DO DESENHO A ESCRITA E LEITURA Cleide Nunes Miranda 1 Taís Batista 2 Thamires Sampaio 3 RESUMO: O presente estudo discute a relevância do ensino de leitura e principalmente, da escrita, trazendo em especial uma abordagem textual do que se refere às práticas de desenvolvimento da escrita utilizadas em sala de aula. Tendo como objetivo verificar as situações de aprendizagem a partir da análise da pesquisa realizada numa escola municipal de Jequié, partindo de um aprofundamento maior da obra de Emília Ferreiro e Ana Teberosky Psicogênese da escrita (1989), que revelam os processos de aprendizagem da criança e abordam em atividades respondidas por crianças, os métodos utilizados no processo de alfabetização. Por fim, compara as propostas pedagógicas aos pressupostos teóricos que a norteiam no desenvolvimento da escrita através do desenho. PALAVRAS-CHAVE: desenvolvimento da escrita; alfabetização; processo de aprendizagem. INTRODUÇÃO Este trabalho parte de uma pesquisa feita com os alunos de 6 (seis) anos, da Escola Municipal do Centro Comunitário Lagoa Dourada, tendo por objetivo analisar como acontece o desenvolvimento do processo de escrita e leitura, analisando como este processo está organizado e se este possibilita promover o desenvolvimento das competências básicas - falar, ler e escrever. E, para tanto, nos embasamos nos estágios de escrita definido por Emília Ferreiro e Ana Teberosky. 1 Discente do curso de Pedagogia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia UESB/ Campus de Jequié cleidenmiranda@hotmail.com 2 Discente do curso de Pedagogia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia UESB/ Campus de Jequié taisjq@hotmail.com 3 Discente do curso de Pedagogia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia UESB/ Campus de Jequié - thamires105@hotmail.com
Sabendo que o desenvolvimento e a representação da grafia para criança estão associados à origem do processo de desenvolvimento da escrita durante a história, bem como ao contexto cultural e as técnicas complexas que a envolve na produção ao longo da história, observa-se então, que a função social da escrita se realiza culturalmente por mediação feita por relações sociais e afetivas do mundo exterior do indivíduo. Partindo deste princípio, a compreensão de como se constitui a produção gráfica da criança está associada ao modo de interagir e reconstruir as especificidades da linguagem a cada momento para a criança. As representações e as modificações da grafia realizada através dos rabiscos e desenhos até a produção escrita são características e percepções da linguagem da criança através das vivências e interações com o contexto sociocultural. No entanto, quanto se trata de abordar o processo de alfabetização e letramento é preciso compreender a concepção de linguagem. Considerado o ensino da língua e o desenvolver da competência comunicativa, ligado ao uso da gramática internalizada ao falante e a tudo que é significativo para melhorar a expressão dos textos trabalhados, no grau em que o educando possa assimilar o conhecimento. Diante deste processo de construção de aprendizagem da escrita é que a criança vai recorrer aos aspectos primitivos da mesma, dando sequência a uma evolução, ao sistema de escrita do sujeito. Ao escrever e desenhar, a criança busca evidenciar traços da sua linguagem que ocorrem principalmente no processo de apropriação desse sistema, são as etapas de representação, que as autoras vem colocar como realismo simbólico da criança. Por isso, se torna importante propiciar a criança um contexto rico de experiências capazes de proporcionar uma aprendizagem significativa. Por isso a relevância deste trabalho, que se constitui como uma importante fonte de pesquisa para compreender a construção do conhecimento da criança nos diversos estágios da aprendizagem, desde as primeiras interpretações simbólicas até a produção escrita.
Sendo assim, a pesquisa realizada busca como ponto de partida apoiar os conteúdos trabalhados, partindo do concreto para analisar os aspectos verbais e não verbais desenvolvidos pela criança, justificando as necessidades diárias do contexto escolar e compreendendo as situações de aprendizagem que favoreça o desenvolvimento significativo. DO DESENHO À ESCRITA E A LEITURA Fundamentando-se nas concepções de Emília Ferreiro e Ana Teberosky, no livro Psicogênese da língua escrita, de 1989, onde as respectivas autoras sentem a necessidade de realizar uma pesquisa com 54 (cinquenta e quatro) crianças numa faixa etária de quatro a seis anos para verificar como ocorre o processo de desenvolvimento da escrita e da leitura nas mesmas, analisando as hipóteses levantadas para justificar as respostas destas crianças, verificando desde o rabisco, até a construção de orações e frases, é possível perceber o quadro do desenvolvimento do processo de escrita e leitura de crianças da rede pública municipal de Jequié, tomando como amostra para análise alguns alunos de seis anos, de uma escola municipal situada em Jequié. As referidas autoras visam em um dos capítulos da obra supracitada estabelecer uma proximidade entre educação e letramento, apresentando as diferenças entre letramento escolar e letramento não escolar, propondo a partir de então os conceitos de dimensão individual e de dimensão ideológica. Uma das concepções mais importantes dessas autoras diz respeito ao desenvolvimento da linguagem falada, que segundo elas é responsável pelo processo de desenvolvimento da escrita, propondo a partir disso que o educador propicie a transição do deslocamento da linguagem do desenhar coisas para desenhar a fala. Para essa pesquisa acontecer, Ferreiro e Tiberosky demonstrou interesse em descobrir o processo de construção da escrita, planejando algumas situações experimentais. Colocando, assim, as crianças em evidência com a sua própria escrita, de como ela vê a leitura, entende e como propõe para si.
A pesquisa realizada por estas autoras busca analisar quais estágios a criança precisa passar para de fato ser alfabetizada, concentrando o foco nos mecanismos cognitivos relacionados à leitura e a escrita, fazendo um processo de análise das respostas de cada criança pesquisada, demonstrando com esta, os artifícios que as crianças usam no processo de aprendizagem da aquisição da língua. Um dos aspectos fundamentais citados por essas autoras, embasadas nas concepções de Vigotsky, refere-se ao desenvolvimento da escrita e da linguagem, as quais para elas se constituem por meio da história, da cultura e do progresso da sociedade. Associando a escrita a representações de símbolos, os quais são representados através das experiências e da linguagem inicial da criança, partindo de hipóteses para colocações concretas em construção. E, é partindo destas colocações concretas que a criança inicia sua leitura de mundo, se inserindo na sociedade, iniciando-se no processo de letramento não escolar. Partindo deste contexto, diante da associação da simbologia ao processo de aprendizagem da criança, ressalta-se a importância do desenho no desenvolvimento da escrita, que de acordo com as referidas autoras, embasadas nas teorias de Piaget, afirmam que o simbolismo da criança está associado aos estágios de desenvolvimentos cognitivos, os quais contribuem para a construção da psicomotricidade e oralidade da criança. ANÁLISE DOS DADOS Para análise dos dados colhidos, tomamos como objeto de estudo, dentre os sete analisados, a aluna X 4, buscando averiguar quais os avanços que esta criança desenvolveu no decorrer de todo o período letivo, correlacionando estes avanços 4 Por questões éticas, prefere-se manter em sigilo a identificação da criança. A referida aluna tem seis anos e este cursando o 1º Ano, sendo representada nesta pesquisa pela incógnita X.
aos estágios de desenvolvimento da aprendizagem apresentados por Ferreiro e Tiberosky. Diante da imagem em seguimento percebemos que os desenhos da aluna em questão já são bem desenvolvidos. Quando solicitada para descobrir a adivinhação: MORO NELA... TEM PORTA E TEM JANELA. COMEÇA COM C e desenhar, ela além de desenhar a casa, constrói todo um cenário composto por árvores, flores, grama e nuvens tudo muito bem posicionados. Figura 1: Desenhando do seu jeito
Fonte: Exemplo retirado da página 12 do caderno de atividades. Atividade realizada em 15/03/12. Averiguamos nesta aluna, fazendo referência ao processo inicial de aquisição da escrita, que esta inicia este processo escrevendo muitas vezes de forma espelhada. Isso acontece porque no processo de aprendizagem da linguagem escrita a criança, utiliza de várias tentativas, pois, ainda não se sabe todas as regras. Em nossa cultura se lê e se escreve da esquerda para a direita, ao contrário de outras culturas que escrevem da direita para a esquerda. É preciso compreender que a criança em processo de alfabetização está adquirindo a noção de direita e esquerda. Figura 2: Comece a contar!
Fonte: Exemplo retirado da página 39 do caderno de atividades. Atividade realizada em 02/05/12. Vale ressaltar, que este perfil de escrita, hoje ainda é observável nesta aluna, pois em alguns momentos, menos constantes que nas atividades analisadas do período inicial do ano letivo, ainda é possível perceber a escrita espelhada. Mas, observa-se uma significativa evolução neste sentido, principalmente, com relação à escrita no reconhecimento dos números. Essas tentativas acontecem até o momento em que a criança atinge a escrita convencional. Figura 3: Aquisição da escrita Fonte: Exemplo retirado da página 26 do caderno de atividades. Atividade realizada em 20/07/12.
No que diz respeito ao trabalho realizado com a leitura de imagem, nota-se em alguns momentos a dificuldade da criança em reconhecer as imagens, pois estas não condizem nestes dados momentos com a realidade do aluno, trazendo, por exemplo, imagens de animais que não fazem parte do cotidiano familiar da criança. Além disso, é notável perceber que a criança na alfabetização costuma escrever as palavras de acordo ao tamanho do nome a ser escrito como a exemplo da palavra pernilongo com poucas letras e vaca com muitas. Isso acontece porque, no pensamento das crianças, o pernilongo é pequeno, logo precisa de poucas letras. Já a vaca é grande, então precisa de muitas letras ou utilizam as letras do próprio nome em ordem diferente para muitas palavras. Figura 4: Escrevendo do seu jeito Fonte: Exemplo retirado da página 41 do caderno de atividades. Atividade realizada em 07/05/12. Diante da pesquisa realizada por Ferreiro (1995), foram definidos cinco níveis sucessivos aos quais as crianças vão superando até chegar ao último nível que é a
escrita alfabética. Estando alfabetizada (alfabetização enquanto aquisição da leitura e da escrita), é o processo de escolarização que terá a responsabilidade de cuidar das questões gramaticais e do aperfeiçoamento da escrita. No Nível 1 a criança escreve por meio de linhas e curvas ou mesclando entre uma e outra. Embora esse traçado seja parecido nas crianças desse mesmo nível, é a subjetividade, a intenção de cada criança é que vai diferenciar o significado por isso só quem escreveu poderá interpretar a intenção que teve. Quando a criança cria hipótese de que palavras (objetos) diferentes devem ser representadas de forma diferente, já se encontra no Nível 2. A criança se utiliza de formas gráficas variadas para representar o objeto, podendo (como já fora dito) permutar formas gráficas que conhece para representar objetos diferentes. No Nível 3, a criança tenta atribuir uma letra para cada som das palavras que tenta escrever. Surge então um conflito: a hipótese que criou dos valores sonoros já não dão conta. Diante disso a criança tenta representar o som com o maior número possível de caracteres tentando ajustar a escrita ao valor sonoro das palavras. Esse conflito é característico do Nível 4, e representa a passagem da hipótese silábica (Nível 3) para a hipótese alfabética onde a criança reconhece que cada letra possui um valor sonoro menor que a sílaba e analisa esses sons para montar as palavras (Nível 5). Tendo em vista as respostas dadas pela criança X, e considerando as hipóteses levantadas por ela para justificar suas conclusões, percebe-se também, a atribuição de letras de acordo a quantidade de sílabas da palavra. Sendo assim, a aluna ainda se encontrava no NÍVEL 3: atribuindo uma letra para cada sílaba. Isto é possível observar na atividade que solicitou, através de um ditado, que ela escrevesse as palavras bola janela e mala e que depois desenhasse, foi observado que na primeira palavra a criança X atribuiu a vogal O para representar a sílaba BO e a vogal A para representar a sílaba LA. A palavra JANELA foi escrita corretamente, talvez por ter sido escrita na questão anterior. Quanto a palavra MALA, foi representada por AM, onde a aluna também se utilizou da
hipótese de representar uma letra para cada sílaba, só que além da aluna X demonstrar ter utilizado de tal hipótese, escreveu da direita para esquerda. Figura 5: Reconhecendo palavras e desenhos Fonte: Exemplo retirado da página 26 do caderno de atividades. Atividade realizada em 10/04/12. É válido enfatizar que houve um significativo avanço neste aspecto, já que, é possível analisar uma preocupação em tentar respeitar o número de caracteres da palavra e não mais atribuição de uma letra a cada sílaba da palavra. Figura 6: Compreendendo minha escrita Fonte: Exemplo retirado da página 98 do caderno de atividades. Atividade realizada em 20/07/12.
Observe que a escrita da palavra PÃO está correta e que, ao tentar escrever as palavras bermuda e lobo, a referida aluna demonstra ter avançada para o Nível 4, pois, para ajustar a escrita ao som da palavra acaba por escrever BELUSN e LOE. Quanto à leitura de texto, as autoras nos mostram através de exemplos que as crianças têm dificuldade em atribuir valor a certos componentes da frase e por isso acabam unindo um verbo ou artigo à palavra que o precede, como se estes fossem uma parte silábica da outra palavra. É o que vemos no exemplo abaixo: Figura 7: Reescrevendo a frase Fonte: Exemplo retirado da página 58 do caderno de atividades. Atividade realizada em 25/05/12. Com esta hipótese, pode-se observar que, por visualizar o sujeito como parte importante, a criança não consegue se utilizar do recurso de recorte silábico. Ainda que ela saiba que existe um verbo (a palavra que indica a ação do sujeito) ela não sabe identificar no texto tal palavra, nem em que posição se encontra. Quando a criança faz a transcrição da oralidade para escrita ela só pega elementos essenciais do texto e utiliza-se dessas partes principais para construir hipóteses, até mesmo da oralidade.
Contudo, através da abordagem de vários tipos de mensagens e as das formas cotidianas de produção oral é que normalmente a criança consegue obter um bom domínio da oralidade. Que funcionam principalmente sob a forma de reação imediata das palavras de outros interlocutores e de outras formas de comunicação oral que se interligam ao gênero e apoiam a aprendizagem escolar. CONSIDERAÇÕES FINAIS Através das observações feitas com os alunos e principalmente com a aluna X do 1 ano de uma escola municipal situada no município de Jequié, pode-se perceber que todas as crianças não se chegam a escola sem saber de nada no que se refere à língua, pois de acordo com Emília Ferreiro e Ana Tiberosky o conhecimento só se concretiza através do sujeito dotado de saberes e do objeto a conhecer, no qual o objeto serve de oportunidades para que o conhecimento se desenvolva. Em relação ao desenvolvimento da leitura e da escrita é preciso que toda criança passe pelas quatro fases para que seja alfabetizada e através das atividades da aluna X, foi visível aos níveis que se passaram no decorrer do ano letivo, as suas dificuldades e desenvolvimentos. As repetições de erros, em relação à forma espelhada de algumas letras e números, a junção de sílaba com verbo, as escritas de letras para representarem sílabas ou sílabas para representarem palavras, mostram que foram suficientes à aluna X entender o que realmente estava sendo pedido e mesmo, assim, volta a se repetir a algum tempo depois. De acordo com a concepção construtivista, a compreensão da criança ao objeto de conhecimento, esta ligada a possibilidade dela reconstruir este objeto por ter compreendido o que se deve fazer e quais são suas leis de composição. Daí se explica o processo da aluna X nas atividades.
Portanto para que aconteça o processo de alfabetização com eficiência, o professor tem que perceber o educando como um ser ativo e não como um ser passivo que só faz receber e aprender o que lhe é ensinado. Estimular os aspectos motores, cognitivos e afetivos é de fundamental importância, mas, tem que ser voltado ao contexto da realidade sócio-cultural do aluno. Para Ferreiro e Tiberosky, é necessário que o professor fique atento as representações da escrita dos alunos para saber agir nas diferentes situações, pois, é através da evolução dos alunos que se constroem, desconstroem e reconstroem a sua aprendizagem. Cabe ao professor organizar atividades que vem ajudar a reflexão da criança sobre a escrita, pois é na prática que ela aprende. REFERÊNCIA FERREIRO, Emília e TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da Língua Escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.