Da historicidade da ciência e suas implicações para a epistemologia (Natureza, Sociedade e linguagem) Prof. Mauro Lúcio Leitão Condé (UFMG)



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Transcrição:

2 0 1 3 Da historicidade da ciência e suas implicações para a epistemologia (Natureza, Sociedade e linguagem) Prof. Mauro Lúcio Leitão Condé (UFMG) Qualquer teoria do conhecimento sem estudos históricos ou comparados permaneceria um jogo de palavras vazio, uma epistemologia imaginária (Epistemologia imaginabilis) Fleck A Filosofia da ciência sem a história da ciência é vazia; a História da ciência sem a filosofia da ciência é cega Lakatos 1

Da historicidade da ciência e suas implicações para a epistemologia (Natureza, Sociedade e Linguagem) Ementa geral O curso analisa como, ao longo do século XX, as ciências (em especial as ciências naturais) se tornaram objeto de análise da história e da sociologia, etc. além da filosofia, que até então tradicionalmente fazia esse estudo transversal da ciência. O curso busca ainda analisar algumas importantes consequências desse processo, em especial, procurando compreender como a concepção de historicidade da ciência, que emerge dessas análises históricas, possibilitou não apenas uma maior compreensão da história da ciência e, consequentemente, da própria ciência, mas também afetou a epistemologia, obrigando o pensamento contemporâneo a abandonar as epistemologias fundacionistas para constituir uma epistemologia histórica. Por fim, serão analisados os alcances, limites e possibilidades dessa nova epistemologia histórica que, ao assumir a historicidade da ciência, trouxe a necessidade de se reequacionar as relações entre natureza, sociedade e linguagem. 2

Programa 1- Introdução: a ciência tem história 2- O filósofo e as máquinas: a emergência da historicidade da ciência 3- Um papel para a história : historicidade da ciência ou relativismo 4- A invenção do conhecimento: natureza, sociedade, história e linguagem na construção da ciência 3

1- Introdução: a ciência tem história Ementa do módulo: Como introdução será feita uma rápida abordagem de questões como o que é conhecimento? ; o que é ciência? ; o que é história da ciência? visando preparar o terreno para as discussões que se seguirão. Nesse primeiro módulo, o objetivo é mostrar como a partir de finais de século XIX a preocupação com a história da ciência passa a ser mais presente. Conduto, essa é inicialmente uma história positivista, isto é, a história como um relato da positividade dos fatos demonstrados pela ciência. A história como um progresso (em oposição à história como processo ). Por fim, será abordado o Neopositivismo ou Positivismo Lógico (ainda Empirismo Lógico) que, mesmo acrescentando a lógica matemática à perspectiva positivista (fatos), continua considerando a história e os aspectos sociais como algo secundário na produção do conhecimento científico. Temas trabalhados: Ciência, História, Positivismo, Neopositivismo 4

Programa do módulo: 1.1- A ciência tem história 1.2- O que é conhecimento? 1.3- O que é ciência? 1.4- O que é história da ciência? 1.5- Uma história da ciência de fatos sem historicidade: positivismo e neopositivismo 1.6- A historicidade no debate internalismo versus externalismo 5

2- O filósofo e as máquinas: a emergência da historicidade da ciência Ementa do módulo: A partir dos anos 1930, Alexandre Koyré cria uma alternativa à concepção positivista de história da ciência ao introduzir uma nova perspectiva com base na análise das ideias científicas. Contudo, a história das ideias científicas de Koyré ainda coloca em segundo plano os aspectos sociais envolvidos na construção da ciência. Contrariamente à perspectiva de Koyré, no mesmo período, autores como Zilsel, Merton, Hessen, Grossman e Fleck elaboram diferentes interpretações da ciência a partir dos aspectos históricos e sociais. Procuram compreender a ciência como uma relação entre a natureza e a sociedade em um determinado tempo histórico e, de diferentes modos, esses autores valorizam os aspectos sociais presentes nas práticas científicas afirmando a emergência da historicidade da ciência. Em outras palavras, a concepção de que a história de um saber é elemento constitutivo desse saber. Por fim, será visto como a dicotomia de Reichenbach atrasa o processo de consolidação dessa historicidade da ciência. Autores trabalhados: Koyré, Merton, Hessen, Grossmann, Zilsel, Fleck, Reichenbach 6

Programa do módulo: 2.1-Koyré: a história das ideias científicas 2.2-Merton: ciência e sociedade 2.3-Hessen e Grossmann: marxismo e história da ciência 2.4-Zilsel: as origens sociais da ciência moderna 2.5-Fleck: a emergência da historicidade da ciência 2.6-Reichenbach: contexto de descoberta, contexto de justificativa 7

3- Um papel para a história : historicidade da ciência ou relativismo Ementa do módulo: Tendo a obra de Kuhn, A estrutura das revoluções científicas, como eixo norteador, este módulo analisa a consolidação da historicidade da ciência e seus novos impasses. Historicidade seria necessariamente sinônimo de relativismo? Com o propósito de compreender como Kuhn consolida a nova imagem da ciência com a afirmação da historicidade, em um primeiro momento, serão analisados Fleck e Wittgenstein como influências centrais da historicidade kuhniana. Na sequência, será abordada a relação entre historicidade e relativismo a partir da análise da (1) contraposição da história da ciência de Kuhn com a filosofia da ciência de Popper, o célebre debate Kuhn versus Popper, nos anos sessenta, e, posteriormente, (2) com as contraposições de Kuhn à sociologia do conhecimento científico do Programa Forte, nos anos oitenta/noventa. Por fim, serão analisadas as limitações de Kuhn na solução dos novos impasses trazidos pela historicidade da ciência. Autores trabalhados: Kuhn, Fleck, Wittgenstein, Popper, Bloor, Shapin. 8

Programa do módulo: 3.1- Kuhn: um papel para a história na história da ciência 3.2- Fleck e Wittgenstein como influências centrais de Kuhn 3.3- Romantismo versus iluminismo: debate Kuhn versus Popper 3.4- Kuhn e as fraquezas do Programa Forte (Bloor, Shapin) 3.5- Kuhn e as insuficiências do léxico 9

4- A invenção do conhecimento: natureza, sociedade, história e linguagem na construção da ciência Ementa do módulo: Neste módulo será abordada a ideia de que afirmar a historicidade é compreender a ciência como o resultado da interação entre sociedade e natureza através da mediação da linguagem. No entanto, contra a tese relativista amplamente divulgada pelas tendências pós-modernas, que afirma que tudo é linguagem, busca-se mostrar que a linguagem está em tudo. Com uma autonomia relativa, a linguagem é uma técnica através da qual o homem se conecta com a natureza e a sociedade. No entanto, a linguagem não é independente de aspectos sociais e naturais, é apenas um tipo de propriedade emergente resultante da interação entre sociedade e natureza. Deste modo, esta perspectiva surge criticamente não só contra os radicalismos sócio-construtivistas que subestimaram a participação da natureza na produção de conhecimento científico, mas também contra uma posição positivista ao entender o conhecimento científico como uma descrição ou representação da natureza. Ciência não é apenas uma descoberta, mas também uma invenção, e invenção significando apenas que a ciência articula linguisticamente a relação entre a sociedade e a natureza. Com efeito, todo conhecimento é tecido a partir de sua historicidade. Autores trabalhados: Kuhn, Fleck, Wittgenstein 10

Programa do Módulo: 4.1- Fleck, o condicionante social do conhecimento e o lugar da linguagem 4.2- Wittgenstein e a gramática da ciência 4.3- O social estruturado como linguagem 4.4- A narrativa conceitual: o historiador como linguista 4.5- A invenção do conhecimento como uma tessitura linguística, natural e social 11

Da historicidade da ciência e suas implicações para a epistemologia (Natureza, Sociedade e linguagem) 1- Introdução: a ciência tem história 2- O filósofo e as máquinas: a emergência da historicidade da ciência 3- Um papel para a história : historicidade da ciência e relativismo 4- A invenção do conhecimento: natureza, sociedade, história e linguagem na construção da ciência

1- Introdução: a ciência tem história 1.2- O que é conhecimento? 1.3- O que é ciência? 1.4- O que é história da ciência? 1.5- Uma história da ciência de fatos sem historicidade: positivismo e neopositivismo 1.6- A historicidade no debate internalismo versus externalismo

2- O filósofo e as máquinas: a emergência da historicidade da ciência 2.1-Koyré: a história das ideias científicas 2.2-Merton: ciência e sociedade 2.3-Hessen e Grossmann: marxismo e história da ciência 2.4-Zilsel: as origens sociais da ciência moderna 2.5-Fleck: a emergência da historicidade da ciência 2.6-Reichenbach: contexto de descoberta, contexto de justificativa

3- Um papel para a história : historicidade da ciência e relativismo 3.1- Kuhn: um papel para a história na história da ciência 3.2- Fleck e Wittgenstein como influências centrais de Kuhn 3.3- Romantismo versus iluminismo: debate Kuhn versus Popper 3.4- Kuhn e as fraquezas do Programa Forte (Bloor, Shapin) 3.5- Kuhn e as insuficiências do léxico

4- A invenção do conhecimento: natureza, sociedade, história e linguagem na construção da ciência 4.1- Fleck, o condicionante social do conhecimento e o lugar da linguagem 4.2- Wittgenstein e a gramática da ciência 4.3- O social estruturado como linguagem 4.4- A narrativa conceitual: o historiador como linguista 4.5- A invenção do conhecimento como uma tessitura linguística, natural e social

Alexandre Koyré, 1892-1964

Principais obras Estudos de história do pensamento científico Estudos de história do pensamento filosófico Estudos galileianos (galiláicos) Estudos newtonianos Do mundo fechado ao universo infinito

Ciência é teoria ( A ciência é essencialmente teoria e não coleção de fatos ). O pensamento moderno é um novo estilo de pensamento. Uma revolução ou uma mutação no pensamento. Kepler: todo o universo é regido pela mesma lei. Leis de natureza estritamente matemática. Galileu: Método científico implica na razão sobre a experiência (primado da teoria sobre os fatos) Utilização da linguagem matemática para compreender a natureza (mundo racional da precisão contra o mundo do mais ou menos da experiência). Lei de inércia: Movimento e repouso colocado no mesmo nível ontológico.

Resposta de Koyré às concepções sociais da ciência moderna Alguns insistem no papel da experiência e da experimentação na ciência nova, a luta contra o saber livresco, a nova fé do homem moderno nele mesmo, em sua capacidade de descobrir a verdade por seus próprios meios, pelo exercício de seus sentidos e de sua inteligência, fé que exprimiram com tanta força Bacon e Descartes se opondo à crença que prevalecia até então no valor supremo e esmagador da tradição e da autoridade consagrada. Outros sublinham a atitude prática do homem moderno que se volta à vita contemplativa que a idade média e a antiguidade consideravam, alega-se, como o apogeu da vida humana, para se voltar para a vita activa, operativa, como chamava por Bacon ou dizia Descartes, uma ciência que voltou o homem senhor e possuidor da natureza.

A ciência nova, somos por vezes informados, é a ciência do artesão e do engenheiro, do trabalhador comerciante, empreendedor e calculador, em soma da classe burguesa ascendente na sociedade moderna. (aqui Koyré coloca uma nota que remete, entre outros, à Zilsel, Hessen e Grossman). Existe certamente verdade nessas descrições e explicações; é claro que a crença da ciência moderna pressupõe as cidades; é evidente que o desenvolvimento das armas de fogo, sobretudo o da artilharia, chamou atenção sobre os problemas de balística; que a navegação, sobretudo para a América e as Índias, favoreceu a construção de relógios, etc.; contudo, devo reconhecer que essas explicações não me parecem satisfatórias. Não sei o que a scientia ativa teve a ver com o desenvolvimento do cálculo, nem a ascensão da burguesia com a astronomia de Copernicana ou Kepleriana.

Quanto à experiência e à experimentação duas coisas que nós devemos não apenas distinguir, mas mesmo opor uma à outra estou convencido que a ascensão e o crescimento da ciência experimental não é a fonte, mas bem ao contrário, o resultado da nova concepção teórica, ou antes, metafísica da natureza que forma o conteúdo da revolução científica do século XVII, conteúdo que nós devemos compreender antes de tentar a explicação (seja ela qual for) deste fato histórico. Koyré, A. Études newtoniennes, pp. 28-29. ( ) se o interesse prático fosse a condição necessária e suficiente do desenvolvimento da ciência experimental na nossa concepção dessa palavra esta ciência teria sido criada mil anos antes (...) pelos engenheiros do império romano, senão pelos da república romana. Koyré, A. As origens da ciência moderna

Edgar Zilsel, 1891-1944

Principais obras As origens sociológicas da ciência A gênese do conceito de lei física As origens do método científico de William Gilbert

A tese de Zilsel A chamada tese de Zilsel é uma explicação para a emergência da ciência moderna segundo a qual o nascimento do capitalismo permitiu a interação entre artesãos e os acadêmicos das universidades (também os humanistas) que, por sua vez, conduziu à emergência da ciência. Os artesãos eram iletrados e menosprezados pelos acadêmicos que ignoravam as atividades práticas. Contudo, alguns artesãos superiores (artistas-engenheiros) começaram a necessitar de mais conhecimentos (que os práticos) para seus trabalhos. Ex. Leonardo Da Vinci. A tese da lei natural A ideia de lei natural no início da modernidade originou-se do conceito de lei jurídica. O rei estabelece as leis para a nação e Deus para a natureza.

A sociedade humana não muda tão frequentemente como mudou tão radicalmente na transição do feudalismo para o início do capitalismo (...). Condições para o nascimento da ciência: 1- emergência do capitalismo (...) cultura centrada nas cidades. 2- O fim da idade média foi um período de rápido progresso tecnológico e de invenções tecnológicas. Maquinas começaram a ser usadas na produção de bens e na guerra. 3- Na sociedade medieval o indivíduo estava ligado à tradição do grupo a qual ele inalteravelmente pertencia. No início do capitalismo, o sucesso econômico dependia do espírito de empreender do indivíduo. No início do feudalismo, a competição econômica era

desconhecida. (...) O individualismo da nova sociedade é o pressuposto do pensamento científico. 4- (...) a emergência do método quantitativo, o qual virtualmente era inexistente nas teorias medievais, não pode ser separado do espírito de contar e calcular do capitalismo econômico. Zilsel, E. As origens sociológicas da ciência, pp. 8-9.

Do período do final da idade média até 1600 os acadêmicos das universidades e os humanistas literatos são treinados racionalmente, mas não fazem experimentos, pois desprezam o trabalho manual. Muitos outros plebeus artesãos fazem experimentos e inventam, mas lhes falta treinamento racional e metódico. Por volta de 1600, com o progresso da tecnologia, o método experimental é adotado por acadêmicos das classes superiores treinados racionalmente. Assim, finalmente, os dois componentes da pesquisa científica são unidos: a ciência moderna nasce. O processo como um todo está embutido no avançar do início da economia capitalista que enfraquece a mente coletiva, o pensamento mágico, as tradições e a crença na autoridade e promove o pensamento mundano, racional e causal, o individualismo e a organização racional. Zilsel, E. As origens sociais da ciência, p. 6. (Texto base do anterior apresentado em 1939 na universidade de Harvard)

Thomas Kuhn, 1922-1996

Principais obras A estrutura das revoluções científicas (1962) A tensão essencial (1977) O caminho desde a Estrutura (2000)

Principais idéias na Estrutura Paradigma Comunidade científica Mudança de paradigma Gestalt Ciência normal Pós Estrutura Léxico Evolução

Possuir um léxico, um vocabulário estruturado, é ter acesso ao variado conjunto de mundo no qual este léxico pode ser usado para descrevê-lo (Kuhn, 2000:61). Diferentes léxicos aqueles de culturas ou períodos históricos diferentes, por exemplo, dão acesso a diferentes conjuntos de mundos possíveis, largamente, mas nunca inteiramente sobrepostos. Embora um léxico possa ser enriquecido para se obter o acesso a mundos previamente acessíveis apenas com o outro léxico. (Kuhn, 2000:61) ( ) para compreender algum corpo de crenças científicas passadas, o historiador deve adquirir um léxico que aqui e ali difere sistematicamente do léxico atual em seus próprios dias (Kuhn, 2000:58). Esse não é um processo de tradução (Kuhn, 2000:59), mas de bilinguismo (Kuhn, 2000: 93, 238).

A impossibilidade da tradução não impede, é claro, os usuários de um léxico de aprender o outro. E tendo feito isso, eles podem por os dois juntos, enriquecendo seu vocabulário inicial, adicionando-lhe conjuntos de termos daquele que apenas adquiriram. Para alguns fins, tal enriquecimento é essencial. (Kuhn, 2000:74) Palavras, com exceções pontuais, não têm significado individualmente, mas somente através de suas associações com outras palavras, dentro de um campo semântico. Se o uso de um termo individual se altera, então o uso dos termos associados normalmente se altera também. (Kuhn, 2000:63) (...) declarar que um enunciado é um candidato a verdadeiro / falso é aceitá-lo como uma marcação em um jogo de linguagem cujas regras proíbem asseverar simultaneamente um enunciado e seu contrário. Uma pessoa que quebra essa regra declara-se fora do jogo (...). Existem, é claro, jogos de linguagem sem a regra da não contradição e seus correlatos: a poesia e o discurso místico, por exemplo. (Kuhn, 2000:100)

Um (...) aspecto significativo do processo de aprendizagem é que a exposição a uma única situação exemplar, raramente ou nunca fornece informação suficiente para permitir que o aluno use um novo termo. São necessários vários exemplos de tipos variados, muitas vezes acompanhada de exemplos de situações aparentemente semelhantes a que o termo em questão não se aplica. (Kuhn, 2000:67) Confrontado com uma atividade não observada anteriormente, aplicamos o termo jogo, porque o que estamos vendo tem uma estreita semelhança de família para uma série de atividades que aprendemos anteriormente a chamar por esse nome. Para Wittgenstein, em síntese, jogos, cadeiras e folhas são as famílias naturais, cada um constituído por uma rede de sobreposição e semelhanças entrecruzadas. A existência de tal rede suficientemente representa o nosso sucesso na identificação do objeto ou atividade correspondente. (Kuhn, 1970:45)

O que tinha sido exemplos paradigmáticos de movimento para Aristóteles (...) não eram propriamente movimentos para Newton. Na transição, a família natural deixou de ser natural; seus membros foram redistribuídos entre os conjuntos pré-existentes, e apenas um deles continuava a ostentar o nome antigo. (Kuhn, 2000:30) Para aprender qualquer uma destas três formas de fazer mecânica, os termos inter-relacionados de alguma parte local da rede da linguagem devem ser aprendidos ou reaprendidos em conjunto e, então, previsto na natureza inteira. Eles não podem simplesmente ser processados individualmente pela tradução. (Kuhn, 2000, p. 44) Qual a melhor forma de caracterizar esse tipo restrito de mudança é um dos problemas que atualmente me ocupa, e eu não tenho nenhuma solução completa. Mas, grosso modo, o caráter distintivo de uma mudança revolucionária na linguagem é que ela altera não só os critérios pelos quais os

termos se ligam à natureza, mas também, maciçamente, o conjunto de objetos ou situações nas quais esses termos se conectam. (Kuhn, 2000:29-30) A prática científica sempre envolve a produção e a explicação de generalizações sobre a natureza, e essas atividades pressupõem uma linguagem com alguma riqueza mínima e a aquisição de tal linguagem traz consigo o conhecimento da natureza. Quando a exibição de exemplos faz parte do processo de aprendizagem de termos como movimento, célula, ou elemento de energia, o que é adquirido é o conhecimento conjunto da linguagem e do mundo (...). Em grande parte do aprendizado da linguagem, estes dois tipos de conhecimento o conhecimento de palavras e o conhecimento da natureza são adquiridos em conjunto, e não são realmente dois tipos de conhecimento, mas sim as duas faces de uma mesma moeda que uma linguagem proporciona. (Kuhn, 2000:31) O aprendizado que resulta de tal processo não é, no entanto, sobre as palavras sozinhas, mas igualmente sobre o mundo em que elas funcionam. Quando eu uso a frase descrições estipulativas no que se segue, as estipulações que tenho

em mente serão, simultânea e inseparavelmente, tanto sobre a substância quanto do vocabulário da ciência, tanto sobre o mundo quanto sobre a linguagem. (Kuhn, 2000:67) Revoluções foram acompanhadas por mudanças na maneira pela qual termos como movimento ou célula se ligavam à natureza. Neste exemplo, houve efetivamente uma mudança nas próprias palavras, que destaca aquelas características da situação física que a revolução tinha feito proeminentes. Quando Planck por volta de 1909, foi finalmente convencido de que a descontinuidade tinha alguma coisa a dizer ele mudou para um vocabulário que tem sido o padrão desde então. Anteriormente, ele se referia normalmente ao tamanho da célula ε como o elemento de energia. Então, ao invés disso, em 1909, ele começou a falar regularmente do quantum de energia. (Kuhn, 2000, p. 28) A posição que estou desenvolvendo é uma espécie de kantismo pós-darwiniano. Assim como as categorias kantianas, o léxico fornece as precondições da

experiência possível. Mas categorias lexicais, ao contrário de seus antepassados kantianos, podem mudar, tanto com o tempo quanto com a passagem de uma comunidade para outra. (Kuhn, 2000:104) Subjacente a todos estes processos de diferenciação e mudanças, naturalmente, deve ter algo permanente, fixo e estável. Mas, como a Ding an sich de Kant é algo inefável, indescritível, indiscutível (Kuhn, 2000:104).

Ludwik Fleck, 1896-1961

Principais obras Gênese e desenvolvimento de um fato científico (1935) Sobre a crise da realidade (1929) O problema da epistemologia (1936) Problemas da ciência da ciência (1946) Crise na ciência (1960)

Principais idéias Estilo de pensamento Coletivo de pensamento Evolução do pensamento versus revolução Mutações no estilo de pensamento Acoplamentos (conexões) ativos e passivos Pré ideias ou Proto idéias Gestalt

Crítica ao neopositivismo (dados e linguagem) e a afirmação do social como base do conhecimento O sistema de Carnap (Der logische Aufbau der Welt A construção lógica do mundo) talvez seja a última tentativa séria de construir o mundo a partir de dados, de vivências imediatas enquanto elementos últimos. Uma vez que o próprio Carnap já abandonou, por etapas, essa posição (cf. Erkenntnis Conhecimento, Vol. II, p. 432), não cabe mais criticá-lo. Em relação a sua posição que rejeita o absolutismo das proposições protocolares (Erkenntnnis, Vol. III, p. 215), cabe desejar que descubra finalmente o condicionamento social do pensamento. Somente então ele se livrará do absolutismo das normas de pensamento, tendo que abrir mão, evidentemente, da ciência unificada Fleck, L. Gênese e desenvolvimento de um fato científico

Assim nasce o fato: primeiro um sinal de resistência no pensamento inicial caótico, depois certa coerção de pensamento e, finalmente, uma forma (Gestalt) a ser percebida de maneira imediata. Ele sempre é um acontecimento que decorre das relações na história do pensamento, sempre é resultado de um determinado estilo de pensamento. Fleck, L. Gênese e desenvolvimento de um fato científico O alcance de habilidades físicas e psíquicas, a coleta de certa quantidade de observações e experimentos, a capacidade de adaptações plásticas de conceitos representam, entretanto, uma série de circunstâncias que escapam a um controle lógico-formal, sendo que a mencionada dialética impossibilita, de vez, uma análise lógico-formal do processo de conhecimento. Fleck, L. Gênese e desenvolvimento de um fato científico

Todo conhecimento é um atividade social, não apenas quando ele requer cooperação, mas porque ele é sempre baseado em conhecimento e habilidades transmitidas de muitos outros. (...) o conhecimento deve ser considerado como uma função de três componentes: é a relação entre o sujeito individual, certo objeto e um determinado coletivo de pensamento, no interior do qual o sujeito atua. Ele funciona apenas quando certo estilo de pensamento originado em uma dada comunidade é usado. Fleck, L. Gênese e desenvolvimento de um fato científico Pelo menos três quartos, talvez a totalidade, do conteúdo das ciências são condicionados e podem ser explicados pela história do pensamento, pela psicologia e pela sociologia do pensamento. Fleck, L. Gênese e desenvolvimento de um fato científico

Por isso, o processo de conhecimento não é o processo individual de uma consciência em si teórica; é o resultado de uma atividade social, uma vez que o respectivo estado do saber ultrapassa os limites dados a um indivíduo. Fleck, L. Gênese e desenvolvimento de um fato científico A teoria comparada do conhecimento não deve considerar o processo do conhecimento como uma relação binária entre sujeito e objeto, entre o ator do conhecimento e algo a ser conhecido. O respectivo estado do saber, enquanto fator fundamental de cada conhecimento novo, deve entrar como o terceiro elemento nessa relação. Fleck, L. Gênese e desenvolvimento de um fato científico

Ludwig Wittgenstein, 1889-1951

Principais obras Tractatus Logico-Philosophicus (1921) Investigações Filosóficas (1953) Observações sobre os fundamentos da matemática (1956) Sobre a certeza (1969)

Investigações Filosóficas Da semântica para a pragmática Uso Jogos de linguagem Seguir uma regra Gramática Formas de vida

A significação de uma palavra é seu uso na linguagem (I. F. 43). A gramática diz que tipo de objeto algo é (I. F. 373) Se as coisas se comportassem de modo totalmente diferente do que se comportam de fato (...) então nossos jogos de linguagem normais perderiam seu sentido (I. F. 142). Ou ainda, Se imaginamos os fatos diferentemente do que são, certos jogos de linguagem perdem alguma importância, enquanto outros se tornam importantes. E, desse modo, há uma alteração gradual no uso do vocabulário de uma língua (S. C. 63). Se o que é regra se tornasse exceção e o que é exceção, regra, ou se as duas se tornassem fenômenos de frequência mais ou menos igual então nossos jogos de linguagem normais perderiam seu sentido (I. F. 142, também em 199, 202, 226, 227).

Compreender uma linguagem significa dominar uma técnica (I. F. 199). Não é um processo mental isolado. Acreditar seguir uma regra não é seguir uma regra. E daí não podermos seguir a regra privadamente ; porque, senão, acreditar seguir uma regra seria o mesmo que seguir uma regra (I. F. 202). Toda prova, todo confirmar e invalidar de uma suposição acontece já no interior de um sistema. Esse sistema não é um ponto de partida mais ou menos arbitrário e duvidoso para todos os nossos argumentos, ao contrário, pertence à essência do que chamamos um argumento. O sistema não é tanto o ponto de partida quanto o elemento da vida dos argumentos. (S. C. 105). Não se trata apenas de afirmar que aquilo em que acreditamos forma um sistema (S. C. 141), ou ainda que aquilo a que nos agarramos não é uma proposição, mas um conjunto de proposições (S. C. 225), mas, sobretudo, de constatar que o nosso discurso adquire o seu significado a partir do resto de nossas ações (S. C. 229). Em outros termos, o sistema não é apenas um sistema linguístico, mas um sistema de

linguagem e ações. A partir dessa perspectiva pragmática é que. o nosso saber forma um grande sistema. E só no interior desse sistema é que o singular tem o valor que lhe damos (S. C. 410). É isso que significa afirmar que até a singularidade de uma proposição empírica, ou a afirmação de isto está aqui!, apenas adquire seu sentido a partir do todo da gramática. Ainda que proposições empíricas aprendidas por nossas experiências possam ser consideradas como certas por nós, (S. C. 273) a experiência não as ensina isoladamente; pelo contrário, ensinou-nos um conjunto de proposições interdependentes (S. C. 274). Seguir uma regra, fazer uma comunicação, dar uma ordem, jogar uma partida de xadrez são hábitos (costumes, instituições) (I. F. 199). Nesse sentido, quando usamos uma ação orientada linguisticamente, nossa intenção está inserida na situação, nos hábitos humanos e nas instituições. Se não existisse a técnica de jogar xadrez, eu não poderia ter uma intenção de jogar uma partida de xadrez (I. F. 337 e também em 200, grifos meus). Toda regra linguística pode ser aplicada apenas em uma instituição (I. F. 381, 540). O conhecimento só encontra suas justificativas nas instituições. Wittgenstein nos diz que instituições são hábitos, práticas, costumes

sociais que se instauram a partir dos jogos de linguagem, nas formas de vida. Como por exemplo, a instituição do dinheiro (I. F. 584), da estética, da ética na qual aprendemos o conceito da palavra bom a partir de um jogo de linguagem (I. F. 77), da escrita e da leitura (I. F. 156), do sistema de medida (I. F. 50) e da matemática. A intenção está inserida na situação, nos hábitos humanos e nas instituições. Se não existisse a técnica de jogar xadrez, eu não poderia ter uma intenção de jogar uma partida de xadrez (I. F. 337) Seguir uma regra, fazer uma comunicação, dar uma ordem, jogar uma partida de xadrez são hábitos (costumes, instituições). (I. F. 199) Suponha que você veio como um explorador em um país desconhecido, com uma língua bastante estranha para você. Em que circunstância você diria que as pessoas de lá davam ordens, entendia, obedecia, rebelava-se contra essas ordens,

e assim por diante? O comportamento comum da humanidade é o sistema de referência por meio do qual nós interpretamos uma linguagem desconhecida. (PI 206)

Karl Popper, 1902-1994

Principais obras Lógica da Pesquisa (1934) Lógica da Pesquisa científica (1959) tradução para o inglês Conjecturas e refutações (1953)

Ideias centrais O problema da demarcação entre ciência e não ciência. (Física x psicanálise, por exemplo) Teorias são seletivas (contra o primado da pura observação). Ciência consiste em resolver problemas. O avanço do conhecimento se dá com os problemas e as tentativas de resolvêlos. Aceitação da crítica da indução de Hume de forma não cética com a substituição da indução pela falseabilidade. Uma teoria é científica apenas se ela é refutável por certos eventos. Portanto, o

teste de uma teoria científica é a tentativa de refutá-la ou falsificála. (Um contraexemplo falsifica uma teoria).

David Bloor, nascimento 1942

Principais obras Wittgenstein e Mannheim sobre a sociologia da matemática (1973) Imaginário social e conhecimento (1976) Wittgenstein: uma teoria social do conhecimento (1983) Wittgenstein: regras e instituições (1997)

O programa forte em sociologia do conhecimento científico Superação da sociologia do conhecimento quanto à limitação no entendimento da ciência, em especial, a matemática e a lógica.

Todas as passagens abaixo são de Imaginário social e conhecimento A sociologia da ciência pode explicar o conteúdo e a natureza do conhecimento científico? Para o sociólogo o conhecimento é tudo aquilo que as pessoas consideram conhecimento. O sociólogo estará interessado em particular pelas crenças que são assumidas como certas, institucionalizadas ou, ainda, investidas de autoridade por grupos de pessoas.

Quatro princípios: 1. Causal condições que ocasionam as crenças ou estados de conhecimento; 2. Imparcial verdade x falsidade, racionalidade x irracionalidade; 3. Simétrica os mesmos tipos de causas deverão explicar crenças falsas e verdadeiras; 4. Reflexiva aplicáveis à própria sociologia.

Karl Mannheim: Apesar de sua determinação em estabelecer cânones causais e simétricos de explicação, faltou-lhe vigor ao considerar assuntos aparentemente autônomos como a matemática e as ciências naturais. Sociologia do conhecimento = sociologia do erro. Empirismo O ponto crucial quanto ao empirismo é o seu caráter individual. Os aspectos do conhecimento que cada um de nós pode e deve ser fornecer a si próprio podem ser explicados de maneira adequada por esse tipo de modelo. Mas quanto do conhecimento humano e quanto da ciência são construídos tão somente pela confiança individual na interação do mundo com nossas capacidades animais? A experiência individual não ocorreria, de fato, dentro de um quadro de pressupostos, critérios, propósitos e significados que são partilhados? Afinal, a sociedade fornece essas coisas à mente individual e proporciona, ainda, as condições segundo as quais elas podem ser sustentadas e fortalecidas.

O conhecimento, portanto, é mais bem igualado à cultura que à experiência, aquilo que consideramos conhecimento científico é em grande parte teórico. É principalmente uma visão teórica do mundo que, em qualquer momento, os cientistas podem dizer conhecer. É em especial às suas teorias que os cientistas devem recorrer quando são incitados a nos dizer o que sabem sobre o mundo. Mas as teorias e o conhecimento teórico não são coisas obtidas em nossa experiência. São o que dá sentido à experiência ao proporcionar uma história sobre aquilo que a fundamenta, conecta e elucida. Isso não quer dizer que a teoria reaja à experiência. Ela o faz, mas não é apenas obtida com a experiência que explica, nem é exclusivamente apoiada nela. o componente teórico do conhecimento é um componente social e parte necessária da verdade, não um sinal de um mero erro. A teoria empirista é implausível como uma descrição do que, de fato, pode ser considerado nosso conhecimento. Ela oferece alguns tijolos, mas cala-se quanto ao design dos vários edifícios que construímos com ela.

Há um componente social em todo conhecimento. A aceitação de uma teoria por um grupo social a torna verdadeira? A única resposta a ser dada é não. A aceitação de uma teoria a torna o conhecimento de um grupo, ou faz com que ela seja a base para o seu entendimento e a sua adaptação ao mundo? A única resposta a ser dada é sim. O Debate Kuhn e Popper Matemática e lógica