente que assentou a prevalência dos valores permanentes da Constituição sobre a vontade circunstancial das maiorias legislativas. 1 Nesse sentido, desponta o tão propalado controle difuso de constitucionalidade das leis, feito por qualquer juiz ou tribunal, dentro de um determinado caso concreto e onde a questão da constitucionalidade ou não do ato normativo não é a questão principal do processo, constituindo-se em mera questão incidental necessária para a fixação da norma-decisão solucionadora da lide. Concreto pelo fato de que a discussão acerca da constitucionalidade da norma se dá com vistas à solução da causa a ser julgada; e não abstratamente. 1 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. Exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. Rio de Janeiro: Saraiva, 2009. p. 10. 6

Um ponto importante de perscrutação no direito comparado está relacionado aos efeitos da decisão final de mérito da Corte Suprema no controle difuso. Como evidencia a figura abaixo, nos Estados Unidos, predomina a ideia-força do chamado stare decisis, isto é, o efeito vinculante das decisões da Suprema Corte em relação aos demais órgãos do poder judiciário e da administração pública, direta e indireta. Ou seja, no âmbito do judicial review norte-americano, a declaração de inconstitucionalidade feita pela Corte Máxima do país retira a norma do mundo jurídico, pois tal decisão tem efeitos vinculantes, contra todos (erga omnes). E assim é que, a partir de um caso concreto, de um processo subjetivo de controle de constitucionalidade, declara-se, com efeitos vinculantes e contra todos, uma determinada norma ou lei inconstitucional, acarretando, por via de consequência, a sua retirada do ordenamento jurídico como um todo. Assim, mesmo em se tratando de controle incidental, difuso, indireto, a decisão a partir da concepção do stare decisis ganha efeitos abstratos e gerais. Diferentemente, quando se fala em controle concreto de constitucionalidade no Brasil, a decisão final de mérito do Supremo Tribunal Federal tem apenas efeitos inter partes, cabendo ao Senado Federal, nos termos do artigo 52, inciso X, editar resolução suspensiva retirando a norma do mundo jurídico. Esta temática será retomada ao longo dos próximos capítulos, porém, impende aqui destacar bem essa RELEVANTE diferença entre o sistema brasileiro e o judicial review estadunidense. 7

O Sistema Austríaco ou Europeu de Constitucionalidade (controle abstrato) O sistema austríaco ou europeu ou kelseniano de constitucionalidade foi concebido, em 1920, com o objetivo de colocar o controle de constitucionalidade das leis e atos normativos do poder público sob a égide de um Tribunal Constitucional, órgão de cúpula do Poder Judiciário. Dessarte, a tarefa de controlar a constitucionalidade das leis é exclusiva dessa Corte Constitucional, o que evidentemente afasta os demais órgãos do poder judiciário de tal controle, proibindo-os de declararem a inconstitucionalidade das leis em nome do princípio da presunção de constitucionalidade das leis. Somente ao Tribunal Constitucional, em atuação principal e abstrata, é dado revogar tal presunção, daí, por conseguinte, a ideia-força de controle concentrado, abstrato, objetivo e direto de constitucionalidade das leis e atos normativos do Poder Público. Enfim, no modelo austríaco de controle de constitucionalidade das leis, não há caso concreto, a constitucionalidade é aferida pelo Tribunal Constitucional de forma objetiva, abstrata e direta. Foi Jellinek o grande mentor do sistema constitucional de controle concentrado em oposição ao judicial review estadunidense. Jellinek concordou com a decisão de Marshall no caso Marbury x Madison, porém discordou que o controle fosse feito pelos juízes e tribunais, tendo em vista as discrepâncias de decisões entre diferentes julgadores. É nesse sentido a recomendação de que o controle fosse feito pela Corte Constitucional, órgão cupular do poder judiciário e criado especificamente para executar essa tarefa de fiscalizar as leis do Parlamento. 2 Em linhas gerais, vale fazer agora uma análise comparativa entre o judicial review norte-americano e o sistema austríaco ou europeu: 2 DIMOULIS, Dimitri; LUNARDI, Soraya. Curso de processo constitucional. Controle de constitucionalidade e remédios constitucionais. São Paulo: Atlas, 2011. p. 47. 8

Sistema americano: todos os órgãos jurisdicionais estão autorizados a efetuar o controle de constitucionalidade (o controle é difuso); Sistema austríaco: o controle de constitucionalidade é tarefa exclusiva do Tribunal Constitucional (controle concentrado num órgão cupular do Judiciário); Sistema americano: o controle de constitucionalidade surge na solução de um caso concreto sobre o qual se cogita aplicar uma determinada lei justamente a que se discute quanto à sua constitucionalidade (controle concreto subjetivo); Sistema austríaco: a análise de constitucionalidade é feita da lei em tese, não vinculada a um determinado caso concreto (o controle abstrato e objetivo); Sistema americano: a questão constitucional não passa de uma parte do fundamento da decisão apoiada nas articulações do autor, do réu, do Ministério Público ou mesmo de ofício pelo juiz, figurando como um obstáculo a ser vencido pelo julgador para que a solução dada à lide específica não termine por afrontar o texto constitucional; Sistema austríaco: a questão constitucional é a única que se discute na ação, habitando, pois, tanto a fundamentação (sem o que não seria possível quebrar a presunção de constitucionalidade das leis) quanto o decisum (parte dispositiva da sentença) do acórdão do Tribunal Constitucional. Exemplo: O quadro abaixo sintetiza as modalidades de jurisdição, concreta e abstrata. 9

Jurisdição Constitucional Concreta O controle de constitucionalidade desenvolvido no âmbito do Poder Judiciário pode levar em consideração a incidência da norma constitucional numa dada relação jurídica concreta, real. Jurisdição Constitucional Abstrata O controle de constitucionalidade desenvolvido no âmbito do Poder Judiciário pode avaliar a compatibilidade de uma norma com a Constituição sem vinculação a um caso concreto, ou seja, de forma abstrata, em tese. O Modelo Francês de Controle de Constitucionalidade (controle político) A doutrina costuma afirmar que, na França, impera o controle político e preventivo de constitucionalidade feito exclusivamente pelo poder legislativo, o que significa dizer por outras palavras que não há controle jurisdicional feito pelo poder judiciário, inabilitado que está para declarar a inconstitucionalidade das leis francesas. Com efeito, na França, é o Conselho Constitucional, o órgão encarregado de examinar previamente a constitucionalidade dos projetos de lei que tramitam no Parlamento, o que evidentemente faz com que o controle francês seja classificado como controle preventivo e político (feito por uma entidade que não é um órgão de jurisdição constitucional). O Conselho Constitucional está ligado ao Parlamento da França, sendo que seus nove conselheiros são escolhidos pelo próprio Parlamento e pelo Presidente da República, aí incluídos os ex-presidentes. No dizer de Luis Roberto Barroso: 10

Embora o modelo francês seja frequentemente referido como o arquétipo do controle político de constitucionalidade das leis, afigura-se mais apropriada a designação de controle não judicial. É que, no fundo, é o fato de não integrar o Poder Judiciário e de não exercer função jurisdicional o que mais notadamente singulariza o Conseil Constitutionnel junto com o caráter prévio de sua atuação. 3 Além disso, é importante destacar que o Conselho Constitucional é um órgão que não delibera sobre a conveniência e/ou oportunidade da proposta legislativa (não faz aferição de natureza política), mas verifica tão somente a constitucionalidade ou não dos projetos de lei que lhe são apresentados. Ou seja, o Conselho Constitucional afere previamente as propostas legislativas com o desiderato de verificar se existe alguma inconstitucionalidade. Essa ideia de controle não judicial (político para a grande maioria da doutrina) tem razões históricas e filosóficas, como bem destaca Luis Roberto Barroso, isto é, remonta ao período revolucionário de grande desconfiança por parte do povo em relação ao poder de juízes e tribunais, daí a visão de controle político, não judicial, de constitucionalidade. Um ponto importante no que tange à classificação do sistema de controle de constitucionalidade francês é levantado pelo Ministro Gilmar Mendes. Para o autor, essa referência de controle prévio e estritamente político não é mais condizente com a nova realidade dominante na França a partir da lei de reforma constitucional n. 724, de 23 de julho de 2008. Nas palavras de Gilmar Mendes: Ao lado do art. 61 da Constituição francesa de 1958, foi adicionado o art. 61-1, que autoriza o Conselho Constitucional, em face de uma disposição de lei 3 DIMOULIS, Dimitri; LUNARDI, Soraya. Curso de processo constitucional. Controle de constitucionalidade e remédios constitucionais. São Paulo: Atlas, 2011. p. 43. 11

que atente contra os direitos e liberdades que a Constituição garante, e quando provocado pelo Conselho de Estado ou pela Corte de Cassação, a declarar a inconstitucionalidade da norma. 4 Em suma, a doutrina costuma classificar o modelo francês como sendo um arquétipo de controle preventivo e político de constitucionalidade, pois é exercido antes de se concluir o processo legislativo relativo ao ato controlado e, ainda, levado a cabo pelo próprio Poder Legislativo, através do Conselho Constitucional. Essa classificação é contestada com propriedade pelo Ministro Gilmar Mendes, a partir da lei de reforma constitucional de 2008, que permite o controle repressivo de constitucionalidade (controle feito depois de a norma já estar no mundo jurídico). Os Sistemas de Controle de Constitucionalidade da Alemanha e da Itália (controle concentrado e incidental) Na Alemanha e na Itália, o que ocorre é uma mistura dos sistemas de controle jurisdicional americano e austríaco. Isto pelo fato de que a tarefa de controlar a constitucionalidade das leis naqueles países só pode ser desempenhada pelos respectivos tribunais constitucionais. No entanto, isso decorre de um incidente ocorrido no bojo dos processos comuns, onde se discute acerca da aplicação de uma norma na solução da lide específica. Significa que, se, por exemplo, o juiz de primeira instância se depara com uma arguição de inconstitucionalidade e entende que a mesma tem procedência, dada a sua incompetência funcional para afastar a sua incidência, ele provoca a atuação do Tribunal Constitucional, que se pronunciará sobre a constitucionalidade ou não da norma, devolvendo a sua 4 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 1010. 12

conclusão ao juízo a quo, para que este, com base naquele pronunciamento, decida a causa. Temos, então, que o controle de constitucionalidade na Alemanha e na Itália é concentrado, mas incidental. O que ainda se pode questionar é sobre se ele é feito de forma concreta ou abstrata. A dúvida se deve ao fato de que, muito embora a análise da constitucionalidade da lei derive da necessidade de se julgar uma determinada lide concreta, o que se destaca do processo é apenas a questão constitucional, que deverá ser analisada pelo Tribunal Constitucional de forma abstrata, pois que essa decisão terá efeitos vinculantes para todas as demais situações. Por esse motivo, ela não pode se dirigir apenas à solução da causa que motivou a sua prolação, devendo assumir foro de abstração, para que possa ser aplicada às demais situações, ainda que, por certos aspectos, sejam diferentes e reclamem a incidência da norma controlada. Uma vez identificados os principais modelos em perspectiva comparada, é importante agora apresentar o complexo sistema brasileiro de controle de constitucionalidade. Visão Panorâmica do Sistema Brasileiro de Controle de Constitucionalidade Como já amplamente mencionado, o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade abarca, ainda que de modo não rigorosamente igual, as características dos sistemas francês, americano, austríaco, italiano e alemão. Por isso, existe no Brasil uma plêiade de modalidades de controle de constitucionalidade, que vai desde o controle preventivo, seja político, seja judicial, até o controle repressivo, que no âmbito do controle judicial, ocorre nas modalidades difusa e concentrada, incidental e principal e, ainda, concreta e abstrata. 13

Quanto ao momento de realização do controle Quanto à natureza do órgão controlador Controle Preventivo - feito antes de a norma entrar no mundo jurídico. Controle Repressivo - feito depois de a norma ter entrado no mundo jurídico. Controle Político (feito pelos poderes legislativo e executivo). Controle Judicial ou jurídico (feito pelo poder judiciário). Quanto ao órgão judicial que exerce o controle Quanto à forma de controle judicial Controle difuso (feito por qualquer órgão do poder judiciário. Controle concentrado (feito exclusivamente pelo Supremo Tribunal Federal). Controle por via incidental (feito a partir de um caso concreto). Controle por via principal (feito de forma abstrata de lei ou ato normativo em tese). O quadro abaixo mostra, em visão panorâmica, as diferentes modalidades de controle de constitucionalidade do nosso sistema: Veja-se a seguir algumas considerações acerca dessas diferentes modalidades. Levando em consideração a natureza do órgão julgador, o controle político é aquele que é exercido pelos poderes legislativo e executivo, ou seja, é o controle de constitucionalidade feito pelos poderes do Estado encarregados das decisões de caráter político, legitimados pelo voto popular. Como vamos brevemente constatar, existem diversas instâncias de controle político no sistema brasileiro, podendo-se citar, por exemplo, o veto feito pelo chefe do poder executivo no processo legislativo dos projetos de leis 14

infraconstitucionais ou então a resolução do Congresso Nacional que susta o decreto regulamentador de lei que exorbita seu poder regulamentar. Por outro lado, designa-se controle judicial ou técnico aquele que é exercido por órgãos do poder judiciário, que é poder do Estado cujas atribuições são, na sua maior parte, de fiscalização da aplicação das leis. No Brasil, por tradições do direito romano-germânico, evidentemente predomina o controle de natureza judicial. Diferentemente, no âmbito do direito constitucional de tradição da common law, impera o controle político a partir da assim chamada supremacia do Parlamento. Nesse sentido, Luis Roberto Barroso traz a lume a lição de Dicey que sistematiza os elementos essenciais que compõem a supremacia do Parlamento sob os influxos da common law da seguinte maneira: I. Poder do legislador de modificar livremente qualquer lei, fundamental ou não; II. Ausência de distinção jurídica entre leis constitucionais e ordinárias; III. Inexistência de autoridade judiciária ou qualquer outra com o poder de anular um ato do Parlamento ou considerá-lo nulo ou inconstitucional. Com rigor, em termos epistemológicos, o único aspecto relevante decorrente da distinção entre controle político e controle judicial reside na obrigação ou não de fundamentação do ato decisor controlador da constitucionalidade, isto é, a fundamentação somente seria necessária no caso do controle judicial, sendo desnecessária na hipótese de controle político. Não obstante, é importante ponderar que, em um verdadeiro Estado Democrático de Direito, a Constituição impõe aos órgãos políticos o dever de fundamentação de sua atuação. 15

Assim é que o Presidente da República estará obrigado, sempre, a motivar e expor as razões de seu veto, seja ele político (contrário ao interesse público) ou jurídico (contrário à Constituição), para que o mesmo possa ser apreciado pelo Congresso Nacional em sessão conjunta. Já com relação ao momento de seu exercício, o controle de constitucionalidade pode ser preventivo ou repressivo. Será preventivo ou prévio quando a tarefa de fiscalização for realizada ainda durante o processo de elaboração do ato legislativo, isto é, antes mesmo de ele se completar; de adentrar ao mundo jurídico. Seu desiderato é evitar a entrada em vigor de um ato inconstitucional. Esse controle incide, portanto, sobre projetos e não sobre normas já formadas. Não há, portanto, declaração de nulidade do ato, mas, sim, eliminação de seus vícios de inconstitucionalidade, tornando-os compatível com a Carta Ápice. Diferentemente, o controle será repressivo quando incidir sobre normas cujo processo de elaboração já tenha sido concluído. Também chamado de controle sucessivo ou a posteriori, o controle repressivo é exercido contra leis ou atos normativos que já se encontram em vigor, após o término do devido processo constitucional legislativo. Seu desiderato, por via de consequência, é paralisar sua eficácia; retirar do mundo jurídico ato normativo inquinado de vícios de inconstitucionalidade. Com todos esses dados conceituais bem consolidados, é importante agora sistematizar, por completo, os controles preventivo, repressivo, político e judicial do sistema brasileiro de controle de constitucionalidade. Este é o nosso próximo passo científico. 16

Controle Preventivo de Constitucionalidade das Leis no Direito Brasileiro Como dito alhures, o sistema de controle de constitucionalidade adotado no Brasil congrega todos os sistemas anteriormente estudados. Isto significa dizer que o sistema brasileiro é, a um só tempo, preventivo e repressivo, político e judicial. É por isso que vamos em seguida sistematizar o controle exercido preventivamente, seja pelos poderes executivo e legislativo (controle preventivo político), seja pelo poder judiciário (controle preventivo judicial). Controle Preventivo Político Em linhas gerais, o controle preventivo no Brasil é desempenhado pelo poder legislativo e pelo poder executivo. Trata-se, portanto, do controle preventivo político que é feito antes de a norma entrar no mundo jurídico. A doutrina destaca duas grandes modalidades desse tipo de controle, a saber: Controle preventivo político feito pelo poder legislativo e exercido pelas Comissões de Constituição e Justiça das casas legislativas que julgam preliminarmente a constitucionalidade dos projetos que serão enviados para a sessão plenária do parlamento, nos termos do art. 58 da CRFB/88. Controle preventivo político feito pelo poder executivo e executado por intermédio do veto do chefe do poder executivo na elaboração das leis infraconstitucionais (leis complementares e leis ordinárias) conforme o artigo 66, 1.º da Constituição de 1988. O quadro abaixo destaca essas duas modalidades de controle. 17

O controle preventivo político de constitucionalidade Feito pelo poder legislativo Feito pelo poder executivo Comissões de Constituição e Justiça Veto jurídico do Presidente da República Portanto, o sistema constitucional brasileiro comporta duas hipóteses de controle preventivo político, nos moldes do sistema francês. A primeira reside na atuação das Comissões Permanentes de Constituição e Justiça, que tem sua base jurídica fincada no art. 58 da CRFB/88 e cuja função é avaliar previamente a compatibilidade dos projetos que serão apreciados pelo poder legislativo, seja do ponto de vista formal ou material. Cumpre destacar, no entanto, que o parecer dessas Comissões nem sempre tem força vinculante, pois cabe recurso para o plenário da respectiva Casa Legislativa, apesar de o Regimento Interno do Senado Federal estabelecer que o parecer pela inconstitucionalidade ou injuridicidade de qualquer proposição a tornará rejeitada e arquivada definitivamente. Além disso, vale lembrar que tal tipo de controle preventivo não ocorre nos projetos de medidas provisórias, resoluções dos tribunais e decretos. A segunda hipótese está relacionada à atuação do Presidente da República e demais Chefes de Governo de âmbito regional e local, que ocorre, como vimos, por meio do chamado veto jurídico (veto baseado na compreensão de que o projeto de lei aprovado pelo Legislativo se incompatibiliza com a Constituição por algum motivo). Fora essa hipótese, portanto, o veto político é oferecido, quando se entende que o projeto contraria o interesse público. 18

Finalmente, impende destacar que o controle preventivo político feito pelo poder executivo não ocorre nos projetos de emenda constitucional. Controle Preventivo Judicial Como se acabou de constatar, em regra, no sistema brasileiro, o controle preventivo é político, porém, existe uma hipótese na qual o controle preventivo será judicial e, não político. Trata-se aqui de mandado de segurança impetrado por parlamentar, em nome de seu direito líquido e certo de participar do devido processo legislativo. Tal mandado de segurança será interposto diretamente no Supremo Tribunal Federal, que avaliará se a questão suscitada pelo parlamentar (deputado federal ou senador) é efetivamente uma violação ao seu direito líquido e certo de participação democrática no processo legislativo ou se se trata de questão interna corporis. Nesse último caso, o mandado de segurança será julgado inepto, sem apreciação do seu mérito. Assim, é importante compreender que, muito embora ao poder judiciário, em geral, não se atribua competência para o exercício do controle preventivo de constitucionalidade, o direito brasileiro admite tal hipótese nos projetos de emenda à Constituição que vão de encontro às cláusulas pétreas. De acordo com o disposto no 4.º do art. 60 da CRFB/88, as propostas de emenda à Constituição (PEC) tendentes a abolir as cláusulas pétreas não deverão sequer ser deliberadas (tais cláusulas de superconstitucionalidade são limitações materiais ao poder constituinte derivado reformador). Por isso, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de afirmar que os parlamentares estão legitimados para pleitear, mediante a impetração de mandado de segurança perante aquela Corte, o trancamento do processo legislativo nessas hipóteses, ou seja, os deputados federais e os 19

senadores da República têm o direito-função de participar de um processo legislativo hígido, vale dizer têm o direito público subjetivo de não deliberar qualquer proposta de emenda tendente a abolir qualquer das cláusulas pétreas. É certo dizer que tal entendimento vem em homenagem ao princípio da separação de poderes, um dos pilares de sustentabilidade do Estado Democrático de Direito, uma vez que, muito embora o poder judiciário não tenha, em regra, competência para o exercício do controle preventivo de constitucionalidade, a posição firme do STF no sentido de reconhecer legitimidade ad causam para os parlamentares impetrarem o mandado de segurança transforma-se em instrumento de garantia do núcleo constitucional intangível das cláusulas de imutabilidade. A ideia aqui é evitar que propostas de emenda tendentes a abolir as cláusulas pétreas não sejam nem mesmo deliberadas. Vale, pois, conhecer o teor da dicção pretoriana constante da ementa do acórdão que julgou o mandado de segurança n.º 20.257/DF: Mandado de segurança contra ato da Mesa do Congresso Nacional que admitiu a deliberação de proposta de emenda constitucional que a impetração alega ser tendente à abolição da república. Cabimento de mandado de segurança em hipótese em que a redação constitucional se dirige ao próprio processamento da lei ou da emenda, vedando sua apresentação (como é o caso previsto no parágrafo único do art. 57) ou a sua deliberação (como na espécie). Nesses casos, a inconstitucionalidade diz respeito ao próprio andamento do processo legislativo, e isso porque a Constituição não quer em face da gravidade dessas deliberações, se consumadas que sequer se chegue à deliberação, proibindo-a taxativamente. A inconstitucionalidade, se ocorrente, já existe antes de o projeto ou de 20

a proposta se transformar em lei ou em emenda constitucional, porque o próprio processamento já desrespeita, frontalmente, a Constituição. Inexistência, no caso, da pretendida inconstitucionalidade, uma vez que a prorrogação de mandato de dois para quatro anos, tendo em vista a conveniência da coincidência de mandatos nos vários níveis da Federação, não implica introdução do princípio de que os mandatos não mais são temporários, nem envolve, indiretamente, sua adoção de fatos. Mandado de segurança indeferido. 5 Observe, com olhos de ver, que o mandado de segurança de parlamentar perante o STF é um controle jurisdicional, muito embora a sua provocação tenha se originado de ato de parlamentar (deputado ou senador). Foi, afinal, o próprio STF, órgão cupular do poder judiciário, que determinou o trancamento do processo legislativo em questão, daí a designação de controle preventivo judicial ou jurisdicional. Em conclusão, a imagem abaixo mostra as três modalidades de controle preventivo, seja político (veto jurídico e parecer negativo das Comissões de Constituição e Justiça), seja judicial (Mandado de Segurança impetrado por Parlamentar). O CONTROLE PREVENTIVO DE CONSTITUCIONALIDADE Veto jurídico do Presidente da República; Parecer negativo das Comissões de Constituição e Justiça; Mandado de Segurança impetrado por Parlamentar perante o STF 5 STF, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, Mandado de Segurança n.º 20.257/DF. 21

Uma vez investigado o controle preventivo de constitucionalidade, vale agora examinar os aspectos característicos do controle repressivo de constitucionalidade, cujo objetivo é retirar do ordenamento jurídico uma norma inconstitucional. Da mesma forma que o controle anterior, o controle repressivo ou posterior também pode ser político ou judicial, valendo pois encetar nosso estudo pelas hipóteses do controle político. Controle Repressivo Político Diferentemente do controle preventivo, a fiscalização posterior ou repressiva das normas inconstitucionais é feita em sede jurisdicional, porém nosso complexo sistema constitucional de controle de constitucionalidade admite, em algumas situações específicas, o controle repressivo feito pelos poderes legislativo e executivo. A doutrina destaca as seguintes modalidades desse tipo de controle, a saber: Controle repressivo político feito pelo poder legislativo e exercido pelo Congresso Nacional quando suspende a eficácia de um ato do poder executivo que tenha exorbitado de sua função regulamentar ou extrapolado os limites de delegação legislativa recebida, com amparo no art. 49, V, da CRFB/88. Controle repressivo político feito pelo poder executivo e executado pelo chefe do poder executivo, nas esferas federal, estadual e municipal, que pode deixar de aplicar uma lei por considerá-la inconstitucional, sob pena de crime de responsabilidade. Nesse mesmo sentido, o pensamento de Luis Roberto Barroso: Há alguns mecanismos de atuação repressiva pelo Legislativo (como a possibilidade de 22

sustar atos normativos exorbitantes editados pelo Executivo) e pelo Executivo (como a recusa direta em aplicar norma inconstitucional). 6 Além dessas duas hipóteses, alguns doutrinadores entendem que também ocorre o controle repressivo político feito pelo poder legislativo quando o Congresso Nacional rejeita uma medida provisória em razão de sua inconstitucionalidade, nos termos do art. 62 da Constituição de 1988. 7 Neste último caso, contudo, não há consenso doutrinário, bem como existem também algumas dificuldades para se aceitar essa tese. Em primeiro lugar, tem-se dificuldade de se concluir que a rejeição se deu por motivo de inconstitucionalidade, especialmente porque as decisões legislativas, nestes casos, não vêm acompanhadas de fundamentação ou de motivação, eminentemente políticas que são. Por outro lado, temos dúvidas em afirmar que essa seria uma hipótese de controle repressivo. Nesta perspectiva, interessa saber se o controle de constitucionalidade que incide sobre uma medida provisória seria preventivo ou repressivo. Em suma, o controle repressivo político é uma exceção à regra geral de que cabe ao poder judiciário realizar a fiscalização posterior ou repressiva. A primeira exceção seria, como já visto, a possibilidade de o Congresso Nacional sustar, mediante Decreto Legislativo, um Decreto Regulamentador de Lei que extrapolou seu poder regulamentar ou ainda sustar uma Lei Delegada que exorbitou da delegação recebida mediante uma Resolução do Congresso Nacional. Tal controle é denominado pela doutrina de veto parlamentar ou veto legislativo, na medida em que simboliza o controle político de constitucionalidade feito pelo poder legislativo contra atos normativos do poder executivo. 6 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. Exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. Rio de Janeiro: Saraiva, 2009. p. 46. 7 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 281-282. 23

Finalmente, é importante saber se é possível a fiscalização abstrata deste ato de sustação feito pelo Congresso Nacional (decreto legislativo) a partir de uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) movida pelo Presidente da República ou outro legitimado qualquer perante o STF. A jurisprudência do STF é firme no sentido de admitir o controle de constitucionalidade pelo poder judiciário do Decreto Legislativo que sustou a lei delegada ou o decreto regulamentador de lei do Presidente da República. Assim, a resposta, em termos simples, é a de que cabe ADIN do Decreto Legislativo do Congresso Nacional que sustou a lei delegada ou o decreto regulamentador de lei. Atividade Proposta Determinado deputado federal apresentou projeto de emenda constitucional (PEC) prevendo o estabelecimento de penas de prisão perpétua e de trabalhos forçados para os condenados pela prática de crimes considerados hediondos pela legislação brasileira. Outro deputado decide consultá-lo(a) acerca da possibilidade de questionar tal PEC perante o Poder Judiciário por intermédio de uma ação direta de inconstitucionalidade (ADIN). Como você responderia a tal consulta? Referências BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. Exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. Rio de Janeiro: Saraiva, 2013. MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição constitucional. O controle abstrato de normas no Brasil e na Alemanha. São Paulo: Saraiva, 2012.. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. Estudos de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2012. 24

Exercícios de Fixação Questão 1 Analise as assertivas abaixo e assinale a resposta CORRETA: I. O Chefe do Poder Executivo pode determinar, por meio de decreto, que a Administração Pública deixe de cumprir uma determinada lei em razão de sua inconstitucionalidade; II. Pode ser objeto da ação direta de inconstitucionalidade o decreto legislativo aprovado pelo Congresso Nacional com o escopo de sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa. a) As duas assertivas são falsas; b) A assertiva I é verdadeira e a assertiva II é falsa; c) Ambas as assertivas são verdadeiras; d) A assertiva I é falsa e a assertiva II é verdadeira. Questão 2 O projeto de lei, aprovado pelo Congresso Nacional, que autorize a União a subsidiar cultos religiosos: a) não poderá ser vetado pelo Presidente da República, porque já foi aprovado pelo Congresso Nacional. b) não poderá ser vetado pelo Presidente da República, porque não apresenta qualquer inconstitucionalidade. c) poderá ser vetado pelo Presidente da República, como forma de controle preventivo da constitucionalidade. d) poderá ser vetado pelo Presidente da República, como forma de controle repressivo da constitucionalidade. 25

Questão 3 Encontra-se em tramitação na Câmara dos Deputados uma proposta de emenda à Constituição, apresentada pelo Presidente da República, cujo teor é a modificação da forma federativa do Estado brasileiro. À vista disso, assinale a opção correta. a) A proposta, enquanto não for aprovada e não se transformar em ato normativo existente e eficaz, não pode ser objeto de controle pelo Poder Judiciário. b) Essa proposta pode ser declarada inconstitucional num mandado de segurança impetrado, perante o Supremo Tribunal Federal, por Deputado Federal. c) Essa proposta pode ser declarada inconstitucional numa ação direta de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal. d) Essa proposta pode ser declarada inconstitucional numa arguição de descumprimento de preceito fundamental ajuizada pelo Procurador- Geral da República na sua função de custos legis. Questão 4 Assinale a alternativa CORRETA: a) Qualquer juiz pode realizar controle difuso de constitucionalidade de leis. b) Somente o Supremo Tribunal Federal pode realizar controle difuso de constitucionalidade de leis. c) O controle difuso de constitucionalidade de leis não pode ser feito por juiz singular. d) O controle difuso de constitucionalidade de leis produz efeitos erga omnes. 26

Questão 5 Com relação ao STF e ao controle de constitucionalidade das leis, assinale a opção correta. a) No sistema constitucional brasileiro, não cabe ao juiz a declaração de inconstitucionalidade de lei, que é da competência exclusiva dos tribunais. b) Ao julgar apelação interposta com fundamento na inconstitucionalidade de lei, a turma do tribunal pode declarar a inconstitucionalidade desta e afastar a sua incidência no caso concreto. c) O controle incidental é a prerrogativa do STF de declarar, em abstrato e com efeito erga omnes, a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo. d) O STF poderá, depois de reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública. 27

Atividade Proposta Resposta: Negativo. Não caberia ADIN contra projeto de lei que ainda não entrou no mundo jurídico. No entanto, aqui é importante ressaltar que caberia Mandado de Segurança em controle preventivo judicial. A jurisprudência do STF admite nesse caso o controle preventivo de constitucionalidade, porque houve violação do direito líquido e certo do parlamentar de participar do devido processo legislativo. Com efeito, o 4. do art. 60 da CRFB/88 menciona que não será sequer objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos poderes e os direitos e garantias individuais. Assim, a Corte Suprema tem entendido que o parlamentar tem legitimidade para impetrar mandado de segurança perante o STF para impugnar o comportamento da Mesa da Casa parlamentar que viabiliza a deliberação da PEC violadora de cláusula pétrea. Exercícios de Fixação Questão 1 - C Justificativa: As duas assertivas estão corretas. Questão 2 - C Justificativa: Trata-se da modalidade de controle político preventivo feito pelo poder executivo. Questão 3 - B Justificativa: Trata-se da modalidade de controle judicial preventivo feito pelo poder judiciário por iniciativa do poder legislativo. Questão 4 - A 28

Justificativa: Como amplamente visto, no controle difuso qualquer juiz ou tribunal pode aferir a arguição incidental de inconstitucionalidade Questão 5 - D Justificativa: A alternativa praticamente repete o enunciado do art. 103-A da CR, que dispõe sobre súmula vinculante. A alternativa A está incorreta tendo em vista que adotamos o sistema difuso, no qual qualquer juiz ou tribunal pode declarar a inconstitucionalidade de leis e atos normativos. A alternativa B está incorreta, uma vez que a regra do art. 97 da CR c/c art. 481 do CPC estabelecem o que se chama reserva de plenário, impondo a cisão de competência quando a questão constitucional for fundamento da apelação. Por esta regra, órgão fracionário deve submeter a questão ao Pleno ou Órgão Especial. A alternativa C trata do controle abstrato por via de ação direta, e não do incidental. Correta, portanto, somente a alternativa D. 29