MORA AO LADO A INOVAÇÃO



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Transcrição:

PONTO DE ENCONTRO Ideias para novas empresas surgem todos os dias nas mesas do bar irlandês Temple, point dos digitais em A INOVAÇÃO MORA AO LADO Com disposição para driblar a crise e a burocracia, jovens argentinos estão criando uma das cenas mais vibrantes do empreendedorismo da América Latina POR FEDERICO AST, de T erça-feira, 19 horas, bar irlandês Temple, centro de Buenos Aires. Entre chopes e baldes de pipoca, dezenas de jovens participam de uma reunião informativa do Naves, o programa de apoio ao empreendedorismo mais importante da Argentina. Alguns rapazes recém-saídos do curso secundário me contam sua ideia: querem desenvolver uma plataforma de empregos em meio período para estudantes universitários. Entre os jovens está Martín Rubio, 30 anos, participante do Naves 2012 e criador da plataforma Sincropool, que possibilita aos usuários compartilhar carros. É uma empresa ainda pequena, com somente quatro funcionários, porém com ambições de se expandir internacionalmente. 38 pequenas empresas & grandes negócios Agosto, 2014 FOTO: LUCHA RAMOS/Editora Globo Agosto, 2014 pequenas empresas & grandes negócios 39

1 2 MILITÂNCIA E TECNOLOGIA Em pouco tempo, o bar Temple lota. Há 20 anos, quase não se falava em, diz Silvia Torres Carbonell, diretora do Centro de Empreendedorismo da IAE Business School, que organiza o Naves. Mas, no final dos anos 1990, com a explosão da internet, ter um negócio tornou-se uma opção profissional desejável na Argentina. Naquela época, jovens ambiciosos deixaram suas carreiras corporativas para tentar a sorte em startups tecnológicas. Muitos enfrentaram a incredulidade de parentes: Você está louco? Vai deixar um cargo na...?. É claro que vários fracassaram. PIONEIROS COMO MARCOS GALPERÍN, DO MERCADOLIVRE, INSPIRAM A NOVA GERAÇÃO FEITA NA IMPRESSORA 1.Rodrigo Pérez Weiss (de pé), dono do 3D Lab & Fab Café, durante uma reunião com ; 2 e 3. A prótese de mão foi produzida de maneira experimental em uma impressora 3D por Weiss e Gino Tubaro; 4. Um dos modelos de impressora disponíveis para os no 3D Lab & Fab Os que acertaram criaram as grandes companhias digitais do país: Patagon (fundada por Wenceslao Casares, 40 anos, e vendida para o BBVA da Espanha), MercadoLivre (criada por Marcos Galperín, 43, e Hernán Kazah, 43, foi comprada parcialmente pelo ebay e, depois, passou pelo IPO na Nasdaq), DeRemate (lançada por Alec Oxenford, 45, adquirida pela MercadoLivre) e Officenet (dos sócios Andy Freire, 42, e Santiago Bilinkis, 43, vendida para a Staples). Esses fundadores se transformaram em símbolo de uma época em que a vocação empreendedora começou a conquistar o respeito social. Centenas de reportagens, textos de escolas de negócios e livros foram escritos sobre esses desbravadores, que também narraram suas histórias em conferências da Endeavor e em programas da TV argentina. O que não falta no bar irlandês são jovens ansiosos para iniciar suas empresas de tecnologia, inspirados pelo modelo daqueles pioneiros, os Bill Gates e Steve Jobs argentinos. Desde o fim dos anos 90, foi se consolidando um ecossistema empreendedor, diz Silvia, que participou do desembarque da Endeavor na Argentina, em 1998. Esse cenário reúne universidades, centros de, ONGs, pesquisadores, empresas em busca de inovação e fundos de investimento à procura de negócios de impacto. CONEXÕES IMEDIATAS Em seu livro De Onde Vêm as Boas Ideias (editora Zahar) e em sua palestra homônima no TED, o pensador americano Steven Johnson explica que a criação dos cafés na Grã-Bretanha do século 17 foi essencial para o desenvolvimento das inovações tecnológicas que lançaram a revolução industrial. Para que a criatividade se realize, é preciso existir um componente social um local em que ideias geradas por mentes diferentes se combinem para produzir inovação. Poucos locais são mais propícios para essas conexões do que a mesa de um café. Por isso, decido levar minha investigação sobre o ecossistema portenho ao 3D Lab & Fab Café, em Palermo, bairro mais agitado de. Na casa, os clientes podem utilizar impressoras 3D pagando uma tarifa por hora. Vêm muitos designers industriais, arquitetos e estudantes, diz o proprietário, Rodrigo Pérez Weiss. Já estamos abrindo franquias no México e no Paraguai. 3 4 NEGÓCIOS NA UNIVERSIDADE Criado pelo Centro de Empreendedorismo da IAE Business School, o projeto Naves ajuda os a transformar ideias em projetos sustentáveis. Durante seis meses, os escolhidos recebem orientação para elaborar seus planos de negócios Partido defende o uso de plataforma online para promover mudanças Nas eleições de 2013, os portenhos se surpreenderam com um Cavalo de Troia de madeira passeando por. Tratavase de um truque publicitário do Partido da Rede (PDR), uma nova agremiação que propõe usar a tecnologia para melhorar a comunicação entre o povo e seus representantes. Assim como na história os gregos usaram o cavalo para entrar em Troia, queremos que o partido seja um instrumento para que o povo entre no congresso, disse à imprensa o candidato Agustín Frizzera. Um dos postulantes ao Legislativo, Santiago Siri, 30 anos, é um veterano dos negócios tecnológicos. Aos 18, criou uma empresa de games. Depois, lançou a startup de análise de dados Popego, que em 2011 se fundiria à brasileira Boo-box para formar o Grupo 42. O PDR quer uma cultura política com menos apatia e mais participação, diz Siri. Nossos representantes se comprometem a votar de acordo com o que os cidadãos expressam em uma plataforma online. Para isso, fizemos o software DemocracyOS. Nas reuniões do PDR, um dos presentes é Gonzalo Lucero. Aos 22 anos, ele já criou uma comunidade virtual de artistas e outra para a indústria médica. Hoje trabalha na Wideo, uma plataforma de vídeos animados. Para o rapaz, quem tem formação tecnológica deve dedicar parte de seu tempo para ajudar os outros. Por isso ele se juntou ao partido. Muitos querem fama ou dinheiro. Mas poucos tentam solucionar os problemas que afetam as pessoas. INTERAÇÃO DIGITAL O Cavalo de Troia é o símbolo do Partido da Rede, que pretende integrar cidadãos e políticos por meio da tecnologia 40 pequenas empresas & grandes negócios Agosto, 2014 FOTOS: LUCHA RAMOS/Editora Globo FOTO: Divulgação Agosto, 2014 pequenas empresas & grandes negócios 41

O ECOSSISTEMA PORTENHO Os digitais não conseguiriam prosperar se não tivessem o suporte de diferentes setores da sociedade. Entenda o funcionamento dessa engrenagem azeitada Há 20 anos, não se falava em empreendedorismo. Mas, no final dos anos 1990, com a explosão da internet, ser dono de um negócio virou uma opção profissional desejável SILVIA TORRES CARBONELL, DIRETORA DO CENTRO DE EMPREENDEDORISMO DA IAE BUSINESS SCHOOL TERCEIRO SETOR Inclui organizações de suporte, entidades do varejo e até um partido político ENDEAVOR: instituição de apoio e capacitação para CESSI (CÂMARA DE EMPRESAS DE SOFTWARE E SERVIÇOS DE INFORMÁTICA): congrega empresas argentinas dedicadas ao segmento de software CACE (CÂMARA ARGENTINA DE COMÉRCIO ELETRÔNICO): reúne negócios envolvidos no e-commerce. Promove treinamento em legislação e segurança para pagamentos eletrônicos UNIVERSIDADE É daqui que saem os fundadores das startups mais bem-sucedidas IAE BUSINESS SCHOOL: figura como a 30ª no ranking de educação executiva do Financial Times em 2013 EMPRENDING: é o nome dado ao curso de empreendedorismo da Universidade de (UBA). Leva aos estudantes de engenharia conteúdo da área de negócios UNIVERSIDADE DE SAN ANDRÉS: mantém um centro de empreendedorismo Em maio, esse empreendedor de 33 anos, junto com Gino Tubaro, um estudante de 18, ganhou enorme visibilidade na mídia argentina ao presentear um menino de 11 anos com aquilo que ele nunca teve: a mão esquerda. A prótese ortopédica impressa em 3D foi feita para Felipe Miranda, que vive em Tres Algarrobos, povoado a 400 quilômetros da capital. A mãe do menino enviou para Weiss e Tubaro fotos e medidas do braço do filho, além de imagens de sua mão direita. Em uma semana, a peça foi confeccionada e enviada à família pelo correio. A notícia chegou aos jornais e à TV. Foi um ato de solidariedade, não fizemos isso para ganhar dinheiro, afirma Weiss, que gastou US$ 200 no mecanismo uma prótese tradicional pode custar até US$ 40 mil. Mas há um entrave para que eles repitam a experiência na área de saúde: médicos e fabricantes de próteses alegam que os rapazes estão exercendo a medicina ilegalmente. Chega à nossa mesa Andrei Vazhnov, um engenheiro elétrico de 40 anos. Nascido na Rússia, ele decidiu radicar-se em depois de trabalhar no Goldman Sachs em Nova York e montar startups nos Estados Unidos. Gostei da cidade e do clima, diz. Dono de amplo conhecimento na área de negócios digitais, Vazhnov é assessor estratégico da Trimaker, a primeira fábrica de impressoras 3D da Argentina, fundada por Maximiliano Bertotto, 37 anos, Juan Chereminiano, 30, Facundo Imas, 30, Emiliano Chamorro, 39, e Alexis Caporale, 25. Em 2011, Bertotto, um estudante de engenharia industrial, iniciou sua pesquisa sobre impressão em três dimensões, influenciado por uma emergência familiar. Naquele ano, uma prima do rapaz sofreu um acidente grave. A solução médica para a reconstrução de seu crânio saiu de uma impressora 3D. Dois anos depois, Bertotto e seus sócios lançaram seu equipamento inaugural, além de hardwares, software e materiais para a impressão 3D. Quando uma nova indústria começa, ninguém sabe como vai evoluir, diz Vazhnov, explicando a estratégia de negócio da Trimaker. Das centenas de fabricantes de automóveis dos Estados Unidos no início do século 20, restam apenas três. O mesmo pode PESOS E BITCOINS A moeda virtual está provocando furor entre os argentinos, que estão em busca de novos modelos que utilizem o bitcoin. Entre as empresas que exploram o segmento, estão a BitPagos, uma plataforma para emitir e receber pagamentos internacionais, e a Bitex.la, mercado de compra e venda de bitcoins em tempo real ocorrer na impressão 3D. Hoje nosso negócio é vender impressoras, em especial para arquitetos e engenheiros, os primeiros a adotar a novidade. Mas, no futuro, podemos mudar o modelo, fornecendo serviços ou materiais. No 3D Lab & Fab, alguns jovens jogam com um simulador de montanha-russa na Oculus Rift, um dispositivo de realidade virtual que permite ao usuário entrar em seu jogo preferido. A Oculus, comprada recentemente pelo Facebook, está incentivando o público a desenvolver aplicativos para sua plataforma. Trata-se de uma oportunidade de sinergia entre fabricantes de impressoras 3D, designers e desenvolvedores de jogos. Somando ideias e esforços, essa turma poderia criar jogos inovadores que mesclem realidade virtual e produtos físicos (a impressão 3D). Um app matador da Oculus Rift poderia surgir na Argentina? Se isso acontecer, certamente sairá de uma das mesas desse café. Por isso, o 3D Lab & Fab é muito mais que um fornecedor de serviços de impressão. É uma fertilizadora de ideias do ecossistema tecnológico local. É aqui que tudo começa. RED INNOVA: organiza conferências e divulga novidades sobre negócios tecnológicos PARTIDO DA REDE: fundado por digitais ACELERADORAS Fornecem mentoria, assessoria legal e financeira a startups com potencial para crescer NXTP LABS: criada em 2001, conta com escritórios no Chile, Uruguai, México e Estados Unidos WAYRA: nasceu em 2011, como uma iniciativa da Telefônica. Tem sedes em 13 cidades da América Latina e da Europa VENTURES BUILDERS Híbridos de incubadora e fundo de investimento, financiam potenciais, que muitas vezes ainda não têm projeto próprio QUASAR VENTURES: foi fundada em 2012 com aporte de capital de fundos de investimento argentinos e americanos UBA (UNIVERSIDADE DE BUENOS AIRES): seus cursos de engenharia e administração de empresas dão origem a profissionais para todo o ecossistema empreendedor FUNDOS DE CAPITAL DE RISCO Investem em empresas que já passaram da fase de capital semente. Hoje, apenas um grande fundo opera na Argentina KASZEK VENTURES: criado em 2001 SETOR PÚBLICO O GCBA (Governo da Cidade de ) atua em parceria com aceleradoras BAITEC: mantida pelo GCBA, a incubadora de projetos tecnológicos capacita e dá apoio financeiro a iniciativas empreendedoras digitais 42 pequenas empresas & grandes negócios Agosto, 2014 FOTO: Divulgação ILUSTRAÇÃO: CÁSSIO BITTENCOURT Agosto, 2014 pequenas empresas & grandes negócios 43

ESTRUTURA PARA CRESCER Aceleradoras, venture builders, fundos de capital semente, incubadoras: conheça os diferentes players da cena digital argentina QUASAR VENTURES Quem é: Santiago Bilinkis (à esq.), fundador, e Pablo Simón Casarino (à dir.), sócio e CEO da empresa O que faz: mistura de incubadora com aceleradora, vasculha o mercado em busca de ideias de negócios. Investe US$ 50 mil em um produto minimamente viável. Se a evolução for a esperada, promove duas rodadas de investimento: uma de US$ 500 mil e, um ano depois, outra de US$ 3 milhões. Fica com 45% de cada negócio acelerado nós geramos apenas duas, afirma Casarino. Mas eles ficam com somente 10%. Nós somos cofundadores. Foi dentro desse modelo que nasceu o Restorando, plataforma de reservas responsável por levar aos restaurantes e bares da Argentina o modelo americano da Open Table. Dois rapazes de 29 anos, Frank Martin e Franco Silvetti, são os idealizadores do site. Os usuários podem filtrar as opções pela especialidade da cozinha, pelo bairro e até mesmo por faixas de descontos. Outra solução que decolou recentemente dos escritórios da Quasar é o Avenida.com, um e-commerce que oferece aos clientes a oportunidade de retirar seus pedidos em centros de distribuição estrategicamente localizados. À primeira vista, PLATAFORMA GLOBAL Além de conquistar o público portenho, o serviço de reservas Restorando ganhou versões no Brasil, Panamá, Chile, Colômbia, Peru e Uruguai. A sociedade, formada pela Quasar Ventures e pelos Frank Martin e Franco Silvetti, contou com capital semente do fundo Kaszek. Para financiar seus planos de expansão, em 2013 a startup fez uma rodada de investimento nos EUA e angariou US$ 13 milhões. CONSTRUTORES DE EMPRESAS A ndy Freire, 42 anos, e Santiago Bilinkis, 43, se conheceram nos anos 1990, nas aulas do curso de Economia da Universidade de San Andrés. Suas trajetórias pareciam levar para altos cargos em consultorias internacionais ou bancos de investimentos. Até que, em 1997, decidiram abandonar a carreira corporativa para montar a Officenet, distribuidora de materiais para escritórios. Amigos e parentes logo chamaram os rapazes de loucos. Mas a empresa prosperou e foi vendida para a multinacional Staples em 2004. Freire e Bilinkis se transformaram em celebridades do ecossistema empreendedor local. O primeiro foi convidado para conduzir o reality show El Emprendedor na TV argentina. Ambos se tornaram organizadores da TEDx Río de La Plata, evento regional com alta concentração de donos de negócios digitais. Em 2012, abriram a Quasar Ventures, adotando o modelo de venture builder trata-se de um híbrido de incubadora e aceleradora, ainda pouco conhecido no Brasil. Na Quasar, começamos a trabalhar com as pessoas quando elas nem sequer têm projetos, afirma o sócio e CEO Pablo Simón Casarino. É um processo diferente do das aceleradoras, que só investem em equipes com um plano de negócio relativamente claro. E mais diverso ainda dos fundos de capital de risco, que entram em campo numa fase mais adiantada, quando um conceito testado demanda financiamento para ganhar escala. Os três sócios e cinco analistas da Quasar vasculham o mercado em busca de oportunidades de negócios e de equipes para tocar os projetos. Procuramos pessoas jovens, intelectualmente brilhantes, ambiciosas, criativas e com qualidades excepcionais de liderança, diz Casarino. É tudo muito rápido: cada startup tem de quatro a seis meses para finalizar o processo, que inclui reuniões semanais entre os e os sócios da Quasar. Os primeiros conservam 55% do negócio; a venture builder fica com os outros 45%. Enquanto uma aceleradora recebe 60 empresas por ano, INOVAÇÃO NO VAREJO Com a meta de se tornar a Amazon argentina, a Avenida.com capricha na diversidade de produtos à venda. Mas seu maior trunfo está no serviço de entrega: o consumidor pode receber as compras em casa ou retirá-las em centros de distribuição. Fundada em 2013 pela Quasar Ventures e por ex-diretores do Groupon, recebeu um investimento de peso da Alto Palermo, dona da maioria dos shopping centers da Argentina. é difícil entender por que alguém preferiria acumular essa tarefa a ter suas mercadorias entregues em casa. Ex-diretores do Groupon na América Latina, os Alan Kraus, 27 anos, e Federico Malek, 29, chegaram à conclusão de que esse conforto cobra um preço inacessível para muitos: é preciso sempre haver gente em casa. Não bastasse essa questão, os argentinos se incomodam com a falta de privacidade e temem que criminosos se disfarcem de entregadores. No momento, os sócios da Quasar estão investindo em duas startups com foco no mercado brasileiro: a Rodati, um marketplace de compra e venda de carros, e a Trocafone, para negociar smartphones usados. Há três formas de realizar negócios digitais, diz Casarino. A primeira é replicar modelos que já funcionam em outras partes do mundo, como fez o Restorando. A segunda é atender às necessidades do mercado latinoamericano. No Brasil, onde um smartphone custa US$ 1.000, faz sentido lançar uma ferramenta para a compra de modelos usados. Mas nos Estados Unidos um smartphone sai por alguns dólares então a proposta não seria atrativa. A terceira maneira é desenvolver um produto inédito, situação que move as empresas de inovação global. A Quasar especializou-se nos dois primeiros modelos. Em quatro anos, queremos construir oito companhias que valham no mínimo US$ 100 milhões cada uma, afirma Casarino. 44 pequenas empresas & grandes negócios Agosto, 2014 FOTOS: Divulgação Agosto, 2014 pequenas empresas & grandes negócios 45

ACELERAR É PRECISO P or uma ideia, pago cinco centavos. Pela implementação de uma ideia, pago uma fortuna, escreveu Peter Drucker (1909-2005). O guru da administração moderna sabia do que estava falando: uma proposta surgida na mesa de um café pode ser um bom começo, mas está longe de significar uma empresa rentável. Para que o mundo dos projetos e a realidade se aproximem, o empreendedor precisa de dinheiro e de uma estrutura completa de trabalho. Pode ser apenas uma coincidência, ou fruto de uma competição acirrada. O fato é que o ano de 2011 registra o nascimento das aceleradoras mais atuantes na Argentina: a Wayra, um braço do conglomerado espanhol Telefônica, e a NXTP Labs, iniciativa criada por quatro sócios argentinos. Quando a empresa espanhola decidiu lançar sua aceleradora, a Argentina foi um dos países escolhidos para abrigar seus programas. O objetivo era captar que estivessem desenvolvendo produtos digitais fora das companhias de telecom. Em abril de 2011, o executivo espanhol Hugo de los Santos deixou a área de negócios para celulares na América Latina para se tornar o diretor global de aceleração da Wayra. Em três anos, já contribuiu para o surgimento de mais de 300 startups em todo o mundo. Além de um aporte entre US$ 30 mil e US$ 70 mil, cada negócio digital tem direito a um local de trabalho, suporte de gestão, finanças e marketing durante seis meses. A América Latina tem grande potencial na área digital. Incorporar esses talentos é prioridade, diz Santos. Como a aceleradora está presente em 13 países, os donos de negócios têm a chance de entrar em contato com fornecedores e clientes globais. Também existe aqui uma questão ligada à responsabilidade social. Não é bom para a América Latina que os tenham de emigrar para os Estados Unidos a fim de desenvolver suas empresas, afirma Santos. APOSTA LOCAL Ex-executiva de uma multinacional de publicidade, Marta Cruz, 55 anos, comandava uma agência de marketing digital para pequenas empresas quando vislumbrou uma oportunidade ainda mais promissora. Alguns clientes não tinham dinheiro para bancar nossos WAYRA Quem é: Hugo de los Santos, diretor global de aceleração da Wayra O que faz: criada em 2011 pelo conglomerado espanhol Telefônica, tem a meta de acelerar negócios digitais. Até hoje, já investiu US$ 15 milhões em 325 startups cada uma recebe US$ 50 mil, em média. A Wayra fica com 7% a 10% da empresa, e a preferência na comercialização dos produtos é da Telefônica serviços, então começamos a aceitar ações como parte do pagamento, diz Marta. Estava lançada a semente da NXTP Labs, que teve como cofundadores Ariel Arrieta, 41, Francisco Coronel, 44, e Gonzalo Costa, 44. Com um fundo de US$ 2,5 milhões captado entre diversos NXTP LABS Quem é: Marta Cruz, fundadora O que faz: administra um fundo de US$ 50 milhões em toda a América Latina. Mantém escritórios no Chile, Uruguai, México e Estados Unidos. Até hoje, já acelerou 150 empresas. Oferece US$ 25 mil de aporte, sede, mentoria e rede de contatos. Em troca, fica com uma parcela das ações das startups, que varia de 2% a 10% investidores, Marta e seus sócios colocaram a aceleradora para funcionar. Não havia quem apostasse nas startups entre a fase inicial e a de capital de risco, afirma. Fomos os pioneiros nesse nicho. Nos modernos escritórios da aceleradora, no bairro de Palermo Hollywood, uma dezena de jovens mantém o olhar fixo nas telas de seus laptops. Durante os quatro meses do processo, eles comparecem ao escritório todos os dias. Duas vezes por ano, a aceleradora convoca equipes que desejem participar de seu programa. Só aceita cerca de 30 dos 600 inscritos. Os que ingressam costumam ter uma ideia relativamente clara de um produto com alcance global. Muitos já chegam com o produto minimamente viável pronto. Em troca do pacote concedido aos US$ 25 mil, sede, serviços administrativos, assessoria legal, contábil e financeira, mentoria e networking, a NXTP Labs fica com 2% a 10% das ações das startups. Eu achava que a melhor parte de estar em uma aceleradora seria o acesso aos recursos, diz Patricio Molina, 30 anos, um dos fundadores da- Real Trends, empresa B2B que potencializa vendas no comércio eletrônico. Mas depois descobri que o mais importante é a rede de contatos. Eu venho do mundo de sistemas. Não estou acostumado a me sentar com fundos. A aceleradora me fez entender o que é preciso fazer para conquistar os investidores. ESPAÇO COLETIVO Em uma das salas da NXTP Labs, dividem a bancada de trabalho STARTUPS FEBRE DIGITAL Conheça as startups argentinas que estão usando a criatividade para explorar novos mercados DE OLHO NO USUÁRIO Presta serviços de Big Data para varejistas online. Para isso, processa os mais de 20 milhões de dados gerados em 13 países onde o MercadoLivre atua, de modo a compreender os padrões de compra. Tem clientes na Argentina, no Brasil e no México. Em 2015, pretende incorporar dados das plataformas ebay e Amazon para alcançar impacto global. PREÇOS UNIFICADOS Criou um sistema de gestão de estoques e de vendas para empresas de e-commerce. Permite ao empreendedor integrar-se em uma plataforma única aos canais de venda (MercadoLivre, Tienda Nube etc.), a fim de unificar os preços e manter atualizados os estoques. Está iniciando operações no Brasil. SISTEMAS SEGUROS Criada por engenheiros argentinos em 2007, desenvolve soluções para testar a segurança dos sistemas ERP da SAP e Oracle. Para que a startup pudesse crescer, os fundadores mudaram-se para os Estados Unidos. A equipe de pesquisa e desenvolvimento continua em. 46 pequenas empresas & grandes negócios Agosto, 2014 FOTOS: Divulgação ILUSTRAÇÕES: CÁSSIO BITTENCOURT Agosto, 2014 pequenas empresas & grandes negócios 47

DEMO DAY: A BUSCA PELO INVESTIMENTO OUTRO PITCH A NXTP Labs promove o seu Demo Day: são duas edições por ano, sempre em. Após os eventos, os projetos que passam pelo crivo dos investidores recebem capital semente. Por meio de seu networking, a aceleradora também abre espaço para que os se apresentem para grupos de investidores do Vale do Silício. T udo o que acontece durante os programas de aceleração argentinos tem como objetivo preparar os para o Demo Day. Seguindo o modelo consagrado no Vale do Silício, os donos de negócio apresentam seus pitches para os investidores, que vão eleger as startups merecedoras de seu dinheiro. No evento organizado anualmente pela Wayra, os mais convincentes saem de lá com aportes que vão de US$ 500 mil a US$ 1,5 milhão. Com todo esse capital em jogo, a véspera do evento tende a ser agitada: é o que observo ao visitar o espaço de coworking da Wayra. Os jovens ali presentes só pensam no evento que acontecerá 24 horas depois: a conferência da Red Innova rede que congrega os principais atores do ecossistema digital da América Latina, que abriga o Demo Day da Wayra. Ninguém quer deixar de receber um investimento alto porque não ensaiou direito ou porque não corrigiu problemas na apresentação em Power Point. Cada empreendedor terá cerca de dez minutos para falar sobre a oportunidade de mercado que encontrou, defender o produto criado e explicar de que recursos precisa para levar adiante o seu desenvolvimento. O clima é de tensão. Cerca de 20 pessoas se concentram perto do palco. Falam sobre negócios tão diversos quanto plataformas para criar videogames, serviços de delivery e aplicativos para controlar a logística das empresas. Essa turma responde pelas 14 startups que disputarão as atenções dos fundos. Oito delas são argentinas; as demais vêm de países como Brasil, México, Peru, Chile e Venezuela. Os sobem, um a um, para ensaiar o pitch. Alguns começam, travam e tentam novamente. Risos nervosos são ouvidos na sala. Fiquem tranquilos, diz o consultor de oratória. Vocês não são atores, são. O pitch tem de ser curto. Vocês devem impactar o auditório. Ao fundo, uma equipe da Wayra produz um vídeo institucional sobre os objetivos e AUDITÓRIO LOTADO Luzes apagadas, projeção na tela: os da Wayra expõem seus trabalhos para os investidores reunidos na Red Innova resultados da aceleradora. O protagonista é o diretor global Hugo de los Santos, que mora na Espanha. A vinda do mais alto executivo da Wayra a demonstra a importância do Demo Day. O ensaio continua. É a vez de Tomás Escobar, 30 anos. Ele, que idealizou um site bastante popular na América Latina, o Cuevana (veja box ao lado), agora trabalha em um projeto de educação tecnológica online, a Acamica. Trata-se de uma plataforma para oferecer cursos de desenvolvimento de games e aplicativos para celular. Já temos 50 mil usuários. Em 12 meses, esperamos chegar a 540 mil, com vendas de US$ 600 mil, afirma Escobar. Se atingir sua meta, a Acamica deverá se posicionar como líder em aprendizagem tecnológica na região, com foco na Argentina, Colômbia, México e Espanha. É um mercado quente, onde competem outras empresas, como a Educatina e a Educabilia. Precisamos de uma rodada de investimento de US$ 400 mil para financiar nosso crescimento, diz, antes de subir no palco. Espero que o Demo Day traga a resposta para os meus problemas. EMPREENDEDOR SERIAL No Demo Day, Escobar apresentou aos investidores um plano de negócios para uma plataforma de educação tecnológica online. Trata-se de sua segunda startup. Embora seu nome não seja conhecido do público argentino, Escobar responde por um produto muito popular: o Cuevana. Milhões de pessoas já utilizaram essa plataforma para assistir a filmes e séries de TV. O site foi lançado em 2009 por Escobar e dois amigos, David Fernández e Mario Cardosio, ambos de 24 anos. STARTUPS SITE FACILITADO Esta plataforma permite montar um site de e-commerce em minutos. Foi criada por alunos do ITBA (Instituto Tecnológico de ) dentro da incubadora Baitec e, depois, acelerada pela NXTP Labs. Recebeu um aporte de US$ 1 milhão liderado pelo fundo brasileiro Trindade Investimentos. REFEIÇÃO CASEIRA Que tal jantar na casa de alguém que adora cozinhar? O usuário pode fazer a busca no site em função do tipo de comida, da localização e das características do chef amador. Em 2013, ano de sua fundação, o CookApp arrebanhou mais de 50 mil adeptos. Foi acelerado pela NXTP Labs. SMARTPHONE DO BEM Acelerada pela Wayra, criou um aplicativo que transforma os fones de ouvido de um smartphone em aparelhos de surdez para quem tem perda auditiva parcial o segredo está no ajuste das frequências sonoras. A USound pretende se lançar nos Estados Unidos em 2015. JOGOS DE PALAVRAS É especializada em aplicativos. Fez fama com os jogos Apalabrados (de formação de palavras) e Preguntados (de perguntas e respostas) esse último teve mais de 30 milhões de downloads na América Latina. Caso raro, a empresa do especialista em informática Máximo Cavazzani cresceu sem recorrer a aceleradoras. 48 pequenas empresas & grandes negócios Agosto, 2014 FOTOS: Divulgação ILUSTRAÇÕES: CÁSSIO BITTENCOURT Agosto, 2014 pequenas empresas & grandes negócios 49

SOBREVIVENDO À CRISE N a década de 1990, criar uma empresa pontocom exigia milhões. Hoje, bastam US$ 5 mil para desenvolver um protótipo. Isso possibilita que jovens com conhecimento tecnológico, boas ideias e capacidade de execução se juntem à engrenagem digital e criem produtos inovadores em escala global. É dessa maneira que a Argentina tenta reassumir uma dianteira que já teve entre seus vizinhos. Em 24 de novembro de 1960, chegou ao porto de o primeiro computador da América Latina. O governo argentino comprou a máquina de 18 metros de largura por 152 mil libras e instalou-a na Faculdade de Ciências Exatas da Universidade de, onde era empregada para fazer os cálculos de modelos de simulação. Lá recebeu o apelido carinhoso de Clementina cada vez que processava um programa, emitia os acordes da canção americana Clementine. O matemático Manuel Sadosky, líder da equipe que trabalhou com o dispositivo, é considerado um dos pais da computação na América Latina., a cidade que teve o primeiro computador da América Latina, foi também a que viu nascerem as maiores empresas da era da bolha das pontocom. Nos anos 1990, a capital tinha 70% do capital de risco da região, diz Mariano Mayer, diretor geral de do GCBA (Governo da Cidade de ). A situação mudou depois da crise econômica de 2001 e se agravou nos últimos anos do governo de Cristina Kirchner. O marco institucional que impôs restrições à movimentação de capital espantou os investidores e prejudicou toda uma geração empreendedora. Dos três grandes fundos de capital de risco existentes na Argentina há alguns anos, hoje só resta o Kaszek Ventures. Embora tenha sido fundado por argentinos, direciona somente uma pequena fatia de seus recursos a iniciativas no país. A exemplo dos brasileiros, os portenhos têm de lidar com os impostos altos e a burocracia. Na última edição do ranking que mede a facilidade para abrir um negócio, organizado pelo Banco Mundial, a Argentina ocupava a 126 a posição. O Brasil, que vem ganhando colocações, agora está na 116 a, enquanto Chile e Uruguai conquistaram o 34 0 e o 88 0 lugares, respectivamente. É fácil entender por que muitos argentinos preferem levar seus ONDE ESTÃO OS PIONEIROS Os precursores argentinos continuam na ativa. Wenceslao Casares (ex- Patagon) é fundador e CEO da Xapo, empresa de serviços com bitcoins. Marcos Galperín é CEO do MercadoLivre, onde começou, enquanto seu ex-parceiro, Hernán Kazah, está no fundo Kaszek. Alec Oxenford (ex- DeRemate) é cofundador da empresa de classificados digitais OLX. Andy Freire (foto) e Santiago Bilinkis (ex- Officenet) hoje são sócios na Quasar Ventures. projetos para o Chile, Uruguai ou Brasil. O movimento pode acabar fraturando um ecossistema que precisou de anos para se construir. O argentino é bom empreendedor e não teme o risco. Porém, as regras jogam contra ele, afirma Carolina Dams, investidora, consultora e mentora. A parte positiva é que o empreendedor que supera tantos obstáculos se torna mais criativo. INVESTIMENTOS CRUZADOS Os ecossistemas que prosperam no país são pródigos em conexões. O vídeo The Multiplier Effect: How a Network of Entrepreneurs Created a Tech Sector in Argentina (O Efeito Multiplicador: Como uma Rede de Empreendedores Criou um Setor Tecnológico na Argentina), disponível no YouTube (http://bit.ly/1hsyjhq), revela como os investimentos cruzados e os programas de mentoria interagiram para estruturar o sistema tecnológico argentino. Em quase seis minutos de vídeo, fica evidente o papel de empresas pioneiras como Patagon (de Wenceslao Casares), Officenet (de Andy Freire e Santiago Bilinkis), MercadoLivre (de Marcos Galperín e Hernán Kazah), Globant (de Martín Migoya, Guibert Englebienne, Martín Umaran e Néstor Nocetti) e Three Melons (de Mariano Suárez Battan). Algumas se fundiram a companhias maiores e outras mudaram de mãos, enquanto seus fundadores embarcavam em outros projetos. Foi esse comportamento dinâmico que propiciou o surgimento de diversas startups, seja pela circulação do dinheiro, seja pelo rearranjo de mentes que nunca param de inovar. Existe uma reciclagem constante de capital, diz Marta Cruz, da aceleradora NXTP Labs. A riqueza acumulada pelos empreende dores de sucesso volta a ser aplicada em novos projetos. A teoria é comprovada pela trajetória do Kaszek Ventures. Lançado em 2011 por Nicolás Szekasy e Hernán Kazah, cofundador e ex-cfo do MercadoLivre, o fundo levantou nos Estados Unidos seus primeiros US$ 95 milhões, injetados em 23 companhias. Em janeiro de 2014, foi a vez de arrecadar outros US$ 135 milhões, que começam agora a encontrar seu destino: negócios com alto potencial de crescimento, que precisem de até US$ 3 milhões para se expandir. Alguns de seus investimentos locais são o site de reservas Restorando, a plataforma social corporativa GoIntegro e a Eventioz, e-commerce de ingressos para espetáculos, vendida para a americana Eventbrite. É um dos melhores exemplos do ecossistema argentino em ação. PÚBLICO E PRIVADO Prefeitura realiza parcerias com aceleradoras para incubar projetos inovadores Em 2009, o GCBA (sigla para Governo da Cidade de Buenos Aires) instalou na zona de Parque Patricios um polo tecnológico que oferece capacitação, networking e apoio financeiro para jovens. No endereço funciona a incubadora Baitec, com espaços de coworking equipados com impressoras 3D. Nos últimos cinco anos, 118 empresas passaram pelo processo de incubação, realizado em associação com a iniciativa privada. É simples: aceleradoras elegem projetos promissores e investem neles uma determinada quantia US$ 25 mil, em média. O governo coloca, então, o mesmo valor. Se a startup fracassar, todos perdem. Porém, se der certo, o empreendedor devolve o dinheiro que recebeu do município. Nos últimos cinco anos, o GCBA já aplicou US$ 2 milhões no projeto. E prepara-se para investir mais US$ 1,5 milhão como capital semente. CIDADE SUSTENTÁVEL No evento Buenos Aires Creativa, em 2013,, urbanistas e profissionais da área de cultura discutiram sua contribuição para o futuro da metrópole STARTUPS DADOS INTELIGENTES A empresa trabalha com Smart Data: propõe a utilização de dados de navegação de diferentes provedores para aumentar a eficiência de campanhas online. Com os dados analisados em mãos, é mais fácil definir audiências com os perfis desejados. Está em aceleração na NXTP Labs. TODAS AS MOEDAS Os fundadores são argentinos, mas a empresa tem braços na Holanda e na Inglaterra e uma base operacional no Uruguai. Acelerada pela NXTP Labs, a Koibanx inova ao atuar como um banco de investimentos que lida tanto com moedas tradicionais quanto com o bitcoin. PESQUISAS SOB MEDIDA Nascida em 2013, a startup quer lançar uma máquina para criar conhecimento. A ideia é oferecer uma ferramenta que possa ser usada por qualquer empresa para fazer pesquisas de Big Data. Assim, não dependeriam de consultorias para fundamentar suas decisões. Foi incubada na Baitec e participou do Naves. NOSTALGIA E MODERNIDADE A Wayra investe na Widow Games, que renova jogos clássicos de mesa, como Palavras Cruzadas, TEG (uma espécie de War) e Memória, criando novas versões em plataformas digitais. Há produtos para PC, tablets e celulares. 50 pequenas empresas & grandes negócios Agosto, 2014 FOTOS: Divulgação ILUSTRAÇÕES: CÁSSIO BITTENCOURT Agosto, 2014 pequenas empresas & grandes negócios 51

ALCANCE GLOBAL Exploração espacial, Big Data e economia criativa são os mercados escolhidos pelas empresas que ultrapassaram as fronteiras do continente latino-americano O que uma empresa de nanossatélites, uma plataforma de Smart Data e um site de compartilhamento de filmes têm em comum? Todos esses projetos saíram da cabeça de argentinos e marcaram pontos no ambiente inovador global. Com planos de expansão ambiciosos, as empresas Satellogic e Grandata têm tudo para se fortalecer. A primeira apostou em dispositivos espaciais que prometem mapear o planeta a um custo muito inferior ao dos satélites tradicionais. Já a outra oferece uma plataforma para otimizar as campanhas publicitárias de empresas de todos os segmentos. Por enfrentarem problemas relativos a direitos autorais, os sites que disponibilizam gratuitamente filmes e séries não contam com investidores, porém atraem milhões de usuários de vários países. Conheça essas iniciativas. CORRIDA ESPACIAL Startup desenvolve satélites em miniatura de baixo custo Desvendar o espaço usando nanossatélites é a proposta de Emiliano Kargieman, 38 anos. Quando tinha 19, ele montou seu primeiro negócio, a Core Security, especializada em segurança da informação. Em 2010, fazendo um curso da Nasa, teve a ideia de criar a Satellogic. Desenvolver e lançar um satélite tradicional leva dez anos e centenas de milhões de dólares, diz. Em vez disso, Kargieman sugere lançar uma constelação de satélites pequenos e econômicos (US$ 50 mil cada um) e fazê-los atuar em rede, colhendo o mesmo número de dados em menos tempo. Com a camisa para fora dos jeans gastos, o empreendedor me recebe na sede da empresa: uma sala em um prédio residencial numa região elegante de, perto do cruzamento das avenidas Libertador e Raúl Scalabrini Ortiz. Uma dúzia de técnicos opera programas de computador aparentemente indecifráveis. Alguns operários vestindo trajes de laboratório estão armando Tita, o terceiro nanossatélite da empresa com dimensões pouco maiores que uma bola de futebol. Mais de cem dispositivos de porte semelhante devem entrar em ação a partir de 2015. Eles orbitarão continuamente a Terra, tirando fotos em alta resolução, que darão origem a mapas em tempo real. As aplicações são muitas: vão da busca de aviões acidentados ao controle de oleodutos, passando pela otimização das rotas marinhas e pelo cálculo de colheitas. Esse tipo de infraestrutura vai mudar o modo como nos relacionamos com o planeta, afirma. O espaço atravessa um momento revolucionário. Trata-se de uma nova corrida espacial. A Satellogic despertou enorme interesse na comunidade tecnológica, além de ser um bom exemplo de articulação entre as iniciativas privada e pública, já que foi incubada no Invap, uma companhia pública de tecnologia espacial com sede em Bariloche. Tem 18 empregados em e escritórios em Israel, Estados Unidos, França e Grã-Bretanha. JORNADA NAS ESTRELAS Emiliano Kargieman (à esq.) comanda a equipe da Satellogic, especializada em nanossatélites 52 pequenas empresas & grandes negócios Agosto, 2014 FOTOS: Divulgação

NA CABEÇA DO CLIENTE Um banco com bilhões de dados é o trunfo da Grandata PONTE AÉREA Mat Travizano comanda dos Estados Unidos uma equipe que trabalha em Mat Travizano, 34 anos, iniciou sua carreira empreendedora no final dos anos 1990, abrindo a CSO, uma empresa de segurança em informática. Depois de estudar Física na Universidade de, dedicou-se a criar startups em série. A mais bem-sucedida é a Grandata, que fundou em 2012 ao lado de Nicolas Goulu, 44 anos, e Martin Mennoni, 36. Os sócios ficam em um escritório em Palo Alto, nos Estados Unidos, mas a equipe de pesquisa e desenvolvimento atua em. Explica-se: no Vale do Silício, um engenheiro custa US$ 100 mil por ano; na Argentina, US$ 30 mil. O que me apaixona é a possibilidade de entender o comportamento humano por meio de dados, disse ele, em uma entrevista via Skype. Nosso negócio é transformar o Big Data em Smart Data. Reunindo bases de varejistas, telecoms e bancos, a Grandata compôs um banco com cerca de 20 bilhões de dados, relativos a 200 milhões de pessoas. A análise desse material permite que forneça informações para otimizar as campanhas publicitárias das marcas que atende. A discussão sobre invasão de privacidade não o incomoda. Hoje em dia, tudo o que você diz, faz ou até mesmo pensa pode ser usado contra você na web, disse o empreendedor em uma palestra recente. Entre os clientes da Grandata estão companhias de peso, como a Telefônica. Em breve, a empresa também começará a oferecer serviços para bancos. A estratégia de crescimento inclui a captação de clientes na América Latina e na Ásia. CINEMA EM CASA Sites de compartilhamento têm repercussão mundial Três empresas argentinas alcançaram outros continentes com a proposta de disponibilizar gratuitamente na web filmes e séries de TV. O Taringa!, dos irmãos Hernán Botbol, 32 anos, e Matías Botbol, 36, começou como uma plataforma social por meio da qual usuários de toda a América Latina trocavam arquivos de filmes, software e músicas. Depois que os sócios foram acusados de infringir as leis que regem os direitos autorais na Argentina, a troca desse tipo de conteúdo foi proibida. Hoje, o Taringa! funciona como um site de relacionamento, com cerca de 25 milhões de usuários em todo o continente. O Cuevana, lançado por Tomás Escobar (veja quadro na pág. 49), permitia aos usuários assistir a séries de TV recentes e estreias do cinema, sempre com legendas em espanhol: a plataforma, fundada em 2009, teve uma audiência que somou mais de 16 milhões de pessoas. Outro site de compartilhamento, o PopCorn Time, criado por uma equipe de desenvolvedores anônimos, teve um momento de glória em 2014. A explosão de usuários em todo o mundo levou a rede de televisão americana CBS a chamá-lo de Netflix pirata. De modo geral, essas empresas alegam que estão simplesmente compartilhando conteúdo, mas todas já esbarraram em problemas legais. Por conta disso, nunca tiveram o apoio de investidores. Mas mostraram que é possível atingir públicos globais a partir da Argentina. 54 pequenas empresas & grandes negócios Agosto, 2014 TRADUÇÃO: LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES FOTO: GRETA PONIEMAN