O SOFRIMENTO PSIQUICO DO DESEMPREGADO NA CONTEMPORANEIDADE



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Transcrição:

O SOFRIMENTO PSIQUICO DO DESEMPREGADO NA CONTEMPORANEIDADE Virgínia Ferreira Maria Teresa de Oliveira Mirás Universidade Católica de Petrópolis UCP (Brasil) Email: virginiaferreira@oi.com.br RESUMO O presente artigo tem como objetivo analisar as características do mundo contemporâneo e o sofrimento psíquico do indivíduo desempregado inserido nele. Considerando que o elemento central da sociedade contemporânea é o consumo, que a taxa de desemprego é crescente no Brasil, e tendo em vista a larga faixa etária atingida, surge a necessidade de estudar o sofrimento psíquico deste indivíduo desempregado que, justo por estar desempregado, encontra-se desamparado e excluído mesmo que temporariamente de seu meio social, por perder repentinamente toda condição de consumo material e cultural. Entendemos que, o sofrimento psíquico do indivíduo desempregado, em geral, é intensificado na sociedade contemporânea pelo aspecto transitório nas esferas familiar, social (interpessoal e cultural) e profissional, o que leva o indivíduo a freqüentes reajustes nos laços de confiança com ele mesmo e com o outro, e a constantes resignificações de seu posicionamento no mundo. Em outras palavras, como pensar este sujeito que na condição de desempregado é tomado pelo sentimento de menos valia frente a ele mesmo e ao mundo, condição essa que, via de regra, influencia na maneira como ele se relaciona com ele mesmo e com o outro. Palavras-chave: contemporaneidade, sofrimento psíquico e desemprego Virgínia Ferreira, Maria Teresa de Oliveira Mirás 1

Um breve panorama sobre a contemporaneidade e sofrimento psíquico. A única universalidade que o mundo atual aceita é a do mercado e a da moeda. Fora disto, cada um está encerrado em sua tribo. (BAUDIOU, 1994,p.13 ). Segundo Bauman (2004), ao falarmos de Contemporaneidade propomos a idéia de um mundo que tende a mudanças rápidas e de forma imprevisível, onde indivíduos encontram dificuldades internas de manter vínculos mais duradouros. Fazem laços como redes que podem ser desconectadas a qualquer momento. Para o autor, as mercadorias como automóveis, computadores, telefones celulares ainda em bom estado de uso são trocados tão logo apareçam versões mais modernas nas prateleiras ou no catálogo das lojas. Pode-se presumir, então, que a questão está para além da funcionalidade, a questão é estar dentro dos ditames da moda, a aparência, a partir daquilo que o indivíduo é capaz de consumir e, sobretudo, exibir. Assim, também são as parcerias e relacionamentos: pessoas parecem ter o valor proporcional ao quanto possam produzir e ao quanto possam ser úteis. Tão logo uma outra pessoa apareça com promessa de maior satisfação dos caprichos e das necessidades atuais daquele indivíduo, elas são trocadas, seguindo desta maneira o padrão consumista que, tende a substituição imediata dos objetos. Segundo Carmen Da Poin (2001), a idéia vendida pela publicidade é a de uma sociedade de sucesso financeiro, com desenvolvimento de tecnologia e facilidade de aquisição de bens materiais e que isto torna o indivíduo em condições de ser inserido em um seleto grupo. Grupo este que todos desejam se incluir. Porém, a sua volta, o que existe é uma árida realidade, com sérios problemas sociais, com graves questões de educação, segurança e saúde pública e com o evidente e agravante crescente desemprego, tanto causando sérias dificuldades ao indivíduo desempregado, como ameaçando e atormentando diariamente a vida do trabalhador e de sua família. Desta maneira, o sofrimento psíquico apresenta-se tanto no trabalhador a partir do fantasma do desemprego, como no desempregado, pelo medo de não conseguir, a curto ou médio prazos, empregar-se, além do sofrimento por ter perdido o poder de consumo. No que diz respeito ao sofrimento psíquico do desempregado, Lipovetsky (2007), propõe a questão dos conflitos familiares criados pelos e entre os membros de sua família por conta do seu desemprego e de suas conseqüências na queda do padrão de consumo e, portanto, na queda do padrão de vida de toda teia familiar. Segundo ainda Lipovetsky (2007), o desemprego traz importantes conseqüências sobre a moral e a conduta dos indivíduos. Não se compreenderia o ímpeto de um comprador compulsivo sem relacioná-los ao mal-estar dos numerosos fracassos enfrentados na vida pessoal. Quanto Virgínia Ferreira, Maria Teresa de Oliveira Mirás 2

mais se avolumam as frustrações e os dissabores da vida pessoal, mas irrompe a febre do consumo. Segundo Bauman (2004), Freud em seu texto O Mal-Estar na Civilização, invoca o preceito amar o próximo como a si mesmo, para dizer que ao mesmo tempo em que é um preceito fundamental para a vida civilizada, é ironicamente contrária da razão que advém da mesma civilização que são o interesse próprio e a busca da felicidade. Esta questão do amor próprio corre paralelamente a questão de que Bauman (2004), propõe que o que o indivíduo ama nele mesmo é se sentir o objeto do amor do outro.é a prova do reconhecimento de ser digno, de ser amado e de ter prazer com isto. Falar e saber ser ouvido com atenção e interesse, e se sentir respeitado. Saber ser importante com o que pensa e com o que diz e com o que faz. Significa aí, admitir e confirmar sua dignidade e portar um valor singular. Por outro lado, o compromisso com outra pessoa atualmente, parece estar sendo evitado a todo custo. Isto porque torna o outro dependente, em um compromisso incondicional, implicando em laços duradouros e, necessariamente, consistindo numa responsabilidade moral. A confiança entre pessoas, as interações no emprego e nas relações profissionais levam freqüentemente a frustrações. Não se dispõe de pontos de orientação, ou seja, de valores morais com expectativa de vida longa. O indivíduo com a consciência de seu valor obtém maior satisfação em suas conquistas, procura e investe em relações consistentes e se emprenha em alcançar elevados níveis de desempenho. Já o indivíduo com baixa auto-estima é menos confiante em sua competência, procura o reconhecimento do outro para se sentir seguro e mais valorizado. O conflito do indivíduo contemporâneo gira em torno do Ter ou Não Ter, não em torno do Ser ou Não Ser. O Ter significa poder e reconhecimento dentro da sociedade. Neste sentido, tudo o que resta ao indivíduo desempregado é a vergonha e o sofrimento por estar à margem do valor capital da sociedade: o consumo. Nenhuma outra técnica de conduta de vida prende o indivíduo tão firmemente à realidade quanto à ênfase concedida ao trabalho, pois este pelo menos lhe fornece um lugar seguro numa parte da realidade na comunidade humana. ( FREUD,1930,p.99). De acordo com Freud (1930), o superego permanece vigilante às relações do indivíduo com o mundo externo e está sempre pronto a lhe chamar atenção. Se algo o contraria, o indivíduo busca no seu interior toda sua agressividade e a direciona contra si e contra o mundo, atitude que, respectivamente, por um lado acarreta ansiedade e, por outro, lhe inflige penitências. Assim Virgínia Ferreira, Maria Teresa de Oliveira Mirás 3

sendo, o destino é encarado e vivenciado como uma punição inevitável que, condena o indivíduo a falta de amor e ao sentimento de desamparo. O destino, neste caso, é tomado como meio e como fim. Conforme Birman (2003), o desamparo originário é exacerbado na contemporaneidade, já que há nesta era uma ruptura das referências tradicionais, culturais e sociais, fato que só faz aumentar as incertezas do indivíduo frente à multiplicidade de possibilidades apresentadas na ordem social e, ainda, facilitando, de uma certa forma, que o indivíduo se feche em seu próprio sofrimento e se isole em seu próprio mundo. Para Dejours (2007), a percepção do sofrimento alheio provoca uma experiência particular do que percebe como culpa, a agressividade e o prazer. O sujeito que sofre no seu trabalho é levado a esconder seu sofrimento do público, por vergonha de reclamar de uma coisa dos quais tantos outros sentem falta, ou até mesmo necessitam. E isto faz com que indivíduo se abstraia do sofrimento alheio. Com isto, dependendo da relação estabelecida entre os indivíduos, estes se tornam aparentemente, ou até mesmo de fato, insensíveis ao sofrimento daqueles que se encontram desempregados. Dejours (1994),por fim, abre a questão acerca da importância e do lugar do trabalho no desejo e na existência do sujeito contemporâneo. O sofrimento psíquico do desempregado na contemporaneidade: considerações finais....o vivenciado e as condutas são fundamentalmente organizadas pelo sentido que os sujeitos atribuem à sua relação no trabalho. (DEJOURS,1994, p.140). Para a psicopatologia do trabalho, o indivíduo é um sujeito presente, um sujeito que produz interpretações de sua situação, e suas condições que reagem e se organizam mental e afetivamente em função de suas interpretações e finalmente age. Sennett (1999), chama atenção para a extensa literatura sobre caminhos para alcançar o sucesso, mas que não há nenhuma que aponte o modo como o fracasso deve ser enfrentado e como dar forma e lugar na vida do indivíduo para o fracasso. No entanto, a perspectiva do fracasso tornou-se um fato numa classe de pessoas que educadas para terem uma profissão e uma carreira predisposta ao fracasso num mercado altamente competitivo, com redução de trabalhadores nas empresas que procuram ser cada vez mais enxutas. O trabalhador necessita de uma motivação para sua carreira ou fica condenado a uma vida sem objetivo e com sentimento de incompetência. Com efeito, o indivíduo que segue uma carreira, persegue um objetivo de longo prazo, desenvolve senso de responsabilidade por sua conduta e segue padrões de comportamentos Virgínia Ferreira, Maria Teresa de Oliveira Mirás 4

profissionais, certamente está fora dos padrões propostos e impostos pela sociedade contemporânea, sociedade a qual os valores não são duradouros, as relações são circunstanciais e descartáveis de acordo com os interesses imediatos do indivíduo num dado momento. Tomando a atualidade a partir desta perspectiva, como pensar em carreiras? Carreiras em longo prazo se contrapondo com uma realidade de capitalismo flexível, de curto prazo, com princípios de produção diferentes de tempos atrás e numa sociedade onde tudo é rapidamente consumido, descartado e substituído. Desta forma, Sennett(1999), em consonância com as idéias propostas por Zygmunt Bauman, em seus textos sobre a pós-modernidade, propõe que a psique permaneça no interminável vir a ser, não havendo, então, uma narrativa de vida coerente. Revela, então: Um Eu maleável, uma colagem de fragmentos, um incessante vir a ser, sempre aberto a novas experiências - estas são as condições adequadas á experiência de trabalho a curto prazo, às instituições flexíveis e ao constante correr riscos. ( SENNET, 1999,p.159). (...) Não é a rigidez de uma situação ou os sofrimentos que ela impõe que constituem motivos para que se conceba outro estado de coisas, no qual tudo sairá melhor para todos; pelo contrário, é a partir do dia em que se pode conceber outro estado de coisas que uma luz nova ilumina nossas penúrias e sofrimentos e decidimos que são insuportáveis. (SARTRE, 2003, p.538). A questão é que o indivíduo integra seu sofrimento à sua existência, sua consciência, ela mesma procura se esquivar da liberdade de refazer seu projeto de vida. E ao fazer isto, o indivíduo, certamente está infligindo a si mesmo maior sofrimento. Sartre segue dizendo que já que o mundo devolve ao indivíduo exatamente a imagem do que ele é, uma vez que ele próprio escolhe a significação do mundo, ele escolhe também a si mesmo. Escolhe o valor das coisas, suas funções, projetos que esboçam não só sua própria imagem como também sua escolha, revelando, assim, inteiramente seu ser. Virgínia Ferreira, Maria Teresa de Oliveira Mirás 5

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BAUDIOU, Alain. Para uma Nova Teoria do Sujeito: conferências brasileiras. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1994. BAUMAN, Zigmunt. Amor Líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2004. BIRMAN, Joel. Mal-Estar na Atualidade: a psicanálise e as novas formas de subjetivação. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. DEJOURS, Christophe. Psicodinâmica do Trabalho:contribuições da Escola Dejouriana à analise da relação prazer, sofrimento e trabalho. São Paulo: Atlas,1994.. A Banalização da Injustiça Social. Rio de Janeiro: FGV,2007. FREUD, Sigmund. Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud. Rio de janeiro: Imago,1969-1970. 24v.( O Mal-Estar na Civilização.(1930[1929]). v.xxi ). LIPOVETSKY, Gilles. A Sociedade da Decepção. São Paulo: Manole, 2007. POIN, Carmen Da (org.). Formas do Vazio: desafio ao sujeito contemporâneo. São Paulo: Via Lettera editora e livraria, 2001. SARTRE, Jean-Paul. O Ser e o Nada: ensaio de ontologia fenomenológica. Petrópolis: Vozes, 2003. Virgínia Ferreira, Maria Teresa de Oliveira Mirás 6