Enxerto de Submucosa de intestino delgado (SIS) na cirurgia da Doença de Peyronie



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Enxerto de Submucosa de intestino delgado (SIS) na cirurgia da Doença de Peyronie Small intestine submucosa (SIS) grafting for the surgery of Peyronie s disease Autores: Nuno Tomada 1, Francisco Cruz 2 Instituições: 1 Assistente Hospitalar de Urologia, Serviço de Urologia do Hospital S. João, EPE Docente de Urologia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto; 2 Director do Serviço de Urologia do Hospital S. João, EPE Professor e Regente da Cadeira de Urologia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Correspondência: Nuno tomada Rua António Bessa Leite 1516E 5º Esq 4150-074 Porto, Portugal nunotomada@sapo.pt Data de Submissão: 28 de Agosto de 2011 Data de Aceitação: 30 de Agosto de 2011 Resumo A Doença de Peyronie (DP) é uma patologia benigna do tecido conjuntivo peniano, decorrente do processo cicatricial secundário a microtraumatismos de origem sexual. A cirurgia é o tratamento de eleição na impossibilidade de relações sexuais satisfatórias, desde que a doença se apresente estável num período de 3-6 meses. As cirurgias de encurtamento peniano (plicaturas ou corporoplastias) estão indicadas em doentes com curvaturas penianas inferiores a 60º e sem Disfunção Eréctil (DE). Contudo, nas curvaturas graves ou complexas, em doentes sem DE, está indicada a cirurgia de alongamento peniano com incisão/colocação de enxerto na área da placa. Para além disso, nos indivíduos com DE refractária às terapêuticas de 1ª e 2ª linha, está indicada a colocação de prótese peniana. Apresentamos a nossa experiência em técnicas cirúrgicas para curvaturas dorsais na DP associada, ou não, a DE, descrevendo a técnica de alongamento peniano com incisão e colocação de enxerto de submucosa de intestino delgado e a de incisão e colocação deste enxerto com implantação simultânea de prótese peniana de 3 componentes. Palavras-chave: Submucosa intestino delgado, Doença de Peyronie, Prótese peniana. Abstract Peyronie s disease (PD) is a benign disorder of the connective tissue of the tunica albuginea of the penis due to an inflammatory response secondary to sexual microtrauma. Surgery is the elected treatment in the impossibility of satisfactory intercourse, once the disease is stabilized for at least 3-6 months. Tunical shortening procedures are indicated for patients with penile curvatures < 60º and without erectile dysfunction (ED). However, tunical lengthening procedures with incision/excision of the plaque and grafting are ideal for complex or severe curvature in patients without ED. Furthermore, in refractory ED, penile prosthesis implantation is recommended. We present our surgical technique for PD dorsal curvature associated to ED or not. We describe a tunical lengthening procedure with incision of the plaque and grafting with porcine small intestinal submucosa, alone or with simultaneous inflatable penile prosthesis implantation. Keywords: Small intestinal submucosa, Peyronie s disease, Penile prosthesis. Introdução Doença de Peyronie (DP) é uma patologia benigna, adquirida, do tecido conjuntivo peniano, com uma prevalência de 3 a 9% nos homens adultos, com apresentação mais frequente na 5ª década de vida 1. O seu diagnóstico e tratamento permanecem um dilema terapêutico, em parte, devido à falta de conhecimento preciso da sua etiofisiopatogénese. Contudo, alterações estruturais do tecido decorrentes do processo cicatricial secundário a microtraumatismos de origem sexual, associadas a uma predisposição genética subjacente, são apontadas como a causa mais provável. 47

O tratamento cirúrgico é geralmente proposto quando o tratamento médico falha e não é mais possível a relação sexual satisfatória, após 12 meses do início da doença e desde que a doença se apresente estável há pelo menos, 3 a 6 meses (figura 1). O algoritmo de Levine e Lenting estabelece que doentes com curvaturas penianas inferiores a 60º e sem Disfunção Eréctil (DE) podem ser submetidos a cirurgias de encurtamento peniano, de que são exemplo as plicaturas ou corporoplastias, obedecendo ao princípio cirúrgico de Heineke-Mikulicz, como a técnica de Yachia 2,3. Quando a curvatura é superior a 60º ou na presença de curvaturas penianas complexas, como a deformidade em ampulheta em doentes sem DE, está indicada a cirurgia de alongamento peniano com incisão/colocação de enxerto na área da placa. Por outro lado, em doentes com DE refractária às terapêuticas de 1ª e 2ª linhas, está indicada a colocação de prótese peniana. Apesar do enxerto ideal ainda não ter sido encontrado, assiste-se a um interesse crescente por materiais desenvolvidos pela engenharia de tecidos. Neste artigo, descrevemos a nossa técnica de incisão e colocação de enxerto biológico de submucosa de intestino delgado de porco (SIS), com o nome comercial Surgisis- -Cook, sem e com implantação simultânea de prótese peniana de três componentes. Técnica para curvatura dorsal Cirurgia de alongamento peniano com incisão e colocação de enxerto (figura 2) Incisão subcoronal com desluvamento peniano até à fáscia de Dartos de modo a expor a fáscia de Buck. Identificação da área de maior curvatura através da indução de uma erecção artificial (torniquete na base do pénis e infusão contínua de soro fisiológico (SF) por agulha Butterfly 19F colocado na glande Sem ED/ED que responde ao tratamento médico Cirurgia Reconstrutiva Doentes com DP crónica ED refractária ao tratamento médico Prótese peniana (PP) Curvaturas <60º Sem deformidade destabilizadora Encurtamento peniano <20% Técnicas de encurtamento da túnica albugínea Nesbit Yachia Plicatura Curvaturas >60º Deformidade proeminente Encurtamento peniano grave Técnicas de alongamento da túnica albugínea Incisão ou excisão parcial e enxerto Curvaturas graves Encurtamento / deformidade graves Defeito da tunica >2 cm após incisão da placa Apenas PP PP com modelagem (se curvatura residual >30º PP) PP com enxerto (se curvatura residual >30º PP e modelagem) PP com técnicas de encurtamento (se curvatura residual >30º após PP e modelagem) Figura 1) Algoritmo cirúrgico para doentes na fase crónica da Doença de Peyronie. Adaptado de Levine e Lenting 2 Figura 2a) Figura 2b) Figura 2c) Figura 2d) Figura 2) Incisão e colocação de enxerto SIS em doente com curvatura dorsal 110º. a - demonstração da curvatura com indução de erecção artificial; b - dissecção do feixe neurovascular; c - encerramento do defeito da túnica albugínea com enxerto SIS; d - aspecto final com a obtenção de um pénis sem curvatura residual 48

peniana). Abertura da fáscia de Buck paralelamente à face lateral do corpo esponjoso uretral com mobilização do feixe neurovascular, sem recurso a coagulação unipolar. É realizada uma incisão de relaxamento em forma de I no ponto de curvatura máxima. O enxerto de SIS é sobredimensionado a 120% e hidratado em SF durante 15 minutos antes de ser suturado em posição com PDS 4/0. Verifica-se a correcção da curvatura e estanquicidade da sutura com nova indução de erecção artificial. Encerramento das fáscias de Buck e Dartos com Vicryl 3/0 e da incisão subcoronal com Vicryl rapid 4/0. Aplicação de penso compressivo durante 48h. Incisão e colocação de enxerto com implantação simultânea de prótese peniana de 3 componentes (figura. 3) Incisão subcoronal com desluvamento peniano até à fáscia de Dartos de modo a expor a fáscia de Buck. Abertura da fáscia de Buck paralelamente à face lateral do corpo esponjoso uretral com mobilização do feixe neurovascular, sem recurso a coagulação unipolar. Estiramento do pénis com recurso a fio de tracção na glande peniana e realização de uma incisão de relaxamento em forma de I na placa de Peyronie, com exérese da mesma sempre que necessário. O enxerto de SIS é sobredimensionado a 120% e hidratado em SF durante 15 minutos antes de ser suturado em posição com PDS 4/0. Colocação de prótese peniana insuflável de 3 componentes com a exposição proximal dos corpos cavernosos proporcionada por dois afastadores Deaver. Abertura bilateral da túnica albugínea numa extensão de 1,5cm. Dissecção lateralizada do tecido cavernoso com tesoura de Metzembaum e dilatação do espaço com dilatadores de Brooks. Medição com Furlow e escolha do tamanho adequado dos cilindros da prótese. Perfuração do pavimento medial do canal inguinal e fáscia transversalis, com tesoura de Mayo, com dissecção digital do espaço de Retzius e dilatação do mesmo com insuflação de balão de sonda vesical com 80 a 100cc de SF. Colocação dos cilindros nos corpos cavernosos e realização de teste de adequação ao espaço, confirmando a não existência de curvatura residual ou herniação dos cilindros na zona do enxerto. Desinsuflação do balão da sonda vesical colocado no espaço de Retzius e sua substituição pelo reservatório da prótese peniana que é, por sua vez, preenchido com SF. Realização da conexão dos tubos entre o reservatório e a bomba de enchimento e deposição da mesma em bolsa subdartos escrotal. Encerramento das fáscias de Buck e Dartos com Vicryl 3/0 e da incisão subcoronal com Vicryl rapid 4/0. Insuflação da prótese peniana, mantida durante 48h. Discussão A incisão da placa de Peyronie e colocação de enxerto é o tratamento cirúrgico de eleição para DP grave. Deverá, também, estar indicado em doentes com pénis de menores dimensões nos quais o procedimento Figura 3a) Figura 3b) Figura 3c) Figura 3d) Figura 3e) Figura 3f) Figura 3) Incisão e colocação de enxerto SIS com implantação simultânea de prótese peniana de 3 componentes. a - incisão da placa após dissecção do feixe neurovascular; b - colocação do enxerto de SIS no defeito criado na túnica albugínea; c - dissecção lateralizada do tecido cavernoso com tesoura de Metzembaum; d - dilatação do espaço de Retzius com balão de sonda vesical; e - inserção dos cilindros nos corpos cavernosos; f - aspecto final após insuflação da prótese peniana 49

com plicatura seja inaceitável dado o encurtamento peniano decorrente desta técnica. O material actualmente proposto para esta cirurgia reconstrutiva inclui material autólogo, tecidos de matriz extracelular (alo ou xenoenxertos), ou materiais sintéticos. A utilização destes últimos, de que é exemplo o politetrafluoroetileno - PTFE, foi abandonada por apresentarem taxas de infecção elevadas, fibrose resultante de fenómenos inflamatórios marcados, retracção devido à inelasticidade do material e risco de reacção alérgica. É unânime que o material ideal deveria apresentar as seguintes características: facilmente disponível, boa relação qualidade/preço, disponível em vários tamanhos e maleável. Para além disso, deveria associar-se a baixa morbilidade, baixo risco de infecção, antigenicidade mínima e, idealmente, ser capaz de preservar a função eréctil. De momento, a procura deste material ideal perdura, uma vez que todos os enxertos disponíveis apresentam vantagens e desvantagens e nenhum cumpre todos estes critérios. Como agravante, não existe nenhum estudo controlado e aleatorizado em humano que compare os diferentes tipos de materiais para enxerto e os seus resultados cirúrgicos. O tecido para a realização de enxerto autólogo pode ter diversas origens, como a mucosa bucal, derme ou veia safena. De todos, o mais utilizado tem sido o enxerto com veia safena, o qual apresenta resultados satisfatórios, a médio prazo, com taxas globais de alongamento peniano, encurtamento peniano e satisfação do doente variando entre 72-96%, 17-40% e 88-100%, respectivamente 4-6. Contudo, requer uma segunda incisão, prolongando o tempo cirúrgico, especialmente se for necessária a plastia de vários segmentos de veia safena para se adaptar ao local de enxertagem. Mais ainda, exclui a possibilidade de utilização futura da mesma caso seja necessária para uma cirurgia de bypass coronário. Assim, a utilização de materiais mais facilmente obtidos, de modo a reduzir tempos operatórios e morbilidade no local dador associados aos enxertos autólogos, tem sido um objectivo recorrente. O recurso ao enxerto de tecido de matriz extracelular, como o pericárdio bovino ou cadavérico, ou SIS, apresenta muitos potenciais benefícios como a capacidade de ser incorporado no tecido, resultando num aumento da sua força tênsil com o decorrer do tempo. Estudos em modelo animal demonstraram que, logo às 6 semanas, o enxerto SIS está completamente substituído por tecido conjuntivo bem vascularizado, com uma rede de colagénio bem organizada com orientação das suas fibras idêntica à do tecido original 7. O SIS é uma matriz biológica de colagénio acelular derivada da submucosa do intestino delgado de porco e está disponível em duas apresentações: uma camada (0,2 mm) e quatro camadas (0,42 mm) (Surgisis ES, Cook Biotech). Knoll descreveu, pela primeira vez, a utilização com sucesso deste material em 12 doentes, com bons resultados funcionais e sem complicações major, mas com tempo de seguimento reduzido 8. Contudo, com um período de seguimento mais prolongado (38 meses) e numa amostra de maior dimensão (162 doentes), este autor continuou a verificar apenas 9% de casos com recorrência da curvatura e a grande maioria dos doentes (79%) com preservação da função eréctil sem encurtamento peniano ou outras complicações major 9. Lee, et al descreveram resultados similares para uma série de 13 doentes 10. Após um período de seguimento médio de 14 meses, 4 apresentaram recorrência da placa e 2 apresentavam deformidade em ampulheta residual. Tal como Knoll, estes autores também não referiram a existência de infecção, deformidade aneurismática ou reacção imunológica no local do enxerto. De igual modo, num estudo recente comparativo entre derme, pericárdio e SIS, com um tempo de seguimento médio de 22 meses, verificou-se uma melhor preservação do comprimento e rigidez penianas e também melhoria da função eréctil, nos doentes submetidos a cirurgia com enxerto de SIS versus enxertos de derme ou pericárdio 11. No entanto, alguns autores apresentam resultados menos animadores, com elevadas taxas de recorrência da curvatura e de complicações cirúrgicas (37%) 12. O recurso a enxerto de SIS de uma camada, em vez de quatro camadas, limita a interpretação destes resultados. Por enquanto, reconhecem-se melhores resultados da utilização do SIS de quatro camadas que, apesar do maior risco de recorrência da curvatura, apresenta maior força tênsil e retenção do material de sutura, o que, teoricamente, reduzirá o efeito de abaulamento e melhorará a estanquicidade da anastomose. Também foram referidas, por Lee, et al, elevadas taxas de DE pós-operatória (54%) 10. Contudo, todos os doentes já recorriam a inibidores da fosfodiesterase tipo 5 pré-operatoriamente, o que pressupõe que já apresentariam DE prévia à cirurgia. Mesmo nas mãos mais experientes, a colocação de enxerto após incisão/excisão da placa de Peyronie apresenta riscos de DE de novo. Na avaliação pré-operatória, é fundamental a avaliação da integridade funcional das artérias cavernosas por doppler vascular colorido, devendo estas apresentar velocidades sistólicas superiores a 35-40 cm/s e velocidades diastólicas menores que 0 cm/s. Os doentes devem ter, assim, uma função eréctil suficiente para tolerar a ruptura da integridade da túnica albugínea e a mais que provável lesão do mecanismo veno-oclusivo, devendo 50

optar-se, sempre que exequível, pela incisão em detrimento da excisão da placa de Peyronie. Implantação de prótese peniana na Doença de Peyronie A implantação de prótese peniana de 3 componentes está associada a uma maior satisfação funcional e menores taxas de persistência da curvatura 13-15. Em doentes com curvaturas menores que 30º, a simples colocação da prótese poderá ser suficiente para a correcção das mesmas. Mas se a curvatura residual for superior a 30º, será necessário a modelagem do pénis com a manobra descrita por Wilson, ou a incisão da placa com ou sem colocação de enxerto 13. A modelagem manual implica o recurso a cilindros de grande resistência como os da 700 CX da AMS ou Titan Resist da Coloplast, com a clampagem da tubagem entre os cilindros e a bomba de preenchimento de modo a protegê-la de lesões de alta pressão. Esta manobra é suficiente para corrigir a curvatura em mais de metade dos casos, mas aproximadamente 1/3 dos homens necessita de cirurgia adicional 16. A incisão da placa da qual não resulta um defeito de preenchimento superior a 2cm poderá não necessitar de enxerto. No entanto, o seu encerramento com algum tipo de material é, também, por nós recomendado de modo a prevenir a formação de hematoma, infecção e/ou herniação dos cilindros. Uma vez que não existe uma indicação clara para o tipo de material a empregar, a escolha do enxerto depende primariamente da experiência do cirurgião e razões de custo-eficácia. Contudo, a não dependência de embebição para sobreviver, em contraste com os materiais autólogos e as características mecânicas que apresenta, torna a enxertagem com SIS particularmente apelativa. Conflitos de interesse Ambos os autores declaram que participaram no corrente trabalho e se responsabilizam por ele. Declaram, ainda, que não existem, da parte de qualquer um deles, conflitos de interesse nas afirmações proferidas no presente artigo. Referências Bibliográficas 1. Smith JF, Walsh TJ, Lue TF. Peyronie s disease: a critical appraisal of current diagnosis and treatment. Int J Impot Res 2008;20:445-459. 2. Levine LA, Lenting EL. A surgical algorithm for the treatment of Peyronie s Disease. J Urol 1997;158:2149-2152. 3. Yachia D. Modified corporoplasty for the treatment of penile curvature. J Urol 1990;143:80-82. 4. Adeniyi AA, Goorney SR, Pryor JP, Ralph DJ. The Lue procedure: an analysis of the outcome in Peyronie s disease. BJU Int 2002;89:404-408. 5. Akkus E, Ozkara H, Alici B, et al. Incision and Venous Patch Graft in the Surgical Treatment of Penile Curvature in Peyronie s Disease. Eur Urol 2001;40:531-6. 6. De Stafani S, Savoca G, Ciampalini S, Gattuccio I, Scieri F, Belgrano E. Saphenous vein harvesting by stripping technique and W - shaped patch covering after plaque incision in treatment of Peyronie s disease. Int J Impot Res 2000;12(6):299-301. 7. Dejardin LM, Arnoczky SP, Clarke RB. Use of small intestinal submucosal implants for regeneration of large fascial defects: an experimental study in dogs. J Biomed Mater Res 1999;46(2):203-11. 8. Knoll LD. Use of porcine small intestinal submucosal graft in the surgical treatment of Peyronie s disease. Urology 2001;57:753-7. 9. Knoll LD. Use of small intestinal submucosa graft for the surgical management of Peyronie s Disease. J Urol 2007;178:2474-8. 10. Lee EW, Shindel AW, Brandes SB. Small intestinal submucosa for patch grafting after plaque incision in the treatment of Peyronie s Disease. International Braz J Urol 2008;34:191-7. 11. Kovac JR, Brock GB. Surgical outcomes and patient satisfaction after dermal, pericardial, and small intestinal submucosal grafting for Peyronie s disease. J Sex Med 2007;4(5):1500-8. 12. Breyer BN, Brant WO, Garcia MM, Bella AJ, Lue TF. Complications of porcine small intestinal submucosa graft for Peyronie s Disease. J Urol 2007;177:589-91. 13. Wilson SK, Delk JR. A new treatment for Peyronie s disease: modeling the penis over an inflatable penile prosthesis. J Urol 1994;152(4):1121-3. 14. Levine LA, Dimitriou RJ. A surgical algorithm for penile prosthesis placement in men with erectile failure and Peyronie s disease. Int J Impot Res 2000;12(3):147-51. 15. Levine LA, Benson J, Hoover C. Inflatable penile prosthesis placement in men with Peyronie s disease and drug-resistant erectile dysfunction: A single-center study. J Sex Med 2010;7(11):3775-83. 16. Kadioglu A, Sanli O, Akman T, Cakan M, Erol B, Mamadov F. Surgical treatment of Peyronie s disease: a single center experience with 145 patients. Eur Urol 2008;53(2):432-9. 51