EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE



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Transcrição:

ARTIGO EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE 111

A autora 1 Felisnaide Martins dos Santos Bacharel em Administração com habilitação em Administração Hospitalar, especialista em Didática Universitária e gerente hospitalar do Hospital Unimed de Imperatriz (felisnaide@hotmail.com).

A afetividade é um tema que tem sido bastante discutido na atualidade, dentro e fora das instituições de ensino, pois interfere diretamente no desenvolvimento afetivo emocional, cognitivo, social e em todas as relações do ser humano. Ela vem sendo explorada em todos os campos da sociedade, através dos programas de qualidade, de incentivo e de projetos voltados para os recursos humanos, pois o ser humano necessita de afeto para viver. Foi pensando nisso que se decidiu realizar esta pesquisa bibliográfica acerca da importância da afetividade no processo de ensino e aprendizagem como mediadora da práxis educativa no ensino superior. Para Piaget (apud LA TAILLE, 1992, p. 14), o ser social de mais alto nível é justamente aquele que consegue relacionar-se com seus semelhantes de forma equilibrada. Nessa perspectiva, será apresentada a importância da relação professor-aluno, o quão necessário é manter a inteligência emocional dentro da sala de aula, respeitando os alunos como seres capazes de perceber, questionar e contribuir de forma significativa no ensino, ao oposto de tratá-los como seres insignificantes diante de seu mestre que sabe tudo. A afetividade na relação entre estas duas figuras contribuirá para que os alunos se sintam valorizados, acrescenta um incremento à autoestima e pode favorecer o processo de aprendizagem. Piaget (apud LA TAILLE, 1992) afirma que a inteligência humana somente se desenvolve no indivíduo em função de interações sociais, que são em geral demasiadamente negligenciadas. A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM... O afeto é considerado a energia que move as ações dos seres humanos, pois sem a troca, o calor e a afabilidade não há motivação nem interação entre os sujeitos, o que pode dificultar o desenvolvimento da inteligência. A afetividade é necessária para a vida e essencial para a construção de relações saudáveis entre os indivíduos. Assim sendo, acresce a necessidade da realização desta pesquisa teórica que visa a contribuir para uma reflexão sobre a importância da relação interpessoal professor-aluno no ensino superior. Revista UNI Imperatriz (MA) ano 2 n.2 p.111-122 janeiro/julho 2012 113

A afetividade, segundo Almeida (1999), constitui um domínio tão importante quanto a inteligência para o desenvolvimento humano. Ela não é sentimento nem paixão, muito menos emoção. Ela é um termo mais amplo e engloba estes três últimos, que, apesar de muito parecidos, são distintos entre si. Na concepção de Wallon (apud ALMEIDA, 1999), a afetividade exerce um papel imprescindível no processo de desenvolvimento da personalidade, e este, por sua vez, constitui-se sob alternância dos domínios funcionais. FELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS Wallon (apud ALMEIDA, 1999) assinala que o nascimento da afetividade é anterior à inteligência. O ser humano, enquanto ainda recémnascido, antes mesmo de estabelecer algum tipo de relação com as pessoas, isto é, no sentido de conhecer, observar, descobrir o meio, permanece voltado para si mesmo como se estivesse se preparando para interagir no mundo físico. Na concepção de Almeida (1999), enquanto não aparece a palavra, é o movimento que traduz a vida psíquica, garantindo a relação da criança com o meio. As descargas motoras e, um pouco mais tarde, os gestos do lactente são carregados de significativos afetos, que, nesse princípio, nada mais são do que expressões das necessidades alimentares e do humor. A afetividade manifesta-se primitivamente no comportamento, nos gestos expressivos da criança. E enquanto as palavras não aparecem, são nesses movimentos que a afetividade se manifesta. Segundo Almeida (1999), na teoria walloniana a afetividade é o ponto de partida para o desenvolvimento do indivíduo e o seu crescimento parte de uma sociabilização sincrética para uma individualização psicológica. Na concepção de Wallon: A importância das relações humanas para o crescimento do homem está escrita na própria história da humanidade. O meio é uma circunstância necessária para a modelagem do indivíduo. Sem ele a civilização não existiria, pois foi graças à agregação dos grupos que a humanidade pôde construir os seus valores, os seus papéis, a própria sociedade (WALLON apud ALMEIDA, 1999, p. 45). 114 EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE

Assim sendo, a partir dessa concepção de Wallon, é interessante que o ambiente em sala de aula seja propício para que se desenvolva a afetividade na relação professor-aluno, que vínculos afetivos sejam criados, que exista uma sensação de bem-estar na relação de ambos para que assim o trabalho do professor seja gratificante e que o aluno tenha motivação para permanecer na instituição absorvendo do ensino o que há de melhor, uma aprendizagem significativa. Sem motivação, a razão de estar na sala de aula pode deixar de existir e isso poderá resultar em frustração, desânimo, reprovação, má qualificação profissional e, até mesmo, desistência. O tema afetividade não é muito associado à teoria de Jean Piaget, o que não significa dizer que este teórico não tenha dado grande importância para o estudo da influência da afetividade para o desenvolvimento psicológico e consequentemente da inteligência (SOUZA, 2003). Para Piaget (apud LA TAILLE, 1992), o desenvolvimento da inteligência humana só se efetiva a partir das interações sociais. Analisou-se a seguinte informação a partir da concepção de Piaget: O homem é um ser essencialmente social, impossível, portanto, de ser pensado fora do contexto da sociedade em que nasce e vive. Em outras palavras, o homem não social, o homem considerado como uma molécula isolada do resto de seus semelhantes, o homem visto como independente das influências dos diversos grupos que frequenta, o homem visto como imune aos legados da história e da tradição, este homem simplesmente não existe (PIAGET apud LA TAILLE, 2003, p. 11). A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM... Nesta perspectiva, observa-se claramente que o homem necessita interagir com os outros e com o meio para que ao menos exista. Tornam-se impraticáveis as vivências sem comunicação, sem troca e sem afeto. Para Piaget, é a partir das relações sociais que a criança vai se desprendendo da fase do egocentrismo, começa a perceber a importância das relações com os outros e assim vai desenvolvendo a construção do seu eu e do outro como referência (SALTINI,1999 apud SILVA; SCHNEIDER, 2007). Assim sendo, a manei- Revista UNI Imperatriz (MA) ano 2 n.2 p.111-122 janeiro/julho 2012 115

ra como os pais se relacionam com essa criança, o meio em que ela convive e exerce suas primeiras relações poderão influenciar no seu desenvolvimento moral e na formação de si mesma. É interessante que, do ponto de vista de Piaget (SOUZA, 2003) no que diz respeito à afetividade, ela não se restringe apenas às emoções e aos sentimentos, mas engloba as tendências e a vontade. Na concepção de Vygotsky (apud OLIVEIRA; REGO, 2003), uma compreensão completa do pensamento humano só é possível quando se compreende a sua base afetivo-volitiva. Este teórico é enfático ao afirmar que FELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS Quem separa desde o começo o pensamento do afeto fecha para sempre a possibilidade de explicar as causas do pensamento [...]. De igual modo, quem separa o pensamento do afeto nega de antemão a possibilidade de estudar a influência inversa do pensamento no plano afetivo, volitivo da vida psíquica, porque uma análise determinista desta última inclui tanto atribuir ao pensamento um poder mágico capaz de fazer depender o comportamento humano única e exclusivamente de um sistema interno do indivíduo, como transformar o pensamento em um apêndice inútil do comportamento, em sua sombra, sua desnecessária e impotente (VYGOTSKY, 1993, P. 25 APUD REGO; OLIVEIRA, 2003, P.18). Vygotsky (apud OLIVEIRA; REGO, 2003) faz um alerta que reconhecer a íntima relação entre o pensamento e a dimensão afetiva é uma condição necessária, porém não suficiente, para os estudos psicológicos. Para ele, é necessário estudar essa relação ao longo da história do desenvolvimento de uma perspectiva genética. Para Vygotsky (apud OLIVEIRA; REGO, 2003), nos pressupostos da teoria histórico-cultural, o indivíduo é produto do desenvolvimento de processos físicos e mentais, cognitivos e afetivos, internos e externos. Em relação ao campo das emoções, Vygotsky (Van der Veer e Valsiner, 1996, p. 382 apud Oliveira; Rego, 2003) postula diferenças significativas entre as emoções dos animais e dos seres humanos, pois, do seu ponto de vista, humanos têm capacidade de emoções mais sofisticadas do que os animais e os adultos têm uma vida emocional mais refinada do que as crianças. Conforme as pessoas aperfeiçoam o controle sobre si mesmas, mudanças qualitativas ocorrem no campo das emoções. Vygotsky (apud OLIVEIRA; REGO, 2003) esclarece a questão acerca da razão, pois para ele a razão tem o papel de controle dos im- 116 EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE

pulsos do ser humano cultural adulto, relacionado à autorregulação do comportamento. Acrescenta ainda, enfocando que esse papel não deve ser confundido com a ideia de razão repressora, capaz de anular ou extinguir os afetos. Ao oposto, com o desenvolvimento a razão está a serviço da vida afetiva, na medida em que é um instrumento de elaboração e refinamento dos sentimentos. Numa interpretação de Oliveira; Rego (2003) acerca da importância da afetividade na teoria de Vygotsky, do mesmo jeito que o ser humano aprende a agir, a pensar e a falar ele aprende a sentir. Nesta perspectiva, o aprendizado sobre as emoções e afetos é longo, inicia-se nas primeiras horas de vida de uma criança e se prolonga por toda a sua existência. Diante de todos os pressupostos teóricos acerca da importância da afetividade, percebe-se que ela é essencial não só na relação professor-aluno, mas também como uma estratégia nas instituições de ensino superior em suas práticas pedagógicas. Um professor afetivo faz toda a diferença na sala de aula em todas as modalidades de ensino, pois através da afetividade o aluno poderá ser motivado a construir o seu conhecimento. O aluno precisa ser visto pelo professor como um ser interativo e ativo no seu processo de crescimento e desenvolvimento, enquanto o professor é o seu mediador, facilitador. Para que haja um excelente aprendizado, é necessário que o aluno não seja forçado a fazer nada, mas que aja por si só, por seus próprios esforços, pois na relação precisa existir respeito mútuo. A afetividade, na concepção de Henri Wallon (1879-1962), parte do pressuposto de que é preciso estudar a formação do ser humano a partir das emoções, buscando compreendê-lo do ponto de vista do ato motor, da afetividade e da inteligência, assim como do ponto de vista das relações com o meio. Ele concentra suas investigações nos primeiros anos de vida, período em que, segundo ele, é possível compreender a formação das funções psíquicas, que na fase adulta se tornam mais difíceis de compreender, uma vez que tais funções já aparecem integradas a funções do desenvolvimento tardio (GALVÃO, 2003). Em sua teoria original, Wallon (apud DANTAS, 1992) atribui grande importância à emoção, pois ela é vista como instrumento de A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM... Revista UNI Imperatriz (MA) ano 2 n.2 p.111-122 janeiro/julho 2012 117

sobrevivência para o ser humano. Se não fosse a capacidade que o ser humano tem, desde o seu nascimento, de mobilizar o ambiente através de suas emoções, possivelmente todos pereceriam. O choro sobre a mãe atua como um chamado de socorro que imediatamente é atendido, assim como os gestos, que, mesmo sem a fala, expressam o que a criança está sentindo. É neste sentido que Wallon considera a afetividade fundamentalmente social, pois: Ela fornece o primeiro e mais forte vínculo entre os indivíduos e supre a insuficiência da articulação cognitiva nos primórdios da história do ser e da espécie (WALLON apud DANTAS, 1992, p. 85). O contágio das emoções entre os seres humanos é inevitável, por isso Wallon (2007) afirma que é impossível as influências afetivas que rodeiam uma criança durante toda a sua infância não terem sobre a sua evolução uma ação determinante. Na teoria walloniana, compete também à emoção unir os indivíduos entre si. FELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS Para o desenvolvimento e crescimento do ser humano, a interação entre afetividade e inteligência exerce um importante papel, pois ambas se desenvolvem gradativamente no indivíduo e existe uma integração que as permite estar juntas mesmo quando o momento é propício apenas para uma. À medida que o indivíduo vai se desenvolvendo, a afetividade vai cedendo lugar à inteligência, pois ele sente a necessidade de conhecer o mundo em sua forma real. Segundo Oliveira (2001), costuma-se distinguir entre as funções cognitivas e as afetivas e/ou emotivas, sendo estas últimas frequentemente identificadas com a motivação e também com os aspectos conativos ou volitivos do sujeito. As funções cognitivas e ou intelectuais abrangem aspectos muito diversos, como a percepção, a aprendizagem, o conhecimento, o pensamento, o conceito, o juízo, o raciocínio, a solução de um problema etc, enfim, tudo o que se relaciona com a aquisição e processamento de informação. Nesta perspectiva, a afetividade é a motivação que impulsiona o indivíduo a seguir em frente, ela constitui o fator energético do comportamento humano e não pode ser separada das funções cognitivas. 118 EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE

Para Dantas, a afetividade não é apenas uma das dimensões da pessoa, ela é também uma fase do desenvolvimento. O ser humano foi, logo que saiu da vida puramente orgânica, um ser afetivo. Da afetividade diferenciou-se, lentamente, a vida racional. Portanto, no início da vida, afetividade e inteligência estão sincreticamente misturadas, com o predomínio da primeira (DANTAS, 1992, p. 90). O ser humano vai crescendo e a diferenciação entre a afetividade e a inteligência vai surgindo, mas elas andam paralelas. Vez por outra, elas alternam, uma dando lugar à outra, e a afetividade muitas vezes reflui para dar lugar à inteligência, para que o ser em processo de crescimento encare a realidade da vida (DANTAS, 1992). Nesta perspectiva, é a partir daí que a personalidade do ser humano é formada segundo as relações variáveis entre as duas funções, ora predominando a afetiva ora a cognitiva. Elas oscilam, mas não se separam. Segundo Almeida (1999, p. 50), a evolução da inteligência é incorporada pela afetividade de tal modo que uma determinada relação afetiva evolui para uma outra. Na obra walloniana (ALMEIDA, 1999), a afetividade e a inteligência constituem um par inseparável na evolução psíquica, pois ambas possuem funções bem definidas, e quando integradas permitem ao indivíduo atingir níveis de evolução cada vez mais elevados. Diante dos pressupostos teóricos acerca da relação entre cognição e afeto, observa-se que é impossível separá-los. Piaget (apud OLIVEIRA, 2001) exemplifica de uma maneira muito interessante a interação destas funções, comparando-as a uma máquina e o seu combustível. Ele diz que a afetividade e motivação são o combustível, enquanto a cognição é a estrutura da máquina ou motor pensante. Realmente, é um exemplo significativo, porque nenhum motor funciona sozinho e muito menos sem combustível, desse ponto de vista o sujeito da questão seria o condutor da máquina. A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM... É difícil aceitar a realidade de que muitos educadores ainda façam uso de uma teoria que separa a cognição e o afeto. É de suma importância que o professor assuma real mente o papel de um educador, facilitador, que observa com olhar atento o seu aluno, não só no aspecto cognitivo, mas também no emocional. Revista UNI Imperatriz (MA) ano 2 n.2 p.111-122 janeiro/julho 2012 119

Apesar de a afetividade ser um tema bastante discutido na atualidade, em muitas instituições de ensino ainda existem educadores que insistem em separar o afetivo do cognitivo. Na teoria walloniana, a afetividade é o ponto de partida para o desenvolvimento do indivíduo. Ela é um domínio funcional cujo desenvolvimento depende de dois fatores: o orgânico e o social. Entre esses dois fatores existe uma relação muito próxima: às vezes um se destaca mais que o outro, mas jamais se separam. A evolução do ser humano parte da sociabilidade sincrética para uma individualização psicológica. Nesse período, as relações familiares e com o meio em que este indivíduo convive exercem um importante papel para a sua formação (ALMEIDA, 1999). FELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS Segundo Wallon, A importância das relações humanas para o crescimento do homem está escrita em sua própria história. O meio é uma circunstância necessária para a modelagem do indivíduo. Sem ele a civilização não existiria, pois foi graças à agregação dos grupos que a humanidade pôde construir os seus valores, os seus papéis, a própria sociedade (WALLON, 1959 APUD ALMEIDA, 1999, p. 45). O ser humano, por ser geneticamente social, necessita do outro para se delimitar como pessoa. Para Wallon (apud ALMEIDA 1999), o meio social é cultural e interpessoal, indispensável para a formação do eu. Para Almeida (1999), a postura a ser assumida pelo professor em sala de aula deve ser a de um observador, um intérprete perspicaz capaz de identificar os entraves que se estabelecem entre o par professor-aluno, para melhor saber lidar com a teia das relações que se criam na apropriação do conhecimento. Em diversas áreas, quer seja no âmbito empresarial, educacional, cristão, grupos de apoios e entre outras, para que as pessoas se reú nam é preciso se sentirem motivadas, pois a troca de afetos, o amar e ser amado, sentir-se respeitado, valorizado, faz toda a 120 EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE

diferença no processo das relações. Como bem comparou Piaget (apud OLIVEIRA, 2001), o afeto representa o combustível e a inteligência representa o motor, nenhum dos dois funciona sozinho. Nesta concepção, o sujeito (aluno) é o condutor do motor, e este precisa de combustível (motivação) para que o motor (inteligência) funcione e haja uma boa aprendizagem. O processo ensino-aprendizagem, do ponto de vista de Relvas (2007), está associado à construção de pontes entre a objetividade e a subjetividade, entre o ser que aprende e o ser que ensina. Paín (apud FERNANDÉZ, 1991) alerta: A função da educação pode ser alienante ou libertadora, dependendo de como for usada, quer dizer, a educação como tal não é culpada de uma coisa ou de outra, mas a forma como se instrumente esta educação pode ter um efeito alienante ou libertador (PAÍN apud FERNANDÉZ, 1991, p. 82). No ensino superior, a afetividade deve ser empregada de uma forma mais abrangente, referindo-se às relações interpessoais e ao comportamento próprio do ser humano. Ao professor cabe ser empático com os alunos para que vínculos afetivos sejam formados tendo como base as boas relações humanas. Para que haja uma boa interação dos sujeitos (professor-aluno) e para que haja um desenvolvimento maior na aprendizagem, é necessário mais que a preocupação na aplicação do conteúdo por parte do professor. O aprendizado tem que ser prazeroso, tanto para quem ensina como para quem recebe. Ele não pode ser imposto. Podemos citar como exemplo uma pessoa que é apaixonada pelo que faz, ela desempenha suas tarefas com prazer, de maneira descomedida, para ela o que importa é a satisfação de fazer o seu trabalho. De igual modo deve ser o professor em sala de aula. A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM... O indivíduo, por ser geneticamente social, precisa de afeto para a sua sobrevivência. No processo de aprendizagem não poderia ser diferente, pois ser admirado, valorizado, ter alguém para Revista UNI Imperatriz (MA) ano 2 n.2 p.111-122 janeiro/julho 2012 121

alimentar o ego tornam-se fatores imprescindíveis para que os resultados positivos em sala de aula sejam alcançados. É muito comum encontrar professores que ignoram a articulação afeto-cognitivo e instituições que, como transmissoras de conhecimentos, muitas vezes não têm clareza de que, além da missão de transmitir conhecimentos, lidam com outros as pectos do desenvolvimento humano ligados diretamente ao aspecto cognitivo. A afetividade e a inteligência estão intimamente ligadas e não podem de maneira nenhuma ser tratadas de forma separada. À medida que a inteligência vai aumentando, a afetividade vai se racionalizando e, assim, o ser humano vai se desenvolvendo. Um professor no ensino superior, para fazer a diferença no processo de aprendizagem e formação do sujeito para a sociedade, necessita entender o que é a afetividade, para que serve, como funciona e entender o propósito das relações afetivas em sala de aula. FELISNAIDE MARTINS DOS SANTOS ALMEIDA, Ana Rita Silva. A emoção na sala de aula. Campinas: Papirus, 1999 (Coleção Papirus Educação). ARANTES, Valéria Amorim (org.). Afetividade na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, 2003 (Coleção na escola: alternativas teóricas e práticas). DANTAS, Heloysa. Do ato motor ao ato mental: a gênese da inteligência segundo Wallon. São Paulo: Summus, 1992. FERNÁNDEZ, Alicia. A inteligência aprisionada. Porto Alegre: Artmed, 1991. GALVÃO, Izabel. Expressividade e emoções segundo a perspectiva de Wallon. São Paulo: Summus, 2003. (Coleção na escola: alternativas teóricas e práticas) GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: a teoria revolucionária que define o que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. LA TAILLE, Yves de; OLIVEIRA, Marta Kohl; DANTAS, Heloysa. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992. OLIVEIRA, José H. Barros de. Freud e Piaget: afectividade e inteligência. Lisboa: Instituto Piaget, 2001. OLIVEIRA, Marta Kohl de; REGO, Teresa Cristina. Vygotsky e as complexas relações entre cognição e afeto. Paulo: Summus, 2003. (Coleção na escola: alternativas teóricas e práticas) RELVAS, Marta Pires. Fundamentos biológicos da Educação: despertando inteligências e afetividade no processo de aprendizagem. 2ª ed. Rio de Janeiro: Wak Ed., 2007. SILVA, Jamile Beatriz Carneiro e; SCHNEI- DER, Ernani José. Aspectos socioafetivos do processo de ensino e aprendizagem. Revista de divulgação 83 técnico científica do ICPG. v. 3, n. 11, jul. dez. 2007. SOUZA, Maria Thereza Costa Coelho de. O desenvolvimento afetivo segundo Piaget. São Paulo: Summus, 2003. (Coleção na escola: alternativas teóricas e práticas) VIGOTSKY, Lev Semenovich. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 7ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. WALLON, Henri. A evolução psicológica da criança. São Paulo: Martins Fontes, 2007 (Coleção psicologia e pedagogia). 122 EDUCAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE